Volume 1

Capítulo 58: Afeto Vermelho Sangue

— Então, o que você pretende fazer, Agnes? — perguntou Colth após ter se decidido.

A garota chacoalhou a cabeça para deixar as reflexões de lado e voltou determinada com o seu planejamento em meio a bela alameda da cidade Rubra que os levariam até o cristal, a saída daquela realidade, mas ainda precisariam passar por Lashir. Agnes estava disposta a fazer de tudo para colocar um fim em tudo aquilo:

— Lembra do que eu falei? Meu escudo é forte o suficiente contra a bruxa. Então é só fazer o que eu disser, que vai dar tudo certo.

Colth foi convencido e deixou isso claro acenando positivamente com a cabeça.

Agnes finalmente voltou a correr em direção a mulher de vermelho enquanto o seu tio a acompanhava ouvindo suas diretrizes. Se aproximavam rápido de Lashir, a guardiã de Rubrum por sua vez, estranhou a atitude dos dois, mas não hesitou em responder à altura da ousadia no meio da rua:

— Acham que eu não dou conta de vocês dois? — perguntou ela com um sorriso cruel satisfeito no rosto — Podem vir!

Lashir mostrou as palmas das mãos planejando lidar com os alvos que continuavam rápido em sua direção. Ela sabia que não podia acertar a guardiã de Mutha com um de seus projéteis de sangue e, mesmo que estivesse em uma luta corpo a corpo com garota, teria dificuldade em passar pelo escudo de Mutha. Tendo isso em mente, planejou impedir a passagem de Agnes pela rua e acertar Colth a distância com a sua magia assim que ele passasse por ela.

Acertar um alvo pelas costas, sua especialidade enquanto guardiã de Rubrum. E quando o rapaz tivesse sido alvejado, ferido ou morto, finalmente poderia ter uma luta de igual para igual com a guardiã de Mutha, e ela não teria a menor chance, afinal, era só uma garotinha.

— Agora! — gritou Agnes enquanto avançou sua corrida pela direita da rua, Colth fez o mesmo só que pela esquerda.

Tudo acontecia de acordo com o esperado por Lashir, os alvos se dividiriam e tentariam fazê-la confusa. Não aconteceu, a guardiã de Rubrum sabia exatamente como lidaria com aquele plano infantil.

A mulher de vermelho escolheu o alvo da direita para o combate a curta distância, fechou o caminho de Agnes e, assim que ela se aproximou, com uma das mãos, tentou impedir seu avanço.

Lashir esticou o braço em direção a garota no esforço de agarra-la. Agnes respondeu pisando forte no asfalto para parar a sua corrida e desviar do ataque da oponente. Esquivou-se como geralmente não fazia, um leve pulo para trás que impediu os dedos de Lashir tocarem em seus cabelos alegres ao vento. Achou que estava momentaneamente segura com aquele movimento preciso, mas estava enganada. Lashir era muito mais veloz e ágil.

A mulher avançou um passo rápido para frente, tão sútil e ao mesmo tempo eficaz que parecia mágica. Ela pareceu levitar sobre o asfalto em uma fração de segundo sublime, talvez realmente fosse magia. Avançou aquele curto espaço como um raio e alcançou a garota com o seu agarrar pretendido desde o começo.

Lashir não perdeu tempo após ter a pequena oponente em seus braços, rapidamente girou seu corpo com a facilidade de uma acrobata e colocou os olhos em Colth no decorrer da rua, ele mantinha a corrida em direção ao cristal sem olhar para trás, o que não a surpreendia nenhum pouco.

Agnes se debateu e investiu em sua fuga, completamente em vão. Lashir tinha todo o controle sobre ela e não a deixaria escapar de modo algum, poderia acabar com a garota a qualquer momento, mas não o fez de imediato, a mulher tinha a sua maior atenção sobre o avanço rápido de Colth.

A guardiã de vermelho apontou a palma da sua mão para as costas do rapaz concentrando-se na mira e na sua magia, desejou o pior para ele, disparou o seu projétil mortal.

A adaga pontiaguda de sangue sólido saiu da mão nua de Lashir e sobrevoou a rua como uma flecha rumando ao encontro das costas de Colth. O projétil estava prestes a acertar o alvo, seria um ferimento irreversível, mais uma obra perfeita da guardiã de Rubrum, mas a adaga simplesmente chocou-se com o ar e foi impedida de concluir o seu caminho natural, caiu no asfalto e permaneceu. Colth manteve sua corrida e entrou pela praça.

— O quê? — se perguntou Lashir observando o rapaz correr para longe. Sem entender de fato o que havia acontecido, a mulher voltou os seus olhos ao primeiro alvo que ainda mantinha em seus domínios.

Finalmente se deu conta, ela tinha os braços envoltos ao corpo da garota. Estava segurando e tocando o tecido delicado rosa do macacão, não só isso, podia sentir a pele quente e macia dela sem qualquer coisa entre aquela sensação. Não havia escudo de Mutha algum ali.

— Boo! — Agnes urrou assombrando a poderosa mulher como se assustasse uma criança confusa.

A garota sorriu vendo o rosto da inimiga de tão perto se dando conta do ocorrido. Agnes não projetou o seu escudo sobre ela própria, e nem deu vida a sua espada, mas entregou uma defesa sólida sobre o seu tio. Com a magia apenas se dando o trabalho de proteger ele e mais nada, Colth era praticamente intocável naquelas condições.

— O que você fez, pirralha? — perguntou Lashir com os olhos em chamas. — Vai ser absorvida por mim, deixará de existir aqui também.

— Essa realidade já estava ficando bem repetitiva, e o meu tio vai acabar com esse lugar mesmo — a garota sorriu com o canto de boca.

— O quê? — Lashir arregalou os olhos percebendo o pior. Se virou rápida e gritou ameaçando com todas as forças o rapaz à distância: — Se fizer isso, nunca mais vai vê-la!!!

Colth estava prestes a tocar no imenso cristal que emitia um brilho vermelho característico ao centro da praça, faltavam apenas alguns passos, mas parou ao ouvir aquelas palavras fortemente desesperadas.

— Se fizer isso, eu absorvo a alma dessa vadiazinha — repetiu Lashir mostrando a garota rendida em seus braços de forma severa.

Colth estranhou de imediato, ficou surpreso com a situação e tentou entender o que havia acontecido enquanto a guardiã de Rubrum caminhava em sua direção com uma das palmas da mão sobre o pescoço de Agnes a domando por completa. O rapaz destacou suas sobrancelhas descrente:

— O que você fez, Agnes? Tinha me falado que não precisava me preocupar, disse que tinha o seu escudo impenetrável.

— Pois é... Mudança de planos? — ela respondeu desviando os olhos em tom irônico enquanto nos braços de Lashir. Sorriu para o rapaz determinada: — Não se preocupa, enquanto você ficar com o Boo, vai estar protegido. Então só encosta nesse cristal aí, e acaba logo com isso, tá legal?

Colth manteve-se preocupado antes de sussurrar os seus pensamentos e a resposta para desvendar o que havia acontecido:

— O boneco... o escudo está no boneco.

Colocou a mão sobre o bolso da jaqueta e sentiu a saliência do trapo, teve certeza daquilo ao lembrar da promessa feita junto a Agnes. Apontou seus olhos para o cristal sabendo que aquele era o objetivo.

— Se fizer isso, eu acabo com a guardiã de Mutha! — Ameaçou Lashir novamente com todas as suas forças.

— Não precisa se preocupar comigo, tio Colth. Você pode simplesmente encostar nesse cristal e desejar destruí-lo, essa não é só a consciência e as memórias mais protegidas de Lashir, é também a alma dela.

— Vadiazinha...

— É por isso que sempre que eu me aproximava daqui você sabia da minha presença. Treinou para isso, não é bruxa? — retrucou Agnes — Aprendeu a identificar algo estranho em sua consciência que podia apresentar risco, afinal essa é a maior competência da magia de Anima. Magia que está em posse de um inimigo seu. Aprendeu a se defender de um ataque na realidade de seus sonhos, pois essa era uma arma poderosa contra alguém como você, alguém tão ferrada da cabeça que chega a dar dó.

— Cala a boca! — esbravejou Lashir. — É sua última chance, guardião de Anima, se não se afastar daí eu vou absorver a alma da guardiã de Mutha, eu falo sério. Ela vai desaparecer.

Colth manteve-se imóvel por todo esse tempo. Pensativo, não conseguia achar uma saída que lhe agradasse, só podia fazer uma escolha, uma escolha simples, mas que pesaria em seus ombros pelo resto de sua vida.

— Eu posso tentar outra coisa, Agnes — sussurrou ele.

— Pode, eu sei que pode. Mas e depois? Vamos fugir dessa bruxa e ficar nos escondendo?

Lashir apertou os braços ao entorno do pescoço da garota provocando dor intensa após o insulto.

— Sim, vamos achar outro modo de sair daqui — disse Colth sua decisão.

Agnes fechou os olhos por um segundo, quando retornou a abri-los foram acompanhados por um sorriso brilhante jovial, deu sua resposta:

— Eu também estou cansada de fugir. Só me deixa descansar, tá bom?

Colth engoliu seco, finalmente percebeu. Aquela não era uma escolha dele, não devia ser, não seria justo se fosse. Respirou fundo com os olhos ganhando um brilho recíproco.

Agnes acenou com os olhos em certeza da sua escolha. Colth respirou fundo aceitando aquilo em seus pensamentos mais profundos:

“Mesmo não estando mais viva, você continua me protegendo, não é Nya?... quer dizer, Agnes. Você é realmente filha da sua mãe e, mesmo depois de me ver fracassar mais de uma vez, continua me dando oportunidades de continuar e tentar de novo. Eu prometo que vou carregar o seu desejo, sua morte não será em vão. Obrigado, Nya. Obrigado Agnes.”

Tomou fôlego para finalmente fazer aquilo.

— Eu não vou desperdiçar nem mais uma chance!

— Não faça isso! — Lashir com mais uma de suas ameaças.

— Não é você quem decide — Colth levantou a mão e a colocou sobre a superfície do cristal se concentrando em sua magia de Anima.

A mulher de vermelho apontou uma de suas mãos rapidamente em direção a Colth, mirando o peito do rapaz, arremessou seu projétil de sangue para tentar impedi-lo, não foi possível. A adaga sanguínea sólida parou no escudo de Mutha ao redor do corpo dele sem feri-lo.

Lashir precisava destruir aquele escudo se quisesse manter-se viva, imediatamente teve a ideia de extinguir a magia de Mutha dali. Focou-se na garota em suas mãos e usou a sua magia, a magia de Rubrum, para isso. Suas mãos brilharam sobre o corpo de Agnes indefesa.

— Ahhh!!!

A garota sentiu a dor de imediato, a mesmo dor que havia corrido pelo seu corpo no bosque vizinho à cidade de Toesane, o lugar onde havia deixado escapar sua vida. Resistiu a dor da tristeza, a sua morte não seria apenas resumida aquilo. Sua morte teria um motivo agora, um motivo que ela queria, e que não fora imposto, um motivo que se orgulharia de ter protegido.

Colth derramou lágrimas ao ouvir os berros de dor de sua sobrinha, mas se concentrou mais firme para tentar acabar com o sofrimento dela. Se concentrou o bastante enquanto o vento começou a soprar forte para todas as direções.

— Ahhh!!!

— Ahhh!!!

Os gritos de dor de Agnes e de esforço do tio se misturavam simultâneos.

Em segundos o escudo imaterial caiu e Colth ficou exposto. Lashir viu a oportunidade, imediatamente apontou a palma da mão em direção ao rapaz concentrado sobre o destruir do cristal e atirou mais uma de suas adagas de sangue. O objeto pontiagudo partiu rápido de suas mãos, mas nunca alcançou o objetivo pretendido, não chegou a lugar nenhum. Uma nuvem de areia foi erguida levando a luz e, em seguida, a existência. Logo, tudo escureceu. O cristal havia sido partido pela magia de Anima, havia sido destruído por Colth.

                                               ***

O lugar era completamente vazio, não havia nada além do chão vermelho banhando por uma lâmina fina d’água. No horizonte, o branco ganhava imagens desconexas do que pareciam lembranças da guardiã de Rubrum, os olhos confusos de Colth se perderam diante de tanta informação:

— Onde eu estou? — sussurrou perdido no vazio.

— Estamos no inconsciente da Lashir — respondeu Agnes chamando atenção ao lado de seu tio.

— Você está bem? — se surpreendeu ele.

— Sim, não se preocupe comigo — A garota sorriu. — Acho que você conseguiu, entrou na parte mais interna da consciência da bruxa vermelha. Aqui é onde estão todas as memórias mais obscuras dela, os medos e os segredos mais bem protegidos. E agora, a guardiã de Mutha — apontou para si mesma.

— Eu não entendo...

— A bruxa absorveu toda a minha magia, e com ela, o que ainda restava da minha existência, a parte da minha alma que ainda resistia. Em breve eu deixarei de existir.

— Agnes... eu sinto muito.

— Não se preocupe, eu estou muito feliz, sério — ela sorriu suave.

— Tem certeza? — Colth manteve sua preocupação e seu desalento.

— Certeza absoluta. Eu ajudei a acabar com a bruxa que ameaçava o meu mundo, se isso não é dever cumprido, eu não sei o que é. Além disso, eu passei tanto tempo nessa realidade, que continuar viva já não faz mais sentido para mim.

— Se é o que você quer... — concluiu ele evitando as lágrimas.

— Eu até queria que tivesse sido diferente, mas pelo menos no final, a escolha foi minha. Graças a você, obrigada.

— ... — Colth calou-se.

—Bom, eu tenho de ir, sinto algo do outro lado me chamando — a garota disse em tom de despedida olhando para o branco vazio sem fim. — Mamãe vai ficar feliz quando eu contar sobre a pessoa que você se tornou.

— Eu já ia esquecendo. — Colth retirou a boneca de pano do bolso do casaco e ofereceu a garota. — Preciso devolver isso.

— Não, eu quero que fique com você. Assim como a magia de Mutha e de Rubrum.

— Hã?

— Não achou que eu deixaria com a Lashir, não é? Eu coloquei o pouco da magia de Mutha que havia me restado nesse boneco e, dá uma olhada na sua mão — Agnes deu tempo para que o rapaz percebesse que segurava uma lasca do cristal que acabara de destruir — Esse é um resquício da magia de Rubrum. Com esses dois fragmentos em sua posse, você poderá usar esses tipos de magia ao seu favor.

— Usar as magias?...

Colth segurou os dois objetos, um em cada mão, e os viu desaparecer em forma de partículas de luz que se misturaram a pele da palma de suas mãos. Ficou atônito, mas não recuou.

— Só me prometa que não vai usar a magia de absorção de Rubrum contra a vontade de alguém, tá bom? — condicionou Agnes se lembrando do tempo que passará aprisionada na realidade dos sonhos de Lashir.

— Tá, claro — concordou ele.

— Tenho certeza de que achará um bom uso para essas magias.

No momento em que Agnes terminou sua afirmação convicta, o chão tremeu e o vento soprou, ela então olhou ao redor e se preparou para suas últimas palavras:

— Essa realidade acabou, é melhor você ir e... — Antes que percebesse, sentiu o abraço quente de Colth uma última vez.

— Me desculpa, por tudo.

A garota se espantou de imediato, mas logo abriu seu sorriso nos braços seguro do último que restava de sua família, deixou ser abraçada com a felicidade reencontrada. Derrubou as lágrimas de despedida que segurava disfarçadamente:

— Não precisa se desculpar. Eu é quem deveria agradecer.

O vento ficou mais forte e a escuridão tomou conta de tudo uma última vez naquela realidade.

— Obrigada.

                                               ***

Colth sentiu a fraca luz incomodar seus olhos fechados em conjunto com o frio úmido que odiava, então ouviu de uma voz masculina familiar:

— Espera, parece que ele está acordando.

Abriu os olhos e encontrou sua visão embaçada e seu corpo ainda dormente. Reconheceu o lugar, mas ainda estava confuso quanto ao tempo e o que havia acontecido enquanto estava em outra realidade. Sentou-se no chão duro onde se encontrava e, enquanto tentava entender os olhares preocupados de duas pessoas sobre ele, repentinamente, alguém lhe abraçou, um terceiro que o surpreendeu.

Não pôde resistir, ainda não tinha recuperado todas as funções de seu corpo abatido e, quando estava prestes a indagar sobre aquilo, foi mais uma vez surpreendido pelas palavras em seus ouvidos de uma voz sussurrada da pessoa que lhe abraçava, ele a reconheceu de imediato:

— Que bom que está bem — murmurou Garta, tão aliviada que deixou escapar mais palavras do que deviam: — Você me deixou tão preocupada, seu idiota. Nunca mais faça isso comigo.

Colth ainda estava surpreendido o bastante para não ter palavras, mas suspirou contente ao sentir os batimentos do coração dela tão fortes sobre o seu corpo.

— Cara, você é mais corajoso do que eu imaginava — disse Goro observando o rapaz sentado ao chão do altar daquele anfiteatro subterrâneo. Sorriu contente, seus olhos se afiaram enquanto cantarolava as suas palavras — Ou talvez seja mais maluco do que eu pensava.

O homem mais velho encapuzado ao lado também se pronunciou sobre o ocorrido de uma forma mais séria:

— Sendo maluco ou não, Goro. O seu amigo é realmente misterioso. Eu imaginei que seria impossível, ou pelo menos muito penoso, para ele sair com vida da consciência de Lashir, mas creio que me enganei. — Índigo se voltou ao rapaz que continuava ao chão sendo abraçado por Garta: — Você aparenta estar até melhor do que antes, parece mais determinado.

— Bom — conseguiu dizer suas primeiras palavras —, eu estou nos braços de uma garota que se preocupa comigo, é claro que eu estaria mais determinado.

Garta se levantou imediatamente com um pulo para trás deixando o rapaz distante:

— Idiota! Não era nesse sentido — ela virou o rosto com as bochechas avermelhadas e as sobrancelhas anguladas pelo aborrecimento. — Eu estava preocupada, pois não queria que a Lashir absorvesse o seu poder e ficasse mais poderosa.

— Poxa, isso me deixa triste — retrucou Colth cheio do sarcasmo. — Espera, falando na Lashir, o que aconteceu com ela?

Colth se levantou com alguma ajuda de Goro. Os quatro caminharam poucos passos sobre o altar para então observarem a guardiã de Rubrum estirada ao chão sob os seus pés.

— Eu vou acabar com isso — Garta se preparou para atacar Lashir indefesa.

— Espera — solicitou Colth e foi atendido. — Ela não representa mais perigo.

A mulher de vermelho deitada ao chão possuía um olhar perdido para o teto de pedra da câmara subterrânea. Fraca em seus últimos suspiros, aquele era o seu leito de morte, ela sussurrou ao perceber a presença dos outros:

— Não é justo.

— Não, Lashir. Nunca foi justo — respondeu Colth certeiro.

— Rubrum morreu assim como eu estou destinada a morrer agora, foi traído por seus irmãos hipócritas e pelos mundos sujos que eles criaram.

— Rubrum sabia exatamente o que ele estava fazendo, mas não temeu. Ele apenas queria te proteger e arriscou tudo para isso.

— Mentira!

— Ele te amava.

— Mentira! Se realmente me amasse, teria deixado o meu sacrifício acontecer e o meu mundo estaria em paz até hoje. Ele foi traído, assim como eu.

— Pense o que quiser, não vai mudar o fato de que Rubrum fez o que fez para te proteger.

 

Lashir mirou os olhos na direção deles.

— Eu sabia que isso poderia acontecer, afinal, vocês todos são sujos. Talvez Lux estivesse certa. Talvez recomeçar seja a resposta.

— Do que você está falando? — Estranhou Colth.

— A cabeça dela deve ter fritado, não deve estar falando coisa com coisa mais — comentou Goro.

— Eu queria recuperar Rubrum, eu juro que tentei — Lashir continuou enquanto o brilho dos seus olhos escarlates diminuía — Mas se não é possível, então que aqueles que provocaram tudo isso sejam punidos.

 — Do que você está falando?! — Colth pressentiu o pior.

— Por que acham que eu precisava da guardiã de Finn e Tera juntas na soltura da deusa Tera?

— Hã?

— Estúpidos, a magia de Finn é basicamente a energia que lida com as conexões dos mundos, podem chamá-la de energia do espaço. Ela é responsável por permitir ou rejeitar viagens entre os mundos. Aqui em Tera, é ela o que impede de Lux vir a esse mundo. E a cachorrinha da guardiã de Finn ainda usa uma coleira... — disse a mulher em seus últimos suspiros com um sorriso cruel observando Garta. — O que significa que sua magia é totalmente contida.

— O que você quer dizer com isso?! Fale de uma vez!

— O único resquício da magia de Finn nesse mundo, nesse momento, é o que está sendo mantido naquela barreira que aprisiona a deusa de Tera. Sem ela, nada mais impede a vinda de Lux a esse mundo.

— Droga... — Índigo se pronunciou preocupado. — Precisamos impedir o fim da barreira.

— Ou podemos tirar essa coleira da Garta — envolveu-se Goro.

— Não, isso pode matar ela — interferiu Colth.

A guardiã de Finn imediatamente levou suas mãos para o colar de Sathsai que a impedia de usar sua magia e engoliu seco sabendo que não seria algo tão fácil, se tentasse o colar se apertaria ao seu pescoço mais e mais. Da última vez foi Bertha quem deu conta de remover aquela peça, mas a inventora tinha paradeiro desconhecido, não era uma opção.

— Boa sorte com isso — proferiu Lashir mantendo o sorriso cruel no rosto com os olhos se fechando pela última vez. — E que Lux não tenha piedade de vocês...

— Como tiramos isso da Garta?!

Colth gritou para o cadáver sem receber qualquer resposta se não a morte da guardiã de Rubrum. Afligiu-se, quando estava pronto para pensar sobre o que viria a seguir, ouviu um som que surpreendeu a todos ali.

O barulho de uma explosão sem anúncios. O chão e o teto tremeram com violência evidenciada por um estouro próximo de onde estavam.

— O que foi isso? — Goro foi o primeiro a perguntar.

— Parece que veio do Norte — disse Colth.

— O palácio — retificou Índigo.

— Droga... — Garta se preocupou ao máximo. Olhou para os outros três antes de trazer às palavras os seus receios: — A barreira que prende a deusa de Tera.



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