Diários de uma Apotecária Japonesa

Tradução: Sakuta404

Revisão: Mon


Vol 1

Capítulo 14: O Fogo

Lá estava. Eu sabia. Equilibrando uma cesta de roupas em um dos braços, Maomao sorriu. Aqueles eram pinheiros vermelhos crescendo em um bosque perto do portão leste.

 

Os jardins do palácio traseiro eram cuidadosamente podados. Uma vez por ano, as folhas secas e os galhos murchos também eram removidos da floresta de pinheiros. E Maomao sabia que um pinhal bem cuidado incentivava o crescimento de um certo tipo de cogumelo.

 

No momento, ela segurava um pequeno cogumelo matsutake na mão. Algumas pessoas não gostavam do cheiro deles, mas Maomao adorava. Cogumelos matsutake cortados em quatro, grelhados na brasa com um pouco de sal e um toque de cítrico — para ela, era o paraíso.

 

Era um bosque modesto, mas como encontrou um grupo conveniente de cogumelos, colocou cinco deles na cesta.

 

"Devo comê-los na casa do velhote ou na cozinha?"

 

Ela não podia fazer isso no Pavilhão de Jade; haveria muitas perguntas sobre de onde vieram os ingredientes. Não olhariam com bons olhos uma servente admitindo que havia colhido os cogumelos ela mesma no bosque. Então Maomao resolveu visitar o médico — o homem que era ótimo com pessoas, mas péssimo no trabalho. Se ele também gostasse de cogumelos matsutake, tudo certo; caso contrário, ela imaginava que ele ainda assim seria gentil o bastante para fingir que não viu nada.

 

Maomao já havia se tornado completamente íntima do homem de bigode de peixe-japonês.

 

Ela não podia esquecer de passar na casa da Xiaolan no caminho. Xiaolan era uma fonte importante de informações para Maomao, que tinha poucos amigos. Quando Maomao voltou da residência de Lihua, mais magra do que nunca depois do esforço de ajudar a consorte, as outras damas de companhia se empenharam em alimentá-la. Por um lado, Maomao ficou feliz com isso — mostrava que ainda estava em boas graças com elas, mesmo depois de ter passado quase dois meses com uma consorte rival — mas, por outro, era tão frustrante quanto gratificante. Ela tinha uma cestinha que vivia se enchendo de petiscos toda vez que serviam chá.

 

Xiaolan, no entanto, nunca recusava algo doce; seus olhos brilhavam ao ver qualquer coisa que Maomao trouxesse, e ela ficava mais do que feliz em fazer uma pausa para mastigar doces e tagarelar sem parar.

 

Agora estavam sentadas atrás da área de lavanderia, sobre dois barris, conversando sobre isso e aquilo. Como de costume, a maior parte da conversa era sobre histórias estranhas, mas entre outras coisas, Xiaolan contou para Maomao: "Ouvi dizer que uma das mulheres do palácio usou uma poção para fazer um soldado durão se apaixonar por ela — e funcionou!"

 

Maomao suou frio com isso. "Provavelmente não tem nada a ver comigo, né? Provavelmente..."

 

Pensando bem, ela percebeu que nunca tinha perguntado para quem era aquela poção do amor. Mas importava? “O palácio” significava o palácio mesmo, e não o palácio traseiro, o que significava que tinha acontecido do lado de fora. O palácio principal tinha homens de verdade, então ser designada para lá era algo muito disputado. Ao contrário das mulheres que serviam no palácio traseiro, essas eram elites que haviam passado por exames rigorosos para conseguir seus cargos.

 

Dito isso, na ausência de homens de verdade, o palácio traseiro podia parecer um destino bem mais solitário. Não que isso importasse para Maomao.

 

Quando Maomao chegou ao consultório médico, encontrou o velho de bigode de peixe-japonês acompanhado de um eunuco pálido que ela não conhecia. Ele esfregava a mão o tempo todo.

 

"Ah, justamente a jovem que eu queria ver", disse o médico com seu sorriso mais acolhedor.

 

"Sim, o que foi?"

 

"Este homem desenvolveu uma erupção na mão. Você poderia preparar uma pomada para ele?"

 

Palavras nada apropriadas para alguém que, teoricamente, era o médico do palácio, pensou Maomao. Era de se esperar que ele mesmo fizesse isso. Mas não era novidade, e Maomao estava contente em entrar na sala cheia de armários de remédios para pegar os ingredientes.

 

Antes, porém, ela colocou a cesta no chão e mostrou os matsutake. "Você tem carvão?"

 

"Oh ho, que belos exemplares você achou!" disse o charlatão animado. "Vamos querer um pouco de pasta de soja e sal também."

 

Pelo visto, ela acertou em cheio. Isso facilitaria as coisas. O médico praticamente saiu dançando da sala rumo ao refeitório, em busca dos temperos adequados. Talvez se colocasse essa paixão no trabalho...

 

Coitado do paciente, que ficou ali, completamente sozinho.

 

"Talvez eu dê um cogumelo de consolo a ele, se gostar", pensou Maomao, observando o eunuco desanimado enquanto misturava os ingredientes. Quando o médico voltou com os temperos, uma pequena grelha de carvão e uma grade, ela já tinha preparado uma pomada espessa. Pegou a mão direita do eunuco e espalhou cuidadosamente a mistura sobre a erupção avermelhada. A pomada não tinha o cheiro mais agradável do mundo, mas ele teria que aguentar.

 

Quando terminou, o rosto antes pálido do eunuco parecia ter recuperado um pouco de cor. "Nossa, que moça gentil ela é." Havia entre as serventes algumas que desprezavam os eunucos. Os viam como seres estranhos — nem mulheres, nem homens de verdade — e não escondiam isso.

 

"Não é? Ela vive me ajudando com essas coisinhas", disse o médico, com um toque de orgulho.

 

Houve tempos na história em que os eunucos foram tratados como vilões sedentos por poder, mas na verdade, apenas alguns eram assim. A maioria era calma e agradável, como aqueles dois ali.

 

Bom, talvez nem todos... Um rosto indesejado passou pela mente de Maomao, e ela o afastou de propósito. Acenderam o carvão, colocaram a grade, rasgaram os cogumelos com as mãos e deixaram cozinhar. Maomao havia pego um pequeno cítrico sudachi do pomar e agora o cortaram em fatias. Quando o aroma único dos matsutake grelhados começou a se espalhar, os cogumelos ficaram delicadamente tostados. Colocaram-nos em pratinhos e os temperaram com sal e suco cítrico.

 

Maomao esperou para dar a primeira mordida até ter certeza de que os outros dois já tinham começado a comer: no momento em que os velhos deram suas mordidas, tornaram-se cúmplices dela. Ela mastigava enquanto o médico charlatão conversava animadamente. "Essa jovem tem sido uma grande ajuda para mim. Ela faz de tudo, sabia? Prepara qualquer tipo de remédio, não só pomadas."

 

"Uau! Muito impressionante."

 

O velho parecia estar se gabando da própria filha. Maomao não tinha certeza se achava isso ideal. De repente, pensou no pai, que não via há mais de seis meses. Será que ele estava comendo bem? Esperava que o custo dos remédios não estivesse afundando ele em dívidas.

 

Foi justo quando Maomao estava nessa maré de emoções que o médico disse algo especialmente inoportuno: "Ora, acho que ela pode fazer qualquer tipo de remédio mesmo."

 

"Ugh?"

 

Mas antes que Maomao pudesse dizer ao velho para parar com os exageros, o eunuco sentado à frente deles disse: "Qualquer tipo?"

 

"Sim, o que você precisar." O médico deu um risinho triunfante, o que, para Maomao, só confirmava sua fama de charlatão. O outro eunuco olhou para Maomao com um novo interesse. Com certeza tinha algo em mente.

 

"Neste caso... será que você conseguiria preparar algo para curar uma maldição?"

 

Ele esfregava a mão inflamada de forma patética. Seu rosto estava novamente pálido.

 

                                ⭘⬤⭘

 

Aconteceu anteontem à noite.

A última tarefa dele era sempre recolher o lixo. Juntava todo o entulho e a sujeira dos arredores do palácio dos fundos em um carrinho, depois levava até o setor oeste, onde havia um grande fosso onde tudo era queimado.

 

Normalmente, era proibido acender fogo após o pôr do sol, mas como o ar estava úmido e sem vento, consideraram seguro e lhe concederam permissão.

Seus subordinados jogavam o lixo no fosso. Ele mesmo ajudava, ansioso para terminar logo com aquilo. Aos poucos, foram lançando o conteúdo do carrinho na cova.

Então, algo no monte chamou sua atenção. Era uma roupa feminina. 

 

Não era de seda, mas era de qualidade, com certeza. Um desperdício jogá-la fora. Quando a pegou para examinar, um monte de plaquinhas de madeira com escrita caiu de dentro dela. A manga da roupa, que estava segurando as plaquinhas, tinha uma marca visível de queimadura.

O que aquilo significava?

Mas sabia que não terminaria mais cedo se ficasse especulando. Um a um, jogou os pedaços de madeira no fogo.

 

"E então você diz que as chamas brilharam com cores estranhas?"

"Exatamente!" Os ombros do velho tremiam só de lembrar daquilo.

"E eram cores vermelha, roxa e azul?" perguntou Maomao.

"Sim, eram essas mesmo!"

Maomao assentiu. Então era dali que vinham os boatos que Xiaolan tinha contado naquela manhã.

Quem diria que algo do setor oeste se espalharia tão rápido? Realmente era verdade o que diziam — rumores entre mulheres corriam mais rápido que um skandha veloz.

 

"Deve ter sido a maldição da concubina que morreu queimada aqui há muitos anos. Foi errado acender uma fogueira à noite, eu reconheço! Por isso minha mão ficou assim!"

A erupção na mão do eunuco havia surgido depois do incêndio. Pálido e trêmulo, ele suplicou:

"Por favor, senhorita. Faça um remédio que cure maldições."

Ele parecia prestes a se jogar de cara no tatame de palha.

"Não existe remédio para maldição. Como poderia?" respondeu Maomao friamente.

Levantou-se e começou a revirar as gavetas do armário de remédios, ignorando completamente o velho e o médico, que estavam atônitos. Por fim, colocou algo sobre a mesa: vários tipos de pós e pedacinhos de madeira.

 

"Foi essa a cor que você viu no fogo?" perguntou ela.

Colocou os pedaços de madeira entre as brasas, e quando começaram a queimar, pegou uma colher e espalhou um pouco de pó branco sobre as chamas. O fogo ficou avermelhado.

"Ou foi essa?"

Dessa vez, outro pó fez a chama ficar azul-esverdeada.

"Também posso fazer isso."

Pegou uma pitada de sal — o mesmo usado nos cogumelos — e jogou no fogo. As chamas ficaram amarelas.

 

Os dois eunucos assistiam, boquiabertos.

"Senhorita, o que é isso?" perguntou o médico, perplexo.

"É o mesmo princípio dos fogos de artifício coloridos. As cores mudam conforme o que você queima."

Um dos clientes do bordel era fabricante de fogos. Diziam que era jurado a nunca revelar os segredos do ofício, mas no quarto, até segredo virava conversa de travesseiro. E se uma criança inquieta estivesse ouvindo do outro lado da parede... bem, ninguém notava.

 

"E minha mão? Quer dizer que não é uma maldição?" perguntou o velho eunuco, ainda esfregando a mão machucada.

Maomao estendeu um pouco do pó branco.

"Se isso entrar em contato direto com a pele, pode causar uma erupção. Ou talvez fosse o verniz das plaquinhas de madeira. Quem sabe? Você costuma ter alergia a essas coisas?"

"Agora que você falou..."

 

O eunuco ficou mole, como se tivesse perdido os ossos. O alívio era evidente.

Deve ter sido algum produto como aquele nas plaquinhas que ele manuseou. Era isso que tinha causado as cores no fogo. Só isso — não havia maldição nem feitiçaria.

Mas de onde estão vindo todas essas substâncias estranhas?

As reflexões de Maomao foram interrompidas por um som de palmas.

Ela se virou e viu uma figura esguia encostada no batente da porta.

 

"Magnífico."

Quando esse visitante tão indesejado havia aparecido?

Era Jinshi, com aquele glorioso sorriso sereno e encantador de sempre.

 

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