Volume 1

Capítulo 2: Sim, eu sou a Princesa Demônio!

Ainda que eu estivesse próxima da margem do rio, atrás de mim, mais adentro da floresta, apareciam duas criaturas. Até aquele momento elas tentavam se manter escondidas, porém, não tinham conhecimento sobre minha incrível e roubada habilidade.

Não sei dizer se só agora elas se aproximaram ou se já estavam me encarando há algum tempo. Pareciam discutir algo entre si e depois de um momento, resolveram sair de onde estavam escondidas.

As duas criaturas pareciam humanas, apesar da aparência um tanto rude. Nariz e orelhas longas, ausência de cabelos e um aspecto meio rústico. Ah, e não podemos nos esquecer da pele esverdeada. Nem mesmo eu, que não era tão aficionado por jogos eletrônicos, conseguiria confundir o que são: os famosos goblins de mundo de fantasia.

Quando se aproximaram um pouco, o sistema avisou de algo novo: [Habilidade Analisar (1) Ativada].

O que é isso agora?

Janelas apareceram diante das criaturas, um pouco ao lado e abaixo. Cada janela tentava seguir sua direção, mas sem que saísse do campo de visão. Mesmo que eu tentasse me movimentar, elas pareciam rastrear esse movimento e corrigir sua posição.

Ver isso em um jogo, através da tela de um computador ou TV, é até normal, porém, tê-las no meu campo de visão é um tanto estranho e precisarei me acostumar com isso primeiro. Antes que eles continuassem eu fiz um sinal para que parassem e entenderam.

Não são tão burros quanto imaginei.

Agora que eles pararam de se movimentar, vejo que nestas janelas há alguns números. Se não estou me confundindo, isso seria seus Stats? Também está escrito alguma coisa, deixe-me ver: Ataque, Defesa, Magia, Resistência, Sorte e Velocidade. É, realmente isso parece muito um jogo de videogame.

Eles continuavam parados e me encarando. Suspirei e comecei a falar:

— Vocês vão ficar me encarando até quando? Espero que não estejam pensando que vão me pegar tão facilmente! — Entrei em posição de combate assim que terminei de falar.

Todos os anos praticando Judô devem servir para alguma coisa. Mesmo nesse corpo de criança, se comparado aos goblins, então estamos de igual para igual.

— Não. Não. Piedade de nós!

Esse primeiro, ele se chama Dogo. É incrível que o tal [Analisar] também seja capaz de mostrar seu nome.

O segundo se chama Nogo.

Os dois faziam questão de tentar me acalmar com gestos e súplicas.

— Dogo e Nogo não é inimigo! — disse Nogo.

— Se não são meus inimigos, por que me observavam à distância? — Questionei, ainda sem sair da posição de combate.

— Dogo, medo. Dogo, muito medo. — Apontou para mim. — Princesa Demônio!

Como é? Mesmo que eu já tenha percebido que meu corpo é praticamente de um demônio, o que é deste termo “princesa”? E pensar que estou conversando com eles enquanto os humanos simplesmente correm em disparada sem entender uma palavra.

— E decidiram se aproximar agora... Por quê? — indaguei outra vez.

— Princesa Demônio, muito medo. Impossível se aproximar — disse Dogo.

— Princesa Demônio, muito forte! Medo em Dogo e Nogo — comentou Nogo.

Espere, minha aura está desativada agora. Deve ser por isso que se aproximaram o suficiente para minha percepção tê-los pegado. Outro detalhe, estão falando japonês? Não vi nenhum aviso sobre a [Tradução Mágica] como antes.

Só foi questionar mentalmente que uma janela de aviso apareceu no meu campo de visão: [Dogo e Nogo estão utilizando Linguagem de Monstros]. Que conveniente, então seria japonês a linguagem dos monstros? E como estou falando com eles, é por também ser considerado um monstro?

Tanto faz, apesar de ainda estarem afastados alguns metros de distância, não parecem querer fugir ou me atacar.

— Eu, Princesa Demônio? — Apontei para mim mesmo e perguntei.

— Sim?! É? — Eles olhavam um para o outro enquanto mantinham aquelas expressões de dúvida.

Ainda não entendi muito bem essa história de Princesa Demônio, porém, talvez seja igual todas aquelas histórias de fantasia com heróis, rei demônio, e todas outras baboseiras. Será que conseguirei mais informações com eles?

Aí olhei para os dois “idiotas”, eles estavam literalmente babando e olhando para o nada. Além disso, um deles simplesmente – me ignorando – começou a limpar o nariz.

Mas que merda, eles são tão... Porcaria!

Suspirei novamente, talvez o líder deles seja mais inteligente, ou mesmo seja outro tipo de criatura. Se porventura eu conseguir conversar com ele, pode ser que consiga muito mais informações úteis.

— Eu quero que vocês me levem para seu líder — disse de maneira lenta. Espero que assim funcione.

— Não?! — negou Nogo.

— Como é? — perguntei.

A janela do Sistema veio com sua pergunta: [Você deseja utilizar um Teste Intimidar?][Sim][Não].

O que é isso? Novamente aquele teste onde meu corpo age de maneira automática. Pelo nome, Intimidação, parece ser algo como forçá-los a aceitar minha sugestão ou ordem. O que eu faço? Sim?

Ergui minha mão direita e cliquei no Sim.

Sistema: [Você jogou 1d20 e obteve 3+99, resultado: Sucesso].

Agora percebi o dado sendo lançado desde o início. Ele caiu no rodapé da janela enquanto mostrava o resultado 3. Creio que quanto mais próximo de 1, mais chances de falhar, porém, com estes +99 no resultado... meio que...

E antes que pudesse continuar raciocinando mentalmente, senti meu corpo se movimentar sozinho:

— Ouse me enfurecer e vocês terão um fim pior que a morte! EU SOU A PRINCESA DEMÔNIO — gritei.

Os dois logo cambaleiam de medo, caindo de joelhos e suplicando por suas vidas.

— Não se enfureça, Princesa Demônio! Dogo não quer morrer!

— Não mate Nogo, Princesa Demônio! Por favor!

Quem diria que os goblins conseguiriam fazer expressões tão tristes. Realmente estavam com tanto medo de que algo pudesse acontecer que seus orgulhos – se tivessem algum – foram jogados fora como se não fossem nada.

— Certo, certo. Apenas parem de se lamentar aí. — Mesmo que seja eu que fiz chegar até esse ponto. — Só me levem ao seu líder.

Eles começaram a limpar seus rostos cheios de lágrimas.

Dogo que estava com o nariz escorrendo deu uma cafungada profunda antes de se levantar e concordar:

— Dogo levar Princesa Demônio. Líder está na caverna casa. Líder Yaga. Mas não pode levar...

— Como é? — perguntei rapidamente. Vão continuar com isso?

— Ok, Ok! Dogo e Nogo levar Princesa Demônio! — Nogo entrou na frente do Dogo enquanto afirmava.

Os dois goblins, apesar de menos tensos, ainda tremiam de medo. Podia jurar que o chão iria quebrar, pois me lembravam britadeiras.

Quando dei alguns passos para me aproximar, só faltou os dois saírem correndo e gritando.

— Olhe, só quero que vocês me levem até seu líder. Certo? Se o fizerem, juro que não farei nada com vocês.

Eles olharam um para o outro e depois de um curto período, afirmavam com a cabeça e logo se viraram para mim.

— Certo.

Agora que percebi que um deles estava carregando o que parecia uma pequena lança feita de madeira. E se olhar bem para descrição de sua “classe”, está algo como Caçador. Então eles são caçadores?

Enquanto estive nessa floresta, apesar de ter percebido alguns animais correrem pelas folhas e raízes, não consegui identificar nada que pudesse ser caçado.

— Vocês são caçadores? O que vieram caçar nessa floresta?

? Sim, sim. — Dogo afirmou e logo continuou: — Dogo caçador, Dogo caçar Coelho-da-Lua.

— Coelho-da-Lua? — É tipo um coelho noturno?

— Sim! Carne macia, carne cheirosa. Carne branca!

— Ótima carne, melhor carne floresta — disse Nogo.

Mesmo eu entendendo-os, é como se eu estivesse conversando com uma criança que mal sabe falar. Fica difícil compreender o que significa algumas palavras ou expressões. Bem, melhor que nada.

Dogo, apesar de ser o de menor nível, parecia saber mais como se comunicar e agir naquela situação, então meio que ele tomou a liderança, nos guiando para fora do lugar.

Seria sensato eu questionar eles sobre os humanos? Da forma como aqueles aventureiros estavam discutindo, dá a entender que humanos e goblins são inimigos de longa data. Então é melhor não envolver o assunto até que eu encontre seu líder.

Passaram cerca de 2 horas caminhando e a noite começou a engolir toda aquela parte da floresta. Uma coisa que percebi é que o nosso trajeto estava levando-nos até a montanha mais alta da região, a mesma que eu já pretendia seguir desde sempre.

Os goblins começaram a mostrar sinal de cansaço e decidiram parar em uma pequena clareira. Nessa região havia um tipo de declive intenso e lá embaixo o que parecia uma fogueira, ou o que sobrou de uma. Provavelmente é um ponto de espera que eles costumam usar.

Mesmo que de costas pareciam crianças humanas desprovidas de bons costumes, mostraram saber viver naquelas condições. Inclusive, prepararam de uma maneira tosca um lugar no qual eu podia me sentar.

Quando digo “prepararam”, foi apenas tirar a poeira e terra de uma pedra com um bocado de folhas retiradas das plantas rasteiras.

Para quem se sentou em pedras de textura duvidosa, essa é até melhor. Tipo um artigo de luxo? Caralho, o que estou pensando? O fato disso tudo estar acontecendo já está me afetando mentalmente.

Quando terminaram de arrumar o “acampamento”, Nogo foi até a mim.

— Nogo caçar Coelho-da-Lua.

Apenas fiquei observando-o por um tempo, imaginando que ele apenas tinha comentado o que iria fazer, e logo partiria. Porém, isso não aconteceu. Estava esperando minha aprovação?

— E daí? Ok? Pode ir.

E era isso mesmo, ele apenas acenou positivamente a cabeça e partiu em direção a floresta.

Pelo fato de já estar escurecendo, a floresta ganhou um ar ainda mais sombrio.

Neste caso ficaram só eu e Nogo. Enquanto eu estava fazendo nada, ele por outro lado estava tendo bastante dificuldade para acender uma fogueira mesmo que aparentemente soubesse como fazê-lo. Em uma das mãos tinha um graveto grosso, na outra, uma madeira que lembrava um bloquinho retangular.

Apesar dos princípios estarem ali, faltava-lhe o fundamental: Material para pegar fogo. Que merda, sei que estas criaturas não são as mais inteligentes, mas vê-las repetindo o erro me dá uma agonia tremenda.

Não aguentei ficar vendo aquilo. Mesmo que ele conseguisse acender o fogo, seria após tantas tentativas erradas que eu acabaria explodindo. Odeio pessoas incompetentes, mais ainda se elas estiverem demonstrando seu nível de burrice do meu lado sem nenhum tipo de consideração.

Me levantei e fui até ele. Ele, por outro lado, se assustou e caiu de bunda, enquanto me encarava com aqueles olhos arregalados. Estava achando que eu iria atacá-lo?

— Me dá isso aqui, pare de ser tão burro. — Enquanto ele se afastava, fui até onde estava as ferramentas e comecei a procurar ao redor folhas secas. — Acha que será como mágica apenas ficar esfregando dois gravetos? Você tem que pegar algo que ateie fogo facilmente.

Ali, está um tufo de grama. Caminhei e comecei a ver se seria útil.

— Vá e pegue alguns gravetos. Eles devem estar secos — ordenei.

Ele acenou com a cabeça e logo se levantou. Começou a procurar na região próxima os gravetos que tinha pedido.

Por que tive que me levantar e estar fazendo todo esse trabalho sujo? Que caralhos. Ao menos é uma forma de não ficar maluco com tudo isso.

Como estávamos em um lugar acima de uma rocha maciça, a terra que o cobria podia ser facilmente limpa, e foi isso que eu fiz. Deixei a região da fogueira delimitada por algumas pedras, também longe de outros materiais inflamáveis. Mesmo não me importando muito com o que pudesse acontecer com essa floresta, se ela pegar fogo enquanto eu estiver dentro dela, seria burrice, né?

Dogo trouxe vários gravetos.

— Deixe-me conferir. — Peguei alguns para ter certeza de que estavam secos e aparentemente ele acertou. — Ótimo, coloque de lado.

Assim o fez, colocando-os do lado do pit.

— Vou ensinar apenas uma vez, então é melhor prestar atenção.

Dogo concordava com a cabeça.

— Você até estava no caminho certo, mas é necessário isso. — Apontei para as tufas de grama e algumas folhas secas que encontrei ao redor. — É isso que vai pegar fogo, não somente os galhos.

Caminhei para próximo do pit, coloquei alguns tufos e preparei os dois gravetos, aquele mais grosso e o que lembrava uma caixinha. Então comecei a friccionar.

Isso é realmente difícil para iniciantes, e as pessoas acham que é fácil, então meio que até entendo quando ignorantes erram durante suas primeiras tentativas, porém, se eles estão como “caçadores”, não deveriam ser tão ruins.

Como eu já fui para muitas excursões e camping com meus clientes e superiores, meio que fui obrigado a aprender para não passar vergonha.

Quando a madeira começou a superaquecer, parei e abaixei rapidamente para soprá-la até que no primeiro sinal de brasa, peguei o tufo e coloquei junto. Tive que continuar soprando mais algum tempo até finalmente o fogo surgir.

— Viu? — perguntei enquanto virava meu rosto para trás naquela posição de “cachorrinho”.

Dogo estava aparentemente surpreso ou... que porra de expressão é essa?

Aí que me dei conta que estava totalmente nu, e naquela posição constrangedora. CARALHO! Quase... Digo... Quase isso deu merda. Rapidamente me levantei, tossindo como se nada tivesse acontecido.

— O que está fazendo aí parado? Alimente o fogo com os gravetos antes que ele termine... — Cerrei meus punhos. — E se isso acontecer porque você estava distraído com qualquer coisa, ai de você.

— Sim! Princesa Demônio muito inteligente!

— Que seja, apenas mantenha a fogueira acesa.

Caminhei em direção a pedra novamente, e sentei-me.

Tem muito mais opções no meu campo de visão agora. E quando eu me foco em algo e penso no [Analisar], ele realmente se ativa. Comecei a analisar o [Analisar] e até me surpreendi pelas coisas que ele consegue me mostrar.

Qualquer coisa viva continha nível, status, e mais algumas informações. Se isso é um jogo, então eu sou capaz de ver a força dos meus inimigos antes de qualquer decisão. E consigo ver a informação em quase tudo, tal como pedras e plantas. No entanto, quando uma informação parecia não ser capaz de me mostrar, ou mostrava como “não calculável” para os números e “desconhecido” para as partes com texto.

Eu consigo me analisar? Olhei para minhas mãos, nada. Olhei para meus pés, nada.

Então olhei para meu corpo... Oh, apareceu a janela também. Só é meio difícil ficar encarando esse corpo apenas para ver a janela de status, ao menos enquanto ele não estiver com roupas.

Vejamos, não há nada tão útil que possa me dar algum tipo de informação. Todos os valores numéricos estão como NC e quase todos outros como “Desconhecido”. As únicas coisas que consigo tirar disso é que sou realmente uma garota – e isso bastava ver pelo meu corpo – e minha raça que consta como Demônio-Real. Isso é diferente de um demônio normal?

Ah, e tem outra coisa, eu não tenho nome... quero dizer, até tenho. Consigo ver meu nome original entre parênteses, o que significa que o Sistema sabe quem eu sou de verdade, mas não nesse corpo. E pelo jeito estou com 12 anos agora.

Por que diabos não consigo analisar meus próprios status?

Sistema: [Sua habilidade Analisar (1) está em um nível muito baixo].

Quê? Que afirmação tosca foi essa? Que jogo o jogador não consegue ver seus próprios valores? Isso não faz sentido algum.

Suspirei e olhei ao redor.

Dogo ainda continua focado em manter o fogo aceso. Creio que meu último comentário meio que marcou seu objetivo de vida. Não era para eu ter ameaçado ele daquele jeito, de qualquer forma, cadê o outro goblin?

Sistema: [Percepção Passiva Ativada].

Falando no diabo, ele apareceu.

Está meio acabado, como se tivesse lutado contra vários monstros. Na sua janela de status mostra que ele realmente está ferido, seu HP – Pontos de Vida – está em torno de 137 de 211. Mesmo assim, ele parece estar feliz. Caminha em minha direção com um sorriso largo no rosto. E carrega consigo o tal coelho. Esse é o Coelho-da-Lua?

É realmente um coelho, porém, suas pernas traseiras são bem maiores em relação às dianteiras – bem mais que o do mundo real – e há um chifre longo e pontiagudo saindo de sua cabeça em forma de espiral. Seu tamanho também é algo para se levar em consideração. Quase alcança a altura do goblin se ele ficasse em pé.

Mesmo uma criatura morta eu consigo usar [Analisar]. E aparece a condição “morto”, isso não seria óbvio ao estar com 0 de HP? E, observando os valores de seus status, dá a entender que a luta foi de igual para igual com o Nogo.

Isso me faz perguntar se ou os goblins desse mundo são realmente fracos ou se esse coelho é uma criatura para levar em consideração.

— Nogo cansado. Nogo descansar. — E lançou a carcaça do coelho próximo da fogueira. — Dogo preparar comida!

Dogo então se afastava da fogueira e caminhava até o coelho, mas logo me observava, e voltava rapidamente para o fogo, já que sua “missão de vida” era manter o fogo aceso e ele temia que, sair 2 segundos longe do fogo, ele se apagaria.

— Não se preocupe com isso, pode preparar a comida – afirmei para ver se ele deixaria de ser tão idiota... Parando para pensar, será que ele consegue?

Dogo acenava e voltava a se aproximar do corpo. Analisou por alguns segundos até se virar para o Nogo que tinha sentado ao lado.

— Nogo idiota! Nogo perfurou a carne errado de novo!

— Nogo lutar bravamente, Nogo fez certo.

— Dogo idiota! Dogo resolver sua burrice.

O que estão discutindo?

— O que aconteceu? — perguntei.

— Coelho-da-Lua ter veneno, não pode ferir aqui. — Apontou para região do animal que tinha sofrido a perfuração da lança. — Agora Dogo ter que cortar a carne ruim.

Ah, é?

Então essa caveirinha (o ícone do lado do nome) não é o mesmo que morte? Jurava que era a condição de estar morto, mas na verdade é por estar envenenado?

Me levantei e observei o Dogo, ele ficou um pouco apreensivo como antes, mas eu apenas fiz um sinal para que ele continuasse.

Antes eu tinha dito que ele não carregava nenhuma arma, de fato, mas de onde ele tirou essa faca? Afinal ele está somente com uma tanguinha de pelos. É melhor nem imaginar isso.

Ele começou a cortar o coelho de maneira bárbara. Arrancou toda sua pele e depois cortou a carne em vários pedaços. A região onde ele tinha reclamado foi removida do corpo e não foi usada em nenhum momento.

Tudo isso foi feito no chão mesmo, sem nenhum tipo de cerimônia.

Espere. Vão comer cru mesmo? Antes que pudessem pular na carne para comê-la, percebendo que eu os observo, pararam e começaram a esperar pela minha aprovação.

— O que foi?

— Princesa Demônio comer primeiro — disse Dogo.

— Princesa Demônio faminta? — perguntou Nogo.

— Quê? Não. Foram vocês que decidiram parar e se estão tão famintos assim, comam logo e descansem.

Eles realmente vão comer assim?

— ESPERE! — gritei.

Os dois pararam.

— Não vão assar a carne?

Podia ver como eles não tinham entendido, olharam um para o outro para ver se algum teria a resposta, mas apenas negava com a cabeça.

— Está de sacanagem? Para que a fogueira então? — Bem, uma fogueira não é só feita para comer, mas não a usar é burrice.

Levantei-me e eles deram alguns passos para trás.

— Dogo, pegue alguns gravetos que sobraram — ordenei apontando para o outro lado.

Dogo logo partiu para os gravetos e os trouxe para mim.

— Não sei como vocês conseguiram sobreviver até agora, mas se nem isso sabem fazer, imagino que... — enquanto estava literalmente descascando eles com insultos, os dois estavam perplexos com minhas palavras. — Veja, vocês nunca comeram carne assada?

Eles fizeram sinal negativo, mas um deles, Dogo, levantou a mão e começou a falar:

— Líder Yaga já fez! Yaga fez carne... “assada”?

— Sim. Mas Dogo e Nogo não comer — disse Nogo.

Pelo menos o líder deles tem um mínimo de inteligência. Será que ele tentou fazer o Fogo por minha causa? Pelo jeito, se fossem só os dois, provavelmente passariam a noite no frio ou mesmo comeriam essa carne crua e sem preparar nada.

— Certo, entendi. Então, peguem esses gravetos e enfiem a carne assim. — Comecei a fazer alguns de exemplo e logo peguei algumas pedras, criando um montinho. — Depois vocês os colocam assim, próximo do fogo, mas não diretamente no fogo.

Oh — respondeu os dois.

— O que estão esperando, façam com os outros pedaços.

Os dois concordaram e fizeram o mesmo. Apesar de serem meio “idiotas”, conseguem aprender facilmente apenas com alguns comandos. Logo a maioria das carnes estavam espetadas e colocadas para assar. Eles olhavam para a carne salivando.

Mesmo assim eu não estava com fome e posso dizer que sequer senti o cheiro da carne assar, então apenas voltei a me sentar.

Se eles não sabiam nem como se preparar, duvido muito que saberiam quando retirar, então fui forçado novamente a intervir.

— Coloquem as outras para assar e retire as que estão próximo do fogo. — E com uma pausa, continuei: — E tomem cuidado para não queimar a língua.

Eles trouxeram para mim e eu apenas confirmei:

— Podem comer.

E eles o fizeram. Se deliciaram com a carne assada que até choraram de alegria. Me ofereceram novamente, mas recusei.

Quanto tempo se passou desde que acordei nesse mundo? 10 Horas?

Sistema: [Tempo Decorrido: 9:30:14].

Errei por pouco.

Depois que eles comeram, pareciam estar mais tranquilos mesmo comigo. Antes parecia situação de vida e morte, agora, bem, está normal. Será que devo aproveitar e descansar um pouco também? Hmmm... Olhei para minha situação, totalmente nu. NÃO! NEM FODENDO!

Estou sem roupa alguma e tem dois goblins de tanguinha do outro lado. Quase cometi um erro crítico. Se não tive problemas até agora, ficar acordado mais algumas horas não será nenhum problema, certo?

Sistema: [Demônio-Real não necessita realizar Descansos Longos ou Dormir, eles recuperam energia meditando].

Melhor ainda, Sistema, obrigado por “responder”. Aliás, essa merda tem vida própria?

De qualquer forma, não posso baixar minha guarda com esses carinhas próximo de mim, ou mesmo qualquer outro animal dessa floresta. E... Caralho! Eles já dormiram? Quero dizer, me ignoraram por completo e estão dormindo como se nada tivesse acontecido. Eu, realmente espero que o líder deles seja um pouquinho só mais inteligente. Agora é esperar eles acordarem.



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