Volume 3
Capítulo 112: A Patinadora do Coração Quebrado
A noite envolvia a sala de jantar da casa de Kassandra, e as chamas das velas lançavam sombras dançantes nas paredes, iluminando o ambiente com um calor suave e acolhedor. A professora, com sua postura ereta e olhar atento, observava Baan do outro lado da mesa, ambos se concentrando no jantar à sua frente.
— Kassandra — disse Baan, com um brilho inquisitivo nos olhos —, já ouviu falar do rumor que está circulando pela universidade sobre... o Poeta Fantasma da Rima Morta?
Ela deu de ombros, levando o cálice aos lábios antes de responder.
— Sim, acho que conheço o que todos conhecem — murmurou, enquanto seus olhos percorriam o ambiente em um misto de curiosidade e apreensão. — Uma entidade misteriosa que, dizem, ataca os alunos... mas, estranhamente, todos eles reaparecem e negam qualquer agressão. No começo, pensei que fosse só uma história tola do Rufus, mas... — Ela fez uma pausa, pensativa, lembrando-se das conversas que ouvira entre os alunos. — Depois que o professor Hazard afirmou ter visto uns encapuzados invadindo seu teste, comecei a duvidar.
Baan notou a expressão dela enquanto levava o copo aos lábios e o pousava suavemente, como se quisesse prolongar aquele momento.
— E você, Baandalf? — Kassandra perguntou com sorriso malicioso nos lábios. — Você tava com o professor Hazard durante o suposto ataque. Acho que ninguém melhor que você para dizer se essa história é mesmo real.
Os olhos de Baan se estreitaram, e ele apertou os talheres com força antes de responder.
— Se é uma entidade, isso eu não posso afirmar — ele respondeu, em um tom grave e sério. — Mas um grupo de encapuzados realmente atacou. A Hermiara foi o alvo... e, embora ela tenha reaparecido, estava... diferente. Parecia um zumbi.
O rosto de Kassandra endureceu, e um brilho de desconfiança cruzou seu olhar, misturado a uma leve sombra de preocupação.
— Baandalf — ela baixou a voz, inclinando-se um pouco mais sobre a mesa, como se estivesse prestes a contar um segredo precioso —, vou lhe dizer algo. Não sei se sabe, mas, além de ensinar equipamentos rúnicos, dou aulas extracurriculares de balé e patinação. Kenia era minha principal aluna nessas aulas. Ela amava balé como ninguém.
Baan arqueou uma sobrancelha, surpreso.
“Kenia... a transmorfa de coelho. Agora sei o porquê dela ter chutes tão potentes”, ele pensou.
—Ela sempre foi esnobe e se achava superior aos outros alunos, principalmente aos calouros. Até lembrava eu mesma... nos tempos de juventude. — Ela suspirou, melancólica, enquanto continuava. — Mas depois que foi... segundo o relato de Rufus, “atacada”... abandonou as aulas de balé e patinação. Eu tentei convencê-la a voltar, mas... era como se eu estivesse falando com outra pessoa. Ela repetia, como um boneco, que “não era mais do seu interesse”. Até hoje, essa história não me desce... Ela amava balé com uma paixão verdadeira, intensa...
— Estou aprendendo muitas coisas sobre você, Kassandra. — Baan sorriu, tentando quebrar a seriedade do momento. — Não fazia ideia dessas suas habilidades... e tampouco que era esnobe na juventude.
Ela riu, mas seus olhos logo assumiram uma expressão triste e distante.
— Fiz muitas coisas das quais me arrependo. — Lentamente, ela se levantou e foi até uma pequena estante ao lado da lareira, onde um retrato antigo repousava. No retrato, uma jovem Kassandra e uma menina de cabelos cacheados e sorriso travesso olhavam para a câmera. Ela passou os dedos pelo rosto da menina com ternura. — E foi Cassie quem pagou o preço.
Baan a observou com atenção, a curiosidade evidente em seu olhar.
— Como assim? — ele perguntou, abaixando o tom.
Ela suspirou, voltando-se para ele com um sorriso triste.
— Cassie nunca conheceu o pai, sabia? Sonha em conhecê-lo. — Ela susupirou. — Criá-la sozinha foi uma das tarefas mais difíceis da minha vida. Se não fosse por Leonora... eu não teria conseguido. Ela me acolheu e ajudou quando mais precisei. Serei eternamente grata a ela.
Baan assentiu, o interesse ainda mais aguçado.
— Kassandra, me conte sobre sua história — ele pediu, com um misto de gentileza e curiosidade.
Kassandra fechou os olhos por um momento, e memórias antigas começaram a inundar sua mente.
O ano era 1581. Kassandra caminhava pelos corredores da universidade com suas amigas, rindo e conversando, quando viu um jovem aproximar-se ao longe. Era Randalf, o estudante que fazia seu coração bater mais rápido sempre que ele estava por perto.
Randalf Flamel, 18 anos, um jovem de óculos e olhos vermelhos penetrantes. Ele usava um sobretudo longo de cor roxa escura, adornado com bordados intricados nos ombros e nas lapelas. Por baixo do sobretudo, vestia um colete cinza escuro com botões decorativos e uma corrente de bolso. A camisa preta era complementada por uma gravata vermelha. Ele carregava uma bolsa de couro marrom sobre o ombro. Seu cabelo preto era curto e bem penteado, com mechas caindo sobre sua testa, como se escondesse o cristal vermelho que possuía em sua testa.
Ela tomou a frente do grupo, tentando controlar o nervosismo que começava a brotar dentro dela.
— Randalf! — ela o chamou, a voz trêmula. — Eu... eu vou fazer uma apresentação de patinação após a aula e queria saber se... — Ela engoliu em seco, sentindo as bochechas corarem. — Se você gostaria de me assistir. Só se estiver desocupado, claro.
Randalf sorriu, os olhos brilhando de uma forma que fez o coração dela dar um salto.
— Vou adorar, Kassandra. Estarei lá. Sempre gostei das suas apresentações.
Kassandra se sentiu tomada por uma felicidade que quase não conseguia conter. Com um sorriso tímido, ela assentiu.
— A-Ah, certo! — respondeu, hesitante, tentando disfarçar a euforia. — Sabendo que você estará lá, vou dar o meu melhor.
Quando ele se afastou, Kassandra virou-se para suas amigas, que a esperavam com olhares curiosos e sorrisos cúmplices. Ela piscou discretamente para elas, comemorando o fato de Randalf ter aceitado o convite.
Mais tarde, durante a aula, uma figura diferente entrou na sala. Era uma jovem de cabelos loiros e olhos verdes. Ela caminhava com passos hesitantes e expressão séria, e Kassandra notou a tensão em seu rosto. A professora, Areta, interrompeu a conversa da turma.
— Alunos, prestem atenção. Esta é Leonora Grammir. Ela é a nova aluna, mas quero que tomem muito cuidado. Leonora possui uma doença rara, uma disfunção mágica. Se alguém tocar diretamente em seu corpo, será desintegrado até morrer.
Leonora Grammir, 17 anos, uma jovem com longos cabelos loiros ondulados e olhos verdes. O penteado era adornado com flores brancas decorativas, complementando sua aparência graciosa, porém tímida. Ela vestia com um colete xadrez marrom sobre uma camisa branca de mangas compridas, que tinha um laço verde no pescoço. Ela usava um colete verde por baixo do colete xadrez, fechado com botões dourados. Suas luvas verdes eram decoradas com detalhes florais e ela carregava uma bolsa marrom pendurada no ombro. Na parte inferior, uasava uma saia longa verde e calçava sapatos com salto.
O anúncio causou um burburinho na sala, mas Leonora simplesmente snetou na cadeira, logo a frnete de Kassandra. Esta, sentindo-se no direito de assumir o papel de líder da turma, inclinou-se para a frente, soltando um comentário zombeteiro próximo aos ouvidos de Leonora.
— Cuidado ao sentar, Leonora! Não queremos que você desintegre a escola inteira, não é? — disse ela enquanto a aluna novata manteve-se em silêncio, ignorando as provocações.
Depois da aula, Kassandra foi até a área de apresentações para seu número de patinação. Ela deslizou pela fina camada de gelo, realizando piruetas e movimentos perfeitamente calculados. A multidão aplaudiu de pé quando terminou, mas ela só tinha um objetivo: encontrar Randalf.
Ao se desvencilhar das pessoas, procurou por ele em meio à multidão, mas ele não estava lá. Seu coração afundou, e ela se retirou para um canto mais reservado, onde as lágrimas começaram a escapar dos seus olhos. As amigas, percebendo sua tristeza, logo a rodearam, tentando consolá-la.
— Não se preocupe, Kassandra! — uma delas disse, com um sorriso encorajador. — Todos sabem que você e o Randalf vão acabar juntos. Vocês são o casal mais famoso da universidade.
— Deve ter acontecido algum imprevisto — disse outra, tentando tranquilizá-la.
Kassandra tentou acreditar nas palavras delas, mas algo em seu coração dizia que algo mais acontecera. Decidida, foi em busca de respostas. Ela caminhou pelas ruas de Meryportos em direção à residência dos Flamel, até que, em uma praça, avistou Randalf. Ele estava sentado em um balanço ao lado de Leonora. Observou de longe enquanto ele segurava a mão dela, protegida pela luva, com uma delicadeza que jamais imaginou ver.
A dor em seu peito foi avassaladora. Desolada, voltou para seu dormitório e se jogou na cama, cobrindo os olhos com as mãos para abafar o som de seu choro.
Naquele momento, prometeu a si mesma que não perderia Randalf para ninguém, principalmente para aquela jovem que nem ao menos podia tocar diretamente em alguém.
Na manhã seguinte, Kassandra, ainda remoendo a cena do dia anterior, ela ouviu, disfarçadamente, uma conversa entre Areta e sue esposo, Rupert, ocorrida nos corredores da universidade.
— Areta, precisamos intervir. Tá ficando estranho esse envolvimento de Randalf com a sua aprendiz — comentou Rupert.
— Leonora e Randalf? Rídiculo! Eu preferiria morrer a ver nosso filho se envolvendo com Leonora. Aquela garota é um erro da natureza, uma aberração — disse Areta, com desdém.
Rupert assentiu, murmurando algo concordante, mas Kassandra não registrou; estava focada na oportunidade que se descortinava diante dela. Leonora havia acabado de se tornar seu alvo perfeito.
Kassandra, acompanhada de duas amigas fiéis, encontrou Leonora sozinha nos fundos da biblioteca, buscando um livro na prateleira mais alta, elevada em uma escada deslizante. Fingindo um sorriso amistoso, Kassandra se aproximou e chutou a escada, fazendo a novata cair no chão, toda desengonçada, aos pés de Kassandra. Esta, zombou, com sua voz em um tom afiado:
— AAh, Leonora, tem que ter cuidado por onde anda ou pode acabar se machucando ao cair. Eu até ia te pegar no ar, mas, você sabe né? — Kassandra, entre risos disfarçados, inclinou-se lentamente para próximo da sua rival. — Eu não poderia tocar em você. É uma pena. Levanta rápido ou algum desavisado pode de tocar e... desaparecer.
Leonora tentou ignorá-la, mas uma das amigas de Kassandra, aproveitando a deixa, fingiu uma expressão de surpresa e acrescentou com um sorriso malicioso.
— Ah, verdade! Caso você se machuque gravemente, quem poderá te ajudar? Vai ter que apodrecer sozinha deitada no chão, como uma minhoca.
Kassandra suspirou teatralmente, deixando escapar uma risada. A humilhação era disfarçada de preocupação, mas Leonora sabia a verdade. Sentindo o calor subir ao rosto, ela se afastou em silêncio, mas a sensação de ser perseguida pelas risadas das três ainda a atingia.
Durante uma tarde no jardim da universidade, Kassandra e suas amigas viram Leonora sentada sob uma árvore, lendo sozinha. Kassandra aproveitou a chance para se aproximar sorrateiramente e derrubou um pouco de suco de sua garrafa no corpo de Leonora, que estava sentada. Quando a jovem se deu conta, estava toda suja e molhada, causando risadas de Kassandra e suas amigas.
— Ah, desculpa, Leonora! Não sabia que você estava aí... Acho que você vai precisar de uma nova muda de roupa. Queria te limpar, mas tenho medo de virar pó, acho que você entende — disse Kassandra, com um sorriso falso.
Leonora abaixou a cabeça, apertando os punhos, lutando para manter a compostura. Ela se afastou em silêncio, mas a marca de desprezo de Kassandra e suas amigas parecia impregnar o ambiente ao redor dela.
Horas depois, Leonora decidiu confrontar Kassandra diretamente. Encontrou-a no banheiro feminino e, segurando o próprio orgulho, encarou a garota.
— Por que você tá fazendo isso? — disse Leonora, com um misto de tristeza e indignação. — Eu não fiz nada a você!
Kassandra riu, um riso frio e sarcástico, inclinando-se sobre a pia e cruzando os braços, encarando-a com desprezo.
— Ah, Leonora, entenda... Randalf é meu, e você não passa de uma ameaça patética. — Ela sorriu, um sorriso que não continha nada além de desdém. — A única coisa que você pode fazer é destruir, apodrecer o que toca. Não seria melhor para você se afastar?
Leonora, com os olhos marejados, fez menção de sair, mas Kassandra bloqueou a porta com um sorriso cínico.
— Você pode até tentar se aproximar dele, mas se Randalf souber das nossas... conversas, a professora Areta saberá que você anda paquerando com o filho dela. — Kassandra sussurrou, ameaçadora. — Então, faça o favor de manter nossas brincadeiras entre nós, certo?
Leonora mordeu os lábios, a raiva e a humilhação se misturando, mas não conseguiu responder. Passou rapidamente por Kassandra, abrindo a porta e saindo. Porém, a jovem nem bem alcançara o corredor quando Kassandra a seguiu.
— E nossa conversa não acabou, Leonora! — Kassandra chamou, elevando a voz com um tom falsamente amigável.
Nesse instante, Randalf apareceu no corredor, ouvindo o chamado. Ele olhou para as duas, confuso.
— Tá tudo bem aqui, meninas? — perguntou Randalf, lançando um olhar entre Kassandra e Leonora.
— Claro, Randalf! — respondeu ela, com um sorriso doce e um tom leve e despreocupado, no intuito de assumir uma expressão de amizade. — Estávamos apenas conversando sobre algumas atividades… Estou tentando fazer com que a Leonora se sinta mais à vontade entre os colegas.
Leonora engoliu em seco, engolindo também a raiva, e forçou um sorriso discreto para manter as aparências.
— Isso mesmo — murmurou ela, sem encará-lo.
— Obrigado, Kassandra. — Randalf, satisfeito, sorriu para Kassandra, agradecido. — É bom ver você sendo tão prestativa. — Ele acenou para ambas e se afastou.
Assim que ele sumiu de vista, o sorriso de Kassandra se desfez. Ela deu um empurrão em Leonora, fazendo-a cair no chão.
— Se afaste de Randalf, Leonora — disse Kassandra com uma voz fria. — Isso é uma advertência.
Com os dias, as provocações continuaram, sempre veladas e discretas. Finalmente, aproximou-se o dia do baile da universidade, e Kassandra já havia decidido que Randalf seria seu par. Aproximou-se dele enquanto ele lia no pátio e o convidou, lançando-lhe um olhar convidativo.
— Randalf, sei que esse tipo de evento não é o seu favorito, mas pensei que poderíamos ir juntos ao baile... — sugeriu ela, com um sorriso esperançoso.
O jovem Flamel, no entanto, hesitou.
— Ah, Kassandra... agradeço pelo convite, mas tenho outra pessoa em mente para convidar.
As palavras dele foram como uma punhalada. Kassandra forçou um sorriso e se afastou com dignidade, mas logo sua expressão tornou-se sombria. Em fúria, ela procurou por Leonora, que andava pelos corredores tranquilamente.
— Leonora! — chamou Kassandra, fechando a expressão ao se aproximar. — Se Randalf te convidar, é melhor recusar. Se não fizer isso, Areta saberá de tudo o que você tem escondido. Tenho certeza de que ela ficará feliz em saber que você tem se aproximado de Randalf.
Leonora, pressionada pela ameaça, ficou sem palavras. Naquela noite, enquanto esperava, Kassandra viu Randalf no jardim, visivelmente pensativo e um pouco abatido. Com um sorriso planejado, ela se aproximou.
— Randalf, você tá bem? — perguntou ela, fingindo preocupação.
Randalf suspirou, balançando a cabeça.
— A pessoa que eu queria convidar para o baile sumiu...
— O meu convite ainda tá de pé. — Kassandra, escondendo sua satisfação, ofereceu-lhe um sorriso reconfortante. — Podemos ir juntos, será divertido.
— Obrigado, Kassandra. Aceito o convite.
Ela se afastou satisfeita, ciente de que, pelo menos por agora, havia conseguido o que queria.
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