Volume 1

Capítulo 9: Um Problema Pessoal

Havia mais de um motivo para eu ter me tornado o representante da Angelica naquele duelo. Mas o principal deles era o ódio que tinha dos cinco personagens namoráveis desde que fui forçado a conquistá-los quando minha irmã me fez jogar aquele otomege.

A indignação que senti ao ouvi-los dizer aquelas frases melosas de novo e de novo ressurgia na minha mente sussurrando: “Dá um pau neles.”

Uma equipe de limpeza retirou as partes quebras do robô espalhadas por toda a arena e a caixa que trouxe o Arroganz para que não houvesse empecilhos nas próximas lutas.

Enquanto eu esperava meu próximo oponente no centro do ringue, percebi que tinha algo estranho acontecendo com o grupinho do príncipe. Usei o microfone do Arroganz para tentar ouvir sobre o que estavam falando.

— Eu vou agora. Sei muito bem que o Brad nunca foi grande coisa, mas aquela Armadura não é brincadeira. Vai ser difícil demais pra vocês — disse Greg.

Chris ficou irritado ao ouviu isso. — Está mesmo insinuando que eu sou inferior a você?

O príncipe olhou para a minha direção. — Essa Armadura deve vir da dungeon que o Bartfort conquistou. Agora consigo entender de onde vem toda aquela confiança.

Jilk seguiu o olhar do Julius. — Acredito que seja um item perdido. Mas, ainda assim, nunca ouvi falar de um tão poderoso antes. Parece ser mais focado em força do que velocidade.

A plateia continuou sussurrando depois da derrota inesperada do Brad. A maioria dos alunos tinha certeza de que eu iria perder e que o grupinho do príncipe sairia intacto. E muitos colocaram enormes quantias em jogo por conta disso. Meu microfone externo também conseguiu captar alguns de seus comentários.

— Bem, não teria graça se a partida acabasse tão rápido.

— É, você tem razão. Mas ele não deve conseguir ter tanta sorte no próximo round.

Eles ainda acreditavam que tudo acabaria bem.

Depois de analisar os dados recolhidos na última luta, Luxion falou: —  Já terminei de implementar contramedidas para a próxima vez que encontrarmos um oponente que usa lanças.

— Valeu aí. Ah, olha só, parece que o próximo é o Greg.

Após entrar em seu robô vermelho, ele começou a caminhar para o centro da arena segurando uma imensa lança em mãos.

Luxion começou a analisar o nosso novo oponente. — Essa Armadura não podia estar pior. Várias áreas foram reparadas diversas vezes. E o enorme número de arranhões e amassados mostra que ela já passou por diversas batalhas.

— Isso mesmo, esse cara é bem forte.

Greg Fou Seberg era o aventureiro mais experiente dos cinco, assim como sua aparência grosseira sugeria. Ser do tipo que prefere treinar em campos de batalhas reais acabou o deixando muito forte. Algo que havia me ajudado muito durante os combates do jogo.

Ele apontou a lança para a minha direção. — Seu nome era Bartfort, não? Vou me lembrar dele. Mas não fique se achando tanto. Por mais que esse item perdido seja forte, ele continua sendo apenas um objeto. Não é o seu próprio poder.

Greg estava certíssimo. Quase bati palmas ao ouvir aquelas palavras. Não tinha como eu refutar aquilo.

— Mas, e daí? — perguntei. — Pensando bem, aconteceu a mesma coisa durante a festa, parece que você não consegue parar de falar. Se quer alguém para conversar tanto assim, por que não me convida para um chá da próxima vez?

A provocação teve efeito instantâneo.

— Eu vou acabar com você!

O juiz gritou: — Comecem!

Greg cortava o ar com sua lança enquanto diminuía a distância entre nós. Já que tinha visto a última luta, ele devia estar tentando evitar que eu tomasse a iniciativa.

—  Vamo, se mexe! — provocou. — O que aconteceu com toda aquela pose de antes?! Vai só ficar parado ai apanhando?!

Ele balançava sua arma, enviados golpes por todas as direções tentando acertar o Arroganz, no entanto, cada um deles era bloqueado pela minha pá. Então metal continuava a se chocava contra metal, enviados inúmeras faíscas pelo ar que, quando combinadas com o brilho da lança, pareciam fazer a arena brilhar.  

— Você é bem forte — elogiei, falando o que pensava. — E até que é corajoso também. Só tem um problema em tudo isso... Você tem que cuidar mais do seu equipamento!

Empurrei a lança para o lado usando minha pá, usando a força superior da minha Armadura pesada para fazê-lo perder o equilíbrio.

Greg começou a voar para tentar tomar distância — aqueles robôs eram feitos para combates aéreos, depois de tudo — contudo, agarrei seu pé no meio do ar com minha mão esquerda.

— D-desgracado! — bradou Greg, que então atacou o braço do Arroganz com sua lança. No entanto ela não conseguiu fazer nem um arranhão, e meu aperto continuava firme.

A habilidade desse cara era impressionante, contudo, assim como no jogo, ele nunca teve interessem em melhorar seu equipamento. Pensava que apenas guerreiros de segunda categoria se preocupavam com as tecnologias mais recentes. E como resultado, a Armadura que estava usando naquele dia era um modelo antigo e produzido em massa, coberta por uma camada escandalosa de tinta vermelha.

Dei de cara com dezenas de Game Overs por causa desse problema.

Coloquei mais pressão no aperto até esmagar o tornozelo do robô. Isso não afetaria sua perna real, mas várias garotas na plateia ainda gritaram aterrorizadas ao ver a cena. O trouxe para mais perto e empalei o capacete usando minha pá, e logo em seguida comecei a destruir um dos braços usando a mão que estava livre.

— Qual é o problema? Vai logo, porque não sai correndo!? — Comecei a destruir o outro braço enquanto o provocava.

— Merda! É melhor você me soltar logo!

Deixei o robô dele em pedaços, tomando cuidado para não acabar machucando seu corpo no processo. Arranquei um dos braços do robô e joguei para longe, deixando o braço real desprotegido. Então usei o peso Arroganz, que tinha o dobro do tamanho dos mechas normais, para prendê-lo no chão.

— ‘Tá se divertindo por acaso!? — O vermelhinho gritou. — Você não é homem de verdade! Um cavaleiro iria lutar de forma justa! É só por causa desse robô que você ‘tá conseguindo vencer!

— Um cavaleiro? — suspirei. — Eu não sou um cavaleiro. Pelo menos não ainda. E você perdeu por que sua Armadura é esse ferro velho. Talvez se tivesse se preparado de verdade, ou melhor, se tivesse me levado a sério, para começo de conversa, você não estaria aí fazendo birra. Mas pensa pelo lado positivo, pelo menos você tem uma desculpinha por não ter vencido, não é? É só sair falando para todo mundo: “só perdi porque a Armadura dele era muito mais forte que a minha!”

Arranquei a escotilha que ficava no peito, expondo o seu rosto. O Greg estava se contorcendo de raiva e desespero enquanto o Arroganz continuava fazendo o robô avermelhado ficar em pedaços. Se estivesse no lugar dele, acho que ficaria traumatizado.

Bem, mas não é como se eu fosse parar por causa disso.

E então, o Greg se arrastou para fora daquele robô inútil e pegou um dos pedaços que cairão no chão. — Ainda não perdi! Vou continuar lutando até o meu último suspiro!

Tanta coragem e forca de vontade me fez sentir que era melhor parar por ali... Nah. Ele só parecia mais idiota falando aquilo

— Não precisa gritar, é fácil de perceber. — Eu disse. — Mas tem um problema...

— Chega de conversa, pode vir! — Ele balançou o pedaço de Armadura em minha direção, porém nem me dei ao trabalho de me defender. Aquilo não conseguir nem fazer cosquinha no Arroganz.

— Diferente de você, eu não gosto de ficar abusando dos mais fracos.

O Greg congelou. — D-do que...? O que você quer dizer com isso!?

— Eu disse que não gosto de ficar atormentado aqueles que não podem revidar, diferente de você e seus amiguinhos. Você é surdo por acaso?

— Para de inventar história! — berrou o vermelhinho. — A gente nunca fez esse tipo de coisa!

Hahahaha! — Não consegui segurar a risada ao ouvir aquilo. — Nossa, como é cara de pau. Teve a coragem vir aqui naquele pedaço de sucata, acreditando que era melhor que todo mundo. Mas me subestimou demais. Você não tem nada de especial, Greg, tem muita gente mais forte por aí. Eu também não sou um dos melhores, mas ver você agindo como se fosse o bonzão quando aceitamos o duelo me fez pensar que isso seria uma luta decente, mas olha essa situação. Você não vale nada. É só um zé ninguém. E sabe o que mais? Não me sinto bem quando fico abusando de um fracassado, então quero acabar com essa luta de uma vez. Mas sei que você não entende essa lógica.

Escolhi a forma mais gentil de esfregar na cara dele as palavras: Você é fraco.

 “Oh, como sou bondoso. ”

Graaaaah! — Ele se jogou na minha direção, tentando atacar, no entanto, ao invés de parecer corajoso, isso só o fazia cada vez mais patético. O oponente entrou no ringue dizendo a todos que eu era um fracote, que não merecia o seu tempo, só para ser tratado da mesma forma ao perder. Ver uma situação tão trágica que fazia meu coração doer.

Nah, não senti nada vendo aquilo. Meu coração estava ótimo. Esses caras precisavam aprender o lugar deles.

Não conseguindo mais olhar aquela situação, o juiz decidiu intervir, sua voz era baixa e compassiva. — O vencedor é Leon Fou Bartfort! Greg Fou Seberg, peço que se retire do ringue. Àqueles que estão assistindo, por favor, uma salva de palmas para os competidores!

Greg caiu de joelhos no chão. E um som fraco de aplausos ecoava pela arena.

— Só falta mais três — sussurrei para mim mesmo.

— Que forma cruel de concluir a luta — alegou Luxion. — Uma pessoa normal sentiria receio de pressionar seu oponente contra a parede desse jeito.

— Como se eu ligasse. Eles precisam encarar a realidade. Odeio pessoas que deixam o privilégio subia a cabeça.

— Já se olhou no espelho, mestre?

Entendia o que ele quis dizer — nem precisava ter falado. Contudo ouvir aquilo ainda me deixava puto.

***

A plateia já tinha perdido toda a animação inicial.

— Essa partida foi brutal. Não é assim que cavaleiros devem lutar.

— Idiota, isso é um duelo.

— Dois já foram. Bem, tenho certeza de que o Chris vai vencer de qualquer jeito.

No entanto, a opinião que tinham do Greg havia mudado completamente.

— Parece que ele só sabia falar no final.

— O cara não parava de encher o saco, falando como experiência real era importante, mas olha a facilidade com que ele perdeu.

— Esperava mais dele. Que decepção. Não tenho interesse em homens fracos como ele.

Angelica estava preocupada durante toda a luta, gotas de suor escorriam por suas sobrancelhas. — O Leon está fazendo de tudo para mostrar a diferença de poder entre eles.

Ela não achava que o Greg fosse fraco. O problema era que o Leon e o Arroganz eram fortes demais. Foi simples má sorte que o fez ser derrotado, o robô ser ultrapassado não afetou nada. Mesmo se fosse o modelo mais recente, o resultado continuaria o mesmo.

“Será que existe alguma Armadura no reino que possa derrotar aquela coisa?”

Olivia, por outro lada, estava incomodada. — Estou feliz pelo Leon ter vencido, mas aquilo foi demais. Ele vai ter que pedir desculpa para o Greg depois!

Angelica balançou a cabeça ao ouvir isso. — É melhor não falar nada. Só iria ferir ainda mais o orgulho do Greg — falou com uma voz fraca, enquanto olhava para o chão.

Durante o duelo, o Leon disse que era diferente do príncipe e seus amigos. A Angelica sabia que estava falando sobre como a humilharam na frente de todos durante a festa enquanto não havia ninguém por perto para apoiá-la.

No entanto, não tinha como saber se Leon percebeu o que suas palavras implicavam.

— Então... eu sou fraca, não é? Que patético. Eu só queria... — Essas palavras saiam enquanto ela olhava para o céu.

“Só queria ser forte para o bem do príncipe. ”

***

Após o ringue ser limpo pela segunda vez, aquele que apareceu em uma Armadura azulada foi o Chris. Empunhava uma espada colossal com ambas as mãos, com várias laminas reservas em suas costas. Esse cara não era só um espadachim, ele possuía o título de Mestre, algo que o reino dava apenas para aqueles que possuíam habilidade excepcional, o que os colocava em uma classe acima do resto.

Seu pai era o Santo da Espada, o ranque mais alto para um espadachim, e, desde a infância, ele treinou arduamente o Chris. Graças a isso que ele tinha essa personalidade calma e séria, o que também o fazia ter dificuldade em expressar o que sentia. Porém, enquanto segurasse uma espada, ele era imbatível.

Sempre odiei aquele cara. Além da rota dele ser mais difícil que o normal, o animal não podia usar nada além de espadas, não tinha um único ataque de longa distância, fazendo com que até enviá-lo para o campo de batalha fosse um desafio. Assim como os outros dois, tive que encarar inúmeros Game Overs por conta da fraqueza desse personagem. Só de lembrar dessas memórias já fazia com que todo o ódio que senti na época voltasse.

O robô azul levantou a espada, entrando em posição de combate. — Não vou baixar a guarda como os outros dois. Vou lutar com tudo que tenho desde o começo.

— Sério? Então acho que tenho que fazer o mesmo.

— Então vai finalmente pegar uma arma de verdade? — perguntou Chris, apontando para minha pá. — Esse tipo de ferramenta não tem lugar no campo de batalha!

— E quem é você para decidir isso? — provoquei.

O Juiz deu início ao duelo. — Comecem!

Deixando meu o ódio de lado, não podia negar que o Chris era forte. Diferente dos idiotas que vieram antes, ele não parecia estar me subestimando. Não mostrava nenhuma hesitação enquanto avançava com tudo, pronto para me cortar.

— Luxion, envie os drones.

— Entendido. Despachando os drones.

Comecei a me afastar, mantendo uma distância segura enquanto 8 drones começaram a sair do container nas costas do Arroganz. Eram robôs esféricos, todos equipados com metralhadoras.

— O que!? — Chris gritou surpreso.

— Fogo! — Apertei o gatilho do joystick, e os 8 começaram a atacar a armadura azul.

Chris tentava de tudo para escapar do ataque, contudo já estava cercado e não tinha como correr. A alta cadencia dos robôs destruía suas defesas a cada segundo que passava. Ele tentou atacá-los, sentindo que era iria perder se não fosse para a ofensiva, porém o Luxion fazia os drones desviarem como se não fosse nada. 

— É inútil resistir — disse Luxion.

Quando Chris tentava atacar um, os outros concentravam o fogo em suas costas. Percebendo isso, ele correu para a parede para acabar com o cerco. Uma boa ideia, no entanto, não mudaria o resultado.

— Parece que é xeque mate. Não acha que já é hora de desistir? — Minha pá ficou imóvel no ombro do Arroganz por todo esse tempo.

— Como você pode ficar satisfeito usando esses truques?! — gritou Chris. — Um cavaleiro não deve lutar dessa forma!

Fiquei impressiona pelo quando ele se prendia ao código de cavalaria, mas, sendo sincero, eu não estava nem aí para esse tipo de coisa.

— Isso é tudo que tem a dizer? Isso aqui não é dois cavaleiros treinado juntos. Não importa o quanto tentem embelezar, um duelo continua sendo uma luta até a morte. E vai me dizer que é errado usar armas de fogo? Não concordamos com nenhuma regra que fala isso. Além do mais, sou só eu contra vocês cinco. Acho que se tem um lado que merece um pouco de compaixão é o nosso? Ah, é verdade, quase esqueci. Só tenho que derrotar um do seu lado de cada vez. Então não posso te culpar pela falta de consideração. Mas, mesmo assim, ainda não percebeu a diferença entre nossas Armaduras? Eu ‘tava pensado em ser legal e pegar leve dessa vez, mas, se vai ficar de chorinho porque quer uma luta justa seguindo o código, vou te dar o que você quer.

Chris se jogou na minha direção.

Luxion não perderia essa oportunidade, fez os oito drones começarem a girar ao meu redor enquanto atiravam no nosso oponente. As balas especiais causavam menos dano, para a gente não acabar o matando por acidente, contudo ainda era demais para ele, tendo que usar sua enorme espada como escudo para se manter em pé.

— Pode falar o que quiser — bradou Chris. — Mas ainda não tem como alguém gostar desse tipo de luta!

— Não tem problema, o resultado é o que importa, eu venço e seu grupinho perde. Ninguém ‘tá nem ai para como a gente vai chegar nisso. Mas não se preocupa, vou falar que você deu tudo de si quando a luta acabar. Iria odiar ter que esfregar seu nome na lama dizendo que não deu nem pro cheiro.

Graaaaaah!

A chuva de balas continuava caindo no robô azul que corria sem medo em minha direção, balançando sua espada para todos os lados. Graças a magia e a velocidade do corte, era quase como se uma lamina de luz tivesse caindo em cima de mim.

Levantei a mão esquerda do Arroganz e parei a arma e a esmaguei com meu punho. — Impressionante, acho que isso é o esperado de um Mestre Espadachim.

Fumaça comece a escapar pelas aberturas de seu robô, e o juiz se apressou para terminar o duelo. — A Armadura de Chris Fia Arclight não está em condições de continuar batalhando! O vencedor é... Leon Fou Bartfort!

O juiz perdeu todo entusiasmos quando foi falar meu nome.

De dentro da Armadura do Chris, era possível ouvir um choro baixo. — Por quê? Por que perdi? Ninguém nunca se esfouçou que nem eu. Só queria que meu esforço fosse reconhecido...

A única opção que ele tinha era dar tudo de si, o filho do Santo da Espada não poderia ser medíocre. Eu conseguia entender um pouco esse sentimento, contudo isso não tem nada ver com a situação que estávamos.

— Se quer chorar e reclamar, vai fazer isso no colo da sua namorada. Tenho certeza que ela ficar com peninha de você.

 — Você é mesmo um lixo humano.

Vacilei por um instante ao ouvir isso. Não esperava que as palavras do Luxion fossem doer tanto. Até eu tinha percebido que aquilo era demais.

Porém, aquilo era o melhor a se fazer — eles tinham que perder aqui e agora.

***

Todos na plateia estavam em estado de choque.

— V-vocês ‘tão vendo o que eu ‘tô vendo? O Chris perdeu!

— O que...? Isso não foi justo!

— Ei, Aquele Leon é o cara que limpou uma dungeon sozinho para conseguir o título de barão, não é? Talvez ele seja mesmo bem forte?

— M-mas, mesmo assim. Será que ele vai acabar vencendo esse negócio? Eu apostei tudo que tinha no príncipe!

Alguns dos alunos que estavam certos da vitória do time da Marie começaram a ficar preocupados. E, ao mesmo tempo, aquele que estavam fazendo pouco do Leon não conseguiam mais vê-lo da mesma forma.

Os olhos da Olivia começaram a se encher de lágrimas, como se estivesse prestes a chorar. — Angelica, eu fico feliz que o Leon esteja ganhando, mas não tem motivo para ser cruel desse jeito.

— Não fala besteira — retrucou Angelica. — O Leon pode perder se não estiver pronto para qualquer situação. Ele não está de brincadeira.

— É-é mesmo?

— O Chris vem de um condado especializado na arte da espada. O pai dele é o Santo da Espada, o melhor espadachim do país. E o Chris está apenas uma posição abaixo desse título.

— Isso é incrível. — Olivia parecia genuinamente impressionada.

— Sim, ele é impressionante.

“E, mesmo assim, Chris não teve nenhuma chance contra o Leon. O Jilk deve estar em pânico agora.”

Angelica olhou em direção ao grupo do príncipe. O Jilk e sua Armadura não pareciam estar por lá. Julius parecia tentar acalmar a Marie, que estava pálida após ver a luta. Ver os dois juntos trazia uma dor imensa ao peito de Angelica.

“Sua Alteza...”

***

Enquanto os servos carregavam o corpo do Chris para a enfermaria, o Jilk focava-se nas preparações para o duelo, dando uma ordem atrás da outra para o engenheiro que cuidava de sua Armadura.

— Instale todas as armas que puder. E traga balas magicas e normais para a luta.

Os olhos do mecânico se arregalaram. — Você não devia usar esse tipo de coisa em uma partida!

— Isso é um duelo! — bradou Jilk. Na maior parte do tempo, ele era gentil e bondoso, porém nesse momento, ele estava desesperado. Não era hora de agir com calma.

Um par de assas decorativas faziam seu robô esverdeado passar uma sensação de delicadeza, no entanto, agora também havia um enorme rifle em suas mãos, e a espada que originalmente usava foi substituída por um machado. Fazendo-a parecer pronta para a guerra.

— Remova todos os enfeites e aumente a blindagem — ordenou Jilk. — Prepare algumas granadas também.

O engenheiro parecia preocupado. — Senhor Jilk, não temos tempo para buscar itens que não estão na oficina.

Ele olhou para baixo por um instante, e logo em seguida falou, determinado: — Sem problemas neste caso. Mas use tudo que estiver disponível.

Enquanto o mecânico e seus assistentes trabalhavam, Jilk pensava na batalha que estava por vir. “Tenho que acabar com esse duelo. Mesmo que não possa vencer, tenho que ao menos causar dano o suficiente para pará-lo. Não posso arriscar ferir a reputação do príncipe.”

Julius era tudo na sua vida. Seu melhor amigo, seu irmão (mesmo que não fosse de sangue). Se perdesse aqui, a imagem do príncipe sofreria um dano enorme. Jilk não podia aceitar isso. Faria qualquer coisa para ter certeza de que isso nunca acontecesse.

Com isso em mente, pegou uma das bombas da oficina, sussurrando: — Vou sair para andar um pouco. — Enquanto saia às pressas de lá.

***

— Cara, que canseira.

Tivemos um pequeno intervalo entra as lutas, então fui dar uma passada no banheiro. E, quando voltei, encontrei a Olivia e a Angelica invadindo a sala de espera.

— Leon, onde você estava?! — Olivia gritou.

— Estávamos preocupadas — acrescentou Angelica.

Inclinei a cabeça para o lado. — Hein? Por quê?

Elas olharam uma para a outra.

Olivia falou hesitando: — É... bem, eu ouvi alguém dizer que você não estava se sentindo bem.

Cerrei um pouco os olhos. — Eu? Só fiquei um pouco cansado.

A Angelica levantou as sobrancelhas desconfiada. — Uma mulher que disse ser sua irmã veio nos ver. A Olivia confirmou que era ela mesmo. Disse que você parecia meio mal, e pediu para a gente vir aqui ver se está tudo bem.

A Jenna? Preocupada comigo? Até parece. Ela não tinha olhado na minha cara desde que arrumei briga com o príncipe. Por que ela iria se preocupar bem naquele momento?

O Luxion tinha a resposta para isso, sua voz era baixa o suficiente para que as duas garotas não ouvissem. — Mestre, uma bomba foi instalada no Arroganz. Sua irmã foi quem plantou, agindo sob ordens de outra pessoa.

Não posso dizer que estava surpreso. Devem ter forçando ela a fazer isso. A vida acadêmica não devia estar sendo tão fácil depois de eu ter irritado o príncipe e companhia. Tenho certeza de que o Jilk viu isso como uma oportunidade e a ameaçou.

Se eu era um lixo humano, então o Jilk era a escória desse planeta.

“Bem, Jilk vai fazer qualquer coisa pelo Julius. Para alguém como ele, os fins justificam os meios. ”

— Aquele que deu a ordem é o seu próximo oponente — confirmou Luxion.

“Na mosca.”

Soltei um leve suspiro antes de me virar para as duas garotas, que pareciam inquietas. — Parece não posso esconder nada da minha irmã. Durante as duas lutas eu ‘tava segurando uma bomba no estomago então tive que ir correndo me livrar dela. Doía tanto que pensei que ia explodir. Cara, aquela privada estava dando mais trabalho que os meus oponentes.

A Olivia parecia pega totalmente de surpresa. — A-ah, bem, acho que... consigo entender porque ela estava preocupada, era só um mal-entendido.

Angelica, por outro lado, me encarava com frieza. — Não acha que poderia ter falado de forma um pouco mais delicada já que tem duas damas aqui?

— Maus aí. Eu, hm, “tinha que retocar a maquiagem, mas como a arena não tem espelho tive que vir correndo para cá, meu intestino não teve nada a ver com isso”, o que acha?

A Olivia tinha um sorriso forçado no rosto.

Angelica colocou a mão na testa e respondeu: — Não é... Ah, quer saber, está tudo bem. Embora seja melhora prestar atenção nessa língua, se você não quiser acabar passando vergonha. Mas não temos que nos preocupar com isso agora, já é hora de voltar.

— Então é melhor a gente ir andando. — Eu disse.

Enquanto caminhávamos em direção a arena, o Luxion continuou com o relatório. — A bomba foi colocada na parte de traseira do Arroganz. Esse é o maior ponto fraco das Armaduras deste país, então seu oponente está disposto a fazer de tudo para nos parar. E pela quantidade de pólvora, posso dizer, com confiança, que o piloto não sairia inteiro também, se fosse um robô normal.

“Então o cara mais bonzinho do grupo é na verdade o mais assustador. Não podia ser mais clichê. ”

***

Quando cheguei na arena, a Jenna já não estava mais por lá. Não que eu ligasse muito. Ficaria sem saber o que falar se a visse depois dela ter concordado em esconder uma bomba na minha Armadura.

Angelica enviou um olhar para o robô esverdeado do outro lado do ringue. — Seu oponente já está esperando. E parece que eles finalmente vão com tudo.

Jilk carregava tantos armamentos que fazia aquele robô parecer um soldado prestes a encarar a morte no campo de batalha.

Enquanto eu entrava no Arroganz, o Luxion reportava: — A bomba parece ser ativada por um tipo especial de mágica.

O mesmo tipo de explosivo podia ser usado no jogo, no entanto, eu nunca senti vontade de usá-los

— Pessoas que nem ele são as mais perigosas — comentei. — Armas de fogo são sua especialidade, mas o Jilk consegue usar quase qualquer equipamento em batalha. Não importa a situação, ele consegue se adaptar.

A maioria dos grandes nobres tendiam a focar mais em combate corpo a corpo, incluindo o Julius, contudo Jilk era um dos poucos especializado em longa distância. Além disso, no jogo, ele era um dos mais uteis em batalhas. Eu o usava bastante por conta disso — mas ainda ficava puto com essa cara porque a rota dele era insana de tão difícil.

Quando pisei no ringue, Jilk começou a falar olhando para mim. — Você é forte. Não posso negar isso.

— Valeu aí.

No segundo em que o juiz iniciou o duelo, Jilk apontou o cano do rifle para mim. Ele começou a voar enquanto atirava, e então jogou algo que parecia uma granada.

— Uma bomba de fumaça — avisou Luxion. E logo após uma nevoa branca começou a cobrir os meus arredores.

— Parece que ele não vai pegar leve comigo.

***

Fumaça engolia a arena, e Jilk voava o mais alto possível observando tudo. Se subisse demais, seria desqualificado, então tomava cuidado para não passar do limite. Planejava continuar atacando com o rifle e granadas enquanto se mantinha no ar.

— Espero que isso seja o suficiente.

Jilk não queria ter que preparar nada por trás dos panos, mais, ainda assim, ele não hesitou em contatar a irmã do Leon — através de outro aluno, obviamente — e entregar a bomba para Jenna. Dessa forma, se alguém descobrisse o que aconteceu, não afetaria a reputação do Julius. Seria fácil enterrar o assunto dizendo que foi só estudante preocupado com o bem-estar do príncipe.

Um círculo magico apareceu em frente a seus olhos, era possível ver Leon no do ringue, perdido no meio da fumaça.

— Você é perigoso demais, tenho que me livrar desse risco o mais rápido possível.

As pessoas não iam pensar bem dele por ter usado esse tipo de bala — uma especial, capaz de perfurar através de blindagem, usada no exército para combater Armaduras inimigas — contudo, seu oponente era forte demais. Não adiantava perder tempo pensando na moralidade de suas ações.

— No segundo em que você foi contra a Sua Alteza, o fim da sua vida foi decidido. Pelo menos tenha uma morte gloriosa pelas minhas mãos!

A mira estava travada na cabeça do Leon, com a intensão clara de tirar a vida de seu oponente. E o gatilho foi então puxado.

— Mas o...?!

Leon olhava para cima, sem nenhum arranhão, como se a bala tivesse apenas chamado a sua atenção. Ele levantou a mão e começou a acenar.

 — Tsk! — Jilk jogou outra granada, e então começou a recarregar o rifle. Mirou e começou a atirar mais uma vez — contudo, ao ver a granada não fazer nem cócegas no oponente, ele decidiu usar sua carta na manga, ativando a mágica para explodir a bomba no Arroganz.

— Um ataque à queima-roupa vai dar um jeito em você!

Após a explosão, não era possível nenhum sinal do Leon na arena. Mas... não parecia se ele tivesse sido feito em pedacinhos. Era como se ele tivesse simplesmente... sumido.

— O que? Onde ele foi parar?!

Uma sombra começou a cobrir o sol, e Jilk percebeu que tinha algo errado. Até um minuto atrás, não havia uma única nuvem no céu. Quando levantou a cabeça o Arroganz apareceu flutuando na frente dos seus olhos.

— E aí.

Jilk acelerou o máximo possível, virando o rifle para trás, tentando mirar no Leon. Seu dedo apertou o gatilho, porém a bala apenas quicou. Algo que não devia ser possível a essa distância.

— Então você aguentou a bomba — disse Jilk.

— Foi um golpe pesado — admitiu Leon. — De várias formas.

Jilk pegou o machado e avançou, no entanto, Arroganz apenas refletiu o ataque com sua pá.

Ele então baixou a voz para que a audiência não ouvisse. — Você não viu nada.

 — Queria ver você repetir isso olhando no espelho. Você e seus amigos estão ficando insanos.

— Você tem mesmo a intenção de enfrentar o príncipe em um duelo? Sua vida como nobre irá acabar no mesmo instante — afirmou Jilk.

— Ótimo! A classe avançada é uma merda! Vou fazer qualquer coisa para ser livre. Parece que nos dois conseguimos ficar felizes com esse resultado, não acha?

Qualquer garoto podia entender o que o Jilk queria dizer. Até mesmo um idiota ficaria despertado para negociar depois de ouvir as consequências dessa ação. Mas para Leon era o contrário. Era como se ouvir tudo isso o deixasse ainda mais animado.

O rosto de Marie apareceu na mente de Jilk. Uma mulher misteriosa. A única que o entendia, como se fosse a personificação de sua parceira ideal. Nunca havia conhecido alguém assim na sua vida. Seu coração sempre se acalmava ao lado dela. E, antes que percebesse, já não conseguia mais viver sem ela por perto.

— Eu finalmente encontrei a mulher dos meus sonhos! — bradou Jilk.

— Bom pra você. Quando seu time perder e o príncipe tiver que ficar longe dela, vai ser um rival a menos! Vai poder ficar brincando de namoradinho por muito mais tempo.

Jilk conseguiu bloquear o ataque de Leon usando o rifle, no entanto a força por trás do golpe foi tão grande que arrancou o rifle de sua mão, o enviando para o chão.

“A diferença de força é muito grande.”

Agora foi a vez de Julius aparecer em seus pensamentos. Toda vez que falavam com a Marie, o príncipe sorria de uma forma que ele nunca tinha visto antes.

— Você não sabe de nada! Sua Alteza e eu amamos a Marie do fundo de nossos corações! Nenhum de nós quer monopolizá-la. Só queremos ver ela feliz!

— Então porque não desiste de uma vez? — Leon parecia entediado, contundo, continuava atacando sem pausas.

Com cada acerto, a Armadura verde rachava e rangia cada vez mais. — Não importa o que eu tenha que fazer para vencer. Não vou perder para você! Se planeja ferir a Sua Alteza, farei tudo o que estiver ao meu alcance para fazê-lo pagar, não, não apenas você, mas farei toda a sua família pagar junto!

Quando descobriu que o príncipe e ele amavam a mesma pessoa, Jilk sentiu ódio de si mesmo e planejava desistir dela para o bem de seu irmão. No entanto o amor que sentia por Marie era forte demais para ser descartado com tanta facilidade. Mesmo assim, essa luta não era para o seu bem, e sim para Julius e Marie — pela a felicidade dos dois, Jilk estava disposto a fazer qualquer coisa.

— Um jeito bem covarde de ameaçar alguém em um duelo, não concorda? — disse Leon.

— Pode achar o que quiser!

Durante o combate aéreo, os dois acabaram ficando alto demais para que a plateia pudesse ouvi-los. Jilk pensou que a batalha finalmente viraria a seu favor. Então se preparou para continuar atacando.

— “Não importa o que eu tenha que fazer para vencer. Não vou perder para você! Se planeja ferir a Sua Alteza, farei tudo o que estiver ao meu alcance para fazê-lo pagar, não, não apenas você, mas farei toda a sua família pagar junto! ”

A voz de Jilk — e a frase que acabou de falar — estavam sendo repetidas na sua frente!

— C-como? — Ele nunca havia ouvido falar de uma mágica que podia fazer isso! Era uma rara? Ou alguma tecnologia nova? Talvez Leon tenha simplesmente imitado sua voz...

Não, não era isso. De alguma forma, Leon conseguiu gravar o que ele tinha acabado de falar.

Jilk rangeu os dentes frustrado.

— Foi você que veio me ameaçando — disse Leon. — Eu entendo, que tal mandar uma cópia disso para a sua família? Tenho certeza de que vão amar. Imagina o orgulho de saber que seu filho ameaçou alguém porque estava com medo de perder? Não vai ser nem um pouco vergonhoso! Oh, talvez seja melhor mostrar para o seu precioso príncipe e Marie? Eles devem ficar só com um pouco de nojo toda a vez que verem a sua cara. Mas, pensando, acho que enviar para a academia é a melhor ideia. Assim podemos fazer todos os alunos escutarem.

Jilk conseguiu se acalmar e falou: — Apenas a minha voz não prova nada.

Se ele não sabia de nenhuma magia ou ferramenta que gravasse a voz das pessoas, então ninguém devia conhecê-las também. Por conta disso, seria difícil de provar que aquilo era verdade. Era difícil, no entanto...

— Pode não servir como prova concreta, mas é o suficiente para criar duvidas na cabeça das pessoas — disse Leon. — E se de repente a minha família começar a ser pressionada, todo mundo vai pensar: “Então era verdade mesmo”. E acha que não vão começar a suspeitar do príncipe, também, depois disso? “O príncipe deve ter planejado tudo isso”, quando começarem a falar isso, a reputação do seu querido amigo vai pro buraco graças a você!

Jilk tentou manter o controle, tentando pensar em qualquer saída para esse problema. — Sua alteza não tem nada a ver com isso. Essa é a minha vontade.

— Mas não é você que decide isso, não é? As pessoas gostam de ligar os pontos, elas vão querer saber quem está envolvido nisso. Lembra quando a Angelica ‘tava tentando falar, e vocês não acreditavam em uma palavra dela? Por que acha que o mesmo não vai acontecer com seu grupinho?

Jilk ficou de boca aberta, sem saber o que falar. O Leon estava certo; a Angelica continuou dizendo que não estava fazendo nada com a Marie, mas nenhum dos cinco deu ouvidos as palavras dela.

— Mas isso foi...

— Já ‘tô cansado disso. Vai dormir. — Leon falava com uma voz fria enquanto acetava a cabeça do robô verde com seu pé, o enviando em encontro ao chão da arena.

Após o impacto, Jilk consegui sentir sua consciência fugindo de seu controle.

— Acabei trazendo problemas para a minha irmã. O que eu faço para arrumar esse problema agora...?

Os resmungos de Leon chegaram a seus ouvidos. Era como se ele já tivesse perdido qualquer interesse no Jilk, que estava deitado entre os destroços de sua Armadura.

E enquanto sua consciência ia embora, ele só conseguia pensar em uma coisa: “Sua Alteza, esse homem é perigoso. Você não deve... lutar com ele. “

Então a escuridão tomou tudo.



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