A Mansão de Alamut Brasileira

Autor(a): Safe_Project


Volume 2 – Arco 5: Laboratório

Capítulo 47: O Demônio

29/04/2002, 19:35 da noite

Desbravando a estrada cercada por uma floresta densa, o Celta preto disfarçava-se convenientemente no ambiente. Se alguma criatura estivesse à espreita, mesmo uma possível capacidade de enxergar no escuro ainda não seria suficiente para enxergar o veículo.

— Então é aqui? Parece bem mais macabro desde a última vez que visitei o lugar.

O comentário nostálgico de Victor tirou-lhe um risada curta. A Floresta do Pecador, um nome que não se alterou mesmo após a demolição da casa que dava nome àquela mata enevoada — cuja névoa havia se dissipado quase que completamente, aliás. Além disso, que tipo de reação a própria natureza teria agora que o detetive trazia de volta nada menos que o próprio Pecado? Provavelmente uma raiva incontrolável.

Ah~! Tantas lembranças! —

Yellow demonstrou-se tão nostálgico quanto Victor, com direito à comentários distantes para si mesmo e, ao mesmo tempo, incompreensíveis para o detetive. Uma pena, seria interessante conseguir detalhes sobre o passado daquele demônio, por mais que ele provavelmente não tivesse um muito interessante.

Enfim, o ápice, vulgo, ponto final daquela viagem havia finalmente surgido ante os olhos do homem. Iluminada pelo farol fraco de seu carro, a placa de madeira em forma de arco dava-lhe as boas-vindas. Escrita nela, apenas “Caverna de Cristais”.

As laterais da estada eram bloqueadas por uma cerca também de madeira, obrigando o detetive a passar pela entrada convencional.

Ei, ei! Se acalma! Não é como se eu fosse te matar assim facilmente. —

A reclamação zombeteira de Yellow não merecia nem o mínimo de sua atenção ou confiança, o problema era que esse demônio estava literalmente dentro de seu corpo, tornando difícil uma tarefa como ignorá-lo.

— Eu agradeço por me trazer até aqui em segurança, mas agora fica apenas calado e deixa eu fazer o meu serviço.

Um humph soou em sua cabeça. Honestamente, ele lutava consigo mesmo em sua cabeça para decidir se ainda dividia o corpo com uma Entidade demoníaca ou com uma garotinha mimada. Como havia chegado até esse ponto?

Enfim, adentrou aquele novo espaço. Não era seu pé, que pisava no acelerador, mas o próprio veículo quem hesitava em avançar sem a maior cautela possível.

Buracos não eram o problema, muito menos a escuridão, graças aos faróis; mas sim aquela sensação sufocante como se estivesse no alto de uma montanha.

Os turistas conseguiam visitar aquele lugar tranquilamente mesmo com um ar pesado daqueles? Não! Impossível, tinha que ser algum tipo de azar do momento atraído pelo detetive.

“Parece que não tem nem guardas. Deve ser seguro descer."

Os seguranças provavelmente haviam se juntado com os protestos que ocorriam na cidade desde aquela manhã. Era a oportunidade perfeita para explorar sem se preocupar em ser pego.

Ele então saiu do Celta, pisando forte contra as folhas secas e confirmando a inexistência de alguém alerta nas redondezas.

Felizmente, a luz refletida pela lua naquela noite era intensa, então mesmo as grandes árvores dispersas naquela área não eram capazes de parar sua trajetória.

A casa de descanso dos funcionários parecia estar completamente trancada, e ainda que estivesse sozinho, arriscar disparar o alarme de algum dos veículos de passeio não seria inteligente.

A opção restante era ir andando. Para a sorte do rapaz, o objetivo em si não ficava tão distante daquele acampamento.

— Por aqui, certo? — disse enquanto seguia a direção das placas.

Lentamente adentrou um caminho estreito e mal iluminado da floresta.

Ouvia apenas seus passos e alguns animais noturnos, ao contrário de ouvidos adaptados que tudo podiam encontrar naquela quietude. Enxergava menos de um metro à frente, diferente de todas as criaturas selvagens que acordavam a essa hora.

A mão direita repousava na cintura, especificamente sobre a arma escondida ali. Não acreditava de fato que uma arma seria o bastante para lidar com algo que surgisse ali, mas era melhor do que nada.

Conforme era engolido pelas trevas da floresta, o som dos animais noturnos desaparecia gradualmente, dando espaço para seus solitários passos barulhentos. A atmosfera se condensava, acumulando o peso de uma montanha nos pulmões do detetive. Mas enfim, aquela imagem surgiu!

Sua entrada sozinha já brilhava como um arco-íris, obrigando-o a cerrar o olhar. O calcário escuro da entrada destacava o caminho que deveria ser traçado, e a ausência de pistas ou pegadas que indicasse presença recente trouxe alívio aos pulmões inflados de Victor.

“Acho que posso seguir sem medo.”

Seria uma escolha tola na maioria das situações, mas o “sem medo”, nesse caso, tinha o mesmo sentido de “sem paranoia, apenas cuidado”. Tal escolha teria um carma mais rápido do que poderia imaginar.

Aproximou-se com cuidado, esperando que os olhos se acostumassem com o ambiente. Em poucos segundos, visualizou as formas reais das fontes de todo aquele brilho azul celeste.

Dos mais variados tamanhos e espalhados das paredes ao teto da caverna pouco profunda, um gama incontável de cristais fazia presença (O nome Caverna dos Cristais não era atoa, né!). Cada um produzia seu próprio brilho, e não apenas isso, como também conversavam com aqueles ali presentes através de uma densa e pesada brisa misteriosa, capaz de sufocar os mal preparados.

Victor teve de parar e tomar fôlego. Aquela bigorna em seu peito não dava sinais de que desaparecia, por mais profundamente que suspirasse ou estufasse seus pulmões.

“Essa sensação é bem familiar. Parece com a presença do Yellow, só que misturada com mais alguma coisa.”

Pesado, assustador e, ao mesmo tempo, atraente. Era como se uma quantidade exuberante de desejos, mundanos a extraordinários, tivessem se acumulado naquele local e assumido uma forma física. Seria essa a natureza daquele cristal? Uma condensação de desejos? (Poético, mas apenas isso.)

Ofegante, ele analisou o ambiente uma segunda vez. Não havia muito o que fazer, muito menos olhar, então qual a razão para um movimento tão instintivo de seu corpo? Ele logo entendeu.

Ainda que com dificuldade, uma névoa misteriosa pairava constantemente pela caverna inteira. Dançava parecendo ter vida própria, numa harmonia caótica digna de uma orquestra eletrizante e memorável. Podia-se sentir na pele que aquele lugar era milenar, tendo sido uma vez o cenário de um embate histórico esquecido (talvez perdido) pela supremacia do tempo.

Se ele tivesse focado mais um pouco, teria sido capaz de enxergar duas silhuetas extremamente distintas, tão opostas que chegaria a rir. Uma pena que não o fez.

“Certo, vamos resolver isso rápido”, pensou juntamente a Yellow, que não parava de suspirar em tédio.

Ao se aproximar de um cristal grande mais afundo na caverna, pairou a mão direita sobre esse. Tinha seu membro atraído como um imã, incapaz de resistir por mais do que alguns segundos antes de entrar em contato com a superfície vítrea.

BZ-TSS! A eletricidade cortou o espaço entre o braço e o cristal num piscar de olhos. Fora simplesmente espontâneo, sem a necessidade de um Querer do detetive para que o Fator B se ativasse.

Sua mente fora sobrepujada por uma onda esbranquiçada, cuja luz superou e muito a dos cristais, levando então seu subconsciente para uma um lugar distante.

                                                                                                    

Era gélido e sem cor, como um filme antigo. Uma atmosfera isenta de razões e emoções, sem motivo para existir em qualquer tempo pensável. Apenas triste, um cenário que — talvez — fosse capaz de ter local numa mente conturbada e/ou atormentada por demônios.

Falando nele, sua presença parecia ser indispensável. A silhueta negra e sorridente fez uma breve aparição no ambiente e, com um balançar negativo do indicador, expulsou o intruso do cenário.

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O ambiente ganhou um pouco mais de cor, mas esta não permanecia somente nele, era irradiada a partir de uma nova silhueta humana, sendo esta inteiramente composta por um líquido da mesmo cor dos cristais.

A sombra brilhosa analisava o próprio corpo com curiosidade, e se tivesse um rosto, provavelmente teria um largo sorriso alegre. Com aquele poder, ela seria capaz de estar acima de tudo! Mas… qual seria o custo disso?

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E por fim, uma possível resposta. Hospital? O ambiente remetia muito para isso, ao mesmo tempo que se deslocava para algo mais laboratorial.

Independente disso, os cabos conectados ao seu corpo executavam o que parecia ser um processo de substituição no corpo. Entretanto, sensação boa aquilo não transmitia em nenhuma forma. Esvaindo-se aos poucos, a luz se dissipou até que o mundo fosse completamente imbuído nas trevas.

Um contrato é tudo que precisam…

                                                                                                    

A voz de Yellow teve um efeito contrário ao de costume, tirou-lhe de um transe importante! Por que logo agora!?? Victor tratou de perguntar assim que se viu de volta à realidade.

Acha mesmo que você é o único que me conhece? —

Não havia necessidade de resposta, ela era óbvia, afinal. Ainda assim, o detetive não pôde evitar de se sentir traído.

“Toda essa visão… Parece que existe alguma linha do tempo!”

Ele relembrou com cuidado, temendo que algum detalhe caísse no esquecimento. Esta era uma palavra bem constante em sua vida, aliás. Quantas coisas será que já não havia esquecido? Podia jurar que o caso estaria resolvido há tempos se não fosse por essas perdas de memória.

Para sua sorte, essa ocasião fora diferente. Talvez por uma ajuda de Yellow, mas as lembranças estavam claras o suficiente para desencadear coisas que Victor sequer imaginava ter conhecimento. Foi como se um cadeado de uma gaveta cuja existência sequer conhecia tivesse sido destravado.

Fora rápido para identificar a origem dessas memórias. “FESOL? Por que eu tô me lembrando disso agora!?”

Mais e mais coisas passavam diante de seus olhos num turbilhão infinito, e em meio a este, a voz de Yellow veio de seu lado esquerdo.

Além de ganhar o Fator B, você foi capaz de evoluí-lo — disse num tom genuinamente impressionado. — Parabéns, nem me lembro da última vez que vi isso acontecer. — 

Claro, houve uma dúvida por parte de Victor acerca da real veracidade daquela parabenização, mas a quantidade de informações que invadia sua mente era tanta que aquele pensamento foi arremessado para longe quando menos percebeu.

Viu desde sua chegada até a saída da FESOL ao lado de Hector. Aquela jornada maluca na qual ajudara o colega, todos aqueles anos onde ajudou-o e conviveu com sua pessoa. Como havia se esquecido? Um peso recaiu sobre seu peito; superando aquele causado pela atmosfera do ambiente.

Fora, no entanto, rapidamente superado! Aquele baque das memórias o desorientou, mas não o suficiente para travar os saltos que dava em sua investigação.

“Agora eu me lembro!! A fonte da EPC são essas coisas!”

Com isso dito, as coisas começariam a se encaixar. Relembrado o fato da FESOL utilizar EPC (Energia Potencializadora Condensada) como maneira de estimular o possível nascimento de Fator B numa pessoa, o que a impediria de criar itens, ou melhor dizendo, equipamentos com isso?

“Amuleto! Deve ter sido isso que o Hector quis dizer naquela hora! O inimigo deve usar um item feito de EPC para conseguir simular um Fator B! Além disso…”

Se não houver a matéria-prima, não haverá manufaturados! E se alguém sabia como destruir alguma coisa (no bom sentido), esse alguém era Hector.

Por mais que o cartola não fosse portador de nenhuma habilidade especial, poderia usar sua mente caótica como fonte de ideias para a demolição daquela caverna.

Yellow não estaria mais disposto a ajudar. O acordo era claro, um total de três ajudas excluindo os extras. A fuga do apartamento, a sombra e a garantia de segurança, tudo culminou para que este momento pudesse acontecer.

Victor logo puxou seu celular do bolso e procurou pelo contato de Hector. Ao encontrar, levou o dedo até o botão de ligação e…

Seu dado afastou-se da tela.

!!? Ele forçou o membro o máximo que podia, e mesmo assim ele ia na direção contrária que desejava. Rapidamente tentou com a outra mão, no entanto, o braço inteiro ignorava suas ordens.

— Mas que porra…?! Ye-Yellow! O que tá acontecendo??

Nada, sequer uma risadinha veio do demônio. Victor tentou entender que tipo de controle aquela Entidade assumia sobre seu corpo, mas tudo que conseguiu foi observar o corpo começar a tremer e, por fim, uma notável protuberância crescer em seu peito ao ecoar de uma voz.

Aqui deve ser um bom local.

Uma porção filamentar de carne estendeu-se de seu peito para quase um metro à frente. Não notou sinais de perfuração, muito menos de alguém atrás de si. Aquilo estava saindo literalmente de dentro de seu corpo!!

O detetive berrou, incapaz até de cair de joelhos, se mantendo em pé por uma força desconhecida que logo revelou mais partes.

Aquele filamento tomou a forma de um braço, e dele veio o mais esperado, um corpo. Sendo do seu tamanho, cada membro saía de uma parte equivalente. Outro braço brotou no membro esquerdo, um par de pernas se fez presente instantes depois e, não menos importante, seu rosto tornou-se em dois.

Momentaneamente, era uma silhueta moldada apenas por carne deformada, mas que tomou forma verdadeiro e observável ao completar a separação dolorosa para Victor.

Victor finalmente caiu, vomitando apenas um pouco de líquido antes de erguer a cabeça com dificuldade para, rasteiramente, encarar a face do elemento.

— Diacho, isso foi mais demorado do que eu pensei — suspirou, levando o olhar elevado até o corpo aos seus pés.

Um homem trajado em roupa pouco formal. Botina, calça escura e uma jaqueta vermelha por cima do que parecia ser uma regata branca. Em seu pescoço, o item denominado por Hector como um Amuleto se encontrava. Um losango dourado que brilhava intensamente, num ritmo que parecia acompanhar e, ao mesmo tempo, desafiar os cristais ao redor.

Ele tinha uma pele negra e isenta de imperfeições. A idade alta aparentada era apenas uma ilusão do cabelo de um exótico tom prateado, este que imitava falhamente um cinza escuro que disputava o domínio da íris contra a escuridão presente em seu olhar.

— Qu-quem é você!?? — Fora mais uma súplica do que uma pergunta. Por algum motivo, seu corpo aceitou um destino que sequer havia sido decidido ainda.

— Oxi! Isso não importa mais pra você, apenas fique calado e torne as coisas menos dolorosas de se ver, muleque.

Com um rápido olhar para seu braço estendido, Victor descobriu a razão de sua atual impotência.

Roxo, um tom púrpuro que trazia consigo um cheiro pútrido espalhava-se pelo membro em sua direção, um pavio de bomba extremamente curto que não demoraria mais que alguns segundos para gerar uma explosão.

Yellow!! Ele clamou por ajuda em sua mente, ignorado uma segunda vez. Não existia sequer resquício do demônio em seu corpo, era apenas ele e aquele homem na caverna, numa floresta completamente isolada da sociedade.

— Maldito…!! — Espasmos de eletricidade dominaram seu corpo, sem efeito aparente na proliferação da mancha. — O que você pretende fazendo isso??

Romanov arqueou uma sobrancelha. Isso não era óbvio? O caminho para qual o corpo do detetive caminhava deveria ter deixado isso mais do que óbvio. Mesmo assim, o Agente se sentiu na obrigação de dar pelo menos essa informação.

— Acho que é isso que dá meter o nariz onde não deve. É um método bem radical, eu sei. Vocês de Utopia devem ser acostumados a fazer isso, não é?

A pergunta teve uma textura tão ácida quanto o arder real que dominava o braço de Victor. A mancha púrpura já dominava metade de seu tronco e encaminhava-se em direção às pernas. Por sorte ou azar, a proliferação pareceu cessar na metade de seu pescoço.

O cabelo prateado denunciava a origem estrangeira, mas isso apenas deixava a dúvida acerca do tom da pergunta ainda maior. Até onde se sabia, Utopia não tinha problemas sociais com nação alguma, muito pelo contrário, chegava a ser considerada a mais receptiva de Solum, perdendo apenas para Santa Cruz.

— Você… Arfa não vai sair… Arfa… ileso!!

Um sorriso brotou no rosto do sujeito, singelo e levemente enraivecido. O quanto de força ele havia feito para manter aquela fachada viva?

— Se sair machucado é o preço, então acho que minha dívida tá mais que quitada. — Ele deu as costas, mirando a saída da caverna. — Eu gostaria que as coisas tivessem sido diferentes, mas não tive muitas escolhas. Então, tudo que posso te dizer aqui é…

Eu sinto muito.

O tom acolhedor das palavras envolveu o coração de Victor como um travesseiro de agulhas. O pânico do momento não lhe permitiu qualquer interpretação naquelas palavras, impossibilitando também uma resposta equivalente.

Seu silêncio perdurou até que Romanov desaparecesse no lado de fora da caverna, ainda com direito a uma última encarada na direção do detetive, para só então desaparecer na escuridão criada pelas árvores.

“Bosta…! Isso não tá acontecendo, né?!”

A falta de dor tirou-lhe o sendo de realidade. Pôde vividamente sentir o cérebro desligar metade de suas funções e um curto desmaio lhe atacar, seguido de outro, e mais outro, e mais outro…

O ciclo repetiu-se incontáveis vezes. Retorno no tempo? A teoria só fora descartada por ter sido capaz de ver que o braço direito começara a derreter, uma ação que não retrocedeu, desacelerou e muito menos cessou a cada desmaio.

Era uma sensação diferente. Os olhos fechavam e uma mão lhe puxava para o infinito das trevas, mas antes que fosse completamente envolvido, um outro membro trazia-lhe de volta bruscamente para o corpo. Isso acontecia em menos de um segundo.

Novamente, invocou Yellow com sua mente. E então, pôde ver uma sombra projetar-se à frente. E sendo incapaz de vê-la, apenas pode se questionar internamente.

O que isso significa!?

Seus olhos não alcançavam os do demônio, e mesmo assim podia jurar por tudo que havia um largo sorriso naquele rosto enegrecido. Sua roupa viva dançava alegremente, entretida pela iluminação e poder emanado dos cristais, tentando alcançá-los a todo custo.

Então, respondendo a questão de Victor, Yellow iniciou em seu tom de voz falsamente humanizado.

— Seu pedido foi bem simples: Garantir que chegasse até aqui em segurança. Porém, nada foi dito sobre depois que você chegasse.

Uma bigorna esmagou a cabeça do detetive. Traiçoeiro! Aquela criatura era pior do que poderia sequer imaginar até então. Todo aquele falatório infantil fora intencional? Queria e não era capaz de acreditar.

— Você foi bem burro, uma pena, realmente. Bem, não é como se eu estivesse surpreso ou algo assim, mas te ver nesse estado realmente é deprimente pra mim.

E agora… “Quer fazer outro Pacto?” A proposta poderia vir como água caindo de uma cachoeira, um ato tão corriqueiro para aquela existência que saía de sua boca como se fosse um Bom Dia.

Contudo, a única atitude tomada por Yellow foi um riso. Travada e sádica, o riso que deveria soar cômico foi direcionado para aquele semi-cadáver parcialmente derretido.

Braços, pernas, tronco, até mesmo suas roupas e os equipamentos que carregava (celular incluso), todos derreteram lentamente. O crepitar de seus ossos fora a única referência que teve para saber que o tempo ainda corria.

Filho… da puta!

Ele finalmente se lembrou de com quem havia se metido. Não era uma entidade qualquer, não um simples “Deus do Abismo” ou Encarnação do Poder.

Uma figura capaz de ocultar suas intenções melhor do que ninguém, parecer quem quiser; ser quem quiser. Aquele cuja alma fora recusada pelos vivos e pelos mortos, e que, com uma força de origem desconhecida, ainda ultrapassou a encarnação da supremacia.

“Então isso… é um Demônio…?”

Em todo aquele tempo, quem, afinal, estava sendo usado como ferramenta? A resposta veio naquele momento, uma pena que nunca alcançaria o próximo azarado a se envolver com aquela existência.

Não fora apenas simbólico dessa vez. Algo que não conseguiu ver saiu de dentro do chão aparentemente inexpugnável da caverna, enraizando-se nos restos do corpo do detetive. Puxaram-no para baixo, para dentro daquele poço de agonia moldado por gritos e murmúrios ressentidos.

Agora, uma nova voz se unia àquela multidão retorcida, lamentos direcionados unicamente para o coração já inexistente da figura diante deles.

 Agora, eu te mostrarei

como é a “vida” no profundo e infinito

Abismo!!



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