Volume 6

Capítulo 253: O navio de guerra Dragão da Água

Dois dias se passaram desde que Fran afundara os cinco navios piratas que tentaram nos atacar. No momento, era por volta do meio-dia, o sol estava brilhando bem acima de nossas cabeças.

Fran estava fazendo a mesma coisa que fez ontem: treinando seus aprendizes. Ela os fez se alongarem, duelou com eles e mostrou como se mover. O treinamento em si estava indo bem, mas foi atrapalhado por uma interrupção.

A campainha de alarme começou a tocar durante uma das sessões de descanso do grupo; seus tinidos soavam de forma repetida em um padrão quádruplo.

Mais uma vez nos encontramos sujeitos a um ataque de piratas.

— Va-vamos lá, Professora!

— Merda, piratas de novo!? Por que diabos existem tantos? Este não deveria ser o Ninho dos Krakens?

Os dois lutadores de combate corpo a corpo, Liddick e Miguel, expressaram suas opiniões nessa ordem no momento em que ouviram a campainha. O primeiro sugeriu entrarmos na briga na mesma hora, enquanto o último gemeu e reclamou.

— Eles podem fazer parte de algum tipo de brigada enorme de piratas, do tipo que pode colocar as mãos em navios novos e modernos, capazes de ultrapassar com facilidade os krakens.

Liddick falou mais uma vez. Ao contrário de sua reação imediata, que parecia funcionar como uma chamada à ação, sua segunda fala parecia conter um pouco mais de lógica.

— Você está falando sério cara? Podemos estar em uma merda muito séria então.

— Pare de entrar em pânico, Miguel. A Srta. Fran, nossa professora, está aqui conosco. Como é que um navio pirata pode se comparar a ela?

— Cer-certo. Bom argumento, Naria.

Fran pediu que seus aprendizes aguardassem antes de seguir para a proa do navio. Lá, ela encontrou o capitão Jerome já olhando para os piratas que se aproximavam através de um telescópio.

— Quantos?

— Eu estava pensando que você poderia aparecer. Desta vez, eles têm 12. Também parece haver alguns navios maiores entre suas fileiras.

12? Droga, isso era muita coisa para um bando de piratas.

— Eles estão agitando a mesma bandeira dos cinco que você afundou alguns dias atrás.

— Amigos deles?

— Parece que sim. Eles provavelmente têm seu QG em algum lugar dessa área.

— Enviaram força principal?

— Desculpe Princesa, mas não faço ideia.

No começo, Fran e eu pensávamos que 12 era um número bastante grande, mas, segundo Jerome, esse não era o caso. As frotas piratas poderiam ser grandes, muito grandes. Os que iríamos enfrentar eram, falando de forma relativa, tão poucos em número que o capitão não conseguia descobrir se eram a frota principal de um pequeno grupo ou a equipe de observação de um bando maior.

— A única coisa que sei é que algo parece errado.

— O que significa?

— Não faço ideia. Eu só tenho um mau pressentimento, isso é tudo.

— Quero ver inimigos.

— Certo. Vou te emprestar isso então.

— Nn. Obrigada.

Jerome entregou a Fran um telescópio sobressalente. Ela prontamente o pegou, levou-o ao rosto e juntou-se a ele, olhando a frota pirata.

"Você vê alguma coisa?"

— Nn… aquilo, de aparência esquisita?

"Uh, você está perguntando para mim? Eu estou perguntando porque eu não posso ver nada..."

— Então nem você sabe o que é aquilo, Princesa do Raio Negro?

— Nn.

A visão de um cara muito musculoso ao lado de uma garotinha, com os dois falando em tom baixo e gutural, foi algo que não pude deixar de achar engraçado. Vê-los lado a lado me deu vontade de rir.

— Ó!?

— O que foi?

— Olhe para aquele navio ali.

Jerome parecia ter notado algo.

"Por acaso ele está falando da bandeira do navio, Fran?"

— Nn? Bandeira estranha acima da bandeira do crânio e ossos cruzados.

"Isso não é apenas algum tipo de bandeira de pirata?"

— Insígnia estranha. Dracônico.

Bem, ela não era uma bandeira pirata se parecesse dracônica.

— Essa é... a bandeira de Sheedran. Merda, eu sabia!

Jerome parecia ter descoberto algo, pois, embora ainda estivesse com o telescópio nos olhos, começou a gemer de desagrado.

— Bem, eu descobri por que me senti tão inquieto.

— Por quê?

— Essa marca dracônica que você viu? É um sinal de que o navio é de Sheedran, uma das nações marítimas ao norte.

Nós não sabíamos muito sobre Sheedran, então fizemos Jerome elaborar um pouco mais. Segundo ele, essa era uma nação oceânica cujas fronteiras se estendiam pelo arquipélago com que compartilhava seu nome.

O continente de onde partimos, Gilbard, tinha Chrom a oeste e Brohdinn ao norte. Tudo o que você precisava fazer para encontrar as ilhas Sheedran em um mapa era marcar os três continentes, conectar os pontos para formar um triângulo e encontrar o ponto central. Visualizar isso me permitiu perceber que ela ficava a sudoeste do mar demoníaco, a extensão de água entre Gilbard e Brohdinn. Levando em conta nossa posição atual, conseguiríamos alcançá-la se seguíssemos para o norte.

Espere, eles têm a bandeira de um país hasteada? Isso significa que eles não são piratas?

Acabou que toda a situação era muito mais complicada do que eu suspeitava de início.

— Veja, o fato de Sheedran ser um país é algo sobre o qual as pessoas gostam de discutir. O local era originalmente ocupado por um grupo de bandidos notórios chamados Piratas de Sheedran. Eles foram bem-sucedidos, tão bem-sucedidos que conseguiram absorver todos os outros grupos de piratas da região. Em pouco tempo, eles começaram a se chamar de nação em vez de apenas um grupo de criminosos. Provavelmente não deveria pensar nessa parte. Não temos tempo para conversar sobre política. Tudo o que importa é a essência. Estaremos bem desde que você entenda que o povo sheedraniano descende do povo pirata, o que significa que eles gostam de ser rudes. Eu até ouvi rumores dizendo que toda a sua população é composta de marinheiros.

Para os cidadãos de Sheedran, os fortes e carismáticos pertenciam aos degraus superiores da sociedade. O ex-rei do país era um destaque excepcional. Ele tinha sido tão carismático que conseguiu que todos os cidadãos do país o reconhecessem e até pessoas de fora. Até pessoas como Jerome admiravam ele, e esse era um recado muito sério.

— O rei foi um homem e tanto, mas ninguém vive para sempre. Ele bateu as botas há alguns anos. Seus sucessores saltaram direto para a luta sobre seu posto no momento em que ele o deixou. Isso acabou virando um belo show de horrores.

A bandeira tremulando acima da bandeira pirata indicava que o navio pertencia à família real de Sheedran.

— Então, marinha de Sheedran?

— Nem mesmo a marinha de Sheedran seria ousada o suficiente para hastear uma bandeira pirata. Você vê como a bandeira real é azul? Ao que parece, isso significa que ela pertence ao primeiro príncipe, o cara que perdeu a luta pelo poder e foi chutado para fora do país.

O primeiro príncipe levou seus homens e começou a brincar de pirata depois de deixar sua nação. Como a realeza de Sheedran era descendente de piratas, seria mais preciso dizer que ele voltou às suas raízes.

Eu não estava convencido de que poderíamos concluir isso com apenas uma bandeira. Poderia ser apenas uma falsificação. Eu não precisava pensar muito para imaginar várias razões pelas quais isso poderia acontecer. Além disso, por que alguém que foi deportado iria querer levantar a bandeira de seu antigo país?

Fran expressou minhas dúvidas, mas elas foram rebatidas. Segundo Jerome, a bandeira devia ser autêntica, e o navio tinha algum tipo de conexão com a família real de Sheedran.

— Por quê?

— Tente olhar para a proa do navio.

— Proa?

"Você vê alguma coisa, Fran?"

— Nn… correntes?

— Certo. Eles estão com um dragão da água. Navios de guerra dragões da água como esse são a razão para os sheedranianos serem tão poderosos no mar.

O conceito de domar feras demoníacas e usá-las para puxar navios marítimos já existia há muito tempo, mas o primeiro rei de Sheedran foi a única pessoa que conseguiu domesticar monstros rank B, os dragões da água.

— Havia apenas quatro deles, mas esses quatro por si só deram aos sheedranianos poder suficiente para eliminar todos os outros grupos de piratas e derrubar até as frotas enviadas pelos países mais poderosos.

Os navios puxados por dragões da água eram muito apavorantes; eles eclipsavam os navios regulares em termos de velocidade e poder de fogo e dominavam todos os campos de batalha para os quais eram enviados. Mencionar suas características e especialidades fez Jerome perceber por que ele sentiu que algo estava errado. Era a velocidade. Os navios dragões da água estavam se aproximando de nós tão rápidos quanto lanchas.

— Eles hastearam a bandeira porque querem se afirmar, ou porque querem intimidar qualquer pessoa que encontrarem.

O ato de autoafirmação parecia estúpido e imprudente, mas não muito improvável com base no que Jerome havia nos dito. Afinal, o príncipe já havia chegado a causar uma tempestade de merda dentro de seu próprio país, apesar de suas responsabilidades.

— Lidar com eles não é algo que gostaríamos de fazer, mas eles têm muita velocidade para escaparmos.

— Não lutará?

— Claro que não, não contra um Navio Dragão da Água. Aquela merda vale por uma frota inteira de 100 navios fortes.

— Mas não pode escapar.

— Sim, estamos sem qualquer porcaria de sorte. Droga! Por que diabos tivemos que encontrar aquele navio monstruoso!?

Parecia que não poderíamos recuar.

— Os sheedranianos odeiam nosso país, por isso duvido que consigamos perder apenas 30% de nossa carga...

Muitos dos piratas menos extremistas estavam dispostos a deixá-lo livre e ileso, desde que você pagasse uma taxa. Aqueles que nos atacavam, no entanto, tinham um Navio de Guerra Dragão da Água. Eles não poderiam se importar menos em fazer de um país seu inimigo. Era possível que eles matassem todos a bordo, mesmo que nos rendêssemos.

— Foda-se. Nossa única esperança é atacar o navio-almirante e começarmos uma luta corporal. Eles têm muitos canhões, então não temos chance a longa distância. Está na hora de você aventureiros fazerem jus a seus salários! Você acha que está pronta para isso?

Não entendi por que o capitão achou que se envolver em um combate corpo a corpo era melhor do que deixar Fran fazer o que havia feito da última vez. Falando de forma lógica, essa parecia ser a melhor escolha.

— Você enfrentará um dragão de água, sabia? Essa merda é perigosa de perto.

— Posso atacar do navio.

Embora os dragões da água fossem níveis de ameaça B, era bastante improvável que eles fossem capazes de nos atingir no ar. Tudo o que precisávamos fazer era encontrar algumas aberturas e poderíamos afundar o navio dragão junto de todas as suas escoltas.

Eu não podia dizer com certeza se seríamos capazes de derrubar o próprio dragão da água, mas destruir o navio que ele puxava seria uma tarefa muito fácil.

— Gosto da ideia, mas ela não nos tira dos apuros em que estamos. Os dragões da água podem ficar fora de controle se forem libertados. Afundaríamos com certeza se eles nos atacarem.

As únicas pessoas que sabiam acalmar um dragão da água furioso eram os superiores de Sheedran.

— Hmmm.

Para ser honesto, eu estava perdido. Eu não fazia ideia do que fazer.

"Ainda temos um pouco de tempo para pensar em tudo antes que tenhamos que enfrentá-los em combate. O que você me diz de perguntarmos a Mordred o que ele pensa?"

— Nn. Entendido.

A solução mais ideal seria eliminar todos os piratas, o dragão da água e tudo mais. Nosso maior obstáculo era o fato de não termos certeza de que seríamos capazes de matar o dragão em questão. Nunca havíamos lutado com nenhum tipo de dragão, então não tínhamos um quadro de referência que pudéssemos usar para analisar nossas chances. Por isso, precisávamos nos manter em guarda, só por precaução.



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