A Lenda do Destruidor Brasileira

Autor(a): Pedro Tibulo Carvalho


Volume 1 – Arco 2

Capítulo 22: A viagem para Alamar começa

— Então, pra onde exatamente nós vamos agora? — Hector perguntou enquanto os dois amigos saíam da sede da Associação dos Mármores de Lockust, que ainda se mantinha intacta, apesar da batalha que ocorreu.

Ethan pensou por um momento e olhou para o céu, buscando nas memórias o que exatamente seu mestre havia mandado ele fazer.

— Temos que chegar em Iron Lake e então ir para Alamar, em Cronos — respondeu, pensativo. Não sabia o porquê, mas, agora que estava para prestar o exame, tinha um enorme receio crescendo dentro de si. “Mantenha a positividade! Vou me tornar um Mármore e ser livre!”

— Cronos? Isso é do outro lado de Nevra, não é?

— Relaxa, ao menos não é numa das fronteiras.

As fronteiras de Nevra eram as portas para o Mar Desconhecido, lugar onde a OPML não tinha poder, era repleto de perigos e monstros, o que fez com que as duas ilhas de Rhéia e Uranus servissem como pontos de parada de muitos Mármores, assim como lar de várias Seitas que guardavam as cidades.

O fato de estarem tão próximos da fronteira sempre incomodou Hector, visto que ele estava acostumado com a Orla Mediana do Mundo Livre, um lugar relativamente seguro, com qualidade de vida muito superior às ilhas da Orla Externa.

De fato, esse lugar era tão perigoso que o Ladino sabia que era a localização ideal para diversas Seitas e organizações criminosas, tal qual a Confederação de Piratas, que era uma das últimas pistas que teve sobre sua irmã, se esconderem.

Além disso, os Mármores Investigativos eram extremamente numerosos nessa área. A proteção só era mais fraca em arquipélagos como Nevra, que já tinham Mármores Exploradores para cumprir o papel de segurança.

Ele ficou preocupado da primeira vez que se uniu a Guilda mas, assim que conheceu mais sobre Locust, pôde ver um pouco do contexto local. Era dolorosamente evidente que a OPML tinha controle sobre a cidade. Se eles respirassem muito alto, seria guilhotina para todos ali.

Evitou chamar atenção, por isso ficou o mais quieto possível e seguiu as ordens do lado que tinha mais chance de vitória. Foi assim até Ethan aparecer e começar a mudar a perspectiva dele sobre o mundo.

O rapaz compreendia a dor da perda e mostrava compaixão para qualquer um, sem pedir nada em troca. Era quase como uma criança e, por mais que fosse irritante no princípio, era algo refrescante e que desarmaria qualquer um que soubesse da história dele.

Pensou novamente nas implicações do Carisma e do quão assustador era aquele Status. A habilidade dele de perceber, mesmo que inconscientemente, o que dizer para fazer as pessoas se abrirem para ele era assustadora.

E mesmo assim ele era o mais próximo de um amigo que Hector tinha.

— Bem, aqui estamos… parece até que a última vez que pisei na estrada foi ontem… — comentou com a mão na empunhadura da espada, pronto para tirá-la da bainha a qualquer momento. — Bem, vamos?

Os dois então seguirão para a próxima cidade, onde encontrariam a caravana que os levaria para Iron Lake, junto de vários outros examinados.

 

Após dois dias de uma longa caminhada, Hector e Ethan decidiram correr até o local. Ambos eram rápidos o suficiente para parecerem vultos, e, enquanto um se movia com graça, o outro apenas se importava com a eficiência do movimento.

“Ele é rápido…” pensou enquanto acompanhava o ladino. Era esperado da classe, mas ainda era impressionante para si o quão ágil ele era. Ethan estipulou que seu companheiro estava próximo da metade do nível 2 em questão de Destreza. “Bem… acho que eu também fiquei mais rápido…”

Era verdade. Antes de chegar em Locust, sua velocidade era grande, mas não era como se tudo fosse um vulto ao redor. Agora ele era tão rápido que mal conseguia perceber os arredores.

Isso trazia outra questão importante para si. Teria que treinar o Status de Sabedoria para aumentar a percepção. Ainda tinha pouca experiência de vida, logo, usaria o exame dos Mármores para aumentar um pouco esse Status.

Os dois enfim avistaram um pequeno vilarejo e apressaram o passo. Em minutos estavam no portão. Ambos desaceleraram e começaram uma quieta caminhada, indo para a ala leste, onde a Caravana estava.

— Ei Hector — chamou ao puxar um pequeno cartão. — Como foi a avaliação dos Status?

O Ladino parou e pegou seu cartão, tocou numa runa no centro e um holograma mostrou os seus números. Ethan observou com surpresa cada um.

Força: 13

Destreza: 36

Constituição: 24

Sabedoria: 15

Inteligência: 28

Ethan ficou impressionado com a Destreza e Inteligência do amigo e notou, com certa surpresa, que ambos eram especialistas. — E você?

Ethan tocou na mesma runa e, uma vez mais, sorriu com o crescimento que aquele objeto demonstrava.

Força: 27

Destreza: 28

Constituição: 33

Sabedoria: 15

Inteligência: 14

Carisma: ?

O rapaz lembrou da explicação que a mulher deu para ele sobre os Status e do ritual que fez para mostrá-los. Enquanto era um ritual complexo, atualizar era mais fácil que avaliar, então só precisaria tirar um pouco de sangue a próxima vez.

Perguntou-se o que o Carisma significava uma vez mais e por que a mulher ficou tão impressionada com aquele Status.

— Conseguiu alguma habilidade? — Hector perguntou, apertando outra runa e mudando o holograma.

Sorte e Aumento Explosivo (destreza), ambas eram normais, raras, mas normais. Também havia a habilidade única: Condutor Divino (linhagem). Essa era uma habilidade única dele, a maior raridade possível.

Ethan fez como o amigo e mudou o holograma.

— Escolhido do Destino e Mimetismo Físico (linhagem), nada mal. — Eram duas Lendárias, uma raridade abaixo das Únicas, mas não foi isso que chamou a atenção de Hector. — Nascido da Tinta, Cântico do Destruidor (herdada) e Lorde da Carne (?)… pera, o que?

Três habilidades únicas e ele era um mero novato…

“Que tipo de monstro você é?”

— A moça ficou chocada quando viu. Só sabia do Mimetismo. Lorde da Carne me é familiar… só não consigo dizer de onde — falou enquanto abria a descrição de Escolhido do Destino e lia ela.

Aqueles escolhidos pelo Destino apresentam sorte e lábia incrível e dificilmente são derrotados. Enquanto tiverem o destino ao seu lado, não há situação que não consigam virar.”

Legal… e sobre as únicas? — disse mas, para sua surpresa, não havia descrição sobre elas. — O que?

— Habilidades únicas são aquelas que só uma pessoa registrada tem. Assim que outra pessoa adquire uma delas, elas se tornam Lendárias. Depois, quando é possível replicar a forma de adquiri-la, elas viram Míticas.

— Você sabe bastante sobre isso…

Hector sorriu enquanto lembrava de dias mais simples, onde ele podia ler com tranquilidade e se focar nos estudos. Dias que jamais retornariam…

— Tive muito tempo pra estudar no passado — falou enquanto afastava os pensamentos melancólicos e voltava o foco para frente. — Não é aquela a caravana?

Ethan olhou e, de imediato, soube que aquele era o grupo correto. Haviam alguns mercadores mas a maioria era formada de guerreiros. Havia todo o tipo de gente ali, desde Bárbaros até Magos. “Bem… aqui vamos nós.”

Assim os dois ingressaram junto a Caravana de Ghuthen, uma das várias que ia para a cidade portuária.

 

Alguns dias depois, a caravana os largou em Iron Lake.

Ethan e Hector alcançaram o porto e adentraram no enorme navio, várias pessoas observavam eles. Vários eram aspirantes do Exame mas quase nenhum interessou o jovem Destruidor.

Não sabia quando ocorreu a mudança, mas percebeu que seus instintos de luta estavam mais afiados desde Locust. Agora era capaz de dizer a força de alguém apenas por olhar para essa pessoa, um truque importante e que todo Mármore devia ter.

Só havia uma pessoa ali que despertou seu interesse. Assim que a viu, soube que aquela era uma mulher muito especial e forte, além de ter a impressão de já a ter visto.

Ela também o olhava com interesse, como se calculasse cada movimento dele e procurasse a melhor alternativa. Ethan notou, com certo desgosto, que lutar não era parte da natureza dela e se perguntou o que fazia naquele barco.

Assim que pensou nisso, o enorme cruzeiro zarpou para fora de Gaia e o rapaz direcionou um olhar para o porto, que ficava mais e mais distante.

— É a sua primeira vez saindo de casa? — perguntou a loira, a voz melodiosa e tranquila mostrava o quão gentil ela era. Seus olhos se cruzaram com os dela e ele reconheceu a cor vermelha.

— Como sabe? — Por mais que aparentasse calmo, dentro de si estava pronto para uma luta enquanto procurava alguma saída. Hector notou isso e pôs as mãos nas adagas.

— Dá pra ver no teu rosto. É o mesmo olhar dos filhos de pescadores e mercadores — falou com um sorriso charmoso no rosto. Ela era baixinha e tinha uma postura completamente diferente de Jack mas ambos estavam prontos. — Soube que encontraram meu irmão em Locust…

A tensão subiu no corpo de ambos. Se ela fosse alguém tão competente quanto o “Dragão em forma humana” eles perderiam a luta.

— Não se preocupem. Diferente do idiota, eu não tenho interesse em lutas bobas. Sou uma Clériga… lutar vai contra minha natureza — sussurrou enquanto se virava para longe.

A impressão que os dois tiveram era que ela estava desapontada com algo que os eludia.

— Ele tá bem? — Ethan perguntou, o que trouxe a atenção dela de volta para si.

— Ele foi esfaqueado na jugular… o que você acha?

Os olhos dos dois se encontraram e a intensidade em ambos era clara. — Ele tá vivo.

— Isso não foi uma pergunta — respondeu com um sorriso. — Ele tinha razão… você é interessante. Acho que deveria saber que ele não ficou feliz com a forma como a luta foi concluída…

O rapaz sorriu e fechou os olhos enquanto se lembrava da intensa troca de faíscas que o aço das lâminas proporcionou.

— É… eu gostaria de lutar com ele de novo — sussurrou alto o suficiente para ambos ouvirem. — Só espero que ele me perdoe.

A garota pareceu satisfeita com sua resposta, ainda que mostrasse um pouco de irritação. Ela estava acostumada a lidar com seu irmão, mas ter outro maníaco por perto seria prejudicial a sua saúde.

— Qual o seu nome?

— Liza… Liza Colt.

 

Alguns dias se passaram e a embarcação já estava em alto-mar. Enquanto o clima estava tranquilo a algumas horas atrás, uma tempestade irrompeu.

— Recolham as velas! Remem como se suas vidas dependessem disso! — gritava o capitão, amaldiçoando a forma como o mar parecia ir contra eles. Ethan tentava ajudar da melhor forma que podia enquanto era observado pelos marinheiros. “Aquele moleque… ele tá completamente calmo?”

Hector ajudou a içar as velas enquanto Liza curava os enfermos.

O mar ficava mais e mais agitado e irritado e era palpável a intenção assassina que era direcionada a eles. Os dois pararam o que faziam e sacaram suas armas, prontos para lutar com seja lá o que causava a tempestade.

Um rugido irrompeu quando uma enorme serpente marinha saiu para a superfície da água. Ela tinha enormes bigodes ondulantes e escamas verdes, além de dentes afiados, do tamanho da espada de Jack.

O enorme ser olhou para os dois humanos que sacaram armas contra si e balançou os bigodes. O resultado foi um raio que caiu próximo a Hector.

— É um espírito da água!

— Impossível! Eles não deviam ter passado pela fronteira!

Ethan pulou no mastro e correu na extensão do mesmo. Após isso ele pulou em direção ao rosto da criatura e puxou a espada. — Patada Leonina!

A besta mostrou os dentes, que refletiram o ataque. Em seguida, abriu a boca e cuspiu uma rajada de água pressurizada. Com grande agilidade que jogou o corpo para o lado, evitando a força da natureza.

— Maldito! — Pulou novamente no mastro. — Falcão Ascendente! — A lâmina cegou um olho do monstro e o rapaz se preparou para continuar o ataque. — Pêndulo Inverso!

A criatura não deixou que executasse a técnica e, com outro balanço dos bigodes, criou um vendaval que lançou o jovem para o mar.

— Ethan! — gritou Hector enquanto o monstro mergulhava, o enorme tamanho e força criou uma onda que lançou o navio para baixo.

O rapaz sentiu o peso do mar e olhou para frente, vendo a boca da criatura.

No instante seguinte, o espírito do mar emergiu com o Destruidor usando sua espada para segurar os dentes que ameaçavam o esmagar.

Hector começou o cântico das flechas mágicas, mas uma mão o impediu.

— Se atirar, o garoto vai perder o equilíbrio e será engolido — falou um monge que carregava uma Nagitana. Ele sorriu ao ver a atenção da criatura ir diretamente para ele e os olhos arregalarem. Hector sentiu a imensa pressão que o homem exalava e deu espaço para ele. — Deixe isso com os profissionais, novato.

Após dizer essas palavras, pulou para frente e brandiu sua Nagitana, a lâmina da lança cortou o pescoço da criatura, que rugiu de dor. Ethan usou a distração para pular para fora da boca.

“Quem é ele?” — Continuou com uma estocada para cima e girou a lâmina.

— Rasen Suisei! — gritou, a força do golpe perfurou o monstro e fez o homem sair do outro lado do buraco. Em seguida pulou no ar, como se andasse nele, e pegou o rapaz pelo cangote.

Com mais um salto, voltou para o navio e atirou o jovem na proa. — Não sei se é corajoso ou tolo. — Sorriu enquanto o rapaz se levantava.

— Senhor Suika! — A voz do capitão mostrava nervosismo enquanto se desculpava pelo incomodo.

— Suika? Quem é tu?

— Sou Kinmaru Suika, um Mármore explorador. — Sorriu ao ver a surpresa no rosto dos dois e a admiração clara de Ethan. — Vocês dois têm bastante coragem. Espero que consigam suas licenças.

Após falar isso, virou-se em direção a cabana enquanto deixava um deles pensativo. Olhava para as costas do Mármore e tomou uma decisão.

Podia ser uma bem idiota mas era algo que tinha que fazer.

— Espera… senhor Suika! — disse ao puxar a Bento da bainha. — Tem tempo para um duelo?



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