Medo da Escuridão Brasileira

Autor(a): Marcos Wolff


Volume 6 – Arco 3

Capítulo 55: Minha vida.

Hideki

3 anos atrás.



— Nos encontramos novamente, Hideki…

Quem falava isso na minha frente era Nina… Seu corpo extremamente estranho passava a impressão de desconforto, mas tudo era apagado pelo simples fato de existir uma sala branca à minha volta.

Eu lembrava de quando fosse me encontrar com ela novamente, toda a verdade seria exposta pra mim… talvez fosse melhor esperar pra isso acontecer. Descobrir o que está por trás de tudo o que meu pai fez, e assim escolher se serei capaz de fazê-lo pagar pelos seus crimes.

Até agora… eu realmente não sabia o que fazer, as minhas escolhas estavam curtas e tudo estava caindo aos poucos em pedaços. As minhas escolhas estavam diminuindo, e com o tempo eu já nem sabia mais qual caminho estava seguindo… precisei de muito mais só para pensar.

— Se nos encontramos… significa que agora eu irei saber a verdade. — digo.

Naquele momento Nina se impressiona e assim deixa escapar uma risada.

— Você é engraçado, Hideki… talvez eu não possa fazer isso com você agora.

Essas palavras já seriam possíveis imaginar… a maluquice dessa deusa era previsível.

— Mas…

— Tá certo que fizemos um contrato onde eu iria te contar a verdade quando essa linda cena acontecesse, mas Hideki… pensa comigo… será que é isso mesmo que você quer? Porque não parece.

Na minha frente… eu mesmo apareci, eu achei que teria acabado com toda essa briga enquanto estava lutando com a Sarah, mas realmente não é isso… essa pessoa, — eu — estava presa dentro de mim e não conseguia sair por nada. Talvez fosse melhor repensar se eu consigo fazer as coisas darem certo…

— Oi, eu. — disse o Hideki que estava na minha frente.

Já vi essa cena algumas vezes, conversava comigo mesmo quando era menor, mas nunca achava que realmente existia alguém dentro de mim que fosse eu mesmo. Todos os sentimentos faziam um certo sentido pra mim, eu me sentia extremamente observado toda hora, talvez era pelo fato de realmente ter alguém me observando… e esse alguém ser eu mesmo.

— Oi.

— Isso talvez seja interessante de ver, pois pense bem… você mesmo não quer deixar o passado passar para o corpo, a alma… não permite o coração ver as coisas. — disse Nina.

No momento em que ela disse isso, algo apitou no meu coração, a diferença de um para o outro. Talvez eu devesse “fazer as pazes" comigo mesmo e só assim seria capaz de entender o que aconteceu em um passado que talvez fosse tão distante, mas o que será que ele quer que eu faça?

— Como eu disse… não é justo você descobrir a verdade não conseguindo nem olhar nos olhos dos outros. Hideki.

— Se ficarmos nessa novamente, entraremos no mesmo looping. — respondo.

— Sim, e é só dessa forma que você talvez entenderá o que deve fazer, já parou para pensar que seus objetivos são como o de salvar todos? Hideki… você não é um herói.

— Eu sei disso. Mas pra você é fácil falar, já que é apenas um espectador, o que faria se estivesse no mesmo lugar que eu? Correria atrás para atingir seus objetivos, mas conseguiria mesmo assim?

— Eu falo isso, discuto com você… porque já estive no seu lugar.

— Você nunca esteve na minha pele.

— Já, eu sei o que falo simplesmente por já ter ficado na mesma parede que você. A diferença… é que o meu objetivo é mais fácil de cumprir agora.

— Você é extremista demais…

— E você é inocente demais.

Não tem como falar com uma pessoa assim, é como se as nossas ideias não se cruzassem… é estranho demais e não tem como fazer nada sobre isso. A verdade só será descoberta depois de entrar em um certo acordo com esse “eu”, mas é literalmente impossível fazer isso. É como se ele fosse programado para ir contra todas as minhas ideias.

Não é que eu não queira matar meu pai, eu estou extremamente confuso com tudo isso e não sei como seguir em frente, em todo esse tempo estive pensando em como eu poderei melhorar e em como tudo isso vai ficar, mas o que ele ficou fazendo? Vendo a minha vida inteira como um espectador e nunca me ajudou… e agora aparece do nada e tenta fazer como se tudo isso fosse a coisa mais fácil e simples do mundo.

Eu não quero acreditar que meu pai está fazendo  tudo isso somente pra me ferrar, eu não quero mesmo acreditar nisso… mas também eu tenho que colocar tudo em uma balança. Eu não irei conseguir perdoá-lo se realmente estiver tentando me matar da pior forma possível.

— Pare de pensar demais… atinja logo um motivo pra você seguir em frente! E dessa vez fale um que seja só pra você. — disse o outro Hideki.

Em todo esse tempo eu tentei seguir uma ideia que fosse pra mim, uma ponte para guiar as outras pessoas para seus objetivos, em toda essa vida… eu nunca consegui achar um objetivo pra mim. É extremamente complicado fazer tudo isso se tornar realidade, penso que se em algum momento… eu achar algo para almejar, estarei sendo totalmente egoísta e deixando todos de lado… e eu não quero fazer isso.

Por isso pensei que seria melhor ajudar as pessoas a alcançarem seus próprios objetivos e assim, depois que eu simplesmente não ter mais o que ajudar, poderia sim correr atrás das coisas que eu queria.

Talvez… em algum universo paralelo… eu tenha feito várias e várias coisas para as outras pessoas e para mim mesmo, mas nesse aqui eu simplesmente não consigo pensar em como tudo poderia dar certo. Não consigo seguir um caminho onde eu seria totalmente egoísta e deixaria os objetivos das pessoas para trás para correr atrás do meu…

“Pense… pense em algo que só você poderá fazer… algo que só você poderá alcançar para descobrir toda a verdade.”

Era o que passava na minha mente por um longo tempo na minha vida. Algo que só eu poderia fazer para simplesmente achar um objetivo… tudo era complicado… eu não corria atrás de algo, eu corria atrás para achar algo. Por conta disso sempre me mantive como um personagem secundário na vida dos outros, apenas chegando no final de toda a briga para dar um apoio… nem que seja moral.

No final das contas eu percebia que acabava ficando pra trás, as pessoas não sabiam meu objetivo e nem mesmo eu sabia, isso dava desconforto para certo alguém… que simplesmente largou tudo para acabar com a minha vida, talvez eu não devesse perdoá-lo, mas algo no meu coração fala mais alto.

Eu devo tentar entender o que aconteceu para chegar nesse nível… só assim eu poderei tirar as conclusões certas e ver se será realmente algo desse tipo que irei fazer. Por tanto tempo… todos esses meses e anos que passaram desde o incidente na minha casa… eu nunca soube o que fazer, nunca soube como seguir em frente.

Todos os sentimentos me levavam para o mesmo lugar e me traziam aquele inferno de novo… o inferno que eu não queria estar, perdido… em um looping de emoções e pensamentos. Talvez fosse só assim para afogar todas as minhas tristezas em felicidades que não são verdadeiras.

Me sentia culpado por não conseguir achar algo para seguir em frente. De todos os caminhos que poderia escolher, decidi ir para o mais complicado e que talvez não tivesse tanta recompensa assim, talvez isso seja o que me torne humano? Todas as perguntas que eu tinha… nenhuma era respondida. Talvez eu devesse correr atrás de todas as perguntas e tentar respondê-las, mas era impossível.

A dificuldade que eu tinha de olhar para mim mesmo… era imensa. Eu só queria que alguém me respondesse, só queria achar as respostas, só queria seguir o caminho certo… só queria ter um pingo de paz. Desejar tantas coisas assim é ser egoísta?

— Seja com você… ou sem você… eu irei achar uma resposta para o que eu quero. — digo. 

— Não vai achar nada dessa forma, voltará para o mesmo looping que tanto reclama estar.

— Mesmo se eu voltar… uma hora eu irei sair.

— Por que simplesmente não aceita que está indo pelo caminho errado?

— E como é esse caminho errado? Por que fala tanto dele? O que seria errado e o que seria certo? Qual devo seguir? Por que fala como se fosse extremamente experiente? O que você quer de mim?

DROGA!

Me ajoelho e bato com tudo no chão, desejando que as coisas quebrem e que tudo caia em ruínas… nesse momento rachaduras aparecem no chão e nas paredes… talvez eu tivesse descoberto uma maneira de acabar com tudo o que estava à minha volta.

Nenhum dos dois reage.

— Tudo poderia ser mais fácil se eu soubesse a verdade… — reclamo.

— Talvez você pudesse descobrir, se realmente fosse digno de saber tudo isso.

— E o que me torna digno…?

— Você… parar de viver pelos outros.

No momento que ele fala isso, meu olhar se torna totalmente afiado. 

— Eu não vivo pelos outros.

— Como não? Tanto fala que vai deixar por último os seus desejos, somente para realizar os dos outros. Do que vai mudar você saber toda a verdade se ainda vai continuar pensando dessa forma? Você não é digno de saber o que vai acontecer.

Meus olhos abriram. Naquele momento eu percebi que o que eu fazia… talvez fosse um pouco errado. Era só uma pessoa ligar os pontos pra mim que as coisas automaticamente iriam acontecer… talvez… eu devesse pensar melhor no que aconteceu em toda a minha vida e pensar se ela é minha mesma… ou é de outras pessoas.

No final das contas era só uma mentira minha para continuar vivendo sendo a custa das outras pessoas, nunca pensei que poderia viver realmente só por mim mesmo, e talvez, mesmo se quisesse… não fosse realmente o que eu queria para a vida. Talvez eu seja imperfeito… na verdade, o que será que estou pensando? 

— Você… poderia por um momento tentar me escutar? — disse Hideki.

— Tentar te escutar?

— Sim, como espectador na sua vida… posso falar pra você o que está certo e o que está errado.

— Mas… você só vai estar impondo seus ideais pra cima de mim.

— Eu sou você, seu idiota. Como eu vou colocar algo na sua cabeça que já é o que você pensa.

Em todo esse tempo… as nossas poucas conversas davam um certo looping, mas dessa vez… ela encontrou uma saída do padrão… talvez eu realmente devesse escutá-lo para descobrir o que ele quer, e assim poderia tentar ajudá-lo… na verdade, tentar me ajudar.

No final das contas eu estaria falando comigo mesmo, e assim tirando da minha cabeça ideias que são erradas para uma pessoa. Eu não queria que ninguém vivesse por mim, eu queria que na verdade as coisas acontecessem por eu ajudar as outras pessoas.

“Seja uma boa pessoa e ajude todo mundo!”

Talvez foi isso o que me fez ser assim, essa fala… da minha mãe, onde eu realmente deveria ajudar as pessoas a serem quem elas querem ser… talvez só com essa fala eu tenha me tornado o que sou agora.

É tão ruim assim… esquecer de você mesmo?

Quando olho pra frente, mãos estavam estendidas para mim… como se fosse uma plena ilusão. Naquela hora percebi, eu não estava sozinho. Existiam pessoas que, caso eu necessitasse de ajuda… apareciam como se fossem anjos. Eu sabia… sabia que não poderia viver às custas dos outros, mas também pensava que tudo bem alguém viver às minhas custas.

Nunca pensei que poderia dizer isso, mas eu queria seguir um caminho onde todas as coisas estivessem escolhidas, e não deveria fazer pensamentos meus sobre o que devo seguir ou não… eu tinha esse caminho para seguir, mas agi como uma criança totalmente infantil e decidi seguir o outro.

Talvez eu realmente devesse escutar eu mesmo.

Me sento no chão, respiro extremamente fundo, assim olho novamente pra frente, aquelas mãos estendidas já não estavam mais ali, eu decidi… que talvez era hora de parar de pensar e colocar tudo pra fora de uma vez só.

— Tudo bem… eu irei te escutar.



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