A Mansão de Alamut Brasileira

Autor(a): Safe_Project


Volume 2 – Arco 5: Laboratório

Capítulo 43: Elemento

“MAS QUE… CRIATURA É ESSA!???”

A bola negra lhe encarava com afinco, sentia-se um verdadeiro inseto observado por uma criança curiosa.

O corpo inteiro paralisou, e não dava sinais de que se mexeria até deixar de ser alvo daqueles olhos. Estes, no entanto, eram isentos de qualquer atenção para dar ao redor senão ao invasor.

Com uma força tirada apenas de seu ódio infinito, ele tentou se mover. Não conseguiu nada além de uma tremulação nas pernas, mas não desistiu. Fez força novamente, e um curto passo foi o seu resultado.

Gruurg!! A criatura gemeu novamente. Um movimento tão simples atiçou seu alarme, então o que um passo de verdade poderia resultar??

“Será que eu consigo saltar pra fora? Essa barreira consegue barrar essa coisa?”

Tinha uma grande dúvida. Se aquela teia de aranha não parou uma pessoa “normal”, como seria capaz de conter algo que nem parecia ser desse planeta.

Tinha que arriscar! De que outra forma sairia dali além de fugir com o rabo entre as pernas? Um salto rápido, era apenas isso que precisava!!

“Ele não pode ser tão rápido!”, pensou, querendo acreditar naquela faísca de esperança.

Então, numa atitude rápida, seus pés soltaram o chão. E mesmo em pleno ar, ou ainda quando seus olhos alcançaram a barreira para atravessá-la, não teve coragem suficiente para desviar o olhar daquela criatura.

Em meio ao salto, uma pressão forte atingiu seu braço direito, o último membro que ainda não havia atravessado a barreira. Poderia jurar que algo lhe tocou, mas sua visão não foi capaz de captar nada se movimentar além de si mesmo.

Mas então, quando menos esperava se viu fora da sala (O braço ainda estava lá!). A porta continuava aberta, e nunca em sua vida que pensaria em arriscar fechá-la.

“Parece que eu me preocupei atoa”, conferiu seu braço uma segunda vez. Felizmente, o membro estava totalmente fixo no lugar. “Descer mais um andar seria uma boa coisa.”

De fato, para alguém já desprovido de sanidade e senso de perigo, descer ainda mais numa masmorra após encontrar aquela besta parecia uma boa alternativa. Além do mais, Alex não seria despistado para sempre.

“Eu ainda não sei como ele me enxerga, muito menos como deixou de me enxergar. Preciso evitar encontrá-lo de novo, mas essa porra é um labirinto ferrado, ein!!”

Deixando a porta daquele quartinho aberto, saiu correndo — sem destino — novamente. Curvas e mais curvas. Algumas pessoas se colocavam como barreira, mas fora capaz de evitá-las em certa instância. Apesar de não saber sua função, aquele Fator B era verdadeiramente útil em alguns momentos.

Enfim, em alguns minutos de procura, encontrou uma nova porta. Ao contrário das outras, que apenas pareciam, essa era um elevador. Não demorou um segundo extra, entrou e escolheu o próximo andar. Haviam muitos botões, mas a lógica de “botão seguinte” provavelmente devia funcionar.

Clic! A música calma e levemente irritante começou a tocar, ao mesmo tempo que Hector sentia o corpo ser puxado para baixo. Funcionou!

Desceu por alguns metros que mais pareceram quilômetros. Ainda lembrava do aviso de Alex acerca da profundidade que o último andar estava, mas aquela demora era surreal!

Plim! Enfim, as portas se abriram novamente. Mais do mesmo. O metal branco refletiu a luz que quase o cegou, parecia mais brilhante que antes.

“Certo, hora de outra maratona!!”

Seus passos apressados ecoavam pelos corredores, e aquele medo anterior logo desapareceu. As poucas pessoas que o encontravam não mais notavam-no pelo barulho que causava no ambiente. Talvez apenas o contato direto fosse capaz de tirar seu disfarce. Magnífico! No entanto…

Aquela fora a primeira vez que suas pernas trabalharam tanto em sua vida. Não ficou exausto, graças ao treinamento pesado da FESOL que mostrava seus efeitos mesmo dois anos depois, o verdadeiro problema estava além do físico, e consequentemente de suas possíveis soluções.

“Nada! Não tem nada de útil nesse andar!!”

Ironicamente, havia muito mais portas do que no primeiro setor, mas a utilidade se mostrava numa decadência impressionante.

Se tivesse que chutar, diria que era a área dos dormitórios. Quartos era o que mais havia por ali, assim como pessoas trajadas não mais com os uniformes do local, como também em algo mais casual, semelhante à um pijama.

Tranquilidade? Não pensou que veria isso em um lugar onde dinossauros são criados como lagartixas domésticas! Onde estava a correria, os cientistas malucos (Alex cumpria bem esse papel), as explosões químicas!!

Seu coração começou a acelerar mais do que deveria. A pressão provinda das fissuras não era mais o incômodo, fora superada por aquela gerada dentro de sua própria cabeça.

A ignorância que mantinha os pensamentos sobre controle descarrilhou de vez dos trilhos. A criatura das sombras, a sessão de répteis, aquela… coisa no quarto e a paisagem atrás da porta… O que caralhos estava acontecendo com aquele lugar!??

Estava em sérias dúvidas sobre sua localização. Aquilo não podia ser o subterrâneo! O planeta era gigante, não! COLOSSAL! Mas mesmo assim era improvável, até maluquice imaginar que uma instalação daquele tamanho estava embaixo de uma base militar! O que o resto de Solum acharia se descobrisse isso??

“Em qual andar eles guardam os dados? Não é possível que não tenha um único computador nesse trem!!”

Parecia realmente impossível, só parecia mesmo. Até então havia visto apenas pranchetas nas mãos dos funcionários. Ninguém carregava aparelhos tecnológicos, apenas papel e caneta.

Todo o seu corpo, físico e astral, desejou encontrar a maldita sala que lhe seria útil naquele lugar imenso. E com essa forte ambição, ele correu mais uma vez. Seus passos retumbaram pelas paredes mais fortes do que nunca. Quem ouvisse poderia pensar que aquele gigante estava se movendo.

Chegou um ponto onde fechou os olhos fortemente, seguindo cego por um bom tempo. Por vezes sentiu um pequeno e rápido peso extra sobre seu corpo, e mesmo nesses momentos não ousou erguer as pálpebras.

Houve momentos em que o som não alcançou seus ouvis, outros momentos em que se sufocou; gelou, queimou… Foi como uma viagem por todo e qualquer bioma existente neste e em todos os outros possíveis mundos.

Todo esse esforço, por fim, resultou em uma localidade não muito distante.

Assim que parou, apoiou as mãos nos joelhos e recuperou o ar em seus pulmões. Lentamente abriu os olhos e, se deparando ainda com as paredes brancas, procurou um meio de se localizar.

Não demorou para avistar uma placa. Ela apontava para um porta, um sinal verde que indicava a saída, ou melhor, as escadas que levavam mais para baixo, especificamente ao 18° andar.

— Dé-décimo oitavo!?? — Não foi capaz de conter a surpresa. — Então… eu tô no 17° andar? Como…?

Especular era tudo que podia fazer, e assim como para tudo que vira até o momento, não havia tempo para pensar em uma resposta.

Devia ser outro efeito de seu Fator B, foi o veredito que deu ao caso.

Logo, se colocou em posição para correr mais uma vez e explorar a nova área, mas sequer isso foi necessário. Adiante, três metros à frente, uma porta se encontrava. Metálica como todas as outras, guardando depois de suas fissuras apenas mais daquela palpável premonição de problema.

“Sem placa”, analisou, tentando enxergar através do vidro. “Telas?… Isso é… São computadores!!”

A excitação dominou seu corpo, levando a mão até a maçaneta e abrindo passagem no mesmo instante. A pequena abertura ainda permitiu um breve vislumbre da escuridão da sala, essa dissolvida pela luz das lâmpadas do corredor em conjunto aos monitores.

Um total de vinte e nove telas, e apenas uma exibia algo diferente da imagem de câmeras de segurança, provavelmente se tratando da máquina principal.

“Não devia ter a porra de um guarda aqui? que tipo de instalação é essa que deixa a segurança sem… segurança?”

No fundo, a indignação com tal falta de lógica era trocada por felicidade imensa. A arma de fogo não seria necessária, por enquanto.

Se aproximou com cautela. No canto, uma câmera vigiava o vazio da sala. Uma curta movimentação da lente fez o coração destacar sobre o tórax. Alguém usava o aparelho!

Será que ele aparecia em imagens? Era uma boa questão, e fora exatamente ela que apressou seus batimentos.

Ao alcançar o teclado, a mão agiu rápido sobre as teclas e o mouse, navegando pelos arquivos ali disponíveis. Uma infinidade! Imaginou que realmente seriam muitas pastas, mas aquela quantidade era exagerada! O próprio computador chegou a travar em alguns momentos.

A questão agora era: em qual pasta estaria aquilo que procurava? Improvável que existisse uma pasta com o nome “Veneno Roxo” ou “Plano de Dominação Mundial”. A maioria das pastas sequer letras possuía, marcadas com numerais. 144; 1-75… Outras denominadas de C-4:970 e vários outros tipos de combinação sem sentido.

“Vou ter que conferir o máximo que eu puder!”

Era a única opção! E então seus dedos começaram a clicar. Cada vez mais forte! Não demoraria para que o mouse quebrasse naquele ritmo. E enquanto isso, a câmera continuava lá, piscando uma luz vermelha enquanto a lente retraía e afastava conforme vagava seu campo de visão pela sala.

Dentre os vários arquivos, destacavam-se projetos incompletos. Armas, veículos, construções e aparatos diversos. Detalhes que o detetive não compreendia preenchiam cada página, tornando aquilo em informações inúteis para si. Além disso, não pareciam nada importante o suficiente para merecer ser arquivado em uma nuvem ou coisa do tipo.

Sua busca então continuou. O corpo inteiro tremia ao ritmo de seu coração, fator esse intensificado momentaneamente quando deparou-se com as primeiras imagens naquele oceano de palavras difíceis.

“Isso são… mapas? De Solum, ainda por cima.”

Pasta DC-400:2050, guardava uma coletânea de fotos via satélite que revelava o Continente Solum. Cada fotografia tinha seu tipo de foco. Regiões, rotas, clima, bioma… Um estudo aprofundado poderia ser facilmente redigido apenas com a análise daqueles arquivos.

De início parecia inútil, assim como tudo que vira até o momento, mas algumas mudanças (que até um leigo como ele poderia notar) trouxeram uma atenção rápida, mas especial de seus olhos.

Desde o início do ano de 2002 — atualmente —, Utopia tornou-se o país mais populoso, perdendo apenas para a FESOL, cuja população majoritariamente militar ultrapassava os 700 milhões. Em contrapartida, o índice de visitas caiu para um zero absoluto. Nada muito surpreendente ao considerar que as fronteiras foram fechadas.

Por fim, mudanças climáticas! A proporção de Solum em relação ao Planeta não permitia que todo o continente sofresse com as mesmas mudanças. Nisso, pesquisadores do Clima e do Tempo chamaram de Mega Ilha Climática o evento apresentado naquele gráfico.

Sarmatia, Santa Cruz, 50 Estrelas e Solis. Todas as outras nações do Continente, novamente, com exceção de Utopia, sofriam de uma constante queda de temperatura. Análises anteriores, remetentes ao ano 2000, mostravam uma crescente na temperatura, que ao decorrer dos dois anos seguintes sofreu uma intensa queda. Na imagem mais recente, todas as nações encontravam-se preenchidas com a cor azul tingindo suas respectivas regiões.

No mínimo suspeito. Mas bem, era um detetive, não um especialista da geografia analisando o mapa. Defendendo-o, as profissões não tinham nada a ver uma com a outra! Um detetive não era obrigado a saber de tudo!!

Porém, apesar de serem informações interessantes, ainda não era o que queria. Sua frustração aumentou, junto da vontade de martelar a mesa com seu punho fechado.

Com a raiva que havia acumulado, uma fratura exposta parecia ser o resultado mais óbvio para o desfecho daquela investigação. Mas para a sua felicidade, uma última fagulha de esperança surgiu, na forma de uma notificação.

A mensagem surgira no canto da tela, de remetente desconhecido, contendo um arquivo anexado. “Informações Gerais :)”, era seu nome.

— Yellow? — resmungou, procurando por um olho dourado ao seu redor.

Nada, até os cantos mais escuros daquela sala permaneciam inóspitos. Se houvesse algo que causava aquela sensação de observação, seriam aquelas fissuras nas paredes.

Aquele rostinho no nome do documento… algo de errado não estava certo ali, definitivamente! Seu instinto paranoico era capaz de sentir a malícia naqueles dois pontos e parênteses. E mesmo assim, era algo levemente diferente de Yellow, uma atmosfera com menor índice de maliciosidade.

“Só pode ser um vírus! Aquele puto não me ajudaria gratuitamente dessa forma!”

Uma forma extremamente sensata de se pensar, apesar de que havia dúvidas no cerne de seu ser depois de receber um Fator B tão poderoso e misterioso da mesma Entidade que lhe tiraria a vida por pura diversão.

No fim das contas, decidiu arriscar (O computador nem era seu, afinal de contas!). E abrindo aquele arquivo anexado, uma lista surgiu diante de seus olhos. Surpreendentemente, não era qualquer lista, longe disto.

Ficha! Era uma ficha técnica de funcionários! Dentre elas estavam as daqueles dois rapazes que encontrara mais cedo. Glen e Jorge, funcionários da Sessão 27 à 28. Duas novas! O buraco era realmente bem mais embaixo que a 23.

No entanto, entre as tantas fotos, uma em específico chamou sua atenção não pela aparência (muito menos pelo marca texto que fazia presença no nome), mas por seu nome.

— Roman… Romanov? — recitou, o suficiente para reconhecer facilmente. — Um início de sobrenome típico de Sarmatia.

Roman, do Kanemuri, cujo significado variava entre as localidades de seus falantes. Roman, em si, era um sobrenome extremamente comum em Sarmatia, não sendo atoa que a avenida mais famosa o carregava em memória a eventos passados.

E entre o gaguejar e seus pensamentos, Hector rapidamente conectou alguns pontos que a mente deu-lhe acesso. Os olhos deslizavam sobre a tela, traçando linhas invisíveis e convergindo-as para um ponto central.

— É ELE!! — exclamou, sem qualquer contenção em sua voz. No meio da leitura, um riso malicioso escapou. — Gegege! Finalmencte consegui seu nome, maldito!!

A empolgação era tanta que sentiu que deveria exclamar o nome do elemento para si mesmo, mas a curiosa necessidade se esvaiu ao lembrar da situação caótica em que se encontrava. Não havia garantia de que sua habilidade o manteria “invisível” por todo o tempo. Nesse caso, a pressa era a parceira para a sua perfeição.

Aprontou-se em dois segundos, virando na direção da porta da sala de segurança e, conferindo a câmera uma última vez — estava aparentemente desligada — agarrou a maçaneta e abriu a porta.

O caminho se revelou tão claro quanto antes. O motivo para tanta luz? Simples, uma superfície refletora intensificou os raios brancos antes que estes atingissem seus olhos. Uma superfície loira, dotada de um par de lentes azuis e um semblante enigmático.

Encarando Hector de baixo para cima, Alex fez questão de fixar seu olhar com o de seu alvo e, num leve balançar negativo do indicador, dar-lhe o aviso.

— Você não pode sair por aí dessa forma, querido Jonas.



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