Medo da Escuridão Brasileira

Autor(a): Marcos Wolff


Volume 3 – Arco 2

Capítulo 29: Um animal de estimação.

Maki

2 Dias depois.

 

Durante essa pequena viagem, o que me intrigava era ter que parar para descansar. Os humanos são fracos quando se trata de sono ou qualquer tipo de descanso, é como se o corpo deles fosse obrigado a fazer isso. Mas de forma alguma tenho o direito de reclamar de algo. O silêncio era algo extremamente presente na nossa viagem, às vezes eles conversavam sobre alguma coisa, mas sempre evitavam assuntos mais sérios como o que aconteceu com eles na academia de batalha.

A minha vida passava diante dos meus olhos em todas essas horas chatas que tivemos andando pelo meio da floresta gigante. Nenhum animal aparecia… mas então… como iríamos comer algo? Simples, as frutas da floresta. No lugar onde estamos, o ambiente úmido e quente ajudava na questão da cultivação das frutas… por algum motivo… parece que alguém veio aqui e plantou tudo isso, talvez seja algum plano da deusa das plantas.

Era como se o ambiente fosse propositalmente feito para essa ocasião, o lugar recheado de frutas traz à tona os animais que sobrevivem desse tipo de alimento… e no meio dessa caminhada encontramos uma raposa.

— Faz silêncio, faz faz… — sussurra Hideki.

As pessoas começam a andar mais devagar que o normal, e com isso o Hideki tira do seu bolso um punhado de frutas vermelhas, e tenta chamar a atenção da pequena raposa que surgiu no nosso caminho. O animal em questão parece se interessar, e aos poucos se aproxima do garoto.

A fofa raposa parece ter gostado e confiado na gente, tanto que ela se abaixa e assim rola um pouco no chão, demonstrando sua barriga e deixando o Hideki fazer um pequeno carinho, os sons fofos que ela reproduzia esquentava mais ainda o coração das pessoas.

Shiori se aproxima e faz o mesmo junto com a Yukiro, e eu fico parada vendo toda essa cena que poderia ser chamada de vergonha alheia.

— O que a gente vai fazer com esse lindo bichinho? — pergunta Shiori.

— Acho que vamos levar com a gente! — responde Hideki.

— S-Sério? Que coisa boa!!!! — diz Yukiro.

— Mas vocês ao menos sabem como cuidar de um animal assim? — pergunto.

A feição deles era como de crianças que viram um presente numa vitrine e agora não tiram o olho…

— Não sabemos, mas você sabe, né… Maki…? — pergunta Hideki.

— Ah… sim, eu sei.

— OBA, ENTÃO VOCÊ PODE NOS ENSINAR! — grita Shiori demonstrando uma intensa felicidade.

Essa ação que ela acabou de fazer me deixa confusa, a tão pouco tempo atrás ela parecia triste, mesmo com a maldição que foi jogada em cima dela… era perceptível que não estava tudo bem, na cabeça dessa garota tudo parecia um caos. E você não precisa ser um psicólogo ou algo do tipo para perceber isso.

Mas agora… Shiori estava feliz como nunca, é como se na sua cabeça… algo entrou, como se alguma coisa ativou e a fez viver normalmente. Não sei se isso é algo bom, se está nos planos da Solveig… mas é verdade que é uma linda cena de se ver, Solveig.

— Certo. Ajudarei vocês a cuidar desse animal.

— Qual vai ser o nome dela? — pergunta Hideki.

Os três no mesmo segundo fazem uma expressão pensativa e começam a jogar nomes para o alto.

— Isabela! — diz Yukiro.

— Carlos. — diz Hideki.

— Mas é uma menina… — responde Shiori.

— … Carla.

— Você é péssimo com nomes… Hideki. — respondo.

— Mas não é um nome ruim… 

Shiori assim levanta seu dedo indicador como se uma ideia tivesse saindo da sua cabeça.

— Gaspar Humbert Ignatius Jayden Kasper Leroy Maximilian Neddy Obiajulu Pepin Quilliam Rosencrantz Sexton Teddy Upwood Vivatma Wayland Xylon Yardley Zachary!

— Que? — pergunta Hideki.

— Bem… eu tô tentando!

— Esses nomes… são ideias?

— Não, seu doido, são todos um nome só!

— Caramba…

— Raposinha doce de amendoim caramelado dos olhos vermelhos e com pelos laranjas adoçado como Açúcar! — diz Yukiro.

— O que é isso? Competição pra ver quem diz o maior nome? — pergunta Hideki.

— Vocês são terríveis com nome… — digo.

A interação dos três era fofa demais. Algo que esquentava o coração e te deixava com um sorriso no rosto. Em toda essa vida eu nunca tinha visto algo assim… talvez essas pessoas sejam especiais, por onde eles passam deixam um ar de felicidade e tranquilidade.

E essa tranquilidade… era tudo o que eu precisava.

As coisas não dão certo para aqueles que só querem seguir sua vida normalmente.

Meu coração aquece e a calmaria sobe pelo meu corpo, chegando na minha mente… e então… todos aqueles pensamentos sobre tudo o que aconteceu, simplesmente foram embora. Minhas preocupações se foram, o meu desejo de acabar as coisas pela metade… também se foi.

— O nome dessa raposa… será Mel. — digo.

Yukiro faz uma expressão onde parecia ter aceitado o nome sem problema algum. Mas a Shiori me olhou decepcionada, levantou o dedo balançando para os dois lados e disse…

— Olha. Eu ainda prefiro Gaspar Humbert Ignatius Jayden Kasper Leroy Maximilian Neddy Obiajulu— Shiori é interrompida por Hideki, que coloca sua mão na frente da boca dela.

— Está certo, então será Mel o nome da raposa! — diz Hideki.

Sua face está como “eu já escutei o suficiente.”

Assim Shiori tira a mão do Hideki e assim pega a raposa pra ela, se levanta e sai andando com o animal em mãos.

No meio de tudo isso começo a pensar em como o Hideki sabia o que dar para um animal desses.

— Hideki…

— Oi?

— Como você sabia o que dar para um animal desses?

— Ah… quando eu era criança, minha mãe um dia me disse que caso eu quisesse ter uma raposa, eu teria que começar a alimentá-la com frutas vermelhas…

— Você quer ter uma raposa?

— Sim, é como aquelas promessas de infância, sabe?

Hideki assim se vira e começa a andar ao lado de Shiori, Yukiro se aproxima e assim me puxa pelo braço, como se não quisesse que alguém ficasse pra trás. Em meio a essa floresta onde só se ouvia o barulho dos galhos quebrando… agora se ouvia os fofos sons de uma linda raposa alaranjada.

Como esse lindo animal chegou até aqui? Olhando em volta do lugar onde encontramos a raposa, consigo ver sangue por aí, não é humano… talvez seja dessa raposa?

— Shiori…

Ela olha atentamente para trás, me observando com uma expressão confusa.

— Me deixe ver suas mãos…

Shiori então coloca o animal no chão com cuidado, ele se deita.

E como eu imaginava… o sangue não era de nenhum humano, e sim da raposa.

Shiori ao perceber isso… não faz nenhuma reação. Ela trava e seus olhos estão brilhando. Hideki se assusta e, com extremo cuidado, mexe um pouco a Mel de um lado para o outro, assim tentando encontrar a fonte do problema.

— Achei.

Hideki encontrou o que aconteceu, estava cortada na barriga…

Algo tão profundo que fazia a minha pensar sobre como ela sobreviveu por tanto tempo… analisando o corte, era perceptível que não era uma lâmina, então não tinha alguém tentando caçar animais por aqui… o corte se parecia com uma garra, algum animal feroz tentou fazer algo do tipo.

— Precisamos ajudá-lo de alguma forma… — diz Shiori.

— Certo, estamos muito longe da cidade, Maki? — pergunta Hideki.

— Não, se corrermos agora, chegaremos em um total de duas horas.

— Correr por duas horas, certo? Alguém aí consegue fazer isso?

— Não. Ninguém. — responde Yukiro.

— Teremos que achar uma forma de chegar na cidade o quanto antes.

— Esperem.. eu acho que isso pode ajudar. — diz Shiori.

Shiori tira seu blazer da academia e o rasga em vários pedaços.

— Tenho certeza que é uma forma de ajudar o animal a sobreviver…

— Espera… você já usou magia de cura antes, não é mesmo… Yukiro? — pergunta Hideki.

— Já. Mas curar um corpo de um animal é totalmente diferente de um ser humano, ainda mais quando se trata de um pequeno e frágil como uma raposa. Eu não tenho tanto controle sobre essa habilidade.

— Bem… talvez agora tenha, conto com você para fazer isso.

— Talvez esteja indo longe demais, Hideki.

Ele se levanta e Yukiro se aproxima, pegando o tecido do blazer de Shiori e colocando em volta da criatura, para que assim o sangue pare, logo em seguida ela começa a recitar algumas palavras em um tom que não é possível ouvir… e uma luz verde começa a iluminar toda a floresta.

O animal começa a gritar muito alto, como se estivesse sentindo dor.

— Opa, me desculpe… usei muita mana.

A luz enfraquece e assim ilumina apenas a mão dela. Os gritos de dores do animal… somem.

Yukiro segura a raposa no colo e começa a andar.

— Vamos, não temos tempo a perder.

Todos começam a seguir caminho.

Um poder de cura daquele tamanho era o suficiente para simplesmente reviver um membro perdido, algo que até então, ao meu conhecimento, era impossível… o que me deixa pensativa até demais é o fato de que uma garota comum como a Yukiro consegue usar esse gigante poder…

 

5 HORAS DEPOIS.

 

Depois de algumas horas de caminhada em meio a floresta, conseguimos ver algumas estruturas. O modelo antigo que parece dos anos 1700 me chama atenção… pois me lembra as estruturas de Júpiter. Me lembra um lugar… que talvez eu não queria mais ver.

Diferente das outras pessoas que tiveram uma reação de surpresa ao ver um lugar que tecnicamente é tão lindo, a minha reação foi normal… pois naquele lugar, não era onde queria estar. A estrada ainda era grande, mas mesmo assim… os muros dessa cidade eram gigantes…

Os portões se abrem quando nos aproximamos e assim… uma garota com os cabelos avermelhados recebe a gente.

— Sejam bem-vindos! Espera…

Ela olha atentamente ao Hideki, com sua roupa que estava rasgada.

— Você é o… Hideki, não?

Ele levanta uma sobrancelha e faz um rosto pensativo, olha para a garota e olha para a Shiori, que também estava confusa com a tal situação que estava na sua frente. A garota passa a mão na frente do rosto de Hideki.

— Alô, tem alguém aí? Sou eu, a Any… a garota que você conheceu na academia de batalha!

— Você conheceu outra pessoa, Hideki? — pergunta Shiori.

O rosto dela era um sentimento estranho, ela forçava um sorriso enquanto seus olhos demonstravam total raiva.

— Gente… vamos rápido… meu corpo não vai aguentar tanto tempo assim… — diz Yukiro.

— C-Calma… vamos começar do zero. Prazer novamente, Any! — diz Hideki.

Ele faz um rosto feliz.

— Fico feliz que tenha sobrevivido ao que aconteceu naquele lugar…

— Também fico feliz por isso! Vejo que tem acompanhantes do seu lado, quem são?

— Essa é Shiori. Essa aqui é a Yukiro. Essa aqui é a Mel. Essa aqui é a Maki!

— Mel nada. Gaspar… — Shiori é interrompida por Hideki.

— Já entendi. Bem, estamos em uma situação meio complicada, essa raposa não parece que vai aguentar tanto tempo, estamos aqui… fazendo magia de cura nela, mas não parece ajudar tanto… conhece algum médico?

Eles conversam como se fossem pessoas totalmente próximas, será que se conhecem a muito tempo? Pela reação da Shiori, não é tanto assim… é como se fosse naqueles meses da academia de batalha, o que aconteceu lá dentro para esse tipo de reação acontecer?

— Oh, eu posso ajudar vocês, eu sou curandeira, se lembra?

— Verdade né, mas você sabe curar animais?

— Sim, é difícil, mas super divertido, tenho certeza que irei conseguir.

— Tenha um pouco de cuidado, é nosso novo animal de estimação.

— Onde vocês acharam ela?

— Na floresta logo atrás.

— Oh… então vocês conseguiram entrar na floresta da Riko…

Riko? Esse é um nome extremamente conhecido, e que Solveig me ensinou sobre uma pessoa do mesmo nome, se lembro bem era a deusa de todas as plantas do universo… se é sobre ela que estamos falando… talvez entrar naquela floresta… não tenha sido algo bom.

No final das contas tenho que esperar essa raposa ficar bem, para assim conversar com eles sobre tudo isso que aconteceu. Toda essa luta, e toda essa caminhada.

Continuaremos nossa viagem… até um certo momento.



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