A1 – Vol.2
Capítulo 42: Nunca se esqueça, mas sempre se perdoe
O ambiente mudou novamente, para um local totalmente diferente. Estavam numa quadra de esportes, com muitas crianças torcendo na arquibancada.
Dois times se encaravam com ferocidade. Do lado vermelho, Catherine e suas amigas; do lado azul, Nancy Willis e seu time, que olhavam para as adversárias com uma expressão de superioridade.
— Eu fiz uma aposta que você não ia durar 5 minutos, Pride! — gritou Nancy, com um sorriso irritante. — Mas tenta aguentar o suficiente pra não me entediar, ok?
Catherine cerrou os punhos, aquela garota fazia o sangue da pequena ruiva borbulhar — mal ela sabia que era literalmente.
— O que essa garota fazia com você? — perguntou a Fênix.
— Meus anos no ginásio foram uma merda por causa dela. Nancy era valentona da escola e, por algum motivo, eu era o brinquedo favorito dela. Não sei se era por que era baixa e esguia na época, ou por eu ser a melhor nos esportes. Mas ela já me humilhou de todas as formas possíveis e, quando eu tentava revidar, ela apelava pra força. Não queira saber qual o gosto da água da privada do banheiro masculino.
— Crianças podem ser cruéis.
— É… mas quem sempre apanha, um dia aprende a bater.
— Como assim?
Yohane ficou em silêncio, encarando a cena com olhos tristes, como se algo a fizesse se arrepender até hoje.
A árbitra girou uma moeda para decidir quem começaria o jogo, e a sorte pesou para o time de Nancy. Assim, a partida começou.
Era uma disputa furiosa, mal podia se dizer que eram crianças jogando. A bola voava e não ficava mais do que cinco segundos nas mãos de alguém. Para as outras jogadoras, aquilo era apenas uma partida para ganhar nota extra no fim do semestre, mas para Catherine e Nancy, era guerra. Ambas queriam vencer, mostrar quem era superior.
No final, apenas as duas sobraram, enxarcadas de suor, mas Nancy parecia ainda mais cansada. Vendo aquilo, Catherine quis provocar.
— Ué, Nancy, já tá cansada? Achei que você iria me vencer em menos de cinco minutos!
Nancy, que estava com a bola, a apertou com força. Não aguentaria ser caçoada por aquela menina baixinha.
— Não fica se achando! — Ela arremessou a bola com força, mas Catherine desviou com maestria. — Você pode enganar todos os idiotas dessa escola com seu jeito de santinha, mas eu sei quem você é, Pride — gritou Nancy, com olhos irados. — Uma pessoa que não derrama uma gota de suor no verão, que não sente dor nem quando pisa no fogo. VOCÊ É UMA ABERRAÇÃO, CAIPIRA DE MERDA! Aposto que sua mãe te sequestrou de um laboratório secreto e tá cuidando de você como se fosse um bicho de estimação. Ou talvez ela só esteja com você porque ela é burra demais para perceber o quão esquisita você é!
Catherine pegou a bola, seus olhos estavam sombrios como um dia de chuva.
— O que foi? Não consegue responder por que sabe que estou certa, não é? Monstro! Quem sabe sua mãe também seja uma aberração, por isso ela não se importa com essas coisas que você consegue fazer.
— Não fala — Catherine fez posição de arremesso, seus olhos brilhando em carmesim. Vapor começou a sair de suas pálpebras e ela gritou com ira —, DA MINHA MÃE!
Nancy não pode ver o que aconteceu.
Quando a bola saiu da mão de Catherine, uma pequena onda de choque foi criada, lançando-a como uma velocidade e força absurda em direção à Nancy, a atingido no estômago. A força foi tamanha que explodiu a bola e lançou Nancy no chão, dois metros à frente.
A arquibancada ficou em silêncio, nem a árbitra conseguiu apitar a vitória do time vermelho. E, de repente, uma grito doloroso foi ouvido. Nancy estava berrando no chão, como se estivesse sofrendo. A árbitra e as amigas da garota correram até ela, mas quando tentaram ajudá-la a se levantar, seu grito ficou mais alto, como se apenas se mover fosse doloroso.
— Minhas costas! — Ela não conseguia parar de gritar. — Faz parar! Tá doendo! ALGUÉM ME AJUDA!
— O quê…? — A pequena Catherine estava em choque. — Eu não…
Murmúrios vinham da arquibancada, falando da menina. Depois disso, o ambiente mudou novamente. Estavam agora em um hospital. Catherine estava sentada em um banco junto de Ashely e Ruby, enquanto Emília discutia com outra mulher, a mãe de Nancy.
— Eu sinto muito.
A mulher não respondeu. Apenas estendeu a mão e deu um tapa no rosto de Emília. A marca vermelho ficou à mostra.
— Sinto muito!? Você ainda tem a cara de pau de vir até aqui e dizer que sente muito!? Minha filha vai passar o resto da vida numa cadeira de rodas porque aquela garota — apontou para Yohane —, não conseguiu aguentar uma ou duas provocações. Por que você não controlou esse animal que você cria dentro de casa?!
Emília se sentia culpada, mas o soco que deu na boca da mãe de Nancy foi dado quase que inconscientemente. Ninguém tinha o direito de falar de sua filha daquela forma.
— Provocações? A Nancy humilhou e bateu na minha filha desde que ela entrou na escola. E ela aguentou tudo isso com um sorriso no rosto por que eu pedi para ela não revidar, por que não queria que ela se rebaixasse ao nível de vocês! Eu não desejava o mal para sua filha, e peço perdão pelo que houve, mas se a Nancy não tivesse uma megera como mãe, talvez as duas até pudessem ser amigas, e nada disso teria acontecido. Pode despejar toda a sua raiva em mim e, se precisar de alguma coisa, qualquer coisa, eu estarei aqui para ajudar. Mas lave a sua boca pra falar da minha filha.
Enquanto isso, Ashley e Ruby observavam a situação enquanto tentavam consolar Catherine.
— Uau, tô vendo de quem a Cat puxou esse lado durão — disse Ashley.
— Ela não deveria me defender. A mãe da Nancy tá certa, eu sou um animal que devia estar numa jaula. Eu quebrei as costas da Nancy, ela poderia ter morrido.
— Ei, não fala isso, Cat! — Ruby falou, de um jeito agressivo. — Você não tem culpa do que houve. Deve ter alguma explicação pra tudo… a gente só não sabe ainda.
— E eu até acho estranho você sentir pena da Nancy. Foi horrível o que houve, mas ninguém pode dizer que ela não mereceu.
— Ninguém merece esse sofrimento. Nem uma pessoa horrível como ela. — Catherine e Yohane disseram ao mesmo tempo, enquanto o pássaro de fogo observava em silêncio.
— Mesmo a Nancy tendo sido maldosa comigo por anos, eu não queria aquilo pra ela. Pessoas ruins devem aprender uma lição, mas não daquele jeito. A Nancy saiu da escola e, quando terminamos o semestre, eu me mudei para White Valley.
— Então você fugiu?
— Seria impossível não fugir quando o mundo te considerava um monstro. Mas eles estavam certos. Anos depois, quando entrei no ensino médio, me tornei a valentona mais temida da escola. Mas diferente da Nancy, eu não humilhava pessoas mais fracas. Eu espancava pessoas que faziam isso. Naqueles quatro anos, eu quebrei o nariz de quarenta e cinco garotos e dezenove garotas, e eu nunca sequer fui punida por isso, porque eu consegui um anjo cruel pra me proteger.
O ambiente mudou novamente, para o portão de uma escola, ao entardecer. Era White Horse, o antigo colégio de Yohane. Na frente do portão, estavam duas garotas. Uma versão adolescente de Yohane, e outra menina de cabelos acobreados e olhos cor de jade. Ela vestia roupas brancas e tinha uma postura madura, que não a fazia aparentar ser tão jovem.
— Eu soube que você quebrou o dente do Dylan hoje — disse calmamente a menina de roupas brancas.
— Não sei do que você tá falando, princesa. Ele tinha escorregado, eu só ajudei o rosto dele a chegar mais rápido no chão. — Diferente de Amarillo, o sotaque texano de Yohane se destacava naquela escola. Coisa que mudou conforme os anos se passavam.
— Interessante.
— O que você quer? Vai dizer pra me comportar, caso contrário vai me dedurar pros professores?
— Ah, eu não estou aqui por isso, Yohane. Na verdade, eu vim te agradecer.
— Hein?
— Estávamos tendo problemas com Dylan ha meses, o modo como ele agia e tratava os outros estava começando a se tornar um problema. Agora, com a sua interferência, ele deve ficar sobre controle. Apanhar de uma garota tão pequena deve ter doído mais do que perder os dentes. Os meninos são tão orgulhosos.
— Saquei. De nada, então. — Ela se virou para ir embora, mas a garota a chamou.
— Eu tenho uma proposta para te fazer. É algo que pode beneficiar nós duas.
Yohane parou e olhou para trás, por cima do ombro.
— Sabe, tenho estado de olho em você nos últimos meses — falou com um sorriso. — Quem acha que tem acobertado o seu… hobby?
— Sempre estranhei nunca ter sido chamada na sala dos professores. Por que a moça-maravilha faria isso por uma caipira como eu?
— Ora, por que eu fiquei muito interessada. Você é como uma justiceira. Cuida dos mais fracos e pune os maldosos. Um amigo meu disse que se você vestisse uma camiseta de caveira, viraria um personagem de quadrinhos.
— Chega de papo furado, princesa. O que você quer de mim?
— Quero que você entre na minha chapa do Grêmio Estudantil, como minha Vice.
— O quê? Você bateu a cabeça em algum lugar? Metade da escola já me odeia, você só vai destruir suas chances de vencer.
— E é aí que você se engana. A escola me ama, a maioria vai votar em mim. Mas óbvio, existem alguns que me odeiam, me acham uma vadia rica. E é por isso, com o medo dessas pessoas por você, que elas também votarão em mim.
— Eu não tô a fim de ser carrasco de ninguém.
— Pensa comigo, com a minha influência, você pode continuar defendendo as crianças mais fracas daqui sem se preocupar com nenhuma interferência dos professores. Eu sei que você tem um coração bondoso, Yohane. E, pra mim, seus métodos são mais do que justos.
Yohane levantou a sobrancelha, intrigada com a proposta.
— Eu vou pensar no teu caso. Qual é seu nome, mesmo?
— Carolyn. Carolyn White.
A Yohane que observava suas memórias cruzou os braços.
— Naquele dia eu quis socar os dentes perfeitos dela, mas Carol acabou se tornando minha única amiga. Minha segunda irmã.
— Ela é estranhamente familiar. Mas o que isso tem a ver com o trauma que você deve reviver nesse labirinto?
— Carol me ajudou a superar toda a situação da Nancy. Só que ela morreu por minha culpa.
— O quê?
O cenário mudou novamente. Estavam na biblioteca, final do dia. O clima estava tenso, mal conseguiam iniciar a conversa. Aquela memória era de um ano e meio atrás.
— Eu não sei o que fazer, Jô — disse Carol, angustiada. — Depois do que houve nas últimas semanas, sinto que tenho a obrigação de ajudar a Detetive Parker, mas estou morrendo de medo.
— E pensar que você é a mesma garota fria e calculista de uns anos atrás — disse Yohane. — Olha, eu sei que aconteceu muita merda em pouquíssimo tempo, mas escuta alguém que tá acostumada a se culpar pelas coisas: pega leve consigo mesma, nada que aconteceu recentemente foi culpa sua. E, claro, se você pode ajudar a Detetive, por que não fazer isso? Talvez até faça você se sentir melhor.
— Então você acha que eu devo ir?
— Acho. E quando voltar, a gente pode sair e beber até desmaiar, que tal?
— E ela nunca mais voltou — disse a Yohane observadora, com lágrimas no rosto sem expressão. — Eu a fiz ir ajudar, e ela morreu por causa disso. Se eu não fosse tão careta e tivesse dito pra ela não se arriscar sem motivo, ela poderia estar viva hoje.
— Yohane, você acha mesmo que teve alguma fração de culpa pelo que houve com sua amiga?
— Eu que convenci ela a ir, como eu poderia não ser a culpada?
— Você não a convenceu a ir. Você apenas deu sua opinião, coisa que ela pediu. A decisão sobre ir ou não foi exclusivamente dela. Você não tem motivo para se martirizar assim.
Mesmo que não quisesse, Yohane tinha que aceitar que aquele pássaro ancestral estava certo. Carol pediu um conselho, mas Pride nunca obrigou sua amiga a fazer nada. Ela foi pois achou que seria o certo a ser feito, e não há nada de errado. O infortúnio foi apenas falta de sorte…
— Minhas mãos estão limpas? — perguntou a ruiva.
— Limpas como água cristalina.
A garota respirou fundo e tentou aceitar aquilo. Demoraria para processar tudo, mas o primeiro passo foi dado. Yohane finalmente tinha entendido que nunca teve culpa alguma pelo assassinato de Carolyn White. Quando soltou o ar, sentiu seu corpo mais leve e, assim que abriu os olhos, todo o ambiente se retorceu, voltando a ser apenas um corredor de pedras. A única luz emitida era pelo pássaro feito de fogo.
— Saímos. Quem diria que funcionaria — disse a jovem.
— Mas não se acomode com isso. Você ainda tem que trabalhar esse sentimento para superá-lo por completo.
— Obrigada… Como eu devo te chamar, a partir de agora? Não tô a fim de ficar te chamando de Fênix.
— Parece que, querendo ou não, teremos mesmo que trabalhar juntas. Então, pode me chamar pelo meu nome: Nikéia.
Yohane estranhou. Aquele nome parecia mais egípcio do que grego. Mas antes que pudesse fazer o comentário, um grito ressoou através das paredes de pedra. Um grito que misturava ira e angústia. Definitivamente era Magda.
Sem pensar duas vezes, Jô correu em direção ao som, seguida por Nikéia, que batia suas pequenas asas, iluminando o caminho à frente.
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