Volume 1

Capítulo 28: CRUCIFICADO

Kai girou no próprio eixo e, num só movimento, matou quase dez goblins. 

Logo embainhou sua espada. O tempo de uso ainda não tinha mudado nada. Ela consumia muita energia. Era faminta.

Fioled se encostou nas costas dele, ofegante.

– Tem muitos deles, Kai, que faremos?

– Não sei...

Eles se impulsionaram um no outro e tornaram a atacar os goblins.

Kai agarrou um pelo pescoço com as mãos nuas, chi fluindo por ela. A criatura guinchou e um fedor saiu de sua boca.

Ele apertou a mão e ouviu o pescoço do monstro se espatifar como palito de dentes.

CRACK!

O rapaz estava surpreso com o nível de poder daquelas criaturas. Tinha quase certeza que se não tivesse chi, ainda seria muito mais forte que eles.

Contudo, era de conhecimento geral que goblins nunca atacavam ninguém sozinhos, pois sua tática estava em cansar o adversário, mesmo que tivessem baixas consideráveis.

E isso se provou correto, uma vez que mais e mais goblins apareciam à medida que cerca de 30 a 60 eram mortos.

– Não há lógica nisso, Stone – gritou Ysgarlad, do outro extremo. Ele protegia os mudanti ainda acorrentados, enquanto os já soltos tentava libertar o restante. – Temos de escapar.

Kai concordou. Não havia mais tempo, de fato.

No mesmo instante, Kai ouviu o gritou de Fioled.

Quando se virou, viu que ela estava cercada por vários goblins, eram quase 100. Eles não seriam um problema, não fosse por ela estar desesperada.

Naquele momento, ele percebeu que ela não passava de uma garota realmente assustada.

Então, sem pensar duas vezes, ele correu até lá, desembainhando a espada novamente.

Chegou em segundos. Varreu a extremidade arrancado braços, pernas, cabeças.

Sangue roxo jorrou por toda a parede.

Quando se livrou do grupo, olhou para baixo.

Fioled estava sentada no chão arfando bastante. Uma das criaturas a havia esfaqueado em sua perna sem que ela percebesse.

– Calma, estou aqui. – Ele disse, tentando mantê-la calma.

– Droga! – Ela gritou. – O sujeitinho foi bem astuto.

Ele se aproximou e checou o ferimento. Sua panturrilha estava perfurada com pequenos buracos, em decorrência de vários golpes.

Kai pegou um pano de seu bolso interno e passou-o por sobre a superfície da ferida, depois amarrou com firmeza. Em seguida, ajudou a garota se levantar.

Fioled esqueceu a dor por um segundo, pois ficou encarando Kai. Mas era realmente difícil ignorar o incomodo.

Ele tornou a caminhar com ela até Ysgarlad enquanto matava alguns goblins no caminho.

Aos poucos as criaturas foram se afastando deles.

Logo, mais nenhum goblin atacava Kai ou o grupo de Ysgarlad, de modo que puderam soltar os escravos restantes.

– Que aconteceu? – Indagou Ysgarlad, cansado.

– Fui burra – escapou Fioled, pressurosa.

– Não se martirize. – Kai disse, colocando-a no chão. – Mais importante: esses goblins estão agindo de maneira estranha.

– Concordo. – Respondeu o mudanti. – Precisamos aproveitar esse momento para escapar. É o primeiro descanso que temos em horas.

– Não sei... é inviável sair pelo mesmo lugar que viemos...

O mudanti concordou. Soltou um respiro ofegante. Estava tão sujo e suado quanto os outros.

Não era pra menos, ele se mostrou valente ao enfrentar uma horda atrás da outra enquanto protegia seu povo.

– Tem algum plano? – Indagou.

– Estou pensando, mas explodir esse lugar com a gente aqui dentro não é uma boa ideia.

Do nada, Fioled soltou um grito agudo e alto.

Quando Kai a olhou, ela estava pálida, como se tivesse prestes a vomitar.

Praguejando, ele se ajoelhou para checar sua perna. Quase deixou escapar um grito sufocado quando puxou levemente o pano.

Há pouco mais de cinco minutos a ferida estava apenas aberta e sangrando.

Agora, estava inchada e num tom verde doentio. Estava inflamado.

– Droga... eu deveria ter previsto isso...

– Previsto o que? – Indagou Ysgarlad, se agachando e encarando a ferida. Sua reação foi quase a mesma. Ele se ergueu depressa e deu largos passos para trás.  – Droga! Está envenenada!

Kai observou o gesto com a testa enrugada.

– Mas isso foi há o que? – Indagou o mudanti. – Alguns minutos?

– Sim. Goblins são conhecidos por seu perfil ardiloso. Isso é completamente comum.

– Que faremos? Não temos tempo para chegar na instalação.

– Concordo – Kai se ergueu e andou até os mudanti.

Alguns ficaram surpresos com a aparência do rapaz, pra variar.

Ele começou a falar sem preâmbulos.

– Me chamo Kai e fui enviado por Daisysia para encontrar vocês... – houve certo alarde e espantos de felicidade. Kai apaziguou. – No entanto, minha amiga, Fioled, foi ferida com veneno de goblin, eu gostaria de saber se algum de vocês é curandeiro.

Não houve resposta. Tudo o que havia era medo e espanto. Um espanto diferente, isto é.

Kai deveria estar acostumado com isso.

Ele poderia estar disposto a ajudar, até salvar os outros, mas não poderia esperar o mesmo daqueles cujo acabara de livrar a bunda.

Sempre estivera disposto a arriscar o pescoço pelos outros, mas, quando chegava sua vez, eram poucos os que faziam o mesmo.

Desta vez não foi diferente.

E o pior é que nem era pra ele. Se tratava de uma vitanti... da mesma espécie que eles.

O silêncio reinou por longos minutos.

Então alguém o quebrou.

– Vamos lá, pessoal, a garota vai morrer. Preciso de alguém que saiba lidar com veneno e contrafeitiços. Vamos, o tempo é crucial. – Esbravejou Ysgarlad.

Imediatamente os mudanti começaram a falar.

– É Ysgarlad que está pedindo...

– Isso mesmo, ele é nosso protetor...

– Talvez devêssemos...

Essas foram algumas das exclamações.

Passados alguns segundos, um jovem deu um passo para a frente. Estava com a mão levantada e tremendo bastante.

– Ótimo! – Exclamou Ysgarlad.

O jovem caminhou até Fioled e se agachou. Assim que bateu o olho na ferida, ele exclamou assustado.

Logo a colocou de lado e, no mesmo instante, ela vomitou uma porção de coisas.

– Esse é um veneno de uma cobra muito específica da Floresta de Bulogg. – Disse ele. – É muito usado para controle de pragas e... sabe, quando diluído, é um bom entorpecente.

O jovem mudanti corou por alguns segundos.

– Consegue dar um jeito? – Kai indagou, ignorando o comentário.

– Nã-não há muito o que eu possa fazer..., mas, se essas criaturas andam por aí com um veneno tão letal, devem ter o antídoto.

– Letal? – Kai se aperreou. – Ela vai morrer?

– Vai... quer dizer, não agora, mas, em algumas brechas, ficará impossível de respirar e todos os seus órgãos entrarão em combustão espontânea. Seus olhos irão sangrar e...

– E o que? – Kai gritou. Ele se aproximou do jovem mudanti e o agarrou pelos ombros, o sacudindo. – Vamos lá, garoto, me diga o que vai acontecer.

Entrementes, Ysgarlad se aproximou e tocou no ombro de Kai, a fim de acalmá-lo.

– Stone, ele não tem culpa...

– Me solte! – Kai gritou. Ele olhou para o garoto de novo. – Você falou de um antídoto... quanto tempo temos?

– E-ela tem em torno de quatro a cinco brechas...

– Brechas? Fale a minha língua.

– E-em outras palavras, é quase 40 minutos...

Kai olhou para trás, furioso.

Os goblins se aproximavam de novo, sorridentes.

Ele imediatamente sacou sua arma e partiu para cima deles.

Ao diminuir o espaço, agarrou um goblin pela garganta e ergueu na altura dos olhos.

– Me dê o antídoto.

A criatura sorriu e exalou um fedor tremendo. Kai quebrou seu pescoço.

Ele partiu para outro e a resposta foi a mesma.

– O ANTÍDOTO!

Nada.

Sempre que pegava um goblin perguntava pela mesma coisa: o antídoto.

Já estavam ficando sem tempo e Kai ficava cada vez mais furioso.

Parecia um demônio, gritando, com o rosto cheio de sangue e matando os goblins sempre que riam dele.

Em dado momento as criaturas só se afastavam, sem mais aqueles sorrisos sarcásticos... agora tinham medo e terror estampados nas suas caras.

Kai já nem perguntava mais por antídoto, só matava e matava, os olhos vermelhos e o rosto enlameado de sangue e suor.

– Não há mais tempo, Stone. – Disse Ysgarlad, finalmente.

Mas ele não deu a mínima, saiu matando todos e procurando pelos corpos um frasco ou qualquer coisa que pudesse salvar a garota.

Ele não podia perde-la. Não agora.

Como olharia para Cineáltas? Como voltaria para Orquídea com o corpo inativo da filha de um senhorio?

Kai deu um último grito, desesperado.

Foi de doer os tímpanos pois esse urro estava carregado de chi e poder.

E os goblins se amedrontaram, pois a aura era imensa.

De que tinha valido todo treinamento se não podia nem salvar uma amiga? Ali ele se sentiu impotente. De mãos atadas.

Entrementes, ele sentiu a presença de um grupo se aproximando.

Quando se virou, viu cerca de seis homens atravessando o vão pelo qual entraram.

Kai notou que a energia em volta destes era poderosa. Não era como quando sentia mana, era realmente a vitalidade das pessoas que ele sentia.

Os goblins restantes se curvaram, amedrontados; mas quando esses homens passavam, uma face de extremo nojo assumia a carranca desses seres fementidos.

Ysgarlad puxou seu arco e armou uma flecha, se pondo a frente dos indefesos.

Entrementes, os homens pararam há alguns metros de distância. Todos usavam vestes negras com capas e capuz.

Tinham uma postura rígida e usavam uma armadura laqueada negra.

Logo atrás deles estava Byzga e um outro goblin que Kai chutou ser Crocog. Ambos estavam curvados como se na presença de um deus.

O homem mais adiantado deu um passo à frente. Retirou o capuz e revelou o rosto sorridente.

Kai teve a sensação de que o conhecia de algum lugar.

Tinha cabelos cor de aveia e olhos verdes. Seus dentes eram brancos como neve e o rosto quadrado.

– Kai Stone. – Disse, numa voz grossa e grave. Havia certo tom de risada nela. – Confesso que duvidei de Byzga aqui quando ele me disse que você estava por aqui... Não sabe o prazer que sentimos ao estar na sua presença. Devo dizer que esperamos bastante tempo...

Ele abriu os braços e olhou ao redor, orgulhoso.

– Mas não foi em vão, afinal... – ele apontou para Kai e sorriu. – Você está aqui. Temos uma proposta, Kai Stone. Fomos enviados pelo Xamã.  

Kai ficou surpreso. Isso era algo que ele não esperava descobrir tão cedo. O sujeito viu espanto na face de Kai.

– Oh... achei que você já soubesse disso. Tive a esperança de que pudesse nos poupar tempo...

Do que raios ele estava falando? Um xamã? Só que tempo ele não tinha.
Kai suspirou e olhou preocupado para Fioled, que suspirava e suava frio.

O homem interceptou esse olhar e soltou uma exclamação. Ele riu.

– É verdade, sua amiga vitanti... sinto muito pelo modo como esses demônios agiram, mas você sabe, são muito... ardilosos.

Ele meteu a mão dentro das vestes e, quando puxou, tinha algo escondido nela.

– Mas acaba que isso nos beneficia, sabe.

– E beneficia como, exatamente?

– Bom... – ele sorriu e abriu a mão. Nela, havia um frasco transparente com líquido dourado dentro. – Temos a chave para que essa proposta não seja recusada. O remédio dos deuses, aquele que cura todo e qualquer veneno e doença mortal... Icor!

Kai deu um passo, mas o homem fechou a mão e levou-a até o peito. Ele abriu um sorriso e balançou o dedo indicador da outra mão.

– Na-na-ni-na-não! Primeiro, tratemos de nossa proposta.

– Stone, podemos lutar contra eles, é apenas questão de... – Ysgarlad começou a falar, mas o rapaz pediu que parasse.

– Que proposta? – Ele perguntou.

– Bom, é simples. Acho que você sai ganhando, até. Damos o antídoto e uma chance de escapar para seu... grupinho. E, em troca, você vem conosco.

– Não! – A voz de Fioled soou por toda a caverna. Apesar de muito mal, ela conseguiu reunir forças. – Kai, não faça isso, eu tenho tempo, podemos...

Ela não conseguiu terminar a frase. Tossira tanto que vomitou um punhado de sangue.

O homem gargalhou. Depois de um bom tempo rindo, ele enxugou os olhos e olhou para Kai.

– Desculpa, pensei que fosse uma piada. Mas, você sabe que ela não tem tempo, não é? Morrerá logo, logo. A prova está aí, já começou a cuspir sangue.

Kai abaixou a cabeça. Na verdade, não era muito difícil de responder. Se essa fosse a sua sina nesta guerra, ele a cumpriria. Se tivesse uma chance dos outros escaparem, de devolver a gratidão de Mael, faria.

– Tic-tac-tic-tac! O tempo corre, Kai Stone.

– Tudo bem. – Respondeu.

– Stone... – Ysgarlad deu um passo. – Espero que saiba o que está fazendo.

– Eu sei. – Ele encontrou os olhos do mudanti por um tempo e eles se entenderam. O outro baixou o arco.

Neste interim, o sujeito entregou o frasco para um de seus cupinchas. Este caminhou até o grupo mudanti.

Alguns se encolheram e Ysgarlad se pôs na frente.

– Ysgarlad... – disse Kai.

Relutante, o mudanti deu um passo para o lado. O sujeito puxou uma seringa de dentro das vestes e meteu a agulha na tampa do frasco.

Depois de puxar o líquido, ele puxou a perna de Fioled, que urrou de dor.

Então apertou a ferida e pus junto de alguns excrementos saíram. Então enfiou a agulha e o líquido foi inserido.

Depois se ergueu, guardou o frasco e voltou para o lugar ao lado dos outros.

Então Fioled começou a gritar. Da sua pele, uma fumaça azul começou a sair, com um cheiro de madeira mofada.

Os gritos da vitanti eram aterrorizantes.

– Que pensa que está fazendo? – Ysgarlad ergueu o arco e apontou para o homem.

– Ysgarlad...

– Cale a boca, qésserin. Não sei como pude ouvir você. O deixei liderar essa missão, e agora você tenta nos matar.

– Ysgarlad...

– Somos bichos, é? Não me surpreenderia se você estivesse com esses aí...

– Ysgarlad, esse é o efeito... assim que a fumaça parar, ela estará bem.

– Mentira! Você está de conluio com esses aí... Daisysia foi tão ingênua de acreditar em você... eu fui ingênuo.

– Ysgarlad, se controle.

O outro sujeito estalou a língua. Deu uma risadinha e olhou para Kai.

– As coisas são realmente engraçadas. Nós damos a mão e eles nem agradecem. Escute seu colega, mudanti ingrato e imundo.

Entrementes, a fumaça cessou e o suor começou a tomar seu corpo. A cor de Fioled foi voltando ao normal, ela parou de ofegar.

Em compensação, apagou por inteiro.

Alguém começou a bater palmas freneticamente. Kai olhou na direção do líder do grupo.

– Bravo! Bravo, esplêndido, glamuroso. Isso sim é teatro, cinema. – Ele ergueu os dois braços para cima e sorriu. – Bom, agora penso que essa é sua deixa, arregalado.

– É Ysgarlad. – Corrigiu o mudanti.

– É, tanto faz. Esse é o momento de você e sua trupe de selvagens se mandar. A não ser que queiram realmente ser feitos de escravos. Isso eu pagaria pra ver...

O mudanti andou até Fioled e tocou em seu pescoço. O pulso estava estabilizado. Ele olhou para o jovem curandeiro.

– Ela ficará bem...

Envergonhado, Ysgarlad olhou para Kai. Mas tudo o que recebeu foi um olhar gentil e grato. Kai sorria com os olhos.

Isso fez crescer o sentimento de vergonha no mudanti. Mas ele não disse nada. Pegou a garota nos braços e liderou a caminhada do grupo em direção da saída.

Antes de passarem pelo vão, ele parou e olhou para trás. Ia dizer algo, mas Kai gesticulou algo: Vá!

Uma dor no seu peito se criou e um remorso igualmente profundo se formou.

Assim que os mudanti passaram pelo arco, Kai sacou sua espada. Ele respirou fundo.

– Ahhhh! – Exclamou o sujeito. – Eu devia saber que você faria isso. Tãããão previsível. Fomos alertados sobre a sua bravata, Kai Stone. De fato, ela existe. Mas, deixe-me fazer um alerta: você não terá chance alguma aqui. Estamos com quantidade e força. Desista.

Kai respirou fundo. Tenho ao menos que tentar, me despedir de Fioled corretamente... pensou.

Sem uma resposta, o sujeito cruzou os braços.

– Nossa como você é sem graça.

O primeiro cupincha ergueu as mãos para cima e desceu-as com uma velocidade tremenda. As estalactites no teto começaram a tremer e se soltaram, indo em direção de Kai.

Quando elas estavam prestes a atingir, ele pulou para o lado. Então um portal se abriu no chão e outro do lado de onde Kai pousaria. A estalactites passaram pelo portal do chão e saíram no outro.

Incapaz de reagir a tempo para um novo desvio, Kai segurou o cabo da espada com as duas mãos e se preparou para cortá-las.

Antes que pudesse fazer isso, as estalactites se desfizeram e tomaram a forma de linhas finas como um chicote.

O mago detentor desse feitiço apertou as mãos como se ele estivesse dando nós em cordas enormes.

A linha envolveu Kai e o amarrou tanto que o fez gritar. Sua pele queimou.

Ele deixou o chi fluir tanto por seus poros que isso quebrou o feitiço.

As linhas se formaram em pó que ficou sobrevoando o lugar por um bom tempo.

Então outro mago entrou na batalha e tocou a ponta dos dedos como se segurasse uma bola entre as mãos. Da fumaça, um novo portal se abriu e quatro criaturas saíram.

Mediam cerca de 1,5 de diâmetro. Eram parecidos com morcegos enormes, de asas negras e peludas.

Kai pulou para trás e se preparou para cortar os morcegos gigantes, mas seu tempo usando a espada já estava acabando, então ele concentrou-se para acabar com todos de uma vez só.

Chi fluiu pela lâmina e ele esperou pelo momento em que ficaram todas no mesmo ângulo; então matou-as com um corte limpo e seco.

Assim que as criaturas foram rasgadas, seu sangue e sua pele se tornaram água.

Uma pequena chuva caiu, com fumaça subindo ao toque no solo.

As últimas gotas se transformaram em lâminas de gelo e suas pontas começaram a girar compulsivamente.

As lâminas de gelo ficaram vermelhas com a alta velocidade e atrito entre si. Elas caíram.  

Kai guardou a espada, muito ofegante. Deu dois passos rápidos e conseguiu fugir da chuva de lâminas, que destruíram o solo.

Ele caiu no chão, respirando fundo. Da fumaça gerada pelo toque da água e do solo, um enorme objeto circular começou a tomar forma.

Quando a fumaça se foi, havia um imenso espelho d’água. Media quase 10 metros de comprimento.

De sua superfície, várias colunas horizontais começaram a se formar, como pregos gigantes.

Kai forçou os olhos e pôde jurar que viu enormes criaturas nadando dentro do espelho d’água.

Até que notou que as colunas na verdade eram enguias, pois bocas e dentes enormes começavam a se formar. 

Houve um trovejar e, em seguida, o teto foi destruído quando relâmpagos amarelos começaram a eletrocutar as enguias e o espelho. Esses raios correram por toda a superfície das enguias e uma chuva torrencial caiu.

Kai sabia que tinha de fazer algo. Então se imaginou criando algo diferente de tudo que fez até ali.

Pensou no chi mais como uma energia do que uma aura, que não só envolvia como também gerava dano. Ele fechou seus olhos e concentrou todo chi fluindo nos punhos, e teve um insight.

Na verdade, ele já vinha pensando nisso há um tempo. Mas consumia muito chi, seria tudo ou nada.

Ao invés de consumir chi do próprio corpo e do ar ao redor, ele pegaria um pouco do próprio planeta.

E veio em sua mente a lembrança de um sonho, cujo ele tentava tocar incessantemente as estrelas, mas não conseguia.

Mas agora ele tocou apenas a fagulha. Ele conseguiu meditar durante uma luta, foi por um milésimo de segundos, quando o outro ataque ainda estava sendo carregado.

Então seus punhos começaram a fumegar e, quando ele abriu os olhos, uma luz brilhante e quente permeava seus braços. E ele soube que tinha de soltar esse poder logo ou seus braços explodiriam.

Isso casou com o exato momento em que o ataque de enguias elétricas foi lançado.

Ele se jogou para trás e apontou os punhos para o feitiço inimigo. E disparou.

Uma onda de choque de energia foi lançado e parecia pulverizar o próprio ar.

Era espesso e formidável, poderoso. Quando tocou o feitiço, a água evaporou em instantes e o espelho d’água se esvaiu. O disparo continuou em direção dos dois magos atordoados, quando o líder dos inimigos entrou na batalha.

Ele sorria compulsivamente.

– Que garoto extraordinário, lindo, perfeito, magnífico.

E ergueu as mãos, daí um enorme portal se abriu na frente dos dois magos e começou a ir em direção do disparo, enquanto que o líder controlava o feitiço movendo o braço.

O disparo entrou pelo portal que seguiu em frente até engolir Kai também.

Nesse momento, o ataque perdeu as forças, e ele foi levado a vários lugares, viajando entre diversos pontos do mundo, sempre caindo.

Ele podia jurar que viu Algüros do alto.

Viu um enorme deserto amarelo; viu monstros atacando o que pareciam ser pessoas num imenso deserto de gelo. Viu uma batalha acontecendo num pequeno vilarejo.

Até que a viagem entre portais parou, e ele se espatifou no chão. No mesmo momento, algemas foram postas em seus punhos, pernas e pescoço.

Seus punhos faiscaram com chi, mas isso queimou sua pele.

– Ã-ã! Se usar magia, vai queimar a pele até a morte. Mas quem diria que você seria capaz de usar disparos fótons, hein?! Uma caixinha de surpresas, Kai Stone.

O sujeito fechou o punho e nocauteou o rapaz bem no meio do rosto.



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