Se der Ruim, Viro Ferreiro Japonesa

Tradução: Rudeus Greyrat

Revisão: Ma-chan


Volume 6

Capítulo 94

Isso aconteceu a muito, muito tempo atrás.

O velho Moran não só não era velho como estava no auge da sua juventude. Moran, dezesseis anos de idade, era um jovem atraente, com feições delicadas, de cabelos prateados e um olhar forte. Essa é uma história de quando ele frequentava a Academia Elenoire como um jovem aristocrata.

Moran sempre foi sério em seus estudos, ficando no topo de sua classe. Ele leria livros sozinho e teria uma atmosfera que tornava difícil para os outros se aproximarem dele. Sendo uma pessoa obstinada e propensa a menosprezar os outros. Seu temperamento era explosivo, no entanto curiosamente sua popularidade com as garotas foi alta. Obviamente, isso significava que ser odiado pela maioria dos estudantes masculinos. Todas estas circunstâncias o faziam não ter uma única pessoa a qual pudesse chamar de amigo.

Um dia, durante o recesso, ele estava a observar algo ao invés de ler seus amados livros. Seus cabelos prateados sopravam ao vento e seu olhar firme permanecia voltado para uma única mulher. Aos dezesseis anos, o jovem Moran descobriu o significado de se apaixonar. Sua figura talvez pudesse expressar um olhar tenso, mas internamente, seu coração disparava. A mulher que capturou o coração de Moran finalmente notou o seu olhar ardente após ser notificada por uma amiga, voltando-se para ele. A expressão dela sugeria que não estava agradada pela atenção, por isso, ele rapidamente fugiu do local. Outras garotas poderiam ficar contentes em serem olhadas tão apaixonadamente por Moran, mas esta mulher em específico não foi movida por tal sentimento.

O nome da garota era Harp Helan. Como seu nome sugere, possuía uma voz linda como uma harpa. Ela era uma mulher estonteante com cabelos curtos e ruivos. Sempre sorrindo, como se satisfeita consigo mesma, seus olhos reluziam como se tudo o que visse fosse interesse dela. Ficar no meio da multidão lhe desagradava, por isso, ela preferia ficar sozinha e fazer apenas o que queria. Em outras palavras, Harp era um pessoa um pouco excêntrica. Não se sabe se foi isso que atraiu a atenção de Moran, mas não havia dúvidas de que ele estava apaixonado.

Os sentimentos dele cresciam a cada dia, mas não eram correspondidos. Suas pernas não o permitiam agir e portanto não havia sinais de que ela notasse a sua presença. Moran passou dias ocioso e a distância entre eles não diminuiu.

Conforme o tempo ia passando, Moran foi lentamente observando o relacionamento que Harp tinha com as pessoas que a cercavam. Francamente falando, ela não tinha nenhum amigo especialmente próximo, mas havia um lugar que visitaria ao menos uma vez a cada dois dias. Moran sentia vergonha de suas próprias ações, mas continuou a perseguí-la mesmo assim. Durante toda a história da humanidade, as pessoas agiram de maneira idiota em meio ao calor da paixão.

O lugar visitado regularmente era o porão de um armazém repleto de livros velhos. Tratava-se de uma biblioteca empoeirada com livros praticamente jamais lidos, do tipo que mesmo um leitor ávido como Moran nunca se interessaria.

— Você veio, nari! Harp veio, nari! Rápido, tome um assento, nari!

Havia um homem no canto do armazém lendo um livro à luz de um candelabro. Era a pessoa que Harp viria se encontrar e Moran o conhecia bem. Ele era de um colega classe então como ele se esqueceria? Seu nome era Petel e sempre terminava suas frases com um “nari”! Sua aparência também era bastante peculiar, tendo um físico magro e baixa estatura, olhos cabisbaixos, de boca e nariz compridos. Ele dificilmente poderia ser considerado um homem bonito.

Teriam Petel e Harp esse tipo de relacionamento então!? Naquele momento, Moran sentiu como se o chão estivesse desmoronando sob seus pés. Afinal, este homem chamado Petel era incrivelmente excêntrico, ainda mais do que o próprio Moran.

Quando aconteceu isto?

Ele amaldiçoou sua própria falta de iniciativa. Talvez se tivesse agido antes, as coisas poderiam ter acabado diferente. Em meio a amargura suas emoções se transformaram em raiva. Mmoran furiosamente se intrometeu enquanto eles conversavam alegremente.

Os dois ficaram chocados. Supostamente ninguém viria até este porão, ainda mais o famoso em toda academia, Moran, que chegou fazendo uma expressão assustadora. Não era para menos que eles estavam sem palavras. Foi nesse momento que os três vieram a conhecer um ao outro e não muito depois, tornaram-se bons amigos.

Assim que Moran descobriu que os dois não tinham aquele tipo de relacionamento, o mesmo começou a enxergar Petel de maneira mais favorável.

— Então o que está acontecendo? O que vocês têm feito aqui em baixo? — Um dia perguntou Moran.

Harp e Petel se olharam e hesitaram em responder. Isso irritou ainda mais Moran, deixando-o com ciúme, pensando que ambos compartilhavam um segredo que o deixava de fora. Os dois entenderam então que Moran era uma pessoa extremamente temperamental e, por fim, decidiram lhe contar o segredo como prova de sua amizade.

— Harp Helan. Como meu sobrenome sugere, minha família pertence ao território Helan.

— Aah, os nobres da periferia. Eu já havia ouvido falar de vocês.

— Nobres da periferia!? Que rude! Bem, suponho que seja verdade. Mas ainda assim, Helan é um ótimo lugar. O território é rico em belezas naturais e suas flores são incomparáveis. Você jamais conseguiria apreciar tamanho luxo plantando nos campos da Capital, não é mesmo?

— Hmph, como se eu pudesse chamar algo assim de luxo. Luxo para mim é somente pedras e metais preciosos.

— Você não sabe o verdadeiro significado de riqueza.

— Vocês dois é que não sabem, nari! Luxo mesmo é viver cercado de livros, nari!

Cada um deles tinha a sua própria ideia do que era riqueza.

Harp disse que aquilo era irrelevante e tentou continuar sua história. Moran se virou para ela com um olhar apaixonado. Ele estava interessado em suas palavras, mas seu interesse maior era nela. Petel parecia completamente ignorante a isso e sentou-se ao lado dele, lendo um livro como se aquilo não tivesse nada a ver com ele.

— Nós podemos debater sobre isso uma outra hora. Primeiro, acerca do que Petel e eu estamos pesquisando, tudo isso começa com um lenda passada pela família Helan.

— Lenda? Hmph, vocês ainda têm uma coisa dessas?

Moran a provocou um pouco. Era um costume dele menosprezar os outros. Ele era um pensador lógico, por isso, coisas como velhas lendas e mitos o aborreciam muito. Elas eram sempre tão vagas e incertas que não mereciam a sua atenção. Entretanto, Harp foi bastante insensível aos sentimentos alheios, por isso, ela não demonstrou qualquer chateação com a atitude de Moran.

— Sim, uma velha lenda que tem sido contada. Minha agora falecida avó me contou quando eu era bem nova que isso era muito importante.

— O que ela lhe contou?

Harp inspirou profundamente. Era algo tão importante que ela não queria contar de ânimo leve. Moran foi um bom amigo, então ela queria dividir este segredo com ele.

— Centenas de anos atrás, a terra onde hoje é conhecida como território Helan era considerada amaldiçoada. Não só era impossível viver lá como sequer crescia grama ou árvores. Havia inclusive boatos de que qualquer um que pusesse o pé lá jamais retornaria a salvo. A terra pertencia ao território de Kudan, mas nenhum nobre teve a coragem de reinvidicá-la…

Moran ouviu atentamente. A expressão honesta de Harp demandava isso. Ela normalmente teria uma atmosfera relaxada ao seu redor, mas enquanto contava a história, uma aura de seriedade emanava dela. Ele não tinha vontade de fazer pouco caso agora.

— Isso tudo começou quando um certo nobre foi ordenado a ir viver sob estas terras impiedosas.

Ele havia se envolvido em uma trama de poder no Palácio Real e acabou sendo expulso da Capital. Como uma forma de insulto, foram-lhe concedidas novas terras, o território Helan. Este homem chamado Helan seria o primeiro senhor feudal.

 

◇◇◇

 

 

◇  Esta é uma história que aconteceu centenas de anos atrás  ◇

O homem perdeu seu antigo nome de família e viveu sozinho em suas novas terras sob o nome de Helan.

Este homem chamado Helan possuía um brilhante cabelo vermelho, corpo magro porém forte e uma vitalidade que o impedia até mesmo de adoecer. Mas o que mais o distinguia era que este homem estava sempre a sorrir. Ele poderia se dar muito bem com qualquer um e amava rir. Embora descendesse de uma antiga e nobre linhagem, ele frequentemente interagiria com os plebeus e até mesmo visitaria as cervejarias locais. Até mesmo ofereceria sua ajuda de bom grado independentemente da situação. Ele era amado por muitos, mas tinha pouca consideração ao sangue nobre que carregava.

Helan não tinha interesse em poder ou fortuna, foi apenas azar ter acabado se envolvido em uma disputa de poder. Apesar disso, sua vontade de se opor a isso era nula e assim ele aceitou a ordem de passar o resto dos seus dias em uma terra amaldiçoada. No entanto, para viver em um lugar assim não lhe parecia ser falta de sorte em si. Ele sempre adorou trabalhar com a terra, mas por ter nascido como um nobre, além disso, um nobre talentoso, acabou sendo obrigado a viver na Capital. Agora ele seria capaz de viver por si mesmo e isso o deixava feliz de alguma forma. Estava sozinho em uma terra onde não crescia grama ou árvores. Sua sentença foi praticamente um banimento, ainda assim, ele sentia uma plenitude todos os dias em que estava ali.

Helan dormiria em um caverna natural durante as noites e, ao nascer do sol, iria plantar capim e árvores. Ele sempre estava sozinho durante o seu trabalho e a concentração era tão grande que frequentemente acabava até mesmo esquecendo de descansar. Os dias foram passando, as vezes com comida, as vezes sem. Assim, seu corpo foi ficando cada vez mais magro, sua pele clara foi queimada pelo sol e ele acabou parecendo uma pessoa completamente diferente. No entanto, sem se importar com isso, continuou a lutar sozinho na terra amaldiçoada.

A grama e as árvores não cresceram…

Nada mudou. O que estava estéril continuou estéril. O mundo poderia estar mudando, mas aquelas terras jamais mudariam. Ainda assim, alguma coisa mudou em volta de Helan. Ele já não estava mais sozinho.

Haviam trinta pessoas com ele no total. Cada uma delas tinha suas próprias razões para vir aqui, mas o que importava é que eles estavam aqui. Helan não questionou a qualquer um sobre suas motivações, ele não iria rejeitá-los e até compartilharia a pouca comida que tinha e assim todos viviam juntos.

Cada um deles sentia enorme gratidão por ele e admiravam sua humanidade. Havia aqueles que ainda tinham algum lugar para ir, mas decidiram ficar aqui junto a ele. Todos tinham fé que a força de vontade de Helan faria com que a terra amaldiçoada se tornasse habitável e rica.

Um dia, Helan reuniu todos os residentes. Ele disse que tinha algo importante a dizer.

— Pessoal, por muito tempo eu tenho ignorado este fato, mas há algo de estranho com o fluxo de magia dessas terras. A mana que corre de maneira natural pelo mundo flui de maneira estranha aqui. E isso não é algo aleatório, mas parece intencional… não é para menos que chamam esse lugar de amaldiçoado.

Mas no que saber disso ajudaria? Isso não faria apenas com que a nossa determinação fraquejasse? Foi o que todos pensaram quando ouviram suas palavras.

— A partir de agora irei investigar cada canto dessas terras. Irei até mesmo nas profundezas que sempre evitei e descobrirei o que está causando a desordem no fluxo da magia deste lugar.

— E depois? — Perguntou alguém

— Farei com que tudo fique normal, é claro! Desse modo, esse lugar estará livre da maldição.

— Mas como você vai fazer isso?

— Felizmente, fui abençoado com um dom para a magia. Eu prometo a vocês que irei encontrar a causa e quebrarei a maldição. Esse dom me foi dado exatamente para esta razão… é nisso que tenho começado a acreditar.

— Eu não acho que você deveria tentar mudar o fluxo natural da magia deste mundo. Algo desse tamanho deverá ter sérias consequências. — Alguém com algum entendimento sobre magia levantou este ponto.

— Eu nunca imaginei que não haveria consequências, no entanto, este é o meu sonho…

Não havia mais razões para discutir. Helan decidiu abandonar a área onde eles ainda conseguiam algum sustento e foi explorar as regiões mais profundas da terra amaldiçoada.

Cada um deles havia apoiado a sua decisão e queriam acompanhá-lo. O sonho de Helan tinha se tornado o sonho deles. Todos foram fascinados pelo seu cintilante sorriso. Os cabelos ruivos de seu líder os guiariam, não importa o quão longe fosse, seus seguidores jamais perderiam sua cabeleira de vista…

A jornada foi muito mais árdua que o antecipado. Não havia sinal para um fim e nenhuma garantia de sucesso, ainda assim, ninguém abandonou a jornada e ninguém questionou a futilidade disso. Entretanto, o ambiente hostil foi derrubando os companheiros de Helan um a um. Aqueles com os corpos mais frágeis foram os primeiros a tombar.

Passados três anos, ele finalmente foi capaz de ter uma noção inteira do fluxo mágico do território, sendo capaz de determinar a fonte de toda a magia.

Ela se encontrava em um lugar que passou a ser conhecido posteriormente como o Pântano Amaldiçoado de Helan. Apenas treze pessoas foram capazes de chegar até aquele lugar. Mais da metade de seus companheiros haviam sido perdidos durante a jornada.

— Há muito tempo atrás havia um outro país onde hoje é Kudan. Dizem que um homem conhecido como um filósofo fugiu para cá e ficou até o fim dos seus dias. As lendas dizem que ele cantou uma canção amaldiçoando este lugar e então morreu. Quem imaginaria que esta lenda seria verdadeira? — Disse alguém do grupo que era um grande conhecedor de história.

O pântano era uma evidência de que tudo era verdade. O turbilhão de magia que se erguia de suas profundezas,  machucava a terra. A alma do filósofo dormia neste lugar e continuava a cantar mesmo após a morte, devido ao profundo ódio que sentia. Entretanto, essa terra também era a esperança deles e se pudessem trazer paz à sua alma, este lugar amaldiçoado floreceria.

A área próxima ao redemoinho era estranhamente coberta pela natureza, bem diferente de todo o resto. Este lugar poderia ser comparado ao olho de um furacão, onde a maldição se mostrava mais forte, mas aparentava ser o local menos afetado.

Os treze sobreviventes decidiram fazer daquele ponto a sua base. Ali eles poderiam investigar como quebrar a maldição, o que renovou suas determinações e, ao longo de dez anos, o feitiço finalmente estava completo. Crianças nasceram e outras pessoas se juntaram, fazendo com que seu número crescesse para cinquenta. Helan agora estava preparado para a batalha final contra a maldição.

— Pessoal, me escutem, por favor. Estarei pondo um fim na maldição desta terra. O feitiço finalmente está concluído.

Obviamente todos estavam cientes do fato. Durante estes dez anos, cada um ajudou com a pesquisa e assim, tornando-os especialistas em magia. Os pequenos detalhes também eram de conhecimento geral e por isso os companheiros de Helan tinham uma expressão sombria no rosto. Quando finalmente havia chegado o momento de erradicar a maldição…

— Tenho certeza de que já sabem disso, mas a maldição não pode ser completamente derrotada. Minha força sozinha não é o suficiente. Para usar este feitiço eu terei de sacrificar a minha vida e mesmo assim o feitiço só irá durar pelos próximos trezentos anos. Me dói o coração ter que passar um fardo tão pesado para os meus descendentes, mas não há outra escolha. Em trezentos anos, a maldição certamente irá retornar para esta terra. Entretanto, um jovem rapaz com as mesmas propriedades mágicas que as minhas irá certamente nascer entre os meus descendentes durante este mesmo tempo para se levantar contra a maldição. Infelizmente, ele terá de sacrificar sua própria vida, mas com toda certeza esta terra será libertada para sempre quando o fizer.

Ninguém presente se importava com o que aconteceria a este descendente que ainda viria a nascer em um futuro distante. O maior pesar agora era perder seu precioso líder em troca destes mesmos trezentos anos de paz. Aquele que se ergueu diante deles e era o seu raio de esperança.

No entanto, todos entendiam que não teriam a menor chance de vencer a maldição se Helan não se sacrificasse. Eles entendiam em suas cabeças, mas não em seus corações. Helan era a sua esperança e só haviam chegado até aqui graças a ele. Mesmo que fossem capazes de retornar a paz a esta terra, se Helan não estivesse junto, então o mundo inteiro poderia…

Apesar disso, a decisão foi tomada. Helan escolheu sacrificar sua vida para tornar a vida de todos que o seguiram mais feliz. Ele não tinha qualquer intenção de recuar agora já que mais ninguém poderia tomar o seu lugar. Esta foi uma missão que somente Helan poderia cumprir através da magia suprema, fruto de todo o seu talento e esforço.

Um dia antes de realizar o feitiço, Helan foi sozinho até o pântano de manhã cedo. O plano era ativá-lo no dia seguinte, na frente de todos os seus amigos, mas dizer adeus era muito doloroso para ele, portanto, sem dizer nada a ninguém, Helan caminhou solitário até o centro do pântano, apenas com seus reluzentes cabelos vermelhos atrás dele. Todos sempre foram encorajados ao verem seu cabelo vermelho, mas a vida de Helan foi perdida naquele dia. Enquanto todos ainda dormiam naquela manhã, Helan utilizou o seu último grande feitiço.

O redemoinho da maldição parou e o feitiço de Helan reverteu à direção da maldição. Quando tudo acabou, a terra ressecada foi regenerada e flores cresceram a partir do centro do pântano. Chuva caiu por mais de um mês, formando rios, crescendo flores, gramas, árvores, transformando aquele território em uma terra abençoada, um pouco mais que um mês após a morte de Helan. Os companheiros sobreviventes batizaram a terra com o nome de Helan e seu filho se tornou o segundo lorde feudal. O feitiço criado por Helan foi compilado em cinco livros mágicos e a história foi passada de geração em geração para que um dia seus descendentes pudessem combater a maldição quando ela retornasse trezentos anos depois.

— Em trezentos anos, aquele que carrega o sangue de Helan irá apagar a maldição de uma vez por todas. Ele terá a propriedade mágica do redemoinho em si e terá um dom incomum para a magia. Será uma pessoa destemida e com cabelos ruivos assim como Helan.

 

◇◇◇

 

— Isso é tudo. A última parte é especialmente importante e minha avó a repetiu para mim inúmeras vezes.

Moran ouviu a história tão intensamente que ficou sem palavras. Ele ficou impressionado por ser ignorante sobre tal lenda. Era algo difícil de acreditar e ao mesmo tempo, chocante para si.

— Por que vocês dois… manteriam algo assim em segredo? Se é tão importante não seria melhor espalhar para todo o mundo e obter ajuda nisso?

Foi uma opinião sensata.

— Nós não podíamos e é por isso que Petel e eu estamos trabalhando tão duro nisso. Investigando em cada um destes velhos livros.

— Hã? Por quê? Essa história não é algo conhecido por todo mundo em Helan?

As palavras de Moran se deram por ele não saber as dificuldades que os dois tiveram que passar até hoje e por isso elas foram extremamente grosseiras para ambos. Depois disso, levou uma semana até que Harp e Petel voltassem a discutir o tópico novamente.

— Muita coisa aconteceu em Helan nas últimas centenas de anos, levando os textos a serem perdidos e a lenda começar a fadar. Sendo franca, não há ninguém que a leve a sério. Quando minha avó repetia isso em seu leito de morte, todos apenas ignoraram como sendo os delírios de uma velha. Meus pais, meus irmãos… todo mundo. E assim apenas Petel e eu decidimos fazer alguma coisa.

— Por que Petel está te ajudando?

— Porque eu tenho muito interesse nisso, nari! Além disso, é divertido passar o tempo com a Harp, nari!

Devido essas interações impensadas entre os dois que Moran ficava enciumado, dizendo coisas pelas quais se arrependeria depois.

— Hmph. Eu acho que a coisa toda não passa de mentira. Claramente tudo isso não passa de uma história para tentar tornar esse fim de mundo um lugar um pouco mais interessante…

— Você foi longe de mais, nari…

— …

No entanto, Moran estava muito interessado em Harp e, uma vez que viu a determinação dela, ele também começou a investigar seriamente a lenda para poder ajudá-la. Os dias em que os três passaram juntos foram frutíferos e divertidos também.

— Este é o quarto livro mágico… mas ainda temos que achar o mais importante, o quinto livro.

— Sim… Os primeiros quatro tinham como propósito aprofundar os fundamentos mágicos, mas o quinto é onde o feitiço supremo está gravado. Ahh, porque não conseguimos achá-lo???

— Não precisa entrar em pânico, nari. Vamos encontrá-lo eventualmente, nari. O quinto é o mais importante, por isso deve estar mantido a salvo, nari. É apenas que ele foi esquecido em um local secreto e por isso não conseguimos achá-lo ainda, nari!

— Isso é muito triste em si. Só nos resta um ano de academia, por isso precisamos terminar o que pudermos.

Por volta desse tempo, Harp começava a ser atraída pela profunda gentileza de Moran e sua atitude determinada. Petel percebeu o sentimento dos dois e começou a ajudá-los a se aproximarem.

— Em qualquer caso, pergunto-me se é obra do destino que Harp tenha a mesma cor de cabelo que o primeiro senhor de Helan. O seu cabelo é muito bonito, Harp. Talvez você seja o descendente da profecia?

— Eu acho que não. Ela não se concretizará por pelo menos sessenta anos ainda e eu nem tenho a aptidão mágica do primeiro Helan. Se houver algum significado na cor do meu cabelo… talvez a minha missão seja continuar transmitindo a lenda para as futuras gerações.

— Você também precisa reunir os livros mágicos.

— Exatamente!

E assim os três passaram suas juventudes a serviço do futuro de Helan, mas, ainda assim, eles apreciavam a presença um do outro e estavam felizes com isso.

O desastre aconteceu durante o último ano como estudantes.

Moran sempre foi abençoado com o dom e, depois de ter estudado os livros de Helan, além de vários outros, seu conhecimento cresceu ainda mais. Desse modo ficou decidido que ele iria trabalhar no Palácio Real depois que se graduasse. Não se tratava de um posto ordinário, mas de um importante passo que lhe geraria inúmeras possibilidades, inclusive a de se tornar o futuro Primeiro-Ministro.

Harp ficou de retornar para sua terra natal quando se graduasse e Petel decidiu seguí-la. Moran queria ir junto, mas… o outro caminho era muito tentador para si. Seu coração vacilou, no entanto, ele eventualmente fez uma escolha que acabaria vindo a se arrepender.

Moran escolheu ir para o Palácio Real. Neste país ele poderia alcançar uma posição que estaria abaixo somente a do rei. Ele era jovem e estava obcecado sobre esta possibilidade. Seu talento e espírito competitivo, retiraram de sua vista qualquer objeção que pudesse vir a ter. Não foi fácil, mas sua vida seguiu tranquila depois disso.

Um dia, ele recebeu a carta de um velho amigo. Foi de Petel.

Muitos anos já haviam passado desde que se apaixonara por Harp. Embora o sentimento tivesse enfraquecido, ele ainda permanecia em seu coração, assim, ele decidiu ir visitá-los logo que se tornasse o Primeiro-Ministro. Além disso, a nostalgia de receber uma mensagem de Petel o deixou genuinamente feliz de receber a carta.

O conteúdo dela foi basicamente acontecimentos que ele havia perdido, o deixando repleto de curiosidade, mas havia algo que o deixou incomodado. Harp não estava bem de saúde. A carta incluía um pedido para que Moran fosse até Helan, pois Harp certamente iria melhorar se visse a sua face.

Moran queria sair voando até lá o mais rápido possível. Mas ele não poderia ir. O exame de promoção estava próximo e, caso desejasse tornar-se o Primeiro-Ministro, não poderia negligenciá-lo. Assim, Moran decidiu prestar o exame ao invés de ir para Helan. Evidentemente ele obteve a nota mais alta do exame e obteve um enorme crescimento social. Dia após dia, participaria de festas com os poderosos e para manter suas conexões, iria para todo e qualquer evento, mesmo sacrificando o seu tempo de sono.

A vida de Moran seguia muito bem e ninguém duvidava de que ele se tornaria o mais jovem Primeiro-Ministro da história… e enquanto isso acontecia, uma nova carta de Petel chegou.

Harp estava muito mal. Petel implorava em cada sentença para que Moran se apressasse. Os exames haviam terminado e ele poderia ir se quisesse. Entretanto, havia um convite para a festa de aniversário da filha de um importante nobre. Caso fosse, poderia garantir um formidável apoio político. Ele poderia alcançar o tão sonhado posto de Primeiro-Ministro e assim o escolheu… Mais uma vez, Moran ignorou o território Helan e foi a festa de aniversário de uma garota que nunca tinha visto antes.

De fato, ele sentiu que havia feito a decisão correta e ficou satisfeito com isso. Afinal, todos o tratavam de maneira especial onde quer que fosse e caso quisesse, poderia ir a Helan a qualquer hora… a qualquer hora…

Meio mês depois, uma nova carta de Petel chegou. Moran sentiu uma pontada de irritação enquanto a abria, achando que seria outra chamada qualquer para Helan. Entretanto, o conteúdo da carta excedeu e muito, muito mesmo, as suas expectativas.

Harp havia deixado este mundo. Ela havia chamado por Moran em seus últimos momentos, mas suas súplicas nunca tiveram resposta. Desamparada, sua alma ascendeu aos céus. Moran pôde sentir o sofrimento de Harp, e o ódio e a tristeza de Petel através da carta. Ele não conseguiu ficar de pé e caiu de joelhos, curvado para o chão.

Sua mente parou de funcionar. Não apenas a mente, seu corpo inteiro vacilou. Foi por apenas um instante, mas ele foi atingido pelo sentimento súbito de estar morto. Petel escreveu o seu adeus no papel.

Com apenas uma carta, Moran perdeu seus dois melhores amigos. Foi então que ele finalmente percebeu sua própria tolice. A estrada que havia escolhido não tinha qualquer significado. Não, ela tinha significado, mas era tão pequena quando comparada com o que havia perdido, que praticamente não havia nada.

Se ele tivesse escolhido seguir para Helan, poderia ao menos ter sido capaz de ver Harp uma última vez. Poderia ter visto o belo sorriso dela uma última vez. Poderia ter milagrosamente salvo a vida dela. Mas no final, ele escolheu fechar esta porta por seu livre arbítrio.

Moran perdeu tudo o que tinha naquele dia. Ele não se importava mais em progredir, em se tornar Primeiro-Ministro, posição, fortuna, nada. Ele abandonou tudo e deixou o Palácio Real. Seu coração estava vazio e assim viajou sem rumo. Uma jornada completamente sozinho.

Sem saber quantos dias ou meses haviam se passado desde que deixou a Capital, um dia ele encontrou uma linda flor desabrochando. Ele não sabia o porquê, mas aquela flor lhe parecia especialmente bela. Moran esteve por tanto tempo em meio a escuridão, com sentimentos vazios… que ficou surpreso que seu coração tenha sido encantado novamente. Depois de admirar aquela flor por um tempo, ele notou que outras flores estavam próximas e continuou a caminhar, às seguindo.

Diante de si estava algo chocante. O mais belo campo florido que já havia visto estava diante de seus olhos, com cores vibrantes que pareciam pintar o seu coração acinzentado. Havia um colina inteira coberta de flores. Flores que cresciam de forma natural, vermelhas, azuis, verdes e amarelas. Elas cresciam em tantos lugares diferentes que criavam a ilusão de se estenderem até o infinito. Antes que percebesse, Moran havia se apaixonado por esta terra. Talvez ele pudesse encontrar o fim de sua jornada… o fim dessa longa e cansativa jornada.

Aconteceu de um comerciante estar passando por ali e Moran correu até ele para perguntar onde estava.

— Aqui? Este é o território Helan é claro…

Então este era o território Helan… os olhos de Moran subitamente se encheram de lágrimas. Esta era uma estranha coincidência. Ele lamentou imensamente que não tivesse vindo a tão belo lugar antes e recordou de seus velhos amigos. Recordou de seu primeiro e único amor. Recordou daquilo com o que ela se preocupava e decidiu proteger este lindo território Helan no lugar dela.

Neste dia, Moran decidiu viver sua segunda vida. Decidiu que iria proteger a paz deste lugar. Por ela, a quem ele amava e que já não estava mais aqui. Era muito tarde para receber o perdão, mas ele finalmente encontrou uma forma de viver com a sensação de ter feito a escolha certa em seu coração.

Depois disso, Moran usou seus talentos para ganhar a posição de bibliotecário da Mansão Helan e por décadas, desde então, ele dedicou sua vida em investigar uma forma de derrotar a maldição que certamente um dia ressurgiria.


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