O Retorno da Gula Coreana

Tradução: Teverrr

Revisão: Melo


Volume 2

Capítulo 56: Acalmando Uma Alma (1)

Assim como Samuel suspeitava, a tumba não estava escondida. Na verdade, quase haviam passado pela colina em que ela se encontrava, já que tal construção havia se fundido com a natureza devido ao longo tempo em que permaneceu intocada. Porém, as quatro passagens e as barras de ferro que acharam no entorno revelaram que as suposições do líder da expedição estavam corretas.

— Toda essa área é meio estranha. — Logo após dizer essas palavras, todas as atenções foram voltadas para Ian.

Como um dos responsáveis por possibilitar a expedição para a Floresta da Negação, tudo dito pelo Mago era muito importante. Além disso, tinha o fato de que o mestre se importava muito com a vida de todos ali, já que queria recuar logo depois de ter descoberto que estavam cercados por Lioners.

Ahh, eu não quis dizer estranha de um jeito ruim. Relaxem — completou, balançando uma das mãos e tranquilizando os outros membros. — Hmm, eu não consigo explicar muito bem o que sinto. — Parou um pouco e tentou reorganizar os pensamentos. — Eu tenho a impressão de que a minha mente e o meu peito ficam mais aliviados à medida que nos aproximamos. Parece que os efeitos da floresta diminuem a cada passo dado em direção à tumba. Não. Parece que toda a magia a cerca e ela é como se fosse o ponto morto.

Paraíso era um mundo em que o instinto não valia muito. Portanto, as pessoas preferiam que a verdade fosse explicada a partir de partes tangíveis de alguma informação ao invés de meras pressuposições, especialmente os Arqueiros, que eram proibidos de falar baseados apenas em simples sensações. No entanto, Ian era um Mago. Claro, Magos também tentavam buscar uma explicação lógica, mas, diferente dos Arqueiros, eles não eram proibidos de falarem a partir de presunções.

Sem contar que Ian também era um terráqueo famoso pelo próprio conhecimento. Ele nunca falaria algo sem motivo em uma situação assim.

— Depois que descobri a existência dessa tumba dentro da Floresta da Negação, eu comecei a teorizar que ela podia ser a responsável por todos os desastres que acontecem aqui. Pensei que os imensos ressentimentos do morto haviam se transformado em uma maldição que envolvia toda essa terra.

— Mas você disse que não era uma maldição, e sim um feitiço.

— Exato, Samuel. E, por acaso, você sabe quem está enterrado nessa tumba?

Samuel fez que não com a cabeça.

— De acordo com os manuscritos da biblioteca real, seria a última filha de uma família real, que costumava ser bastante aclamada antes de perder a influência. Essa filha até mesmo foi escolhida como uma santa após a morte.

— Uma santa?

— Deixe-me corrigi-lo em algo primeiro. O significado de santidade daquela época é bem diferente do que estamos acostumados. É como se fosse mais um gesto simbólico do que qualquer outra coisa. — Ian limpou a garganta com uma tosse e continuou a explicação. — Este é um conto de muitos séculos atrás. A dona dessa tumba foi vítima de um casamento arranjado para fins políticos. Lógico, casamentos assim eram comuns naquela época, mas o problema era em quem seria o seu marido.

— Ele a violentou e abusou? — perguntou Hugo.

— Não temos relatos sobre violência. A única coisa que sabemos é que ele foi infectado por alguma doença fatal e estava prestes a morrer.

— E por que alguém mandaria a própria filha para casar com alguém assim?

— Por quê? Porque tinham um acordo. Não é óbvio o motivo de uma decadente família nobre prometer a sua última filha para alguém como se estivessem a vendendo?

As expressões do Guerreiro demonstravam o quão confuso ele estava.

— Por outro lado, a família do marido, planejava ganhar muito com tal evento. Mesmo que fossem recusados.

— Por acaso, o marido era filho único? — indagou Seol Jihu, que ouvia a história em silêncio até então. Ao ouvir a pergunta, os olhos de Ian se arregalaram e ele deu um sorriso.

— Exato. Quando o seu único filho estava prestes a morrer, a família correu em busca de algum jeito para conseguirem um novo herdeiro. Esse era o único jeito da linhagem continuar.

Ah…

— E então, eles prosseguiram com a cerimônia, mas… — A voz de Ian parecia melancólica. — Por coincidência, o noivo acabou morrendo logo após o final do casamento. Ele morreu até mesmo antes de conseguir continuar a linhagem.

— Uma coincidência bastante cruel.

— O destino dessa mulher não foi muito bom. Porém, a partir desse momento, o conto diverge muito entre os relatos oficiais e os não oficiais. A história oficial é bem curta. Mesmo não conseguindo passar a noite de núpcias juntos, a noiva se voluntariou para permanecer ao lado do noivo até a morte. O Império todo aplaudiu esse desejo de castidade e integridade e a transformou em uma santa para que pudesse servir de exemplo para os outros.

— Q-Que porra? Eles a enterraram viva?! — perguntou Hugo, com uma expressão confusa.

— Tecnicamente sim.

— Bando de retardado! Por que fariam isso?

— Você não devia tentar entender a mentalidade daquela era com conceitos do presente. O título de santa devia ser utilizado em situações assim no passado.

— Mesmo assim!

— Hugo, eu concordo que foi algo desumano. Porém, a nossa própria história na Terra é tão cheia de crueldade quanto essa. O que as pessoas do Paraíso iriam pensar quando descobrissem sobre os costumes antigos de povos terráqueos ofereceriam sacrifícios humanos? — O tom de voz de Ian era muito sério.

Entendendo a gravidade da situação, o Guerreiro permaneceu em silêncio.

— Agora, a história não oficial é completamente diferente. É o oposto, na verdade. A noiva se recusou a ser trancada na tumba, mas a família do noivo a forçou. Assim, ela resistiu até o final enquanto gritava xingava e proferia maldições repletas de ressentimento e ódio.

— A família dessa mulher não fez nada? — perguntou Seol Jihu.

— Parece que não. Apesar de ser apenas um gesto simbólico, naquela época, ter uma santa na família era algo digno de muito orgulho. — Após responder a pergunta, o Mago continuou a falar. — Como eu disse antes, eu presumi que os efeitos da floresta eram devido às maldições da noiva. Porém, apenas parte dos meus pensamentos estavam corretos. Sem dúvidas, os ressentimentos dela influenciaram, mas as famílias reais também foram bem cuidadosas.

— Cuidadosas?

— A história oficial não possui nenhum relato sobre esse evento, mas as não oficiais possuem um parágrafo a mais na história. Três meses depois, o renomado sábio do Império, um outro Mago, veio para a floresta em que o noivo e a noiva estavam descansando juntos por convite das duas famílias.

Percebendo como seria o desenrolar, o Marca de Ouro soltou um suspiro.

— Após muito tempo, eu acho que posso dizer o que acho que aconteceu. Acredito que os efeitos da Floresta da Negação sejam, na verdade, uma magia defensiva feita pelo sábio. Um feitiço eterno que protegeria as duas famílias do ressentimento da noiva. — Em seguida, Ian deu de ombros. — Se aquele sábio estiver tentando negar todos os ressentimentos da noiva e procurou a ajudar para que ela atingisse o “nirvana, preciso reconhecer o quão bem pensado tal magia é. Claro, não posso ter 100% de certeza. Isso sempre será uma teoria até que seja comprovada, mas mesmo assim…

Após alguns segundos, o Mago voltou a falar, mas com uma voz mais baixa.

— Não se esqueçam. Mesmo que apenas metade da minha teoria esteja certa, então… — Ele ficou ainda mais sério após encarar o caixão. — O local mais perigoso de toda a Floresta da Negação é dentro daquela tumba.

Seol Jihu chegou a esfregar os braços devido ao calafrio que aquelas palavras lhe causaram.

— Acho que vamos descobrir — disse Dylan, após ouvir toda a história sem falar nada. — Eu não irei suprimir as minhas emoções aqui. Se os efeitos da floresta não se manifestarem depois de um tempo, uma de suas teorias estará correta, mestre Ian.

— Vamos tentar. Mas tenha cuidado — falou, balançando a cabeça.

 

***

 

Passaram um bom tempo próximo da tumba, mas os efeitos da Floresta da Negação aparentemente não os atingiu. Se fosse apenas uma pessoa, tal fato poderia ser considerado uma coincidência, mas, com o grupo todo, era bem provável que uma das teorias de Ian tinham sido confirmadas.

Era interessante terem conseguido obter um pouco mais de conhecimento da situação, mas pelo que o Mago tinha dito, ainda não deviam comemorar. A magia que cobria todo aquele local parecia ser mesmo para proteção, mas qual era a real força de todo o ressentimento guardado no interior da tumba?

“Nada é fácil, né.”

Seol Jihu podia apenas lamentar. Tinha pensado que, apesar de ser chamada de expedição, a experiência não devia ser tão diferente de tudo que havia encarado até então. Tinha apenas avançado um pouco em níveis de dificuldade, matando alguns monstros e encontrando algumas ruínas históricas. Pelo menos era o que tinha em mente.

No entanto, a diferença entre o que idealizou e o que realmente aconteceu era imensa. Será que podia chamar aquilo tudo de azar? Logo após derrotarem os Lioners, já estavam de frente a um perigo ainda maior. Claro, nada ainda havia acontecido, mas mesmo assim…

Ativou o “Nove Olhos” e começou a morder o lábio inferior. A tumba era o único local ao redor que emanava um brilho negro. Após ter recuperado essa habilidade, aquela era a segunda vez em que via tal cor — “Escape Imediatamente”.

— Isso não pode estar certo — falou Samuel, franzindo o cenho e se aproximando da entrada da tumba com Chohong o acompanhando.

— O que não pode estar certo?

— A entrada.

— O que que tem a entrada?

— Eu estou vendo alguns rastros.

— Sério? Que tipo de rastros?! — perguntou Chohong, já um pouco irritada.

— Parece que o time do Kahn também descobriu essa tumba — respondeu o Explorador, estalando os lábios e um pouco atônito.

— Oi?

— Tenho certeza. Os rastros são iguais aos que encontramos no caminho pra cá.

— Espera aí. Espera. — A Guerreira Divina chamou os outros membros da expedição e, quanto todos se aproximaram, Samuel começou a explicação.

— Os rastros deles entrando e saindo ainda são visíveis a olho nu. Porém, há uma diferença grande entre os dois. Quando saíram, eles pareciam estar com muita pressa, é como se estivessem sendo perseguidos. Parece que eles escaparam e se dividiram.

— Estranho — disse, Dylan, um pouco confuso com toda a situação. — Se eu não estiver enganado, o líder dos Lioners estava com a arma do Kahn, né? — Ele estava certo. Afinal, todos os armamentos coletados após a batalha estavam nas mochilas dos carregadores. — Porém, o time do Kahn achou a tumba, entrou, foi perseguido e se separaram para escapar. Então eles não foram mortos pelos Lioners?

— Eu não sei. É possível que eles tenham sido mortos um por um, mas eu não consigo descobrir. Alguma coisa não está certa. Está faltando informação. — Repleto de incertezas na mente, o Explorador começou a massagear a própria testa. Em seguida, soltou um grunhido e murmurou que não conseguiria fazer nada. — Não vamos conseguir descobrir nada parados aqui. Vamos entrar e ver se achamos alguma coisa.

Dylan não parecia muito convencido, mas também não discordou da ideia. Como tinham apenas uma quantidade limitada de informações, o único jeito de conseguir descobrir mais sobre o ocorrido era se arriscando.

— Parece que vamos ter que mudar a formação. Chohong e Hugo devem ficar na frente…

— Espera — interrompeu Seol Jihu, levantando uma das mãos. A opinião do líder da exploração era entrar na tumba primeiro e descobrir o resto depois, mas isso não podia acontecer.

— Seol? O que foi? — Mesmo sendo interrompido, Samuel não pareceu irritado.

— Não podemos ir.

— Não podemos?

Uhmm, essa tumba é de onde o feitiço ancestral está vindo, não é? — disse, sentindo vários olhares voltados para si.

— Sim.

— E não é só isso, é uma tumba na qual uma mulher cheia de ressentimentos foi enterrada viva. Se entrarmos e tentarmos roubar os itens que estão ali, ela não ficaria irritada?

O raciocínio do jovem fazia sentido, mas poderia ser facilmente refutado.

— Você está dizendo que não devemos pilhar a tumba por obrigação moral?

Estava perdido, pois não sabia o que responder. Queria impedi-los de entrar, mas até mesmo da sua perspectiva, o argumento que deu era, no mínimo, inconsistente. Pilhar a tumba não era o objetivo daquela expedição? Se não concordasse com isso, não era nem para ter aceitado participar.

— Não é isso que eu quis dizer…

Contudo, toda essa situação não significava que podia revelar a existência da habilidade “Nove Olhos”.

— Não é? Está tudo bem, pode falar. Você também é um membro da expedição.

A única razão para estarem escutando o que tinha a dizer, era porque ele tinha um mérito enorme devido à batalha contra os Lioners. Porém, se quisesse mudar a opinião do líder da expedição, precisaria de uma argumentação muito boa.

“O que eu faço?”

Pensou por um tempo até que se lembrou da existência de um certo item que tinha.

— Me dê dez minutos. Não, cinco. Quero tentar algo antes.

— Cinco minutos é tranquilo, mas o que você está tentando fazer?

Ao invés de responder, Seol Jihu abriu a mochila que carregava nas costas. Não carregava mais a bagagem, mas sempre fazia questão de ter a sua bolsa consigo.

— Mestre Ian, se importa em me dar um pedaço de papel que você não vai usar?

Hm? Toma.

Quando o Marca de Ouro fez o pedido enquanto mexia na mochila, o Mago apenas estendeu a mão com o pedaço de papel, mas sempre muito curioso para descobrir o que aquele Guerreiro Nível 1 poderia fazer.

— Achei. — Segundos depois, Seol Jihu estava segurando uma caneta de pena.

Hã?

— Isso, isso aí! Ei, você conseguiu isso no Tutorial? — perguntou Grace, apontando para o item e gritando.

— Sim. Como descobriu?

— Eu também consegui uma na caça ao tesouro. É um item ESPECIAL, não é?

— É sim.

— Nooossa, já faz muito tempo desde que vi um desses pela última vez. — Como Grace parecia bastante surpresa, Chohong decidiu perguntar.

— E o que esse negócio faz?

Ah, o nome é Caneta de Pena Consciente. Se tiver sorte, você consegue uma dessas pela máquina de itens. Custava 300 moedas na minha época.

— E o que ela faz?

Hm. Resumindo, ela é capaz de converter a consciência do alvo em palavras.

— E como se usa? — O rosto da Guerreira Divina demonstrava o quão confusa ela estava.

— Eu usei uma logo depois de entrar na Zona Neutra. Tinha um cara no Tutorial que ficava me olhando, então eu estava muito curiosa.

Ah, é? E o que aconteceu?

— O que eu esperava, sabe? Nem fiquei surpresa. “Uma gostosa”, “quero dar uns tapas naquela bunda”, “vou foder com ela até o cu fazer bico”, “será que eu tento dar em cima”, etc, etc…

Quando Grace respondeu, Samuel começou a tossir. Chohong apenas sorriu. 

Hahaha. Que alívio. Você descobriu antes que ele fizesse alguma coisa com você.

— Pior que não — disse a Guerreira de Escudo, negando com a cabeça.

— Oi? Você não mandou ele ir a merda depois disso?

— Eu apenas aproveitei a situação e deixei ele tirar vantagem. — Depois de se explicar, como se aquilo fosse a coisa mais natural do mundo, Chohong e Hugo ficaram encarando surpresos. — Por que estão me olhando assim? Foi uma escolha minha. Respeitem.

— Pare de mentir!!! — De repente, Samuel gritou com raiva. — Foi você quem tirou vantagem de mim, não o contrário!! Eu estava dormindo, mas você chegou e subiu em cima da minha cama, e então…!!

— Mas o que a caneta de pena escreveu estava errado?

Tsc. — O Explorador deu de ombros, fazendo com que Grace desse uma leve risada.

— Muito burro. É por isso que você devia ter dado em cima de mim quando teve a chance. Eu te dei várias dicas, mas você ficou muito indeciso, sabe? É por isso que eu tive que…

— Como você usou a caneta de pena dessa vez? — indagou Seol Jihu.

Com a pergunta, Samuel passou a prestar mais atenção e Grace deu língua para o líder da expedição. Tentando acalmar um pouco o clima entre os dois, Dylan se aproximou.

— Eu acho que eu amarrei o cabelo do Samuel em volta da caneta? Ele tinha cabelo comprido desde aquela época, então conseguir um fio não foi tão difícil.

“Um fio?”

O jovem olhou o entorno e viu um pouco de grama alta crescendo próximas à tumba.

“Será que eu posso considerá-las parte da tumba?”

Decidiu tentar. Pegou um pouco da vegetação e a amarrou em volta do item. Em seguida, colocou a folha em cima do pedaço de papel, fazendo com que a caneta de pena começasse a vibrar.

— Usar a Caneta de Pena Consciente para descobrir o que a tumba está “pensando”. Huhuh. Que cara interessante — afirmou Ian, demonstrando admiração e olhando para baixo no intuito de ver o que acontecia. Não apenas ele, mas todos os outros membros da exploração também começaram a encarar aqueles itens.

Foi então que aconteceu.

Ninguém tocou na caneta, mas, mesmo assim, ela se levantou. Em seguida, começou a se mover, formando letras, fazendo com que todos se aproximassem ainda mais para ver o que estava escrito.

“Vejamos.”

Pouco tempo depois.

O rosto de Seol Jihu congelou após ler o primeiro parágrafo.

Escreve, escreve, escreve, escreve.

 

Mais vieram matar todos eles matar matar hehehe devo matar quero matar, hehehehe.

Não é justo estou com raiva estou aborrecida repleta de ódio malditos eu culpo todos vocês eu os amaldiçoou

Quero rasgá-los ao meio e puxar os seus olhos até que eles saiam da órbita matar matar!

Sim entrem aqui e eu vou matar matar matar kekeke matar hehehee!

 

Escreve, escreve, escreve, escreve, escreve.                 



Comentários