A Maldição da Trindade Brasileira

Autor(a): Felipe Ramos


Volume 1 – Arco 3

Capítulo 26: A Curandeira e o Garçom

Dois anos atrás.

Kaya estava em uma escola que parecia estar abandonada. Ao seu lado uma garota de cabelos de cor vinho estava em prantos.

— Eu não aguento mais esse lugar. Quando cheguei aqui imaginei que fosse um internato pra ajudar a despertar os poderes de cura, mas isso aqui é uma tortura psicológica, eu não vou mais aguentar isso. — exclamou a menina, enxugando suas lágrimas.

— Não entendo sua razão de lidar com essas coisas assim, eu nunca tive um tratamento diferente do que temos aqui. Tudo o que faço é para procurar a minha limitação.

— Você nasceu nesse lugar, com essas pessoas, isso é tão triste. — A menina colocou as mãos no ombro de Kaya. — Espero que um dia você saiba o que é ser feliz.

No dia seguinte, a Sarah fugiu do internato. Eu continuei por mais alguns meses, até que evoluí tanto que me convocaram para trabalhar para o governo de Solária, onde eu seria treinada pela Helena, eu achei que indo eu finalmente acharia uma nova limitação para poder evoluir minha cura reversa, então eu fui.

Sarah foi a primeira pessoa que me apresentou como a vida deveria ser, Helena foi quem me tirou do lugar ruim e você… Você me fez rir pela primeira vez.

Kaya estava encarando Sachi, parado em sua frente, completamente chocado com o encontro inesperado.

— Não é possível, pegamos caminhos diferentes, não existe isso de nós nos encontrarmos por aqui, só pode ser algum erro! — gritou Sachi.

— Deve ter sido alguma armação do governo, eles tem alguma vontade maior, somos apenas peças desse plano.

— Mas o que eles ganham nos colocando para lutar?

— Sou apenas uma curandeira e você apenas um garçom, só estamos sofrendo a consequência de uma mudança maior que fizeram em outra luta.

— Não vou conseguir lutar contra você, de jeito nenhum, eu vim pra cá só pra te apoiar.

— Eu sei que parte disso você fez por mim, mas não foi só por mim, também foi por você. — Kaya entrou em pose de luta. — Estamos há uma luta de chegarmos nas finais, vamos nos divertir.

Sachi se impressionou com o que a curandeira falou.

Esse é o tipo de coisa que eu deveria falar pra você, sua besta., pensou o garçom.

A menina de cabelo ciano avançou e começou a disparar socos e chutes, mas o garçom esquivou-se de todos. Ela o enganou e conseguiu encostar seu dedo na testa do garoto.

— Merda! — Se prepare para a tortura! — A garota se afastou e cerrou seu punho esquerdo. — Dolores!

A cabeça do garoto começou a latejar e, segundos depois, uma enxaqueca de muita força tomou conta de toda sua cabeça. Ele colocou as mãos no rosto e se jogou no chão, agonizando de dor.

Eu já nasci órfã, nunca conheci meus pais, nem ao menos sei se eles existem, também não me importo. Crescer naquele internato me fez entender o porquê das pessoas quererem estar lá, afinal não era um internato comum.

A cura é um poder que você pode aprender, então pessoas que desejam ajudar ao próximo e não tem poderes comuns, vão até lá estudá-los. Mas no meu caso não foi uma escolha, como é muito raro alguém decidir ir estudar esse poder e assim a taxa de curandeiros diminuía, o rei fez um acordo, mandando órfãos para serem treinados desde sempre, fui apenas mais uma naquele lugar.

Sarah foi uma pessoa que escolheu ir lá estudar, ela tinha uma família em Poor, mas decidiu ir para lá, porém não aguentou a tortura que aquele lugar era. Eu consegui, fui tão bem que consegui criar uma técnica que nunca ninguém tinha conseguido, a técnica de ter tanto poder sobre a cura que eu poderia revertê-la, ou até criar a dor. Mas conforme fui acostumando com ela, percebi que aquele lugar não me servia mais para evoluir.

Onde será que você está, Sarah? Eu queria te contar que eu descobri a vida, e ela é realmente ótima, mesmo que tenha milhões de problemas.

Sachi levantou, a dor parecia ter diminuído.

— A intensidade diminuiu sozinha? Eu não pedi isso. — exclamou Kaya.

— A dor é psicológica. Então eu só preciso não pensar nela! — Sachi correu em direção da garota.

Que ódio, como posso me tornar um cavaleiro romântico se esses merdas me colocaram pra enfrentar a minha donzela. Talvez eu devesse perder… Pelo menos se ela fosse uma pessoa comum, mas ela não é! Ela é incrível!

Sachi desfere alguns socos, mas Kaya consegue esquivar. Sachi aproveita e acerta uma rasteira, derrubando Kaya no chão e a imobilizando.

— Desista, agora! 

— Você vai ter que me acertar um golpe se quiser me vencer, bobão. — A curandeira abriu um sorriso. — Dolores!

Os braços de Sachi começaram a dar cãibras com alta intensidade, e ele largou a garota.

— Merda! Argh!

— Tente me acertar! — Kaya estalou seus dedos e todas as dores de Sachi sumiram. — É a sua última chance, em!

Sachi avançou novamente.

Kaya estalou seus dedos de novo, e uma vertigem fez com que Sachi caísse no meio da corrida. A curandeira sorriu do jeito engraçado que o garçom caiu.

— Sabe, Sachi. Você foi a primeira pessoa que me fez sorrir, sua existência é bem engraçada.

Então eu sou um palhaço…, pensou Sachi.

— Eu tive uma amiga que me contou que eu um dia iria conhecer alguém que me fizesse rir, e que quando eu achasse essa pessoa, eu nunca iria querer me afastar dela. — Ela abriu um sorriso. — Mas você é diferente, é um engraçadinho diferente.

Tô perdendo no físico e no mental, nunca me senti tão humilhado., pensou o garçom.

— Esses meses que eu passei treinando com você me mostraram que você não é só engraçadinho, mas que é maior do que imagina. Perder por que não consegue me ferir é um final bem ridículo para alguém que tem uma força física com potencial de chegar no nível da Helena.

— Queria enfrentar as pessoas fortes, queria poder enfrentar a Blair e ver se a minha força é tudo isso mesmo, mas eu também queria que você chegasse nas finais, são duas coisas que eu tenho que escolher apenas uma, isso é injusto.

— Então vamos ver o que você faria se não me conhecesse. — A curandeira acerta um soco bem na testa de Sachi, que o deixa super tonto. — Eu consigo criar coisas terríveis como fazer você perder seus sentidos, ritmo de batimento do coração e respiração, mas isso só dura alguns segundos. Então, por trinta segundos, vamos ver como você lutaria sem ter memórias de quem sou eu.

O garçom se levantou e ficou encarando a curandeira.

— Venha! Eu sou a porta para seu futuro! Faltam 25 segundos!

Sachi correu em uma velocidade extrema e, antes de que Kaya conseguisse reagir, ela já estava imobilizada. O cozinheiro preparou um soco e quando foi acertá-lo, parou milímetros antes e uma lágrima escorreu de seu rosto.

— Ainda faltam 15 segundos, ele não deveria lembrar de coisas o bastante pra evitar me vencer, eu mudei isso!

— Eu sei que você quer que eu mostre meu verdadeiro poder contigo, me desculpa ser tão injusto assim, mas nunca mais tente mudar a mente dos outros assim, isso é muito errado. — exclamou Sachi.

Kaya estava assustada, pois o que ela tentou fazer não funcionou.

— Mas, o quê? Eu jurava que tinha feito tudo certo.

Semanas antes, no Sexto Distrito.

— Sra. Helena, eu vim novamente agradecer por me ajudar a participar do torneio, estou ansiosa pra ver até onde meus poderes podem ir. — disse Kaya, animada.

— Eu que agradeço, graças a você agora o meu primo entrou pra esse torneio, eu sempre quis isso.

— Aposto que ele pode vencer, ele parece tão forte!

— Tem potencial, mas o problema dele está na mente, ele não acredita que é tão forte quanto imagina.

— Sério? Ele pareceu bem convincente da força física. 

— Não estou falando disso, estou falando da força mental dele. — Helena apontou para a própria cabeça. 

— Então mentalmente ele também é forte? Que incrível. Ainda bem que ele está no meu time.

— Kaya, o quão longe você espera chegar?

— O bastante para ver se alguém vai conseguir parar meu poder. Penso muito sobre a princesa Blair, ela não pode copiar o meu poder, então talvez ela consiga evitar minha mudança.

— Nunca imaginei que veria uma curandeira com o mesmo discurso da futura rainha de Solária, ambas vão para o campeonato esperando encontrar limitações.

— Acha que estou sonhando muito alto?

— Você está no caminho certo, só lembre-se, Blair não é a única competidora, existem outros valores que podem te surpreender.

Sua mente… Ignorou minha mudança… É a primeira vez que alguém desfaz meu poder!, pensou Kaya.

A curandeira começou a gargalhar e quando parou, levantou seu braço.

— Eu desisto!

— O quê? Por quê? Eu não quero passar sem vencer, isso é injusto! Eu que desisto! — gritou Sachi.

— Eu achei alguém que parasse minha mudança, isso é incrível. Agora vou ter mais coisas pra evoluir sobre minha cura inversa. E você estava do meu lado o tempo todo!

— Estou me sentindo um lixo.

— Não posso fazer nada sobre isso, Xuxu. Mas uma coisa você pode fazer.

— O quê?

— Quero que chegue até Blair nesse campeonato e enfrente ela com toda sua força, assim poderá se perdoar.

Sachi continuou cabisbaixo.

Talvez ele precise de uma motivação… Sarah me disse uma vez que algo criava uma motivação instantânea, como se chama mesmo? Não sou boa com sentimentos ainda…

Kaya beijou a bochecha de Sachi e sussurrou em seu ouvido.

— Se você ganhar da Blair, eu prometo que aceito namorar com você. — Kaya não percebeu, mas além de deixar Sachi completamente corado, ela também ficou.

— Certo! — gritou Sachi.

Será que meu beijo tem poder? Esse amor é poderoso? Por que era pra motivar ele, mas agora… Meu coração também acelerou.

Kaya desistiu primeiro. O vencedor da luta é Sachi!

Dentro da sala dos mentores, Helena estava envergonhada com a cena que eles assistiram, enquanto Samantha provocava.

— Que partida vergonhosa, tem sorte que isso só é transmitido aqui, se você pela televisão sua moral acabava de vez, Heleninha. — provocava a adulta de cabelo vinho.

— Calada, Samantha. Kaya não levou esse torneio a sério desde o começo, não vou perdoá-la por me convencer a recomendá-la. — O olhar assustador de Helena estava de volta.

— Pelo menos agora poderemos ver a real força de Sachi, ele está mais do que motivado. — explicou Harry.

— Com isso já temos três classificados. Mas tem algo esquisito nisso. — exclamou Aiden.

— Sim, Drake, que foi o primeiro a chegar não teve nada filmado, toda a jornada dele no templo não foi documentada. E de quebra ele não está com nenhum outro ferimento ou cansaço, parece que ele só passou reto. — exclamou Zane.

— Outras coisas estranhas foram a realocação, Ben não deveria enfrentar Natsumi e nem Sachi deveria ter enfrentado Kaya. Tem algo errado nisso. — disse Harry.

— Mas o que mais me preocupa é que a televisão do lado de Toby ainda não mostrou imagem alguma, não temos ideia do que está acontecendo. — falou Helena.

— Pois deixem comigo, eu irei averiguar. — Zane levantou-se e saiu da sala.

Enquanto isso, Sachi entrava na sala de espera da próxima fase.

Drake e Natsumi o olharam com muito julgamento do que assistiram, mas logo voltaram suas atenções para a televisão desligada do caminho de Blair.

— Não tá funcionando? — indagou o garçom.

— Não, o que é muito estranho, já que Drake não enfrentou ninguém nessa fase. — explicou Natsumi.

— Ninguém? Como assim? deveriam colocar alguém para o caminho dele.

— Pois é, mas não tinha ninguém.

— Então quer dizer que tem alguém sobrando… — Sachi leu a lista do top12 e se assustou. — Meu deus!

— Sim, nós também percebemos isso, Sachi. — exclamou Natsumi, com um olhar sério.

— Além de Toby, quem falta são Orochi e Clark, ambos da mesma equipe.

Minutos antes, Toby entrou na sala do top12 do caminho de Blair.

— Estou tão ansioso para enfrentar o próximo logo! Essa fase demorou muito pra começar! — O garoto com sardas avistou duas pessoas. — Ei, são vocês daquele dia, o que fazem aqui? Quem eu vou enfrentar?

— Nós também não estamos entendendo nada, eu estava preparado para enfrentar o Drake, mas de repente parei aqui — explicou Clark.

— Luta entre Toby e os dois integrantes da cidade de Poor, Orochi e Clark, começa agora! — Ecoou pelo alto-falante.

— O quê? — Orochi se assustou.

— Apenas um poderá passar para a próxima fase, decidam-se. — Uma voz grossa foi ouvida. — Então juntem-se e vençam esse garoto na frente de vocês, e depois decidam quem vai passar.

— Essa voz! — Toby se irritou.

Golias estava sorrindo, na sala de controle.

— Excalibur pediu mesmo isso? — perguntou Bertha.

— Sim, teríamos que fazer Drake enfrentar Yuki sem que o filho de Excalibur precise lutar, pois ele quer que os dois possam evoluir se enfrentando. Então quem acabou pagando o pato foi o plebeu de merda do meu distrito, como Adder já queria o tirar do caminho de Blair, acho que essa solução foi ótima.

Zane escutou a conversa do corredor.

Isso é demais, por que eles vão cometer essa injustiça com um garoto normal como o Toby, por que ele não pode encontrar a Blair? Eu não posso fazer nada sobre essa injustiça que vão cometer com você, Toby. Mas em compensação, eu posso expôr essa injustiça para todo o planeta., pensou Zane, olhando para a sala de transmissão.



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