A Mansão de Alamut Brasileira

Autor(a): Safe_Project


Volume 2 – Arco 5: Laboratório

Capítulo 39: Fonte de Atração

Rodovia Federal, UT-136, Sul de Paradise

Conectando-se diretamente com Romantusk ao adentrar a cidade costeira, a rodovia ia de norte à sul de Utopia, sendo esta última a exata direção para a qual Victor seguia.

No Celta Preto que de alguma forma não fora encontrado ou confiscado por ninguém que estivesse atrás de sua cabeça, ele dirigia ultrapassando qualquer limite de velocidade que pudesse existir. Nesse instante, passava logo ao lado de um outro ponto turístico dentro do domínio de Paradise.

— Aquele é… o Arco de Pedra? Argh! Agora que eu tô PERTO da metade do caminho! Não me lembrava dessa caverna ficar tão distante!

Nem eu, mas me traz muitas lembranças. —

A voz distante de Yellow continha certa felicidade, uma não irônica, por mais incrível que pudesse parecer. Não havia qualquer arrogância, mensagem subliminar ou ameaça, fora de fato um simples comentário nostálgico de uma existência de idade desconhecida.

As coisas estão finalmente andando. Tem ideia de como é chato ficar só observando formigas andarem sem rumo de um lado para o outro? —

— Se você é uma entidade suprema, a Encarnação do Poder, devia ter…! — Interrompeu a fala, percebendo o que havia dito, repetindo: — Encarnação do Poder? Hum? De onde surgiu esse termo?

Uma pontada deu-lhe a única possibilidade. Surgimento de memória? Não seria um simples dejá vù, com certeza não. O olhar fixo fora direcionada para si mesmo, usando o retrovisor como espelho de comunicação com o além.

Que foi? Agora qualquer coisinha a culpa vai ser minha? —

Óbvio! Teria respondido, ação desnecessária graças à leitura de mentes de Yellow. Ah~! Privacidade, dentre todos, o maior medo de Victor naquele momento era esquecer que tal coisa existia.

Infelizmente, esse provavelmente era seu destino. Não havia tempo (muito menos maneira) de esconder informações do Demônio. Era cooperar ou morrer, ainda mais agora que havia utilizado todas as três ajudas que tinha ganho como promessa ao realizar o pacto.

“Tenho que chegar nessa caverna de uma vez e enviar para aquele cara!”

Entre os vários inimigos, só aquela pessoa ainda se mostrava de confiança. O único que ainda mantinha viva a determinação de Victor para solucionar o Caso 47!!

Com essas limitações, a pressa apenas injetou mais adrenalina em seu corpo. O pé afundou mais no acelerador, e o Celta apenas não quebrou a barreira do som devido às irregularidades da estrada.

O tempo estimado para chegar na Caverna de Cristais era de 1 hora e 40 minutos…

 

***

 

Casa 839, 18:15 da noite

Ainda trajado em sua farda militar, Henry, a nova personalidade recém-adquirida no vasto histórico da [Dark Wave], andava de uma lado para o outro naquele caos organizado que era o interior da casa.

Coçava os braços incessantemente, mordendo o lábio inferior a cada vez que encarava o lado de fora e se deparava com aquela cena perturbadora.

— Pessoas… Elas estão passando em frente da casa!!

A força atmosférica exercida por seu Fator B não estava funcionando. Havia desaprendido a usar? Não, um dos tentáculos que brotavam do meio da bagunça tornou a possibilidade numa definitiva mentira.

— Mas se está ativa…

por que está…

… tão fraca? —

!! A troca ocorreu quando menos percebera. De um militar para um civil comum em um piscar de olhos.

Agora no controle do corpo, Isaac fez o mesmo ato de olhar pela janela, fitando alguns dos passantes antes de se esconder atrás da cortina novamente. As pessoas andavam depressa, com olhares rápidos para os lados e uma constante ansiedade em seus rostos.

O rosto inteiro franziu, tentando forçar o cérebro a produzir a maior quantidade possível de respostas para aquela situação. Fora um efeito da batalha? Talvez apenas um cansaço? E poderia realmente ser, pois desde que chegara (ou até onde se entendia como gente), nunca fora necessário uma batalha real que exigisse de si toda a força que conseguiria expôr ao mundo.

Nem quando Victor visitara-lhe pela primeira vez fora uma exceção. A aura de seu monstro notavelmente assustava o detetive, que apenas não desmaiou graças ao costume com a situação e, claro, o fato de também portar um Fator B.

— Só pode ter sido a luta contra aquele militar — proclamou às suas outras personas.

E falando em luta, o comentário despertou-lhe curiosidade nas notícias do dia. O Dia do Tarche fora uma completa calamidade, então tranquilas as pessoas com certeza não estavam. Aquelas que corriam pelas ruas demonstravam isso muito bem.

Agarrou o controle no sofá e ligou a televisão. Bem na hora! O plantão da tarde acabara de começar. Como sempre, era Bonner quem apresentava o plantão.

Continuando com as notícias da noite, foram identificados os cadáveres encontrados no perímetro de Romantusk.

General do Exército, Xeps TG. Comandante das Tropas de Choque, Alpina TG. E além destes dois, o cidadão conhecido como “Mendigo da Romantusk” também foi encontrado morto, com o corpo partido em duas partes. Ele estava soterrado por uma pilha de gatos mortos que também foram recolhidos pelos serviços da prefeitura.

Bonner continuou a notícia, citando o fato mais surpreendente da noite. O cadáver de uma figura de aparência meio-humano e meio-lagarto foi encontrado fora da Romantusk, com metade do corpo soterrado dentro do próprio concreto.

“Bem, esse eu me lembro. Foi o Lucas quem matou aquela coisa, afinal.”

Ainda assim, não era como se soubesse de onde uma existência como aquela tinha surgido. Literalmente invenção de um filme de ficção científica! Já conseguia imaginar facilmente os incontáveis conspiradores postando suas teorias em fóruns da internet.

… Os cidadãos também se perguntam sobre a estrutura encontrada abaixo da Avenida, que parece se tratar de uma grande esfera de vidro, da qual escorreu um líquido brilhante e ainda não identificado pelos especialistas. Mais informações após os comerciais.

O jornal encerrou normalmente, mas a realidade estava longe de ser capaz de uma transição tão natural.

A situação poderia não ser notável ali, na Rua da Maritaca, mas as pernas de Isaac tremeram descontroladamente ao simplesmente imaginar como as coisas estavam se desenrolando no centro da cidade e na frente da Prefeitura.

As pessoas estavam descontroladas, e ainda mais cedo ouvira gritos do outro lado do quarteirão. Notícias rodavam grupos das redes sociais, com fotos das multidões reunidas e instalações destruídas por toda a cidade.

A praça do Escudo de Bronze, em especial, fora alvo da fúria dos mal-informados. Aquele que deveria ser o Símbolo de Paz da cidade acabou por ter sua beleza maculada com pichações e ranhuras, essa última devido à incapacidade da população de prejudicar gravemente um monumento de metal.

“O que tá acontecendo…!??”

A voz afeminada em sua cabeça deixava claro de quem viera a pergunta. De longe, Melissa era a mais retraída em todo aquele cenário. Quase era possível ver sua pequena sombra escondida atrás das outras várias pessoas que existiam naquele único corpo.

Porém, entre essas várias pessoas, havia uma em específico que intrigava todas as outras personalidades, sem exceção.

Tinha já uma forma escura, discernindo e muito do vívido brilho das outras, que cercavam a outra num círculo assustado.

“Alexandre…”, pensou, temeroso. “Esse cara, será que ele…!?”

A mera suposição deu-lhe um forte enjoo. Não havia como descobrir exatamente o atual estado de Alexandre apenas com sensações de seu próprio corpo, a única maneira de adquirir uma resposta concreta era permitindo ou forçando a troca de lugar, mas isso também não soava muito agradável.

No caso de um cadáver, quem poderia dizer se conseguiria trocar ou não? Não tinha como saber o resultado, então aquele incômodo deveria ser suportado até o surgir de uma segunda opção para aquele caso.

Por um momento, o rapaz arrependeu-se de ter ignorado a oportunidade de seguir com Lucas para fora do país. Entretanto, o motivo da recusa àquele chamado logo veio aos seus pensamentos.

“Essa coisa… o que é essa sensação que ela transmite?”

Seu olhar caiu sobre o sofá. Assim como toda a casa, havia muita tralha ali em cima, mas um pequeno objeto se destacava do restante.

O item que Xeps carregava em seu pescoço. O colar arbóreo chamava a atenção, principalmente, devido às quatro cores que decoravam seus quatro quadrantes. Vermelho, azul, cinza e marrom. Contava também com um cheiro característico. Ar puro! Nem parecia que estava em uma cidade. Não havia brisa, e mesmo assim um frescor aconchegante atingia seu rosto. Pisava num chão frio, mas sentia-se num vasto campo recém-arado.

Isaac admirava aquele item com temor e grande admiração. Até onde ele sabia, apenas o Ser Humano era apto para desenvolver um Fator B. Nenhum outro animal, consciente ou não, muito menos um objeto tinha a capacidade de possuir tal habilidade. Até onde ele sabia.

“Será que eu arrisco colocar de novo?”

Lembrou-se da sensação anterior. Puxão. Seu corpo desprevenido fora atraído como um imã numa certa direção assim que colocara o colar ao redor de seu pescoço. Ele caiu e rolou no chão, mas logo foi capaz de controlar aquela força.

Mas excluindo esse estranho fenômeno, algo que teve certeza que percorreu cada milímetro de suas veias poderia ser resumido em apenas esta palavra: Poder.

Poderia colocar, estava preparado agora! Porém…

“Pra onde? Pra onde essa coisa está tentando me levar?”

Aquela dúvida cruel corroía seu coração cada vez mais, e para sua felicidade e infelicidade de outro, a mesma coisa acontecia com aquele que, anteriormente, havia sido o seu protegido.

 

***

 

Além da Fronteira…

Lucas continuava correndo desde que atravessara aqueles grandes muros protegidos pelo exército. Seu olhar às vezes caía no horizonte que deixava para trás, e aquele questionamento apenas aumentava: Se alguém surgisse querendo capturá-lo, seria um alívio ou algo para se desesperar?

Acreditava ser a primeira opção, pois desespero era o que mais existia em seu ser naquele instante.

Se pelo menos houvesse mais areia por ali, ficaria até satisfeito, o problema era que nem isso existia no local que, originalmente, deveria ser a extensão do maior e único deserto do mundo.

Parando para respirar, pôs-se a questionar mais uma vez sua localização.

A bússola que carregava consigo ainda apontava para o Norte, direção a qual seguiu desde o início da jornada. Se a contagem de tempo estivesse certo, estaria em direção à civilização mais próxima daquela nação, Sarmatia.

Se fosse para o Leste, iria se deparar com Solis, o único país que carregava costumes orientais, anteriores ao ano 1600, quando o mundo era dividido em dois polos.

— Estranho — gaguejou ao nada. — Muito, muito estranho…!

Não tinha certeza de quanto tempo havia se passado, o único relógio que tinha era o de sua barriga, cujo ronco aumentava gradativamente, piorando ainda mais com as doses constantes de água que era obrigada a absorver para manter o corpo funcionando na marcha mais baixa.

Porém, fora exatamente esse movimento desacelerado que lhe permitiu perceber o primeiro sinal que tanto desejava. Fora como ganhar um presente de Deus, o problema era que este talvez fosse de segunda mão.

Enterrado parcialmente no chão, um objeto que só pôde ser percebido por causa da luz refletida em sua superfície de vidro.

Isso… Ele murmurou enquanto agarrava o item. Um pequeno porta-retrato. Cantos amadeirados, com partes quebradas, outras levemente queimadas. O vidro, obviamente, não havia resistido ao ambiente, expondo a foto às forças da natureza.

Lucas forçou a vista, querendo de todas as formas descobrir o que diabos estava ali representado. E no fim das contas, adquiriu sucesso. Aquilo não era apenas uma foto, era um prelúdio da resposta para o segredo que ele perseguiu desde que conhecera Victor.

Na fotografia, três pessoas. Uma mulher, um homem e, entre eles, uma criança. Com o vento do horizonte, nada além de um sussurro fraco chegou aos ouvidos do Intangível.



Comentários