Volume 1

Capítulo 09: A "Gata"

Ray sai da caverna e vai pela floresta em direção à cidade, pensando alto em como resolver o problema.

— Se eu falar com o mestre… os ladrões perceberão e, além de fugirem, eu vou levar uma bronca… Até se o mestre sugerir ajuda dos guardas locais não vai ajudar… Na caverna, pude ver mais de trinta ladrões, armas com veneno, e na sala escura pode ter mais… Quem será o homem que falou com eles…? De qualquer forma, até o momento devo fazer o jogo dele, depois de tudo posso voltar e, com a ajuda de Baltazar, sair de lá com a joia para devolvê-la. Isso! Melhor opção até o momento, negociar em levar a joia e levá-la de volta depois.

Na cidade, Ray chega cansado e com fome. Com medo de que os ladrões envenenaram a água e as frutas de sua mochila, ele não arrisca e compra em uma loja água e três frutas para não fadigar durante o dia.

Depois de comprar, ele comenta com a vendedora, uma senhora de idade, mas auxiliada por seus filhos na loja.

— É minha primeira vez na cidade, muito bonita, ouvi falar que tem uma grande casa, um palacete, gostaria de vê-lo, saberia me dizer onde se localiza?

A senhora, com um belo sorriso, explica:

— Simples, garoto, você segue essa rua, passa pelo centro, onde tem a estátua de Alfor, o palacete está para onde os olhos da estátua olham, é só seguir o olhar da estátua, simples localizar.

— Obrigado, senhora.

— Garoto educado, bem-vindo a Coniuro.

— Obrigado.

Ray bebe e come enquanto vai em direção ao centro. Chegando lá, vê que está bem movimentado. Repara na estátua e para onde ela olha e segue por mais duas ruas, onde avista o palacete, com três andares, mas com poucas janelas, sem sacada, feito de tijolos e com grandes colunas, uma grande porta com uma fonte à frente. É a única construção que não encosta com outras casas, sendo um diferencial na cidade.

É fácil associar que deve ser de alguém importante. Ele termina de comer, aproxima-se da casa, que parece vazia, como se os proprietários estivessem fora, sem movimento de empregados ou animais.

Ele observa em volta e espera em um ponto cego em que ninguém o visse entrando na casa. Sem perigo iminente, ele se aproxima da grande porta, coloca sua mão na fechadura e comenta:

— Que bom que perdi a chave do armazém, assim Maxmilliam me ensinou magia para abrir fechaduras.

A porta faz um som de “destrancar” e se abre. Ray rapidamente entra, fecha a porta, percebendo que, ao fazê-lo, ela se tranca novamente. Já dentro do palacete, saindo do vestíbulo e indo para o salão principal, ele analisa o local.

Há muitos quadros nas paredes, móveis de alta qualidade de marcenaria, muitos tapetes de couro e pele de animais. Ele estranha que por fora viu poucas janelas e dentro há muitas. Os quadros dão a entender que a casa é de Nycollas, rei da cidade.

Ray fica um pouco nervoso, mas continua andando cautelosamente. Investigando mais, ele tem certeza de que a casa está vazia, sem barulho algum, então começa a procurar pela joia. Vai de porta em porta, achando cozinha, quartos, salas, copa, área de serviço, entre outros cômodos, sem achar a joia, até que percebe que a escada que liga todos os andares leva a um cômodo único no terceiro andar.

Supondo que seja o local certo, Ray vai em direção a esse cômodo e repara que a porta está fechada.

Hmmm… Não para mim.

Ao colocar a mão na fechadura, Ray sente que ela destranca sem conjurar magia. A porta abre para dentro. Em um susto, um vulto fumacento sai, empurrando-o, que não cai por pouco, por conseguir se segurar no corrimão.

A fumaça cessa, revelando o vulto, uma figura ameaçadora, um personagem todo coberto dos pés à cabeça por armadura leve, couro, metal e pano preto, escondendo a sua identidade com uma máscara.

Antes que Ray pudesse analisar seu oponente, ele o ataca com uma lâmina presa à armadura do braço esquerdo e com uma adaga de serra na mão direita. Ele consegue se esquivar de alguns golpes e aparar outros com sua espada, que saca em uma das suas esquivas.

Contra-ataca, mas o personagem consegue se esquivar facilmente dos golpes, até que Ray, com os impactos e a situação da luta, é direcionado para as escadas, descendo-as e recebendo os ataques do personagem totalmente calado, mas focado.

O personagem começa a usar os membros inferiores para o ataque, e Ray aproveita a localização íngreme da escada, apara a adaga, esquiva do chute, puxa o pé do personagem, desequilibrando-o, e assim tenta jogá-lo para que caia das escadas.

Antes de cair, a figura tenta o agarrar, que se esquiva dando mais impulso para que o outro caia com mais força nas escadas. Ele o vê cair e virar um vulto fumacento rolando por toda a escadaria abaixo.

Antes que o vulto chegasse ao primeiro solo, Ray sente uma presença atrás de si no topo da escada, vira e se depara com o personagem indo para cima dele, novamente atacando com outra sequência, aproveitando a posição superior íngreme da escada, que lhe dá mais força em seus ataques, colocando-o contra o corrimão e imobilizando-o com a adaga em seu pescoço.

Ray olha para o início da escada e percebe que nada caiu e que de alguma forma ele ainda está enfrentando o mesmo personagem.

— Um assassino experiente…

O assassino guarda a lâmina do braço esquerdo, saca outra adaga igual à da direita e ataca Ray na cabeça. Ele empurra o braço, livrando-se da adaga no pescoço, e se esquiva do golpe da esquerda.

Ele empurra o assassino para trás, consegue correr para o alto da escada e fica em frente a ela. O assassino se prepara para ir atrás dele. Ray se preocupa por não conseguir vencer e usa uma magia em sua espada, deixando-a mais leve para o usuário e mais pesada e afiada para o alvo.

O oponente é astuto e repara no truque. Ele sobe calmamente as escadas em direção de Ray, empunhando as adagas. Enquanto isso, Ray murmura algo com os olhos fixos no assassino, que o ataca brutalmente, mirando exatamente na espada e em sua mão.

Ray estranha e tenta esquivar mais do que aparar os golpes, mas ele recebe vários golpes na espada. Sente a mão cansada e, mesmo segurando com as duas mãos, os ataques continuam sendo direcionados à espada e em pontos precisos, até que no primeiro sinal de fraqueza o inimigo o desarma e o empurra para trás com um chute no tronco.

Caindo dentro do quarto de costas para o chão e junta as palmas das mãos. Em seguida, o inimigo para e o observa ali caído de mãos juntas olhando fixamente para ele. Olha para trás, lembrando que Ray pegou em sua perna e na mão direita no meio da luta na escada, e sente que esses mesmos membros estão ficando paralisados e que está perdendo o sentido deles, e associa que esse efeito começou quando Ray juntou as mãos.

O garoto sorri para o assassino, que responde atacando com a adaga da mão esquerda. Ray esquiva rolando para o lado. O oponente puxa a adaga da mão direita com a esquerda, ameaça atacá-lo novamente, e antes que ataque, Ray ameaça:

— Você viu o que posso fazer! Se me atacar novamente, eu esquivarei e ficará desarmado, e a minha vitória será certa!

— Sério?

Ray se espanta por ter uma resposta verbal e ainda mais com uma voz de mulher. O assassino tira a máscara, revelando uma bela mulher morena de olhos escuros, cabelos longos e bem claros, revelando também ser uma aurem. Ela se posiciona para atacar Ray e informa:

— Acha mesmo que nunca enfrentei guerreiros com truques ou até mágicos? Vamos acabar logo com isso, você quer morrer lenta ou rapidamente?

— Nem um nem outro. Se for me matar, será mais difícil do que pensa.

— Ladrão corajoso, normalmente eles fogem nessa hora.

— Não sou um ladrão!

— Não? Invade uma casa, ataca um morador, como você chama isso?

— Desespero.

Ray ri e nota que a joia que procura está no quarto. Reparando em seu olhar, a assassina diz:

— Então é isso! Veio atrás da Aquarium.

— Aquarium? Esse é o nome da joia?

— Não sabe o que veio roubar?

Ray se aproxima da pedra e diz, com lamento:

— Me desculpe… nunca fiz isso…

— Prove! Pegue a joia.

Ray não entende como pegando na joia irá provar algo. Achando que fosse uma armadilha, ele protege sua mão com encantamento e pega a joia. Ao tocá-la, o encanto da mão é desfeito e a esfera ganha uma cor dourada.

Ao mesmo tempo, Ray sente um bem-estar, como se o transtorno e a preocupação deixassem sua mente e coração. Com esse bem-estar, o garoto tem mais clareza da situação.

Relacionado o clã dos ladrões, a casa do rei de Coniuro e a aurem que protege a joia. Todos estão ligados. Os ladrões que vivem dos roubos da cidade do rei desta casa que possui um item especial, especial a ponto de ter uma assassina como guarda-costas.

A aurem interrompe os seus pensamentos.

— Como?

Ray volta a si e, ainda segurando a joia, se expressa:

— Você pode me ajudar!

— Você não é um ladrão! Como fez para a joia ficar dessa cor?

Ray olha para a joia que ainda brilha e entrega para a aurem, que não sente mais os efeitos do feitiço usado por Ray.

— Por quê? Que cor fica quando você a pega?

A aurem pega a joia, que, em pouco tempo em sua mão, muda de cor, um vermelho sangue sumindo com o dourado de Ray.

Ray se espanta e questiona:

— Você não está mais no efeito do encantamento? Eu não tirei…

— Sou mais experiente do que aparento.

— O que significa minha cor? Você ficou pacífica depois que a viu.

— Significa que você não é um ladrão, e com isso conseguiu fazer algo que raramente fazem… confundir-me.

— Juro! Não fiz por mal…

— Calma!

A aurem coloca a joia em cima da estante de onde Ray a tirou, pega a adaga do chão, entrega a espada de Ray, guarda as adagas em suas vestes e se apresenta:

— Eu sou Anirak d’ Cayth, a sombra de Alfor…

— Uma assassina?

— Eu diria “transtorno explosivo intermitente em alvos pré-selecionados”.

Ray fica sem argumento, e Anirak continua:

— Posso te levar à saída, então… E esqueceremos esse transtorno.

— Não! Eu preciso de ajuda!

— Ajuda você vai precisar se não sair daqui.

— Espere! Se você me ajudar, consigo te mostrar onde fica o clã dos ladrões, onde está o líder deles… Algo a ver com Raposo.

Anirak mostra interesse no plano.

— Sei quem ele é, o nome verdadeiro dele é Onurb Gaster… Mas como você fará isso?

— Para salvar um amigo, eu preciso levar essa joia para ele. Levando-a, e você junto, resgatamos meu amigo e fugimos com a joia, assim não saímos com perdas.

— Interessante… Espere no saguão, preciso pegar alguns equipamentos para a ocasião.

Ray fica um pouco desconfiado, mas estranhamente, no fundo ele sente sinceridade nela. Ele segue descendo as escadas, e no saguão aguarda uns minutos, até que Anirak desce, vestindo sobre sua armadura um grande sobretudo marrom.

— Pronto?

— Sim, mas preciso levar a joia.

Anirak entrega a joia passivamente. Ray questiona:

— Parece que você confia mais em mim do que eu em você. Por quê?

— Aquarium releva a essência do ser, você é o segundo em quem vejo a cor dourada.

— E quem foi o primeiro?

— Vamos logo, não quero perder mais tempo.

Ray se contenta com a resposta e segue o caminho com ela. Ao ver que está começando a anoitecer, acelera o passo junto com Anirak para a entrada do clã dos ladrões. No caminho, os dois ficam em silêncio, com o pensamento focado na batalha que viria.

Aproximando-se, Anirak para.

— Melhor você ir à frente, eles não podem me ver.

— Você consegue passar da ilusão?

— Não, mas acredite, estarei bem perto de você.



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