Nisoiro Brasileira

Autor(a): Pedro Caetano


Volume IV – Arco 11

Capítulo 95: Mesmo Sentimento

Já nas primeiras horas da manhã, o castelo do rei Aka já tinha seus Senshis no portão. A caravana que chegava tinha a marca de um Sol entalhada na sua porta, indicação o suficiente para os Senshis a deixarem passar.

Dentro da fortaleza real, Ryoma já caminhava com os convidados para uma sala onde Chaul esperava por eles:

— Estão aqui Senhor — anunciou Ryoma abrindo as portas largas. 

A matriarca estava acompanhada do representante do conselho, sua irmã e um de seus cavalheiros. Chaul, que descansava na cabeça da mesa, levantou-se para estender a mão:

— Matriarca Yasukasa. Herdeira de Osíris, certo? 

— É um prazer vê-lo pela primeira vez, Chaul. 

O aperto de mão dos dois, arrancava o sorriso de Hoshizora, ao passo que um Kenkushi frustrado tinha sua atenção nos documentos na mesa. Em pouco tempo, todos estavam sentados com os papéis nas mãos. 

— Fiquei muito satisfeito em saber que estão dispostos a ouvir nossos termos para uma aliança — explicava Chaul — Meu único termo inegociável é a transparência. Qualquer dúvida, preocupação ou incômodo, falem à vontade.

— Pode acreditar que temos nossos próprios termos — respondeu a rainha — Acho justo que na união de nossos exércitos, as forças militares sejam lideradas por comandantes nativos da terra. Aka comanda exércitos em território Aka. Kiiro, em território Kiiro.

— De acordo — respondeu Chaul — alguma outro termo?

— Mais uma dúvida do que um termo. Vocês e os Shiro são os únicos sem fronteira com os Kuro — folheava o tratado — o interesse de vocês nesta guerra deveria ser mínimo — apontou com a pena — qual o objetivo, então? 

— Nosso interesse e objetivo é acabar com a guerra. Impedir que um conflito de escala continental escale e mate inúmeros dos nossos responde sua pergunta? — respondeu Chaul. 

— As nações vão responder a nossa aliança. Vocês estarão declarando guerra junto conosco. 

Hoshizora pediu licença com os braços. Com um aceno da cabeça, sua irmã a deixou falar:

— Minha alteza acredita que sua posição no acordo é desigual, visto que recebe o ônus da declaração, por fazer fronteira com o inimigo. Queremos dividir esse prejuízo, solicitando uma colaboração ostensiva em nossa linha de frente no deserto.

— Vocês não me conhecem e nem eu os conheço. Mas, já posso adiantar que o mesmo sentimento que vocês tem, eu também tenho. Essa aliança não faz sentido se não concordar — disse o Rei Chaul, fazendo um gesto ao seu Supremo — será concedido. 

O sorriso esboçado no rosto de Hoshizora podia ser visto por todos na sala. Yasukasa molhou sua pena, mas a segurou acima da folha:

— Tenho uma última pergunta. Um dos nossos homens tentou contato Império Ao após a morte do imperador. O objetivo deles é o mesmo que o nosso. Escolher vocês vermelhos seria dizer não aos azuis? 

— Negativo — tomou a palavra, Ryoma — ainda não conhecemos bem os novos líderes, mas também fizemos a eles uma proposta semelhante à que estamos fazendo a vocês.

— Então talvez realmente, Chaul — a pena de Yasukasa tocou a folha — Dividimos o mesmo sentimento.

Com a mão leve, Yasukasa escreveu seu nome. Da sacada dos portões internos do castelo, os responsáveis exibiram o documento assinado aos seus Senshis, que receberam a notícia com palmas antes de correrem para divulgar a boa nova.

Na região sudeste do Reino Aka, algumas horas distantes do internato, na mesma floresta em que os mirins disputaram sua promoção há pouco mais de um ano atrás, eles balançavam os galhos e preenchiam a terra com seus passos apressados. 

Diferente daquela vez, era um grupo maior vagando juntos como um só corpo emanando uma luz vermelha esbranquiçada. Sua formação era de um diamante, cujo centro era o jovem moreno de cabelos castanhos.

— O que a gente faz quando encontrar eles, Yanaho? — perguntou Katsuo, na ponta mais recuada, subindo de galho em galho.

— Atacamos o professor Arata. Se ele cair, a formação se quebra e nós vencemos. 

— Está subestimando o inimigo — comentou Kazuya, correndo à esquerda de — Se perdemos você, também seremos derrotados.

— Eu vou me virar — saltou sobre um tronco caído no chão — É só eu estar perto de vocês, que terão energia Shiro suficiente..

Correndo pela esquerda, uma menina se alinhou com o grupo, gritando para o rapaz mais à frente, na ponta avançada do losango:

— O que você acha Usagi?

— Bem, o plano depende de mim, Aiko — virou o rosto sorridente para a menina apontando para si mesmo — É só me proteger dos outros e me deixar chegar no Arata que vamos nos sair bem. Se a coisa piorar, ainda temos o Yanaho. 

Katsuo reparou em aves voando na direção contrária. As folhas das árvores se agitaram. De repente Umi e Jin vinham correndo na direção deles. 

— Eles estão vindo — gritou Jin — Se preparem.

Uma onda de terra veio atrás deles, atingindo uma árvore que caiu no meio do grupo. Umi puxou seu irmão para o lado, mas o tronco dividiu a equipe. Yanaho, Usagi e Kazuya ficaram de um lado, Katsuo e Aiko do outro.

A segunda onda se formou na terra abaixo deles, cavalgando por cima dela estava o primeiro oponente do grupo. Ele saltou da crista, cruzando espadas com o mais velho do grupo.

— Sempre querendo se desafiar, Yukirama — provocou Usagi — Surpreso que não tenha interesse no Yanaho.

— Aqui o trabalho é em equipe — agachou, chutando o oponente na barriga..

Uma flecha passou por cima da cabeça de Yukirama, carregando uma rede que se enroscou em Usagi. Seu oponente olhou para trás e acenou para Masori, apoiada em uma rocha alta perto dali.

A muralha de terra empurrou Yanaho contra uma árvore, onde ele teria batido se não tivesse disparado seu kazedamu no último instante. 

Terra e lama se dispersou para todos os lados. Dos galhos logo acima, desceu um garoto para atacá-lo, quando Kazuya se chocou com ele em pleno ar e os dois rolaram no chão. Antes que pudesse se recompor, Yanaho foi atacado pelos lados por outro mirim.

— Etsuko — abaixou a defesa do oponente com dois golpes laterais — você não vai me atrasar!

— Atrasar? — girou o corpo, acertando um soco com as costas da mão — Eu vim te vencer!

Sem cambalear com o golpe, Yanaho disparou outro kazedamu, abrindo caminho para correr até Usagi.

— Katsuo, me dá cobertura — gritou Yanaho sem olhar para trás — Aiko, Umi, vão ajudar o Kazuya!

Mais uma vez, o aluno de Onochi utilizou sua técnica Shiro desta vez para se propelir tomando impulso, se arremessando em direção a espada de Yukirama.

Naquela altura, Usagi já havia se livrado das suas amarras. A presença de Yanaho, o fez correr para encontrar seu alvo, enquanto seus dois oponentes estavam ocupados.

Yanaho e Yukirama trocaram golpes, o brilho vermelho no punho do garoto de capa fez o oponente se afastar. Ele então puxou uma faca e a riscou em sua espada. A faísca ganhou forma, crescendo e se tornando uma labareda. 

As chamas rastejavam pelo chão, obrigando Yanaho a correr até subirem em um pilar de fogo bem na sua frente. Circulando o garoto, Masori atirava na tocha espontânea que seu parceiro criou, incendiando suas flechas no meio do caminho para acertar seu alvo. 

Contudo, Yanaho não apenas soprou os projéteis para longe, como a puxou para perto usando uma corrente contrária. Yukirama correu para intervir, mas seu oponente agarrou Masori pelo braço e a girou contra ele. 

Caídos no chão, Yanaho apontou a espada para eles:

— Dessa vez, não vou me conter.

— Está mais agressivo — afirmou Yukirama — mas continua um perdedor —  ficando de pé e ajudando Masori a se levantar.

Yanaho arregalou os olhos, sua aura branca havia sumido. Ele olhou para o lado e viu seus parceiros se levantando do chão, incluindo Usagi. Arata apareceu no meio deles, segurando em cada mão Katsuo e Aiko.

— Manter a formação significa todos juntos, colônia de férias — disse o professor, soltando os dois alunos — o egoísmo no campo de batalha é perigoso. 

— Era pro Usagi enfrentar você — abaixou a cabeça.

— Foi o que ele fez, enquanto Masori e Yukirama te afastaram dos outros três membros. Você nem percebeu, mas Katsuo e Aiko sequer puxaram suas armas. Se não fosse eu os surpreendendo, teria sido o inimigo. E depois? Dois dos seus mortos, por que você queria mostrar serviço? 

— Não, senhor.

— Você é forte, colônia de férias, só está pensando muito em si. Sacrificar é importante, mas não antes da hora certa. De que adianta pedir pros seus companheiros ficarem perto, se no fim vai tentar resolver tudo sozinho?

Ao passo que Arata terminava de instruir seu aluno, Yukirama e Masori se juntaram ao seu grupo para comemorar. Aiko correu para junto de Usagi. Katsuo e Kazuya cercaram Yanaho, porém Jin chegou por trás com um cascudo:

— Boa gênio. Adivinha quem vai fazer a vigília desta noite? 

— Como se você tivesse feito alguma coisa para impedir isso — disse Umi, puxando Jin para si. 

— Foi mal — dizia o mirim — Quer saber, acho que liderar não é para mim.

— Está tudo bem, ainda tem tempo de aprender — disse Usagi, com um tapa nas costas — todos vão precisar de sua energia branca. Tá treinando isso há mais tempo que a galera de cima.

— Quando um erra, todo mundo erra — Katsuo abraçava Yanaho pelos ombros — Vamos melhorar juntos, poxa. 

Após o encerramento do exercício, os mirins retornaram ao internato, sendo poupados do serviço daquela tarde até que o alarme soou no complexo. Imediatamente todos se aprontaram, para o portão que determinava a entrada e saída do local. 

Tomio e Arata receberam autoridades que acabavam de chegar. Uma delas exibiu seu rosto, removendo seu capacete de batalha. Ele tinha um escuro cabelo volumoso que realçava seus olhos vermelhos. Após uma breve conversa deles na frente dos formandos, Tomio se dirigiu a eles:

— Atenção! A partir de hoje a Aliança entre os Kiiro e Aka está em vigor, estando juntos contra um inimigo em comum. Como mirins, admito que alguns estão mais prontos do que outros para um conflito desta magnitude. Isso faz parte porque ainda não estão formados, mas não podemos escolher ocasiões. Suas família, seu povo, todos precisam de vocês. Sem exceções!

Os mirins mais próximos logo se inquietaram, provocando o mesmo no restante do plantel.

Kiiro? — cochichou Katsuo no pé do ouvido de Yanaho.

— Silêncio! — ordenaram os Senshis que passavam nas fileiras.

— O momento pede uma abordagem diferente do que eu e Tomio oferecemos — Arata tomou a palavra — por isso, o comandante de tropas Iori, está aqui para esta transição.

Com o tomar da frente do Senshi que segurava o capacete, Yanaho notou Jin e Umi  discutindo sutilmente entre as fileiras, sem esconder suas expressões de desgosto do homem diante deles.

— Saudações, nobres mirins, ou deveria dizer… futuros Senshis. Apesar de vocês serem o futuro, o que vão enfrentar está no presente. Estou aqui justamente por nenhum de vocês terem enfrentado isso antes; Eu estarei junto aos seus professores para criar pontes entre a teoria e a prática real no conflito — levava as mãos para trás — A colaboração de vocês não é um pedido. É uma obrigação, fui claro?

— Sim, senhor — todos respondiam.

Os Senshis que supervisionavam a forma passaram a amarrar pulseiras em alguns mirins selecionados na forma. 

— Essa pulseira é uma distinção, de qual fronte de batalha serão designados — explicava Iori — Ainda passarão os próximos dias treinando juntos, mas serão avaliados separadamente com base nas competências necessárias.

— Lembrando que o papel de vocês será sempre de suporte e não de participação direta nos conflitos — ressaltou Tomio — Com o tempo estarão prontos, mas o campo de batalha não é lugar para pretensos heróis.

Alguns mirins engoliram seco. Yanaho vestia sua pulseira espiando atrás de si, e viu os dedos fervorosos de Katsuo coçando as palmas da sua mão sem cessar, sem qualquer adorno no pulso.

— A guerra os tornarão Senshis! Encarem seus destinos como homens de guerra! — gritou Iori — Preparem-se!

— A vigília da noite permanece — complementou Arata — Por conta da nova circunstância, todos os mirins devem comparecer ao exercício, mesmo os vencedores. Dispensados!

Todos bateram continência, exceto por Umi. De volta aos dormitórios, Yanaho reparou nas fitas presentes nos pulsos de Usagi, Yukirama e Kazuya:

“Essa classificação está atrelada às provas dos últimos meses? Ou ao domínio da energia Shiro? Querem todos os alunos do topo para a mesma batalha, mas para que?”, levava a mão ao queixo, quando de repente ouviu gritos nos corredores. 

Ao correr entre a morada de madeira, percebia os gritos de Umi: 

— Por que você acha que estamos com a pulseira, hein? Me responde! 

Yanaho se deparava com Umi segurando Jin pelas roupas. 

— Solte-o Umi! — disse Usagi se colocando entre os dois — é apenas um exercício, levará punição por bo… 

— Vocês não conhecem aquele homem — ela interrompeu — não percebem? Ele escolheu os melhores avaliados na transferência de energia, com exceção de eu e Jin. E eu ainda tenho que entendê-lo? Me poupe!

Jogando seu Jin no chão, Umi entrou no quarto e trancou a porta.

— Do que ela tá falando? — perguntou Yanaho ajudando Jin a se reerguer. 

— É o pai dela, aquele teimoso — suspirou fundo.

— Como é? Vocês não eram irmãos? — perguntou Usagi.

— Iori é o pai de Umi, eu só fui criado por ele mesmo — explicou Jin, mostrando o pulso com a fita — Parece que ele nos selecionou a dedo, porque só assim para a gente ter ganho isso aqui.

— Mas isso não explica a reação da Umi. — questionou Yanaho.

— Vai todo mundo morrer mesmo. Quem liga? — Jin colocou as mãos nos bolsos e saiu andando pelo corredor — Me deixa.

Já passava da meia noite no acampamento guardado pela equipe perdedora do exercício de mais cedo. A maioria estava do lado de fora das cabanas montadas, circulando pela mata em revezamento. Apesar disso, eles mal trocavam palavras. 

A entrada e saída era feita por meio de acenos e olhares. Aqueles que ficavam na fogueira, esquentavam os alimentos e a bebida.

Era chegada a vez de Umi sair para rondar a floresta. Jin observou sua saída acompanhada do gelo que a garota lhe dava. A beira do fogo ele batia com a caneca em sua mão na terra. 

— Idiota igual ao pai! — sussurrou — estou cansado disso tudo. 

Ele ergueu a cabeça para encontrar os olhares atravessados de Katsuo e Yanaho. Seu tom de voz subiu:

— Ah, qual é? Eu nem ao menos queria ser um militar, imagina ser um homem de guerra?! Eu nunca pedi por isso, eu não…

Por trás dele, Usagi o puxou para falar no pé do ouvido:

— A Aiko não saiu do dormitório desde a notícia do conflito. Foi difícil trazer ela para cá e mesmo assim ela tá na cabana a noite toda — apertou com mais força — Dá para parar de pensar só em você por um momento?

Com o puxão de orelha, Jin apenas se aquietou com o olhar desesperançoso. Deixando a caneca de lado, ele foi para a floresta assim que Umi voltou para pegar seu lugar na fogueira:

— O que vocês falaram para ele ir?

— Nada demais — dizia Usagi, sentando ao lado dela — Só bom senso.

— Boa sorte — pegou a caneca deixada pelo irmão — ele nunca mudou um pingo.

Yanaho apontava direções para Katsuo e Kazuya. Os três andavam um para cada direção, com lâmpadas nas mãos. Se sentando logo depois próximo a fogueira, apenas escutando a conversa da noite. 

— Uma notícia dessa abala qualquer um — comentou Usagi — Seu irmão até tem o direito de ficar chateado, mas… Cada um também tem a sua maneira de sentir medo.

— É sempre a vítima por estar em um cenário que nunca quis. Naquela cabeça oca, só ele leva a pior. Deveria entender que, o internato, os exercícios, até mesmo a guerra, é só mais um episódio.

— Guerra nunca é apenas um episódio — disse cutucando a fogueira. 

— Dizem que você se acostuma. Eu espero que sim.

— Eu espero que não. Como alguém se acostuma com a morte? Eu também queria o dinheiro que os Senshis oferecem. Só pensei que pudesse fazer isso protegendo as pessoas, não matando.

Retornando da floresta, Katsuo apareceu puxando Jin pelo braço. 

— Ele tentou voltar para o dormitório — explicou Katsuo — Já falei que vai todo mundo perder ponto assim, poxa. Colabora.

— Jin! — Usagi foi em sua direção — De novo tentando escapar? 

— Vocês tem que concordar comigo agora — cruzou os braços — o que ponto vai valer para guerra? 

— Eu avisei — dizia Umi mastigando — não tem censo nessa cabeça oca. 

Um arbusto balançou, captando a atenção do grupo. Usagi usou seus largos braços para colocar Jin e Katsuo para trás dele. Yanaho suspirou alto, uniu os braços e soprou seu kazedamu numa árvore de galhos cheios. Uma batida seca foi ouvida logo depois. Saindo do chão, um rapaz balançou a espada.

— Ao ataque! — gritou Etsuko saindo de seu esconderijo.

Ao perceber que estava sozinho, ele parou na frente de Yanaho. 

— Você não escondeu seu iro. Somos Aka, esqueceu?

— Até vocês tão assim hoje?

— Nós? — comentou Umi, atrás de Usagi — Então os outros tão por aí?

Aos poucos cada um dos mirins da equipe adversária apareceu. Entre eles Yukirama, Masori, Tsuneo, todos que planejaram o ataque entraram no acampamento bocejando sem dar uma palavra ao companheiro. 

Etsuko chacoalhou os braços e bateu os pés:

— Tá brincando? O exercício não era surpreender eles na madrugada? Vai dizer que estão com medo também? 

Saindo por último da floresta, Tsuneo tocou o ombro do amigo.

— Deixa para lá, Etsuko. O exercício acabou — Yanaho interrompeu — Vamos contar pro Arata que perdemos mas que ajudamos na vigília depois. Anda, ajuda a montar as barracas.

O corpo de Etsuko murchou naquele mesmo lugar. Ele encarou os próprios pés, antes de se juntar ao restante.

Perto dali, Katsuo aproveitou o final do exercício para correr de volta para a sua cabana. Desenterrando um quadro do meio dos lençóis e uma pequena bolsa de couro, ele começou a se organizar nos fundos.

Notando seu sumiço, Yanaho foi ao seu encontro.

— Ainda neste quadro? — exibiu sua lanterna — Precisa de uma ajuda para enxergar?

— Obrigado — pegou a lanterna e deixou do lado do tripé que acabara de ajustar — Poxa, sabe como é,  só preciso acabar com isso a tempo.

O garoto de capa vermelha, reparava nas silhuetas em laranja que o seu amigo formava sob a tela com as tintas, misturando vermelho com amarelo. Percebia a pintura dando cor a uma paisagem conhecida pelo mesmo, quando o artista quebrava o silêncio: 

— Eu estava me perguntando, desculpe falar disso mas… poxa, como se sente em relação aos Kiiro?

— O que quer dizer com isso? — disse indo até um armário.

— Pelo o que me contou eles quase te mataram injustamente — notava a serenidade nos movimentos do parceiro — só não entendo como pode ficar tão calmo depois de tudo que passou lá. 

— Não diria que estou calmo — retirava sua capa — só não estou desesperado — ergueu ela a encarando — até porque, já vi ele de perto. 

A capa carregava um rasgo em sua parte inferior, notando o silêncio do amigo que rabiscava, finalizou tocando em seu ombro:

— Se não confia neles, confie em mim. Tomio já nos disse que não iremos participar diretamente das ações. Além disso, também há pessoas boas em Kiiro, a prova disso é eu estar aqui hoje. 

— Diz isso pela princesa de seus sonhos que te salvou — provocou segurando uma risada — poxa. 

— Isso não tem graça — cruzou os braços desviando o olhar.

Katsuo abria um sorriso que mostrava todos seus dentes, logo depois contemplou sua pequena arte, notando os tons alaranjados mesclando entre as duas cores primárias que formalizaram um pôr do sol: 

— Fico mais aliviado então, com as cores eu aprendi que elas podem convergir para algo melhor. Desde então é no que prefiro acreditar, querendo ou não essa aliança é uma iniciativa pra isso, certo? 

Questionou mostrando o desenho com a parte superior já pronta, um crepúsculo no qual o sol atinge o horizonte, com a parte inferior ainda inacabada em branco. 

— É por aí — sorria Yanaho — mas falando em artes e cores, cadê aquele quadro maior no qual você estava trabalhando desde o internato? Cansei de ajudar você a esconder dos professores. 

— Sabe que não precisa mais disso, poxa — guardava o quadro menor — irei te mostrar na hora certa.


Ilustradora: Joy (Instagram).

Revisado por: Matheus Zache e Pedro Caetano.



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