Sakurai Brasileira

Autor(a): Pedro Suzuki


Volume Único

Capítulo 6: Vizinhos

Ao fechar os olhos, Hiroshi pôde ouvir gotas de chuva que ressoavam como batidas rítmicas no teto, como se fossem uma orquestra natural. 

— Que som relaxante... 

No entanto, as pequenas gotas de chuva, que antes ressoavam levemente em seu teto, logo se intensificaram, deixando de ser apenas uma orquestra harmoniosa, agora estava mais para um campo de batalha. Uma tempestade pesada estava se formando. 

— ...Não, minhas roupas! — Hiroshi saiu correndo para ver as roupas que havia estendido de manhã. 

 
Agora encharcadas, ele teria que lavá-las novamente, mas, por enquanto, apenas as dobrou e as jogou em um canto da casa. Tentou dormir, mas alguém bateu à sua porta. 

Hiroshi estava um tanto irritado. Apanhou novamente a espada, na expectativa de uma visita indesejada, e foi abrir a porta com cautela 

— Uma nuvem? 

Entreabriu a porta e viu uma pequena ovelha, com um sino brilhante em seu pescoço e um pelo bem cuidado e arredondado, o que despertou uma grande curiosidade.  

Logo, ao abri-la por completo, revelou um elegante homem, trajando um quimono azul com estampas de nuvens.  

Ele segurava um guarda-chuva volumoso, que abrigava uma mulher de cabelos longos e pretos, presos por um palito de madeira. A dama, por sua vez, segurava uma cesta com as mãos, enquanto vestia um quimono rosa com estampas de sakura. 

Tanto o homem quanto a mulher usavam uma aliança dourada mais reluzente que o sino no pescoço da pequena ovelha. 

Sentiu vontade de assar a ovelha por conta da fome, mas se censurou por tal pensamento cruel. Nesse momento, a mulher começou a falar. 

— Boa noite, eu sou a Sue Sakurai — disse a mulher, com um sorriso. 

— Fuyuki Sakurai — disse o homem, igualmente amigável. 

— Venha, Aki… — murmurou Sue, olhando para o garotinho atrás dela, que Hiroshi supôs ser filho do casal. 

O garotinho deu um passo à frente, de trás do pai, tão tímido que não conseguia falar. 

— Esse é nosso filho, Aki — disse Fuyuki. 

— Seremos seus novos vizinhos, então espero que nos demos bem! 

— Sejam… Bem-vindos — respondeu Hiroshi, em uma mistura de receio e sono. 

— Estávamos saindo de casa, mas essa chuva começou, e não queria deixar esses pães esfriarem. Estes são para você, aceite-os como um presentinho.  

— Obrigado, espero que se adaptem bem. — “Eram exatamente aquilo de que precisava!”, pensou Hiroshi, ao recebê-los. Seus novos vizinhos pareciam anjos caídos do céu. 

— Bom, nós vamos indo — disse Sue. 

— Tchau, tchau — disse Aki acenando. 

Hiroshi acenou de volta, enquanto voltava para dentro, lamentou por não ter tido tempo de convidá-los para dentro. 

“Uma ovelha”, pensou Hiroshi, ao olhar para o ouro que recebera, considerando comprar uma também. 

Ao abrir a cesta, esperando um pão simples, do tipo que comia quando servia no exército, ele se deparou com uma variedade de pães frescos, todos visualmente singulares e cujo aroma logo tomou conta da casa. Era óbvio que eles haviam sido feitos recentemente, tanto pelo aspecto quanto pela temperatura. 

Engolindo em seco, pegou um pequeno pão em formato de bolinho com uma estampa de flor e não tentou descobrir se havia veneno como de costume. 

Hiroshi levou o pão a sua boca e deu uma mordida, para sua surpresa, o gosto superou em muito, suas expectativas. 

O pão tinha uma textura agradável de se mastigar e um gosto surpreendentemente rico em sabor. 

“Isso é mesmo só um pão?”, pensou Hiroshi, pois, só esse pão já estava mais bem temperado que a maioria das refeições que já havia comido. 

Ao dar uma segunda mordida, Hiroshi alcançou o recheio, e a explosão de doçura do anko, sobrepôs por completo o sabor do pão. 

Pelo pequeno tamanho do pão, a doçura estava em um ponto que não era enjoativo. Essa comida reacendeu a fome de Hiroshi, que não conseguiu se segurar e em duas bocadas, engoliu o pão, e logo em seguida mais um… e mais um. 

Quando percebeu, já havia atingido o fundo da cesta. 

Sem dúvidas, era a melhor refeição que ele já havia tido. 

“Eles são algum casal de chefs famosos? Se sim, com certeza ensinariam melhor que o Kuro.”, pensou Hiroshi. 

Sem titubear, pegou uma das barras de ouro, depositou no recipiente de onde os pães haviam sido retirados para os proteger da chuva e deixou o local rumo à casa ao lado. Com os olhos cheios de esperança, ele bateu na porta. 

Hiroshi escutou passos apressados e logo a porta se abriu. 

— Por favor, mate-me, mas poupe minha família! — Fuyu prostrou-se, tremendo de medo, na frente da porta. 

Embora a situação fosse inusitada, Hiroshi já estava acostumado com esse tipo de mal-entendido, devido ao seu infame apelido. O que o deixou surpreso, na verdade, foi em vê-los aparecendo de forma tão amistosa na sua casa, mais cedo.  

Na realidade, eles haviam decidido tomar suas próprias afirmações sobre Hiroshi, mas ao vê-lo segurando uma katana, ficaram tremendo de medo e saíram quase que correndo de sua residência. 

Apesar de não ter feito nada de extraordinário na aldeia, sua fama de demônio que matava centenas de homens brutalmente já havia se espalhado por todo Japão. A única que não o julgou nem se sentiu intimidada era a vendedora de mochi. 

— Eu não... 

— Então você quer um duelo? Por favor, eu não sou proficiente na espada, tenha piedade, eu dou o que você quiser, poupe minha família! 

— Pare com isso! — gritou Hiroshi, aumentando sua voz sem querer. — Ah, perdoe-me… Eu não vim aqui para matá-los nem nada, apenas queria devolver o seu presente. Estavam deliciosos, os pães. 

— Sério!? 

— Sim, por favor, se levante. 

— Então era isso… — De uma vez, ele saltou do chão e sacudiu as roupas para tirar a sujeira. — Podem vir, ele não veio matar a gente! 

A mãe, que levava o filho nos braços, e até a ovelha, que estavam escondidos, vieram recepcioná-lo. 

— Eu te disse que não precisava de tudo isso! — exclamou Sue para Fuyuki. 

— Posso tocar na ovelha? — sussurrou Hiroshi. 

— O quê? 

— Nada, não é nada. 

— Fale, o que era? — Perguntou Sue. 

Er... Podem-me ensinar a cozinhar? 

— Com certeza… Não.  

Hiroshi, sem ter o que dizer, permaneceu na chuva. Já havia exaurido a boa vontade do casal. Aki, de repente, saltou do colo da mãe e foi até a porta, na direção do homem. 

— Ei! — Ele mandou Hiroshi se agachar com um gesto. — Você não quer mesmo tocar na ovelha? — O garoto cochichou no ouvido dele. 

— É... eu queria mesmo, mas agora estou encharcado — disse Hiroshi, seguido de um pequeno riso. 

— Então venha amanhã aqui! 



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