Volume 3
Capítulo 150: O Pôr-Do-Sol
— O que é isso? — Lee-Sen-Park perguntou confuso, olhando as chamas azuis que devoravam lentamente as roupas de Zita — Você não deveria ter poder algum.
— Deixa eu te mostrar uma coisinha! — Zita disse enquanto exibia uma pedra vermelha na palma da mão — Isso aqui é um cristal raríssimo, formado nas entranhas da montanha de fogo. Metade aqui é cristal de magma, tipo um basalto vermelho. Mas o legal mesmo é a outra metade!
Ao mesmo tempo que terminou de falar, seu corpo se cobriu de chamas, estas eram um pouco mais claras do que as de Lee-Sen-Park. A roupa inteira de Zita desapareceu junto com o aparecimento de suas chamas, mas ela usava o traje especial que recebeu dos efrites.
—É energia! Magia de fogo, como um sol em miniatura… Ou uma bomba nuclear. — Zita disse. — Agora vamos logo com isso, o sol está quase se pondo e eu não quero servir de lamparina.
Os cabelos dela se tornaram vermelhos mais uma vez, um tom mais intenso do que costumavam ser tempos atrás. Sobre seu corpo havia apenas uma roupa colada, como se fossem escamas escuras que brotavam de sua pele, além das labaredas dançantes.
— Roupas à prova de fogo!? — Lee-Sen-Park disse, mexendo na gola de seu uniforme militar — As minhas também são…
O novo herdeiro da chama olhava para Zita com admiração, como se desejasse ter tanto poder quanto ela. E a sacerdotisa do fogo sabia disso, e por esse motivo aceitou duelar, mas ela não estava disposta a enrolar muito.
O primeiro movimento de Zita foi encurtar a distância entre os dois. Ela era imune ao fogo, e como não sabia se ele também era, buscou levar o assunto para o combate físico.
Ela não sabia se a intenção dele era realmente uma luta, mas foi desafiada e não estava com paciência para conversas fiadas. Além do mais, Zita tinha um plano e precisava que tudo desse certo, para isso contava com Le-Sen-Park.
A expressão dele mudou de confiança para confusão.
Em vez de contato físico, Zita criou uma explosão entre os dois, amortecendo sua velocidade e arremessando Lee-Sen-Park para trás. Aquele foi um truque que ela aprendeu com experiência pessoa, o coreano não esperaria por algo tão inusitado.
Zita era uma das pessoas que acreditavam que o brasileiro só não dominou o mundo porque está ocupado com meme e gambiarra. Sua mania tentar resolver as coisas com criatividade foi o que a tornou um destaque entre os heróis em ambos os mundos.
Conforme as chamas se dissiparam ela viu Lee-Sen-Park caído, confuso e chamuscado. Ele se levantou cambaleando, em seguida se cobriu de chamas e adotou uma postura mais equilibrada.
— Pronto para a próxima? — Zita provocou.
— Não imaginei que dava para usar esse poder dessa forma… — Ele comentou.
— Sua vez de atacar. — Zita gesticulou com a mão, o incitando a ir em frente.
O coreano bufou e lançou três bolas de fogo de tamanhos pequenos em Zita, ela nem se moveu, recebendo o ataque com uma expressão apática.
— Vamos lá, você consegue fazer melhor que isso… — Zita disse e bocejou.
Lee-Sen-Park criou, então, dois chicotes de fogo ligados um a cada braço. Isso fez Zita recuar dois passos, bem a tempo de um dos chicotes estalar exatamente onde ela estava um segundo antes.
Aproveitando o recuo de Zita, o coreano avançou em direção a ela enquanto convertia o segundo chicote em uma esfera de chamas. Uma ideia interessante, Zita concluiu, liberar as chamas lentamente na forma de um chicote para elas não dispersarem e depois moldá-las em uma esfera de fogo.
Ele aprendia rápido.
Mas ainda não tinha o tempo de treino que ela teve. E com um giro rente ao chão, Zita conseguiu desviar do ataque e ficar de frente a ele pronta para atacar. E mesmo que Lee-Sen-Park soubesse o viria em seguida, não foi capaz de evitar.
Outra explosão à queima-roupa o arremessou para trás.
Zita pôs as mãos na cintura e esperou que ele levantasse outra vez. O que foi mais rápido do que na primeira queda, já que agora ele parecia entender o que havia acontecido.
Levantando seu corpo com um salto, Lee-Sen-Park já se posicionou atacando. Duas bolas de fogo maiores que as anteriores voaram lado a lado em direção a Zita, e dessa vez ela esquivou do ataque.
Uma esquiva do adversário era um segundo de vantagem ao atacante, ele acabara de aprender isso na prática. Aproveitando esse segundo, o coreano colocou as duas mãos à frente com as palmas voltadas para Zita e lançou todo o fogo que conseguiu.
Não uma bola de fogo, era mais como um lança-chamas.
Por mais que fosse à prova de fogo, ela ainda precisava respirar, ele acreditava. Era assim que conseguiria enfraquecê-la. Lee-Sen-Park nunca pensou em derrotar Zita, apenas queria ser reconhecido por ela.
Ao contrário de suas expectativas, ele viu a garota dividir as chamas ao meio com apenas um movimento de mão. Isso fez ele cessar o ataque e pensar na próxima estratégia.
O terreno era irregular, não daria para usar ele como vantagem, principalmente porque ele estava acostumado a lutas em ambientes artificiais, com solo mais nivelado. Zita não tinha tanto poder, mas seu controle sobre o fogo era impecável, outro ponto contra o coreano. E ela ainda tinha todo aquele pessoal lá atrás, gritando e vibrando a cada movimento executado com perfeição.
O que Lee-Sen-Park pensou que seria uma partida de exibição dele, estava mais para humilhação pública. Desistir também não era opção, ele havia começado isso e iria até o final. Mesmo que o final fosse uma derrota vergonhosa.
De qualquer forma, o objetivo daquela comitiva toda do qual ele fazia parte era apenas entreter os heróis naquela região isolada enquanto a AI abria suas rotas e construía suas bases pelo continente.
Mais uma vez ele foi em direção à garota em chamas, e imitando ela, se cobriu de chamas. Por algum motivo aquilo pareceu aumentar a sua velocidade. Talvez fosse sua impressão, ou talvez esse fosse o motivo dela ser mais rápida do que ele.
A experiência em combate que Zita acumulou estava mostrando a sua eficiência. Ele usaria essa oportunidade para aprender tanto quanto fosse possível com ela.
Encurtando a distância, ambos partiram para o combate físico. Uma combinação aleatória de chutes, socos e explosões à curta distância. Até que Lee-Sen-Park sentiu seu poder começar a esgotar.
As chamas que cobriam seu corpo desapareceram, e ele saltou para trás buscando abrir uma distância segura entre si mesmo e Zita. Era admirável como ela conseguia manter tanto poder com apenas uma pedrinha.
Uma bola de fogo voou em direção a ele, que ainda estava em movimento. Não havia tempo para desviar.
Lee-Sen-Park se preparou para o impacto, mas a bola de fogo se dissipou a menos de um metro de seu corpo. Antes que ele tivesse tempo de ficar confuso, a explosão veio do seu lado esquerdo, o derrubando mais uma vez.
Ao mesmo tempo um som de disparo foi ouvido. Um estrondo ensurdecedor que ecoou por todo o vale, trazendo consigo um silêncio profundo.
Um tiro que acertou o abdômen de Zita, exatamente na altura do estômago, e lá deixou um buraco do tamanho de um punho. O impacto arremessou ela alguns metros para trás, mas Zita ainda conseguiu se manter de pé.
As chamas que cobriam seu corpo foram reduzindo aos poucos, se tornando efêmeras até que desapareceram por completo.
Em cima de uma das formações rochosas que rodeavam o acampamento da Aliança Internacional estava uma arma de cano longo, manuseada por três militares. Saía fumaça do cano da arma indicando que havia ocorrido um disparo.
O diâmetro de quatro polegadas na extremidade do cano indicava que o projétil era grande, e pelo estrago que fez no corpo da heroína, a arma mostrava um alto potencial de destruição.
Lee-Sen-Park estava caído, olhando para a garota ferida que se recusava a morrer. Ele sabia quem tinha feito isso, e sabia que não deveriam ter feito. Agora ele temia pela própria vida.
Se Zita não tivesse tirado ele do caminho, a bala teria atravessado os dois. Ele não sabia se ela tinha previsto o tiro ou se foi apenas sorte, mas sua vida havia sido salva pela heroína.
Uma heroína de verdade.
André correu em direção a Zita, ignorando a possibilidade de um segundo disparo. Antes que ela perdesse o equilíbrio, André a segurou nos braços, ajudando-a se apoiar no chão.
— Cuidado… — Ela murmurou.
Um segundo tiro foi ouvido.
Uma névoa escura e densa cobriu tudo ao redor deles. Mas rapidamente ele se recolheu dentro do corpo de André, e na mão esquerda do rapaz estava o projétil do segundo tiro. E no seu rosto havia uma expressão de ódio.
A névoa começou a cobrir o projétil e girar em alta velocidade, e sem que André desviasse a atenção de Zita, ele disparou contra a direção onde estavam os soldados que atiraram em sua amada.
O projétil descreveu uma trajetória curvada, cruzando quilômetros mais rápido do que da primeira vez, e dessa vez sem som algum. O impacto da bala de alta densidade em junção com a rotação e o poder do Rancor comprimido resultou em uma explosão que vaporizou a formação rochosa onde os soldados da Aliança estavam escondidos.
A explosão gerou uma onda de choque tão forte que desequilibrou todos que estavam por perto, mas André parecia nem ter sentido. Ele continuava agarrado ao corpo de Zita, chorando.
— Por que fez isso? — André perguntou em meio a lágrimas.
— Você vai entender… — A ruiva respondeu.
— Por que?
— Eu… te amo…
— Não me deixe.
— Me… beije…
Seus lábios se tocaram e ficaram juntos por alguns segundos, a mão da garota escorregou da nuca de André, descendo pelas costas dele, até encontrar o chão. Sua cabeça pendeu para trás, e seus olhos perderam o brilho vívido de outrora.
Ela estava morta.
André se manteve agarrado ao corpo de Zita enquanto ela lentamente se tornava mais fria. Em seus últimos momentos os cabelos da Sacerdotisa da Montanha de Fogo mantiveram a cor vermelha, tal qual o seu sangue que escorria pelo corpo de André até chegar ao chão.
Vendo que estava tudo perdido, o filho mais novo de Miraa deu um grito de agonia, como se estivesse sentindo a dor daquela morte em sua própria carne. Um grito quem ecoou por muito longe, causando uma sensação de desconforto e angústia a todos que ouviram.
Então seus corpos foram cobertos repentinamente por uma nuvem negra que pareceu brotar da terra e disparou para cima como uma coluna quilométrica de escuridão, se espalhando rapidamente acima de todo aquele continente.
Ao mesmo tempo, o Sol se pôs e as trevas cobriram todo o continente.