A Lenda do Destruidor Brasileira

Autor(a): Pedro Tibulo Carvalho


Volume 1 – Arco 2

Capítulo 30: O exame já começou? Parte 2: Nascido da tinta

Dias antes, ainda quando Ethan e os outros estavam em Lockust, uma reunião acontecia entre um membro da elite dos Mármores, uma das três Edificações Superiores, com um humilde examinador.

Um participante chamou sua atenção, lorde Beell? — O jovem questionou, não acreditando no que ouvira. O homem do chapéu Fedora sorriu enquanto lembrava do encontro que teve, cerca de seis meses atrás.

Sentado na mesa, levou a xícara do chá até a boca e bebericou, sentindo o gosto quente do líquido descer a garganta enquanto imaginava o quão forte aquele jovem se tornou depois de se encontrar com Ittai.

Sim… Um jovem bem promissor — falou, seu sorriso se alargou um pouco mais enquanto ria com as possibilidades que viriam. — Vou garantir que seja um dos examinadores dele na etapa preliminar.

O que devo fazer?

Beell ficou quieto por alguns segundos, o sorriso se alargava conforme o tempo passava. Nisso, começou a rir levemente enquanto pensava em como dificultar a vida do jovem Destruidor.

Quero que o teste. Se ele não for forte o suficiente para lhe derrotar, mate-o… — Nisso, sacudiu a cabeça, pensando melhor na ordem. — Na verdade, sugiro que lute com esse intuito desde o início. Lute para matá-lo, trate-o como uma besta selvagem.

Nisso, serviu-se de chá novamente e brindou, um sorriso verdadeiramente psicótico enfeitava seu belo rosto, tornando-o uma encarnação da feiura, uma verdadeira monstruosidade.

Afinal, é isso que ele é… Que seu tipo sempre foi… não é… Amnael?

 

A memória cortou quando o examinador olhou fundo nos olhos do rapaz, segurando a machadinha enquanto tentava parar a tremedeira no braço.

A força daquele ataque…” Fez uma careta enquanto via o Destruidor pegar a jovem e levá-la para longe da arena onde lutariam. “Se não fosse meus genes de ogro, meu osso teria sido partido em dois.”

Ethan deixou Liza longe da luta e voltou, dando três passos e parando, tomando o tempo para respirar fundo e se acalmar. Olhando de volta para o assassino, seus olhos clarearam e um sorriso se fez no rosto dele.

Não dá… Não consigo deixar de te odiar! — disse, tombando o corpo para frente e saindo em disparada contra o examinador. O mesmo, ainda que seus atributos físicos beirassem o nível 2, teve dificuldades em seguir a velocidade do rapaz.

Aquilo não devia ser possível. O examinador tinha uma destreza maior que a de Ethan por dois pontos, por isso que se surpreendeu tanto quando viu a velocidade do mesmo.

Pulou para trás, bloqueando a Bento da melhor forma que podia. A madeira da machadinha quase rachou e seu corpo foi lançado para longe. Contudo, dessa vez estava pronto e pôde cair com segurança.

Avançou contra o destruidor, que deixou o corpo cair para frente de novo e, uma vez mais, pulou para frente. A lâmina e a machadinha se cruzaram, ambos criando faíscas, de novo e de novo.

Ethan sorria como uma criança na manhã de natal, algo que provocou o seu adversário.

Esse… esse zé ninguém tá tirando uma com a minha cara?” rugiu internamente e, afastando-se, observou bem a postura do Destruidor, deixando seu ‘verdadeiro eu’ vir a tona.

Naquele estado, o homem não entendeu como a velocidade do jovem destruidor aumentara tanto, mas o mesmo não podia ser dito por Liza. Ela conviveu com um monstro por bastante tempo e sua recompensa foi a capacidade de perceber padrões no impossível.

Por isso que, ainda que ficasse surpresa com a curva de aprendizagem que a habilidade lendária “Mimetismo físico” dava ao usuário, conseguiu analisar friamente o que acabara de acontecer.

Ethan estava usando a base da técnica ‘Rasen Suisei’ de Suika, onde relaxava as pernas momentaneamente e tensionava os pés, pulando no último segundo.

Sua velocidade deve ter, no mínimo, dobrado. Algo impressionante, mas…” Ainda que não demonstrasse, os olhos treinados de Liza podiam ver que estava cansado. Além disso, essa técnica criava uma velocidade de um míssil, mas só quando ia numa direção.

Era uma questão de tempo até o Mármore perceber o mesmo.

Ethan sabia disso e, por isso, cada ataque tinha a intensão de finalizar a luta o mais rápido possível. Não apenas isso, mas usou de toda a destreza que tinha para não dar tempo ao oponente de sequer pensar.

O porqueira…” Sentiu o peso nas pernas aumentar conforme chegava mais e mais perto do seu limite. Em sua mente, a imagem de Suika aplicando o primeiro fundamento do ‘Rasen Suisei’ se repetia, como um disco quebrado. “Mesmo depois de todo aquele treino, só consigo realizar a técnica como um todo, mas ainda tenho dificuldade na parte mais básica!”

A Bento se chocou com a machadinha e arregalou os olhos, bloqueando uma segunda arma. O adversário acabara de pegar outra de um bolso. Os ataques do oponente ficaram mais presentes, cada um rasgando sua defesa, indo direto a carne, despedaçando-a.

Ainda que defendesse da melhor forma que conseguia, não era o suficiente. Não perante àquela técnica. Uma técnica que fazia toda a defesa e ataque se tornarem inúteis, uma que nem mesmo Ethan dominara por completo.

Cansado dos cortes que se acumulavam, pôs toda a sua força num balanço, conseguindo afastar o Mármore.

Ethan olhou para ele com claro apreço, sentindo seu espirito crescer com o desafio. Em sua mente, buscava uma forma de contra-atacar a técnica do oponente. Conseguiu notar que aquilo não era algo físico.

Não era algo que sua habilidade lendária o permitiria copiar. Invés disso, conseguia ver claramente que era um estado mental que o usuário atingia.

Ele pode ler meus movimentos. Sua velocidade é um pouco maior que a minha, mas ainda estamos iguais em força… Não, talvez eu ganhe nesse sentido, ao menos por um pouco.”

Decidido, fechou os olhos, relaxando o corpo. Seu inimigo olhou para ele, surpreso.

Então, enfim decidiu pedir minha ajuda, Ethan? — A voz de Agar, desagradável como era, soou no seu ouvido, o sibilar ameaçava tirar sua sanidade. O jovem, contudo, manteve a calma e buscou além daquilo, indo mais fundo no seu âmago.

O que ele está fazendo? Claramente não é o Mushin.” O adversário olhou para o rapaz, esperando algo sair dali. Vendo que não teria resposta, respirou fundo, permitindo que seu ‘verdadeiro eu’ viesse à tona.

Naquele momento, quando tornou-se oco, como se para responder a sua técnica, o jovem candidato também liberou algo. O que era esse algo, no entanto, era o mais interessante.

Diferentemente de Lockust, quando, ainda desacordado, trouxe o destruidor dentro de si para o mundo, o que desabrochou ali era diferente de tudo. Invés de ser aquele que anuncia a destruição, tomando aquela espada, Ethan tornou-se aquele que reescreve.

Trazendo uma vez mais seu ‘verdadeiro eu’, só havia uma coisa que podia o definir. Um único conceito, um elemento.

Tinta.

Seus olhos se arregalaram com a visão, ainda que momentânea, das diversas linhas que levavam a vitória. Correndo em direção ao oponente, entrou em outra postura. Conforme se aproximava, as linhas eram cortadas pelo espírito do oponente.

Até que, então, só uma restara.

Ambos sabiam que aquele que agarrasse a linha ganharia. Preparando a Bento, tentou um corte, mas o oponente foi mais rápido. A linha, antes branca, tornou-se vermelha, cor do Mármore.

Naquele momento, um que devia ter sido morto, algo no rapaz despertou.

Girando o punho, a linha tomou uma nova coloração. O Mármore, ao ver aquilo, arregalou os olhos e mudou a postura, assumindo uma forma mais defensiva.

Se do pó o homem veio, ao pó ele retornará. Essa é uma verdade presente em todos os filhos de Seth. Todas as linhagens vinham do mesmo lugar. Todas destinadas a ter um fim.

Contudo, havia uma em específico em que isso não era verdade.

A linhagem que foi retirada da “ordem natural de todas as coisas”, aquela que sempre se levanta para responder o destino.

Uma linhagem vinda da tinta.

A ponta da Bento tocou no corpo do Mármore e quase o decapitou. De fato, só estava vivo naquele momento pois decidiu que seu pescoço valia mais que sua mão direita.

Ethan ficou incrédulo. Como se estivesse enfeitiçado, saiu do estupor que o tomou e olhou a lâmina que lhe fora concedida por Ittai.

A visão do sangue alternava entre o rubro que era esperado e um líquido negro, tão escuro quanto o mais profundo vazio.

A cabeça latejava e quase perdeu sua consciência, de novo e de novo.

O queimar do estômago veio com tudo, e podia sentir a bile subir a garganta, mas segurou. Se perdesse a concentração, sabia que acabaria vomitando o mesmo líquido negro e que todos o veriam como a aberração que era.

Não queria isso e, por esse motivo, meramente pôs a espada em frente, usando de toda a sua concentração para não falhar.

Veias negras saltavam de sua pele, uma aura negra era percebida por todos que seguiram o caminho do Mushin. O adversário engoliu em seco.

Beell disse que ele era um novato. Todos os relatórios que ouvi eram claros nisso. Ele não demonstrou nenhuma capacidade de usar o Mushin… então como?” pensou, tentando achar uma forma de explicar aquilo.

Segurando a machadinha, suspirou enquanto fazia força para parar o sangramento.

Só pelo fato que tomou minha mão, já é digno de passar neste pequeno teste… Contudo…” Sorriu, pulando contra o rapaz. “Quero ver até que ponto consegue chegar!”

Nisso, o ar mudou. Tornou-se mais pesado, denso até. A sede de sangue fez com que Ethan tomasse um passo para trás inconscientemente. A sua frente, estava um Mármore que cansou de brincar.

Um oponente que decidiu usar o primeiro Céu.

Vamos começar?

Nisso, correu numa velocidade absurda, o dobro da que tinha antes. Ethan, assustado, pôs a Bento em posição de defesa, impedindo um corte que quase lhe tomou a cabeça.

Da melhor forma que pôde, bloqueou cada golpe, os ataques deixavam seus ossos tremendo. Para Liza, aquela visão era absurda. A forma como ambos dançavam numa chuva de aço e faíscas era bela, porém mortal.

Quase como se fossem duas bestas, ambos lutavam numa velocidade muito superior a dos outros participantes. Algo que muitos atraídos pela explosão de fogo viram.

A verdade era que, enquanto lutavam, Ethan não percebeu que quase todos os examinados os olhavam. Tão imerso estava na luta, no sentimento de se provar, de afundar no prazer da batalha que não conseguia ver nada além do que estava a sua frente.

Ambos tinham a mesma expressão, o mesmo sorriso psicótico. A machadinha se chocava com a Bento, forçando-o para trás. Alguns ataques passaram de sua guarda, manchando seu quimono em vermelho.

Filhote de rapariga! Tá me atirando pra trás…” Sabia que, se continuasse dessa forma, os ferimentos se acumulariam e ele perderia.

Não queria isso.

Jogando fora a cautela, redobrou a velocidade, forçando seu adversário a ficar na defensiva, seu desejo lhe dava mais poder, seu foco tirava a atenção dele da fraqueza continua que lhe acometia.

Continuou girando a espada, que, a essa altura, mais parecia um flash prateado, até que, finalmente, superou a velocidade do Mármore, cortando o peito dele e, dando um forte soco, jogou-o para longe.

Vendo a forma caída, achou que enfim tinha ganhado, deixando-se sentir cansado. Apoiou-se na lâmina, tentando não cair enquanto observava o subir e cair do peito do adversário.

Sabe… — disse, enfim, levantando-se enquanto tossia um pouco de sangue. — Essa é a primeira vez em muito tempo que alguém me corta tão profundamente assim sem a força concedida pelos Ciels.

A multidão começou a murmurar conforme dizia, seu olhar, irritado, caiu sobre o rapaz enquanto sua cara virava uma máscara de ódio.

É a primeira vez que sou humilhado dessa forma. Se tivesse usado o primeiro céu, teria conseguido me cortar em dois… contudo, hesitou. Por quê?

Ethan ficou quieto por alguns segundos, olhando fundo nos olhos do mármore, pegou a espada e pôs-se na mesma posição defensiva, dentro de sua mente viu o mesmo sonho de novo.

Não… Não sou um monstro!” pensou, cansado. Esta era a melhor forma de defini-lo naquele momento. Sentia-se exausto, levando um peso nos ombros muito acima do que podia carregar.

Nada a dizer, é? Certo… se é assim que quer brincar, vou te mandar para o inferno…

Eu não posso derrotá-lo assim. Aquele último ataque tinha tudo o que eu podia oferecer, mas ele ainda está de pé. Além disso…” Olhou para as manchas vermelhas, notando como havia algo negro ali. Voltou-se para Liza, a visão turva escondia a expressão que carregava. “Preciso vencer. E tem que ser rápido.”

Naquele momento, uma ideia surgiu na mente do rapaz conforme uma memória tomava conta.

Ainda limpando a espada, Ethan?

Naquele dia, uns quatro meses atrás, tinha voltado da selva com uma das várias armas de Ittai, uma Zweihander que o espadachim deixou consigo quando acordou no meio do mato.

Ei, senhor, dá pra parar de me fazer acordar no meio da selva! Acha que sou bicho pra ficar levantando dessa forma? — disse, esfregando a lâmina para tirar o sangue e tripas dos animais que o atacaram. — Além do mais, essa espada é pesada demais, não tinha como me dar uma mais leve, não?

O velho suspirou e, caminhando a passos lentos, deu-lhe uma forte porrada na cabeça. — Idiota! Um verdadeiro mestre do nosso estilo consegue usar qualquer arma como uma extensão de si mesmo! Agora limpe-a! É sua punição por ser muito lento.

O jovem acariciou a cabeça, olhando-o com estranheza. — Lento?

Sim. — Começou a caminhar para longe, suas costas largas estavam tão próximas, mas tão distantes de Ethan que o rapaz não pôde deixar de engolir em seco e absorver o que ouviria. — Alguém que domina bem uma arma consegue cortar seu oponente sem sujar sua lâmina.

A memória se encerrou e o rapaz olhou profundamente para o seu inimigo. Suspirando, decidiu que era hora de testar uma técnica em específico.

Se isso não funcionar…” Conseguia imaginar facilmente o que aconteceria consigo. Aquilo tinha que ser perfeito, ou perderia sua cabeça. “Sem distrações!”

Apesar de ser uma situação de vida ou morte, apesar de estar no limite do que seu corpo aguentava, não pôde deixar de sentir-se completo, o vazio que lhe atormentava desaparecia pouco a pouco.

Antes de acabarmos com isso, deixa eu te falar uma coisa. — Olhou para o oponente, que parou seu avanço, esperando o que viria. — Meu nome é Ethan, aprendiz de Ittai… Meu mestre me ensinou o estilo da Foice da Doninha e devo muito a ele, mas o que vou te mostrar agora é algo que nem mesmo ele sabe.

Nisso, relaxou as pernas enquanto olhava fundo nos olhos do oponente, preparado para a dor que viria do esforço a seguir, deixou seu espírito lhe fortalecer.

Estilo Foice da Doninha, forma secreta…” Com todo o corpo mole, pôs toda a força nos dedões do pé e, quando estava para cair de cara no chão, usou a combinação de sua força, destreza e constituição para pular.

O salto foi tão violento que atravessou a arena inteira. A distância coberta não impediu a forma como sua espada foi usada, ao contrário.

Como se usasse a gravidade a seu favor, ignorando por completo a resistência do ar, a lâmina da Bento cortou o metal da armadura que o protegia, cortou a carne que ali estava, e, quando enfim parou de cortar, Ethan estava do outro lado da arena, três metros atrás do Mármore.

Meteorito! — sussurrou, uma explosão de jato de sangue surgiu logo atrás de si.

Caindo no chão, sorriu ao olhar para a Bento.

Nenhuma mancha…”

 


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