Trovão Infinito Brasileira

Autor(a): Halk


Volume 1

Capítulo 62: Não Dá Para Ganhar Todas (1)

— ERMO —

 

O rapaz do Distrito 5 andava pelos corredores da instalação secreta da classe S sozinho. Pensava consigo mesmo sobre todas as situações que tinham lhe acontecido nos últimos tempos. Estava realmente aborrecido, tão aborrecido que fazia questão de xingar o chão que não lhe fizera nada além de lhe servir como apoio.

Ora, não fora assim sua vida inteira? Sempre gostava de pisar nas pessoas que lhe serviam de apoio. Era assim até com seus amigos, Parca e Saibro. Os dois eram os únicos que estavam do seu lado, porém como Ermo estava irritado demais, não ligava para a demonstração de amizade. Continuava excluindo seus amigos, como o bom egoísta que era.

Por acreditar ser o melhor e mais merecedor de toda a grandeza do mundo, nunca lhe passou pela cabeça estar errado. Tudo que passava em sua cabeça, era como o outro estava errado, ou o quanto o outro estava errado. Não havia pedidos de desculpas, não havia fracasso. Havia sabotagem, apenas. E apenas em sua mente.

Além de ser o único a acreditar em suas mentiras, Ermo ficou afastado, andando pelos corredores. Simplesmente porque quis. Na verdade, se fosse parar para pensar, ele não queria de fato. Fora seu próprio ego quem o levara ali, forçado. E ali ele havia de ficar, andando e perambulando até descobrir uma maneira maquiavélica de dar a volta por cima da situação.

Ele sempre dava um jeito, não dava? A sorte costumava lhe sorrir sempre que possível. Foi assim durante a vida inteira. Todas as tramoias que fizera para transformar a vida de alguém em um inferno foram acobertadas por razões completamente fora de seu controle. Ele era assim. Um grande sortudo. 

Era uma pena não usar tal sorte para o bem e sim para satisfazer seus desejos egoístas. De fato era uma pena, pois a verdade é que mais uma vez a sorte o abençoaria, da maneira mais estranha possível. Ele daria a volta por cima, mais ninguém falaria mal dele. Esqueceriam facilmente todas as suas faltas. Esqueceriam a tortura que fizera com Vida.

Enquanto caminhava, Ermo ouviu um barulho estranho vindo de uma das portas que passava. Era fato que os corredores eram repletos de portas e que lá dentro sempre haviam pessoas trabalhando ou dormindo. Porém aquela era uma porta estranha, tinha uma tranca do lado de fora, o que indicava que não era um local de repouso. 

O mais estranho era que o barulho vinha lá de dentro. Era como uma batida de palma. E Ermo estava começando a estranhar. Olhou para cima e viu que havia algo escrito em uma plaquinha. Dizia: Sala de computação.

“Tem algum soldado transando na sala de computação?”, pensou. Um sorriso maléfico se abriu e ele decidiu que iria entrar de uma vez, pegando quem quer que estivesse lá dentro no ato. Assim, poderia ferrar com a vida de alguém. 

— Peguei! — disse quando abriu a porta.

Não pegou alguém fazendo sexo. Era mais degradante que isso. Era Clio, o ex-auxiliar, amigo de Ash, que estava se masturbando enquanto acessava conteúdo pornográfico no computador.

Clio, completamente assustado, levantou as calças e desligou a tela do computador com uma intensa velocidade. Ele ajeitou os óculos e, completamente vermelho, perguntou nervoso:

— O que você está fazendo aqui?

Ermo mal parecia acreditar.

— Calma aí — disse ele, projetando um sorriso em seu rosto. — Então é aqui que você vem todo dia para se acabar na punheta? 

— Isso não é da sua conta — falou Clio, tentando por o maior esforço na voz possível para parecer respeitável. Porém receber respeito em uma situação como essa requer muito mais do que uma voz controlada.

Ermo notou que na roupa de Clio havia um pequeno crachá que dizia: "Técnico de Informática." Ermo deu uma gargalhada forte.

— Você veio para cá, só para ter acesso a um pornozão? — zombou. — Você é simplesmente… Simplesmente patético!

E deu tanta risada que mal podia se conter. Para o garoto do Distrito 5, ver Clio ali, um rapaz tão respeitado naquela situação, era o maior motivo de piada do mundo. E a verdade era que Ermo tinha certa razão. Clio só havia concordado em conseguir a sala de computação para ter acesso a rede e assim conseguir material para satisfazer os seus fetiches.

— Isso não é da sua conta, Ermo — disse, agora mais calmo e com mais seriedade. — Você é patético aqui. É você quem gosta de torturar garotas. Não eu.

Aquilo atingiu Ermo bem no coração. Clio não era o tipo de pessoa que gostava de torturar ninguém, tampouco de passar por cima dos outros. Já ele, Ermo, era uma pessoa terrível. E ele sabia disso.

— Vamos deixar que os outros decidam quem é o pior então, punheteiro! — falou.

E saiu em direção a porta correndo. Clio correu atrás, pois pressentia o que ia acontecer. Entretanto, não fora rápido o suficiente. Assim que tentou alcançar a porta, Ermo a fechou, a trancando por fora. 

— Me deixa sair! — gritou a voz abafada de Clio, que vinha do lado de dentro. 

— Nem pensar. Agora você fica aqui até eu voltar com algum supervisor. E nem tenta apagar o teu histórico. 

É claro que Clio iria apagar. Porém, mesmo que não achasse nada, uma denúncia como aquela, mesmo vinda de Ermo, poderia resultar em uma vigia. A classe S era poderosa e poderia muito bem ter câmeras escondidas naquela sala. Entretanto, sabe-se que a instalação tinha poucas câmeras por conta de uma medida da Comandante Negra a muitos anos atrás.

Ermo já ia sair correndo para chamar alguém, quando se virou para o lado e viu uma coisa estranha se aproximando. Parecia uma pessoa, porém mais esguia e com a pele completamente exposta. Ermo não sabia, mas aquilo era um Estertor. E assim que a criatura avançou em sua direção, o rapaz conseguiu se desviar e sair correndo, deixando Clio para trás.

— Socorro! — gritava Clio, achando que quem estava no corredor era um ser humano.

Quanto mais ele gritava, mais das criaturas apareciam no corredor. Não demorou para tentarem arrombar a porta. Clio não via o lado de fora. Imaginava que era alguém que não sabia o que estava fazendo.

— Você só precisa puxar a fechadura. Daí você só precisa abrir a porta…

Mas a porta foi arrombada, sendo jogada para longe. Clio desviou por pouco. Mas assim que ele se virou para a porta e viu aquelas criaturas, entendeu que era melhor ter tentado sair por outro lugar.

O rapaz correu para longe, gritando, pedindo socorro. Mas só havia uma saída. Foi aí que olhou pra um duto de ventilação. Aquela poderia ser a sua salvação. Se agachou rapidamente, tirou a grade e começou a entrar.

Antes de por seu corpo completamente para dentro, sentiu algo perfurar sua perna e o arrastar para fora da passagem. Eram três Estertores que estavam em cima dele. 

Ele foi comido vivo, aos poucos. Ou seja, demorou para morrer, pois acharam sua carne macia, então ficaram mordendo diversas vezes apenas para sentirem a sensação da pele sendo perfurada por seus dentes.

 

ϟ KAIKE ϟ

 

Estou correndo em direção ao dormitório. Sei que lá com certeza seria o local onde a maioria dos recrutas estariam caso acontecesse uma invasão. 

Quer dizer, não é como se eu tivesse recebido alguma instrução sobre como proceder em uma invasão, mas sei que com toda certeza vou achar um retardatário que ainda não foi até o local de encontro. Daí basta seguir ele. E principalmente, proteger ele.

Quando viro um dos corredores, dou de cara com uma criatura estranha. Imediatamente noto que se trata de um Estertor. O que ele está fazendo aqui?

Assim que nota minha presença, a criatura correu para cima de mim. Eu revido com apenas um golpe, quebrando seu pescoço. Essa foi fácil.

— Um Estertor? 

Então as coisas começam a fazer sentido na minha cabeça. A invasão foi causada por uma infestação, que veio do Porão.

— Remi! Isso é um teste?

— Não tenho dados suficientes para uma resposta significativa.

Droga! Continuo seguindo até achar o dormitório. Enfrento algumas criaturas fracas aqui e ali. Fico preocupado pois vejo algumas marcas de sangue espalhadas aqui e ali. Quando chego, noto que está completamente vazio. 

— Kaike! — ouço alguém dizer atrás de mim.

Quando me viro, meu coração quase salta de alegria e por um segundo penso em ir abraçar a pessoa que me chamou: Solares. Ela está junta de sua amiga, Leona. Eu me aproximo.

— Sol! O que aconteceu? Isso faz parte do treinamento?

— Treinamento? Não, não tenho certeza sobre isso. Não fui informada. Parece ser uma invasão — diz ela.

— Na verdade é uma infestação — respondo. — Essas criaturas são do Porão. Um lugar secreto que fica abaixo da instalação, onde eles fazem experimentos. Essas criaturas costumam ficar trancadas, porém parece que alguém liberou elas.

— Como você sabe de tudo isso? — pergunta Leona.

— Isso não importa agora — fala Solares. Ela ficou muito curiosa com o que falei, porém não me faz nenhuma pergunta. Pelo visto ela foi bem treinada, sabe que em situações assim, o certo é receber informações e trabalhar com elas, sem questionamentos. Os questionamentos vêm depois da ação. — Precisamos nos reunir e proteger o maior número de pessoas possíveis. Parece que alguém ficou sabendo sobre a saída dos nossos superiores. O que significa que há um infiltrado entre nós. 

Ela olha para mim com firmeza. Então olha para o meu bastão. Ela não pergunta nada, porém quer saber onde conseguir isso. 

— Podemos contar com a sua ajuda? — pergunta.

— É claro que sim.

E então nos separamos novamente, dizendo que o dormitório será nosso ponto de encontro. Vamos tentar resgatar o maior número de pessoas possíveis e levar elas até aqui, o local seguro.

Depois, é bem provável que vão me fazer um monte de perguntas. Afinal eu sou o mais suspeito. Eu sei demais e tenho agido da mesma maneira que um infiltrado agiria… Só que… Eu não sou o único que fez isso.

— Porra, Tomas! — xingo, enquanto esmago o crânio de criaturas imundas.





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