A Mansão de Alamut Brasileira

Autor(a): Safe_Project


Volume 2 – Arco 1: Dr. Yellow

Capítulo 7: Colega de Trabalho

BAM! BAM! As batidas na porta ficavam cada vez mais fortes. Do lado de fora, homens bravejavam ordens para o ruivo, mandando-o sair daquele quarto imediatamente e repetindo constantemente que aquele era o seu fim.

Talvez realmente fosse, mas isso não dependia daqueles desconhecidos, e sim de outra pessoa.

“Yellow! Eu espero que aquela ajuda tenha sido um assunto sério!!”

De todas as formas que conseguia pensar, Victor “injetava” poder naquela câmera. As veias em seus braços saltavam a cada batida de seu coração, a respiração se tornava mais pesada e a visão começava a ficar turva. Força demais! Acabaria desmaiando naquele ritmo!

A câmera não reagia, pelo menos não visualmente, mas sabia que algo estava dando certo, só precisava continuar e descobrir o que.

BAM! BAM! A porta estava prestes a ceder, mostrando que nem uma montanha de móveis era o bastante para parar aqueles perseguidores.

“FUNCIONA, FUNCIONA!!”

Era como se tentasse exorcizar um espírito preso na câmera, e de certo modo pareceu funcionar. Finalmente conseguiu uma reação; mais forte do que esperava.

Uma corrente elétrica percorreu seus braços, causando arrepios por toda a superfície desse, até que um choque fosse expelido da ponta de seus dedos e atingisse a câmera.

Na mesma hora, um forte flash de luz dominou o quarto, podendo até ser notado por aqueles do lado de fora, os quais agora batiam na porta com ainda mais força.

“Isso… Isso é!!”

Seus olhos podiam muito bem estar lhe enganando, ou talvez sua mente estivesse à beira da loucura. Pairando pelo ar, rastros de uma densa névoa roxa provinham da câmera e dançavam para fora do apartamento, como o rastro de uma lâmina que guiava para o centro da cidade.

Parabéns, não esperava que você fosse conseguir.

A voz de Yellow soou em sua cabeça, no mesmo tom zombeteiro de sempre. Entretanto, não havia tempo para discutir com aquela entidade sádica.

A porta estava prestes a ceder, e não tinha saída de emergência. Preso no terceiro andar de um prédio, Victor considerou a ideia de lutar, mas além de desarmado, não tinha noção de quantos inimigos havia do outro lado? Foi ante essa dúvida que o demônio se manifestou novamente.

Eu resolvo isso. Considere essa como a minha primeira ajuda.

De repente, seu corpo relaxou e a consciência pareceu afastar-se do corpo. Em sequência, sentiu correntes lhe aprisionando, ao mesmo tempo em que seu olhar era levado até o espelho do quarto.

— Heh! Possessões até que são mais legais do que eu pensei.

A imagem refletia um homem de sorriso cínico e com a mais marcante característica. Ambas as pupilas foram imbuídas na cor do ouro, aquele maldito realmente fez aquilo? Sim! Não tinha outra explicação!

Ei, seu desgraçado! Você possuiu meu corpo!?

Sua voz parecia distante, ou melhor, realmente estava; mas talvez Yellow que lhe tivesse ignorado. Por mais que tentasse alcançar a entidade com sua voz, foi calado pela próxima ação do mesmo.

Abrindo a única janela e analisando a altura por um breve momento, ele alargou o sorriso e deu uma curta risada.

Ei, ei, ei! Espera aí!

— Essa adrenalina… Como é bom senti-la de novo!!

Espremendo-se na abertura como um contorcionista profissional, saiu do apartamento e, sem qualquer hesitação, saltou! Quase doze metros de queda livre, onde Victor não conseguia nem gritar.

KABLAM! A aterrissagem não foi nada elegante. Apesar de cair em pé, ambas as pernas afundaram um pouco no chão e o corpo desequilibrou. Após tirar os membros de dentro do chão, Yellow simplesmente tirou a poeira da roupa e finalizou:

— Não se preocupe, não quebrou nenhum osso. Agora, o resto é com você.

Como dito, o detetive se viu livre daqueles correntes e de volta ao controle do próprio corpo num piscar de olhos.

Entre as falhas de sua respiração ele encarou as mãos trêmulas, franziu o cenho e então cerrou os punhos. Uma veia saltou-lhe a testa, e ao seguir aquele rastro púrpuro pelo ar, focou no caminho que deveria seguir.

Dentro do apartamento, a porta finalmente foi ao chão, permitindo que vários homens armados invadissem. Um deles logo notou algo estranho, e apesar de não acreditar, não tinha como ser enganado pelo o que estava vendo.

— Ele fugiu! Está na direção do agente de campo!

Os outros reagiram de imediato, retomando o caminho para perseguir o alvo que já se misturava numa densa multidão.

Enquanto corria entre os civis, Victor tentava a todo custo identificar o fim daquele rastro. Tal seguia de maneira que parecia não ter fim, e para piorar, era notável sua lenta dissipação.

“Como que eu consigo enxergar isso? O que foi que aconteceu naquele momento??”

Dessa vez, Yellow não veio lhe responder. Talvez por causa do susto, a câmera foi deixada no apartamento, mas pelo jeito ela não seria mais útil a partir dali.

Entre as arfadas, o detetive levou uma das mãos ao rosto para limpar o suor, mas sua mão saiu suja com outro líquido. Seus olhos estavam sangrando!

PORRA! O grito agudo chamou a atenção de todos ao redor, mas também serviu para abrir caminho.

O brilho dourado se extinguiu lentamente, assim como sua capacidade de enxergar aquela névoa. Entretanto, antes que seu guia sumisse de vez, ele deu um salto da verdade, conseguindo ver exatamente o que queria.

— EI!! VOCÊ DE CAMISA VERMELHA, PARADO AÍ!

O suspeito olhou de volta com o terror estampado em todos os seus movimentos, mas não foi possível ver o rosto claramente. Seu cabelo era grisalho! Seria um idoso? Não importava!

Empurrando todos em sua frente, não tardou em alcançar a pessoa. Esticando a mão como se tentasse alcançar uma luz no fim do túnel, agarrou a gola da camisa e imobilizou os braços do suspeito.

— Agência de Polícia! Se identifique, cidadão!

O homem vagou os olhos arregalados, tentando encarar a pessoa que gritava contra si. Após alguns segundos de ameaças, ele respondeu:

— Jo-jorge Santos, se-senhor…!

— Jorge, preciso que me acompanhe até a delegacia!

O investigador buscou algo na cintura, revelando um par de algemas. Era ele! Tinha certeza absoluta! Mesmo que ambos os olhos estivessem sangrando e as pernas lutassem para lhe manter de pé, era ele!

Nenhuma dor importava naquele momento, nem mesmo as cobranças de Yellow, só precisava colocar as algemas e tudo estaria acabado.

Porém, uma voz veio da multidão:

— Policial, você não estava seguindo um homem de camisa vermelha?

Ele arqueou a sobrancelha, procurando pelo dono da voz, esse que não encontrou. Seu olhar voltou ao suspeito apreendido, e ao analisar a roupa que vestia, sua face ficou branca.

O elemento vestia uma regata cinza, enquanto os cabelos eram completamente negros, sem qualquer resquício de alguém de idade mais avançada.

— O… o quê? Mas eu estava… — Deu passos para trás, analisando a multidão que lhe encarava. — Pra-pra onde ele foi?

— Ué! Você gritou por um homi de camisa vermeia e depois agarrou esse cara aí — explicou uma senhora.

Victor encarou o suspeito totalmente desacreditado. Do que aquela velha estava falando?? Ele pulou no cara errado? Não, impossível! Simplesmente impossível!!

Tantas possibilidades viajaram por sua mente, mas nenhuma, sequer aquelas mais prováveis faziam sentido.

“Como? Mesmo um Fator B não é capaz de alterar a forma física da pessoa… Será que é alguma habilidade que facilita na fuga?”

O civil inocente levantou-se, tratando de se retirar entre tropeços. 

As pessoas cochichavam umas com as outras, olhando para Victor de forma julgadora. Não demoraria para que a notícia se espalhasse entre todos os estabelecimentos da área.

“Cabelo grisalho… Não posso me esquecer disso de maneira alguma!”

Saiam da frente! O urro atraiu a atenção de seus olhos vermelhos. Aquele grupo de perseguidores já havia lhe alcançado!

Com um forte gosto amargo na boca, o agente se retirou da cena o mais rápido que pôde, voltando para a posição de perseguido. 

Mesmo após ter chegado tão perto da pessoa que queria, literalmente uma mão de distância, não pretendia agradecer ao Dr. Yellow, nem agora, nem nunca.

.

.

Arfa! Arfa! Enquanto o investigador se contorcia internamente por ter perdido seu alvo, o próprio tentava acalmar as batidas de seu coração. A mão trêmula deslizou pelo cabelo branco, em seguida, limpou o suor da pele morena com a camisa.

Escondido no banheiro de uma loja, o elemento fez uma ligação, atendida prontamente por uma voz feminina:

Agência de Tecnologia, com o que posso ajudar?

— Código 3952, linha de chamada Alfa.

Ah, é você. Aguarde só um instante.

A mudança no tom de voz foi impressionante, passando de uma atendente normal para uma mulher ranzinza em menos de um segundo. Sem muita demora, uma jovem e animada voz masculina atendeu:

Yo~! Alguma coisa boa aconteceu? Encontrou o que a gente quer?

— Muito pelo contrário, eu quase fui pego pelo Victor, aquele sujeito disgramado. — Ele se segurou para não gritar.

Sério? Putz… Aí é foda, ein. Bem, a culpa não é minha se ele faz um bom trabalho como detetive.

Ao fundo, podia-se ouvir resmungos do que inicialmente parecia ser uma criança, fato confirmado pelo rapaz do outro lado.

Se acalma aí, garoto. Eu já brinco com você…

Ouvindo aquela voz, o homem engoliu seco e perguntou:

— Usar o poder daquela coisa vai realmente dar certo?

Hm? É claro que vai. O poder da jóia que você carrega é um ótimo exemplo.

O tom do rapaz soou como se tudo fosse óbvio, a convicção em suas palavras era tanta que apenas ouvir seus argumentos fazia pensar que eram verdades absolutas.

O homem encarou o item comentado, passando os dedos pelo cordão vermelho em seu pescoço até alcançar o pingente pendurado. Era um losango pequeno, mas o brilho dourado emitia uma aura poderosa e atrativa, quase hipnotizante.

Até mesmo eu não sei o motivo, mas existem alguns itens, como esse seu aí, que são tão poderosos quanto qualquer tipo de Fator B que eu já vi na minha vida. Ninguém sabe de onde essas coisas vieram, mas… quem liga, né?

Hã~… Se você está dizendo…

Não se preocupe, eu entendo suas dúvidas. De qualquer forma, lembre-se que você não está sozinho, você pode pedir aos outros agentes pela cidade para te ajudarem com os problemas. Você sabe quem eles são, não é?

— Sim. — Ele cerrou os punhos, dando seu melhor para não gaguejar. — Eu vou dar o grau nessa situação e deixar ela bem massa, fica tranquilo.

É assim que eu gosto de te ver! Então, a gente se fala a qualquer hora. Até mais!

Bip! A chamada encerrou não apenas a conversa, mas também o nervosismo do homem. Com o coração agora batendo normalmente, ele se pôs a pensar naquele banheiro apertado.

Seus olhos de além da muralha, banhados num cinza bem escuro, vagaram pelo teto do lugar, para que em seguida caíssem na tela do celular que tirou do bolso.

— Os agentes espalhados… Quase que eu me esqueço deles — disse, decepcionado. — Certo, tenho que aproveitar que essa ajuda existe e aproveitá-la. Vamos ver… quem eu posso chamar? 

O elemento tinha dúvidas cruéis, pois mesmo que fossem poucos parceiros de trabalho, não conhecia nenhum deles. Era a desvantagem de ser o novato do grupo.

— Vai esse! — reclamou, escolhendo praticamente na sorte.

O celular chamou algumas vezes, até que uma voz rouca e cansada atendeu:

Romanov? Primeira vez ligando, ein... Qual as boas?

Eh… E-eu preciso de… ajuda? — O tom do outro era íntimo demais, tanto quanto o de um melhor amigo.

Não aja dessa forma. Esse banheiro aí tá confortável?

Ele saltou do vaso, procurando algo que não sabia o que era por todos os cantos.

Ahaha! Não se assuste, eu só vi você entrando, não tô querendo te ver cagar nem nada disso.

— Po-posso saber quem é você?

Não, até gostaria de dizer, mas tenho que manter sigilo. Na verdade, eu nem estou aí, mas sim as minhas câmeras.

— Quê? Como assim? Você é tipo um daqueles hacker dos filmes?

Ele ficou em silêncio, sendo possível ouvir o caminhar de diversas pessoas do outro lado da linha. Quando os passos cessaram, ele respondeu:

Melhor eu não dizer, eu me sentiria mal se deixasse meu colega de trabalho perturbado. Mas e aí, qual a razão pra me ligar, afinal?

— Ah! Re-realmente. Eu liguei pra pedir ajuda com um mininu aí. É o detetive Victor, ele acabou de passar muito perto de me capturar, eu só fugi graças ao meu pingente.

Novamente, um curto silêncio, seguido de passos rápidos e resmungos por alguns segundos.

Hum… Tranquilo. Mas a melhor oportunidade pra eu fazer meu trabalho é no Dia do Tarche, então… aguente até lá.

— Ok, se for só isso, eu acho que consi…

Bip! Romanov resmungou, como uma criança abandonada. Mas não importava se foi ignorado ou não, conseguiu o que queria.

Ciente de como deveria seguir, ele tocou o losango dourado, cujo emitiu um brilho de mesma cor antes da mágica acontecer.

O grisalho do cabelo tornou-se num negro juvenil e as roupas se transformaram num padrão pouco chamativo. A cor da pele e dos olhos permaneceu, mas nem de longe seria o suficiente para ser reconhecido, era sua única certeza.

“Certo, não posso ficar avoado toda hora. Com isso, vou conseguir andar até o próximo ponto sem nenhum imprevisto… eu espero.”

Agora com seus problemas — de certa forma — resolvidos, ele saiu da loja da forma mais normal que conseguiu.

Passou perto! Era tudo que conseguia pensar, mas o alívio de saber que não estava sozinho era impagável. Ao seu ver, os dias de Victor estavam contados. 

Caminhando rapidamente, Romanov desapareceu pelo centro da cidade, tão apressado que não percebeu um gato de rua que lhe encarava fixamente.

O Dia do Tarche, que ocorreria no dia 28, se aproximava rapidamente, e diferente das outras vezes, não seria um simples feriado nacional, mas o palco para eventos tão grandes que a população nunca seria capaz de imaginar.



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