Volume 1 – Arco 12

Capítulo 77: O Apelido Favorito

Diego acordou muito bem naquele dia, abrindo os olhos lentamente. Não era como as outras vezes, em que de certa forma sentia um leve mal-estar logo pela manhã, associado ao uso indevido dos venenos do tio. Supunha que era uma das primeiras vezes em que acordara tão bem.

Ele se espreguiçou e por fim se ajeitou na cama de modo a pensar. Algumas lembranças lhe vieram a mente e aos poucos o rapaz ficou agitado. Saiu da cama com um pulo. Sentiu uma pontada na perna. 

Quando foi em direção ao espelho, viu que seus cabelos estavam amarrados por curativos e seus olhos não estavam mais vermelhos. Eram castanho bem clarinho, sua cor natural.

Quando o rapaz piscou, encarou sua comoda mais uma vez e viu um livro de capa amarela. Em cima do livro tinha um amuleto azul. Diego engoliu em seco. Não tinha sido um sonho toda aquela historia de Rei Amarelo. 

Antes que pudesse tocar os objetos, Angela abriu a porta e entrou no quarto trazendo uma bandeja. Deu um grande sorriso quando viu o rapaz.

— Jovem Diego! Ouvi você acordando e vim lhe trazer o café.

— Angela! O que foi isso que aconteceu? Onde que tá o nocivo de ontem? E o meu tio? Eu ouvi ele matando o monstro, mas eu achava qu ele…

— Jovem Diego — interrompeu a mulher. — Não tenho como lhe explicar tudo agora. Mas garanto que está tudo bem.

— E o que é isso? — Ele apontou para o livro amarelo e o amuleto azulado.

Angela esticou o pescoço.

— Isso o quê?

Quando o rapaz da cicatriz se virou para a comoda, viu que não havia nada ali, apenas os seus objetos do dia a dia como pentes e perfumes e o espelho.

— Não viu um livro amarelo aqui? Com um titulo estranho todo dourado e um amuleto, um cordão estranho? Azul?

A empregada fez cara de confusa. Se aproximou dele e pôs a mão em sua testa.

— Eu estou bem! — disse ele, empurrando sua mão.

Ela suspirou, fez um gesto com a cabeça, indicando a cama. O rapaz, um tanto confuso, sentou-se e se acomodou. A empregada colocou a bandeja em seu colo, apresentando diversas iguarias da gastronomia. O estomago de Diego saltou de felicidade quando viu que no meio dos pratos tinha macarrão.

Angela se sentou na beirada da cama, o observando.

— O diretor Nebeque lhe enviou uma carta. — E apontou para um canto da bandeja, onde tinha uma carta muito volumosa com um selo de cor roxa, com um brasão em formato de N.

— Ele não tem coragem nem de me ver? — perguntou, frustrado.

— Não é isso, Jovem. — Ela suspirou. — Infelizmente aconteceram algumas coisas bem ruins depois da noite em que você enfrentou aquele nocivo… O seu tio teve que ir comparecer na Organização. O diretor também teve outros problemas. Quer dizer, ninguém iria imaginar que isso podia ter acontecido…

Diego apenas encarou ela. Depois voltou sua atenção para a carta. Ali teria as respostas que estava tanto procurando?Bom, era uma carta muito volumosa. Com toda a certeza tinha bastante coisa ali.

— Vou deixar você a só. — Ela se levantou e saiu, mas não sem antes se despedir com um lindo sorriso.

O rapaz pegou a carta, apalpou e foi comendo o seu macarrão enquanto tentava abrir o lacre, sujando um pouco o papel. Quando conseguiu abrir, viu que haviam varias coisas na carta.

Primeiro havia uma enorme carta, escrita em letras rabiscadas, longas e deitadas. Depois havia mais um outro papel, com letras mais bonitas e cheias de decorações nas bordas, e por fim uma pedra vermelha, o que lhe lembrou muito uma Hagar Selar.

Falando nisso, o rapaz olhou para um lado, depois para o outro, e não viu o seu colar em canto algum. O livro amarelo junto com o amuleto também não estavam mais ali. Aquilo estava lhe tirando do sério. Tinha de conseguir algumas respostas e urgente.

Abriu a carta maior.

“Olá, Jovem Diego. Escrevo essa carta para lhe responder algumas de suas perguntas, porque penso que você, nesse momento, deve estar muito confuso com tudo que está acontecendo.”

— O senhor não faz ideia! — disse, sarcastico.

“Acho que primeiro tenho de falar sobre os seus tios. Eles foram requisitados pela Organização e os dois estão sendo julgados atualmente, se tudo der certo podem ser liberados da prisão quanto antes.”

— Pera aí, prisão?! — Diego teve de reler mais de uma vez para acreditar.

“A acusação é de estarem fazendo experimentos ilegais em você, Jovem Diego. Porém, não é isso que você está pensando. Para lhe explicar melhor, tenho de contar um segredo, que agora já não é tão segredo assim. Quando você foi resgatado pelo seu tio na noite em que seus pais morreram, um nocivo verde conseguiu lhe infectar com um parasita.”

O rapaz se lembrou da noite em que o nocivo lhe atacou, logo depois de ter um encontro bizarro com um ser que se auto intitulava Rei. Assim que acordou da espécie de transe que estava, vomitou um verme que criou braços e fugiu para um canto obscuro da biblioteca.

“Coisas assim são muito raras, a Prof.ª Domingues deve ter lhe explicado sobre como são tratados os pacientes. Era para você ter morrido, mas o Sr. Elizel nunca revelou sobre sua infecção para ninguém, nem mesmo para a Sra. Lidja. Ele lhe dava venenos regularmente para, além de lhe treinar para se tornar um Dragão Negro, fazer o parasita dentro de você morrer.”

— Ah! Claro! Isso explica tudo! — Falou alto para si mesmo, cheio de ironia. — Que sujeito bom. Estava me machucando e me dando veneno apenas para controlar um parasita dentro de mim. Ah! Faça-me o favor. Se a Organização acreditar nessa idiotice eles são muito burros.

Voltou a ler, cheio de raiva.

“Esses parasitas se alimentam do que o hospedeiro se alimenta, criando um vínculo por meio do sistema digestivo. Por isso você, às vezes, sentia fortes dores no abdômen. Essa dor era ainda mair quando tomava o veneno. 

“Graças a isso, o seu tio descobriu algo fantástico, os venenos estavam de fato funcionando em você. Se passaram duas semanas e você continuou vivo. Mas ainda não tinha aniquilado a criatura totalmente de você, então não poderia alertar as autoridades sobre aquilo. Foram longos dois anos de tratamento.”

— Tratamento?! — riu, sem de fator sentir graça alguma.

“E hoje, você finalmente ficou livre do parasita. Isso foi provado depois de um teste que seu tio fez em você enquanto dormia. Ao ver o exito que teve, foi alertar as autoridades da Organização. Bom, não posso dizer que ficaram muito felizes com ele. Lidja mesmo ficou muito aborrecida, porque não sabia de nada. Os poucos que sabiam juraram nunca falar nada para ninguém, nem mesmo para você.”

— Bando de mentiroso — resmungou. — Então não era só o meu tio que sabia!

Estava mesmo empenhado em brigar com a carta, como se essa pudesse transmitir toda a sua frustração. Como se ela fosse um ser animado, e não apenas uma carta. 

“E sim, a Sra. Bjorn sabia sobre a sua situação. Fui eu que aconselhei Elizel a contar, já que era ela a chefe da cozinha, e não tinha outra forma de continuar aplicando o veneno em seu alimento sem ela saber. Sim, eu sabia, e autorizar algo assim foi um movimento muito arriscado e imprudente da minha parte. Sofia quase não aceitou o encargo e até ameaçou se demitir. Tive muito trabalho para convence-la a não fazer.”

Diego apertou a carta com força. Quando começou a pensar sobre como a dona Sofia, uma santa em sua concepção, estava por trás de toda essa mentirada apenas para proteger ele, sentiu como se não pudesse confiar em ninguém. Estariam todos mentindo para ele no fim das contas?

Teve outra pontada de raiva assim que leu a sentença seguinte da carta.

“Sinto muito pelo que aconteceu com Tiago, quando tomou a sopa que era para você. Foi um incidente infeliz e tomei toda a responsabilidade para mim. Deve ter notado que naquele dia a sopa realmente estava com um cheiro diferente. Isso porque seu tio, nos dois anos que ficou tratando você, analisou uma coisa:

“Todas às vezes em que você, Diego, ficava nervoso, irritado ou tinha aqueles sonhos, o parasita parecia ficar mais forte dentro de você. Como se estivesse criando uma resistência. Por isso você acaba tendo surtos de raiva frequentemente, por conta do parasita que, de certa forma, queria forçar a sua saída.”

— Com certeza eu estou com raiva agora por conta desse parasita — murmurou.

O fato era que desde que acordou, não sentiu nenhuma dor em seu estomago, lugar mais sensível de seu corpo, principalmente quando ficava com raiva.

“É um pouco difícil de entender, mas no dia em que você lutou contra o Jovem Golias, aquele poder que você demonstrou, descontrolado, era um sintoma do parasita querendo sair, por assim dizer. Isso acontece com todos aqueles que são infectados, acabam por demonstrar mais irritação e perca do controle dos próprios poderes. Logo, quanto maior for o descontrole, significa que mais avançado o parasita está.

“Assim que você foi expulso do Craveiro, era para o seu tratamento ter continuado. Mas Morfeus e Angela não estavam sabendo da sua condição. Sempre pensaram que se tratava de um treinamento. O descontrole de seu tio foi algo lastimável. Mas saiba que ele apenas estava assustado com o fato de perder você para o monstro que crescia dentro de si.”

Aquilo era outra mentira, com toda certeza. Diego conhecia muito bem o tio para entender que não havia nenhum tipo de bondade por trás daquelas ações. 

Como imaginava, o rapaz estava sendo usado para experimentos ilegais. No fim das contas isso só iria beneficiar Elizel, e o seu nome voltaria a ser reconhecido por todo o país como o homem que curou uma doença intratavel.

Esses pensamentos enfureceram Diego. Estava sendo tratado como um mero paciente teste.

“Sinto muito por tudo que aconteceu e por não poder lhe contar a verdade sobre a sua situação, mesmo sabendo o quanto você odiava os venenos. Ainda assim, acho que tem mais algumas coisas para falar para você.”

— Quantas mais mentiras eu vou descobrir aqui? — Se ajeitou na cama enquanto comia um pedaço de lasanha.

“Acho que está curioso para saber sobre o nocivo amarelo que estava lhe perseguindo, não é? Bom, infelizmente ninguém acreditou nessa versão. Decidiram que o nocivo que entrou na sua casa foi apenas mais uma infestação mal-sucedida. Tentei argumentar que isso não seria possível, já que as infestações são feitas em bando. Mesmo assim não acreditaram.”

O rapaz franziu o cenho, mesmo não estando com tanta raiva assim mais. Não se importava muito, ao menos agora, se acreditassem nele ou não. Estava começando a perder a fé naquelas pessoas.

“Eu, Diego, acredito que seja verdade. E tenho minhas razões para isso. A primeira delas é que de fato os nocivos tendem a ter um comportamento diferente do usual quando estão perto de pessoas com parasitas."

Imediatamente o rapaz se lembrou da vez em que a criatura, ao encostar no rapaz, acabou perdendo um dos braços. Teria isso alguma coisa a ver com o parasita dentro de si?

"Isso não é provado e quase nunca foi estudado, já que algo assim é muito raro, mas é uma excelente explicação dizer que você tinha uma sensação esquisita por conta da sinergia do seu parasita com o nocivo. Mesmo assim ainda é muito estranho um nocivo solto por nossa assosiação. Não tenho uma explicação  para isso. Só uma teoria de que talvez alguém esteja por trás disso. Afinal, quem mais poderia colocar um nocivo dentro de um Craveiro?"

— A Besta... — murmurou.

"Há mais detalhes a serem esclarecidos, mas assim que você voltar para o Craveiro poderemos conversar mais sobre estes detalhes.”

Diego quase deu um pulo da cama quando leu que voltaria ao Craveiro. Sua frustração começou a desaparecer a partir daí.

“E sim, como você deve ter lido, você, Diego Murdock, foi aceito para o segundo ano do Craveiro graças as habilidades que demonstrou em enfrentar aquele nocivo amarelo, até que o seu tio chegasse o finalizasse a criatura. 

“Foi feito uma perícia para saber mais informações e acharam evidencias de três usos de segredos de tipos diferentes, todos vindo de você. Troca, Transfiguração e Geração. O que me levou todos a crer que você, Jovem Diego, é um multi-tipo. O que é um tanto curioso, já que seus pais não apresentavam nenhum sinal de mais de um tipo de segredo. Isso impressionou tanto os Executivos do Craveiro que até ameaçaram retirar todas as verbas da nossa instituição caso não trouxéssemos você de volta.”

Diego sentiu seu peito arder. Era como se estivessem reconhecendo ele finalmente. Pessoas importantes querendo ele de volta? Isso sim que era exclusividade. Se alguém pudesse lhe ver naquele momento, poderia compara-lo com um pombo de peito estufado.

“Agradeça ao Sr. Rosa por isso. Ele que movimentou todo o grupo de Executivo para nos atacar. Mas independente das ações dele, eu faria de tudo para colocar você aqui de volta.”

— Não, obrigado — respondeu para a carta, ainda se sentindo o máximo.

“E isso nos leva a mais uma coisa respeito de você: A sua cor. Como deve saber, todos os jovens tem uma cor em suas Hagar Selar demonstrando, resumidamente, a sua especialidade como Assistente Social. As cores primarias são, azul, sendo um frio, e amarelo, sendo um quente. Quanto mais próximo dessas duas, mais forte é considerado o Assistente. Bom, o seu caso foi um pouco mais complicado. 

“Pela primeira vez, em toda a história da comunidade dos Assistentes, existiu alguém com a cor vermelha em sua Hagar Selar. O que significa que sim, sua cor é a mais rara do mundo inteiro. Tão rara, que ninguém sabe dizer ao certo o seu significado. Na verdade, até pouco tempo atrás era chamada de ‘cor impossível’. Mas como ninguém sabe muito sobre essa cor, deduzimos que você continua pertencendo aos quentes, o mais lógico.”

Diego olhou para a pedrinha vermelha que estava anexada a carta e começou a analisa-la. Era de fato a sua Hagar Selar, pois reconhecia o cordão. Impressionado com a cor, um vermelho bem forte e vivo, ficou analisando a pedra de um lado para o outro.

Nem conseguia ver o seu reflexo como a maioria das outras pedras dos jovens de sua idade. A luz não conseguia refletir muito bem, tão intensa era a cor do vermelho. 

Tentou vasculhar na memoria alguma vez em que leu algo sobre uma Hagar Vermelha. E pensando bem, nunca viu nos gráficos de cores a cor vermelha. Se lembrava de laranja, uma cor bem próxima ao vermelho. Mas pensando bem, essa era a única cor primaria que não estava registrada nos livros.

“Gostaria de finalizar minha carta por aqui, já que já deve estar se tornando entediante ler tanta informação assim. Mas ainda tem mais algumas coisas que quero conversar por meio dessa carta. Por favor, me acompanhe.

“Descobriram que você conseguiu invocador um machado enorme e depois transformá-lo em correntes. Se lembra? A questão é que aquele machado não é qualquer machado. Ele tem uma história por trás dele. Tentarei ser breve.”

De breve aquela carta não tinha nada. Era enorme. Fora que o rapaz não queria que acabasse, queria continuar lendo as informações, mesmo sabendo que provavelmente o diretor iria mencionar os seus sonhos.

Sim, seus sonhos, afinal de contas era de lá onde veio a imagem do machado sendo segurado por um enorme bárbaro.

“No começo da nossa Organização, enquanto ainda explorávamos cavernas em busca de respostas para nossas perguntas, achamos as Hagar Selar. Isso aconteceu a muitos séculos atrás, em uma caverna no norte-europeu. Essa caverna se tornou histórica, já que nosso conhecimento sobre as Hagar Selar começou por ali. 

“Tendo isso em mente, vamos à parte em que as coisas começam a ficar estranhas. Dentro dessa caverna descobriram que além das pedras havia um enorme trono, também dourado. E bem ao lado dele, cravado no chão, um grande machado dourado, o mesmo machado que você invocou na noite em que o nocivo lhe atacou.”

— Então não era um sonho? — falou para si mesmo. 

Imaginava que o machado fora um mero acaso. Nunca passou pela sua cabeça que especificamente o machado do seu sonho existia de verdade, e nem que era um objeto reconhecido de verdade. O que significaria que…

— O sonho era real?

Curioso, voltou a ler a carta.

“E aqui as coisas começam a ficar um pouco mais estranhas: Aquele machado nunca foi retirado daquele lugar. Nenhum de nossos Assistentes, usando qualquer tipo de segredo ou até maquinas, conseguiu retirar aquele machado do lugar. Você, Jovem Diego, foi o único no mundo inteiro a conseguir invoca-lo.”

Agora, o rapaz realmente ficou impressionado consigo mesmo.

“A criança que sobreviveu a uma infestação, a um parasita e a um duelo contra um nocivo amarelo. Uma das únicas pessoas que é multi-tipo em nosso país. A única criança que conseguiu invocar um machado lendário que mais ninguém conseguiu. A única pessoa no mundo todo que tem uma Hagar Selar vermelha.”

Chamar ele de único era algo novo. Estava gostando. Sentia borboletas no estomago e não parava de balançar seus pés de um lado para o outro, animado com a situação. 

Já nem se lembrava mais do tio que passou o ano inteiro tentando lhe matar, mas na verdade era uma forma bizarra de ajudar.

Continuou a ler:

“Andei pesquisando sobre o que aconteceu e tenho uma teoria para responder ao menos boa parte das perguntas que possivelmente estão rodeando sua cabecinha nesse momento.

“Seu tio me disse que você tinha sonhos estranhos, com um Bárbaro carregando um enorme machado. Isso devia ter a ver com os delírios da sua infeção, era o que pensávamos. Mas depois de tudo o que aconteceu eu fiz uma pesquisa e descobrir que o dono do machado que você invocou possivelmente era esse bárbaro que você sonhou. Lembrando, isso não passa de uma teoria.

“Não se tem nenhum registro oficial sobre esse bárbaro do seu sonho. Nem se sabe ao certo se de fato existiu ou não. Mas pesquisando, existem alguns relatos em algumas lendas, cantigas e poemas de um bárbaro alto, comparado a uma muralha que carregava um enorme machado e que queimava como carvão em brasa.”

Diego se curvou para ler. Estava curioso para saber o nome.

“Alguns registros o chamam de Guerreiro, Lutador, Bárbaro e outra variações. Mas, existe um que chama ele por um nome: Diablo.”

— Diablo — repetiu para si mesmo. — Que nome legal! 

Já Nebeque não concordava com essa ideia.

“Um tanto deselegante, se quer saber minha opinião. Mas o que ele tem a ver com você? Ainda não sei. Talvez nunca saibamos, já que esses dados não são oficiais. De qualquer forma, tudo isso não passa de teoria.”

— Diablo — repetiu mais uma vez, procurando uma sonoridade no nome que lhe fosse positiva. Tentou enxergar estranheza, mas, como criança, achava o a pronunca bastante descolada.

A carta por fim chegou ao fim.

“Espero que você venha logo, para conversamos o quanto antes. 

Atenciosamente,
Ali Volg Mohamed Nebeque.”

Diego guardou a carta e puxou o outro papel, o mais bonito. Era um convite especial para o Craveiro, assinado por todos os três diretores.

Para sua intensa satisfação, o rapaz não conseguiu deixar de soltar um enorme sorriso. Agora era importante, mas pensando melhor, quantas pessoas estariam sabendo de tudo aquilo?

Era óbvio que acabaria sendo reconhecido por ser o “único”. Mas e quanto as teorias malucas do diretor? Bom, isso apenas os seus amigos saberiam por meio dele. E estava louco para voltar para a Associação.

Ele pulou da cama, foi direto para Angela e gritou:

— Vamos logo Angela! Morfeus

 

 

O carro parou bem na frente do enorme portão gradeado do Craveiro. O rapaz se despediu de Morfeus e foi recepcionado mais uma vez por…

— Duque!

Dessa vez o cachorro não conseguiu lhe derrubar. O rapaz lhe deu um cafuné enquanto era recepcionado por diversas lambidas.

— Pequeno Murdock! — falou o Sr. Bjorn, o homem que mais parecia um ursão. — Você cresceu, hein!

— É, acontece. 

Diego se divertiu com Max por um minuto, enquanto os dois gozavam da cara de Ernesto e sua surdez. O rapaz ainda tinha medo da cobra de estimação do velho, então preferia não se aproximar muito.

O portão se abriu e o rapaz prosseguiu sua jornada. Passou pelos jardins super coloridos, a ponte e chegou na frente do prédio principal. Antes de entrar tinha de ir direto ao dormitorio, então…

— Ei! Aquele não é o Diego? — gritou uma voz de longe. O rapaz se virou, mas não reconheceu quem era. 

— É ele mesmo! Pessoal, aquele ali é o Diego! 

E como formigas, diversos alunos, crianças e adolescentes, começaram a se juntar em volta do rapaz, falando e perguntando coisas sem sentindo para ele.

— Como você conseguiu explodir o Nocivo?

— É verdade que você tem 4 tipos de segredo?

— Sério que tu conseguiu invocar aquele machado?

Diego ficou tão confuso e sem saber o que responder, que teve de confiar mais uma vez na única coisa que, quase, nunca o traia: Seus instintos. E naquele momento a sua intuição lhe dizia para correr.

E assim ele fez, correu em direção ao dormitório. Pulou por cima da catraca que fazia a contagem, deixando boa parte da multidão para trás, entrou em um elevador já aberto e clicou no andar OP.

A porta se fechou antes que alguém pudesse chegar para apertar o botão e isso deu um tempo de paz para ele. 

Quando o elevador abriu, uma nova multidão estava ali lhe esperando. Diego teve de desviar de todas, empurrar algumas e pedir desculpa para outras, até finalmente chegar em seu quarto, número 7.

Assim que passou o cartão na maçaneta e conseguiu entrar, teve de fazer força para fechar a porta. Quando finalmente conseguiu, soltou um suspiro e relaxou. Fechou os olhos, e colocou a cabeça para cima.

Qundo se virou teve uma nova surpresa. Em seu quarto estavam varias pessoas. lhe observando com entusiamos. Menos do que o do lado de fora, mais ainda era muita coisa.

Sanches, Fabio, Dani e Lauro já deveriam estar mesmo ali, afinal era o quarto deles. Mas além deles estavam: Tiago, Margô, Lorena, Mini, Bruno e Leo. E isso apenas o que ele viu de imediato, pois do banheiro saiu Rodrigues, o amigo de Faramir. 

Tiago e Margô, seus amigos, se levantaram meio cautelosos. Viram que ele não estava de bom humor com toda aquela gente ali.

— É… Diego — falou o loiro. — Oi. 

Ele não falou nada. 

— É que… Ahm…

— A gente quer que tu conte pra gente o que aconteceu, parceiro! — falou Lauro.

— É! — disse todos.Lorena apenas balançou a cabeça afirmativamente. Diego estava tão estranho que mal teve tempo de se sentir constangido pela presença da garota. Ela estava ainda mais bonita do que ele se lembrava.

— Olha, Di — começou Margô. — A gente sabe que foi meio duro para você esses dias e tudo… Se você não quiser contar nada para a gente, então, tudo bem.

O rapaz apenas balançou a cabeça positivamente. Depois disso, em um silêncio constangedor, Diego falou:

— Tá bom, eu conto!

E se sentou no chão, onde todo mundo formou um circulo animado para ouvir a história dele.

— Foi lá no meu aniversario, 9 de novembro. Esse dia foi doido. Eu queimei o meu quarto, espanquei três idiotas em um corredor e sem querer acabei machucando uma pessoa inocente…

E ele contou a história inteira. Alguns acrescentaram a sua parte na história, a sua visão. Outros apenas ficaram ouvindo e se impressionando. De fato, Diego talvez tenha aumentado algumas coisas aqui e ali.

E ainda havia muita coisa a ser respondida. Ele queria saber mais sobre aquele Rei, sobre aquele mistério e o amuleto que ninguém via, mas de vez em quando aparecia do seu lado.

De qualquer forma, por mais frustrante que fosse não ter todas as respostas, como a razão de um nocivo estar vasculhando o Craveiro, Diego passou todos os dias recebendo novos apelidos.

Alguns ele gostava, outros nem tanto. Mas tinha um que era o seu favorito: Diablo Murdock.



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