Volume 1 – Arco 1
Capitulo 3: Os Bambis
Enquanto caminhava pelos corredores lotados, Ártemis sentia a pressão da multidão a empurrando de todos os lados. Ela tentava manter o ritmo, mas os alunos ao seu redor a esmagavam contra a parede de pedra fria. Cada passo parecia uma luta, com os ombros roçando, cotovelos esbarrando, e o som das vozes ecoando em sua mente.
Ártemis tentava manter o equilíbrio. Tentando manter o controle com o caos ao seu redor. O brasão da escola, bordado no peito da camisa, brilhava sob a luz fraca do corredor.
Cansada de ser esmagada, ela se encostou em frente a uma porta, tentando recuperar o fôlego. Sem perceber, a porta atrás dela se abriu repentinamente, e, antes que pudesse reagir, Ártemis perdeu o equilíbrio e caiu para dentro de uma pequena sala escura e abafada.
A sala era estranha, cheia de sombras e com uma atmosfera opressiva. Ártemis esfregou os olhos e tentou entender onde estava. O chão de pedra reverberava o som de seus sapatos enquanto ela se levantava, sentindo-se ligeiramente desorientada.
De repente, uma figura se destacou no fundo da sala—a silhueta de uma garota sentada, de pele negra, cabelos cacheados amarrados em um coque, que parecia estar tão surpresa quanto ela.
A garota, que vestia o uniforme escolar ficou paralisada por um segundo ao ver Ártemis invadir seu espaço. Seus olhos arregalaram-se de susto.
Num movimento rápido, a garota se levantou deixando cair o livro que estava lendo, seus pés deslizaram pelo chão, assumindo uma postura de combate. As mãos firmes erguidas, como se estivesse pronta para lutar, os pés plantados com firmeza no chão. Seus olhos se estreitaram, e o ar na pequena sala ficou ainda mais denso.
Ártemis, atônita, deu um passo para trás, levantando as mãos no ar, tentando mostrar que não era uma ameaça. O coração dela batia acelerado, mas não de medo—de pura adrenalina.
Ártemis, assustada e acuada, recuou ao perceber que havia invadido o espaço de outra garota. A tensão no ar era quase palpável. À sua frente, Trrira — uma jovem de pele negra, cabelos presos em um coque apertado e usando o uniforme da escola — a observava com atenção. Seus olhos avaliavam cada gesto de Ártemis, mas aos poucos seu corpo relaxou. Ela recolheu o livro caído no chão e voltou ao seu lugar, mantendo-se vigilante, porém menos rígida.
Ártemis respirou fundo, permitindo-se ficar na sala. Virou-se ao pequeno vidro na porta e observou o tumulto no corredor. Do lado de fora, alunos se apressavam, empurrando-se entre si. Lá dentro, no entanto, reinava um silêncio quase acolhedor, apenas quebrado pelo som suave das páginas viradas. Trrira estava mergulhada em seu livro, encostada contra a parede, alheia ao caos exterior.
Depois de um tempo, Ártemis se aproximou e as duas começaram a interagir de forma mais leve. Ártemis desmonstrava interesse em conhecê-la melhor, esforçando-se para entender o nome incomum da colega, Trrira. Ela tentou repetir a pronúncia corretamente, errando algumas vezes, o que gerou uma onda de risos espontâneos e sinceros entre as duas.
Ártemis se aproximou de Trrira, os olhos curiosos voltados para o livro em suas mãos. Estava prestes a perguntar sobre o conteúdo quando um estrondo repentino interrompeu o momento. A porta da sala se escancarou violentamente, batendo contra a parede com força.
Um garoto foi lançado para dentro, como se tivesse sido empurrado por alguém do lado de fora. Ele tropeçou sem equilíbrio e caiu ao chão com um baque seco. Do corredor, ouviu-se um riso abafado, debochado, seguido pelo som apressado de passos se afastando. A porta se fechou com um estrondo solitário, selando o ambiente novamente no silêncio abrupto.
Ártemis e Trrira, sobressaltadas, se voltaram ao mesmo tempo, os olhos arregalados no garoto ainda atordoado pela queda repentina. Ele moveu a cabeça em todas as direções, tentando entender onde havia sido jogado.
Ao perceber as duas garotas no canto da sala, parcialmente iluminadas pela luz filtrada do vidro na porta, seu corpo se enrijeceu. O desconforto era visível em sua expressão e postura. Ele se levantou de forma apressada, como se quisesse apagar o embaraço com rapidez, e começou a sacudir o uniforme amassado. O silêncio entre os três tornou-se denso, preenchido apenas pelo som abafado dos passos do garoto tentando se recompor.
Ele sacudiu os cabelos cacheados com exagero, ainda em pé, meio torto, e abriu um sorriso largo, como se tentasse disfarçar o constrangimento com humor. Com um gesto dramático e uma reverência improvisada, apresentou-se com entusiasmo:
Chamava-se Gumer — e claramente não tinha problema em rir de si mesmo.
Gumer observava Trrira com interesse genuíno. Havia algo na forma serena como ela se comportava que o atraía — a timidez leve, o jeito silencioso e atento, como se cada detalhe ao seu redor fosse importante. Ele gostava de pessoas assim: discretas, sensíveis, fáceis de se admirar. Ártemis, por outro lado, parecia diferente. Não havia nada nela que o chamasse tanto a atenção. Seu semblante era mais fechado, sua postura mais contida. Ela não parecia exatamente o tipo de pessoa que ele gostaria de ter no seu grupo, mas estava ali, ao lado de Trrira — e isso já bastava.
Movido pela curiosidade, Gumer comentou sobre a tranquilidade de Trrira, que explicou gostar de observar o mundo antes de se expressar. Isso o encantou ainda mais. Sem pensar duas vezes, Gumer a convidou para ser sua amiga e fazer parte de seu grupo. Trrira aceitou imediatamente, com um sorriso decidido e espontâneo.
Ártemis observou aquilo surpresa, sem entender como a conexão entre os dois surgiu tão rápido. Gumer então se virou para ela e, mesmo sem sentir a mesma empolgação, a convidou também — mais por educação, ou por ela estar com Trrira, do que por real interesse. Ártemis percebeu o tom diferente no convite, mas mesmo assim sorriu, um pouco desconfiada, e aceitou.
Eles se aproximaram da porta, espiando o corredor ainda tumultuado. Trrira, com um brilho nos olhos, comentou com Gumer sobre como quase ninguém conseguia pronunciar seu nome corretamente. Ele achou graça, tentando imitar o som, e ela riu, dando um desconto pela tentativa. A leveza da conversa deixou os dois mais próximos.
Em seguida, ele perguntou o nome da outra garota. Ártemis respondeu com simplicidade, e Gumer elogiou o nome apenas por educação, notando que ela não parecia tão receptiva quanto Trrira. Mesmo assim, manteve o sorriso, mantendo o clima amistoso.
Gumer então comentou que tinha dois amigos que queria apresentar, dizendo que eles ainda não tinham chegado. Trrira demonstrou empolgação imediata, arrumando a mochila com entusiasmo.
Já Ártemis, observando a energia da dupla e o jeito como os dois se conectavam com naturalidade, decidiu apenas acompanhar. Ainda não sabia se se encaixava ali, mas aquele primeiro dia prometia ser mais interessante do que esperava.
Enquanto isso, os alto-falantes ecoaram a chamada para o auditório, misturados ao som apressado dos estudantes no corredor.
Quando a multidão começou a se dispersar, os três deixaram a sala, caminhando lado a lado pelos longos corredores da escola. Suas vozes se misturavam ao barulho de passos e conversas, enquanto seguiam em direção ao auditório, prontos — ou quase — para encarar o primeiro dia juntos.
No auditório, os estudantes foram se acomodando em fileiras organizadas, com olhos curiosos e ansiosos para descobrir com quem dividiriam os quartos. A cada nome chamado, sussurros e olhares cruzados tomavam conta do ambiente.
Quando Ártemis ouviu o próprio nome ser anunciado, junto com Trrira e mais duas garotas do segundo ano, sentiu um alívio silencioso ao saber que estaria com alguém conhecida. Trrira, ao seu lado, praticamente pulou de animação, vibrando com a novidade.
Ao lado, Gumer observava a cena com um sorriso forçado. Ao ouvir que ficaria em um quarto com desconhecidos, engoliu a frustração e tentou manter a pose. Seus olhos cruzaram com os de Ártemis e Trrira, que agora riam e cochichavam animadas sobre o dormitório.
Apesar de tentar parecer tranquilo, algo o incomodava profundamente: seus amigos, os dois que ele queria tanto apresentar, ainda não haviam aparecido. A cada minuto, seu olhar voltava para a porta do auditório, inquieto, esperando que eles entrassem a qualquer momento.
Mesmo assim, Gumer se esforçou para manter o sorriso. Afinal, agora ele tinha duas novas amigas — ou pelo menos, Trrira. Ártemis ainda parecia fechada demais para fazer parte real do seu mundo.
Algumas horas se passaram no internato mágico. A luz da manhã deu lugar à tarde, com o sol mais alto e o ar levemente mais quente. O ambiente calmo da escola se manteve, agora envolto por uma quietude suave, enquanto as sombras se alongavam lentamente pelos corredores.
Ártemis e Trrira finalmente chegaram ao dormitório. O quarto era simples, com dois beliches dispostos em cada canto do quarto, uma escrivaninha e muitas malas encima dos colchões. A luz suave das lâmpadas criava um ambiente acolhedor, mas algo naquela atmosfera parecia deslocado.
Uma das outras garotas, deitada no topo de um dos beliches, observava-as com um olhar penetrante; Chamada Leonarda, vestida no uniforme clássico da escola que parecia simples nela, mas seu olhar... aquele olhar predatório fazia Ártemis e Trrira se sentirem pequenas.
As duas trocaram olhares rápidos, tensas e desconfortáveis. A sensação de serem observadas como presas era inegável. Leonarda, sem dizer uma palavra, continuava a encará-las, como se estivesse analisando cada movimento, cada respiração.
Ártemis tentou quebrar o silêncio, mas sua voz falhou ao sentir o peso do olhar da garota felina. Trrira, igualmente desconfortável, evitou o contato visual, tentando focar em qualquer outra coisa no quarto.
O tempo passou, e a manhã no internato se desenrolou com rapidez. Quando o horário do almoço chegou, Ártemis e Trrira, ainda tentando se adaptar ao novo ambiente, caminharam juntas em direção ao refeitório.
O espaço estava tomado por vozes cruzadas, gargalhadas e o constante tilintar de talheres. O cheiro de comida quente se misturava à confusão sonora, criando uma atmosfera sufocante para as duas recém-chegadas, que vasculhavam o salão em busca de um lugar mais tranquilo.
Logo avistaram Gumer de longe, chamando por elas com empolgação. Ártemis e Trrira se entreolharam e, aliviadas, seguiram em direção à mesa onde ele estava sentado.
Ao se aproximarem, perceberam que Gumer não estava sozinho. Com ele estavam dois outros jovens: um garoto de aparência retraída, chamado Glomme, e uma menina de semblante sério e reservado, chamada Firefy.
Glomme mantinha os olhos fixos no prato, os ombros curvados, o corpo quase encolhido. Sua mão tremia levemente ao segurar os talheres, denunciando o desconforto que o cercava. Cada movimento parecia medido, como se tentasse desaparecer no meio da multidão barulhenta. No entanto, havia uma tensão quase contraditória em seu corpo: embora retraído, ele escutava com atenção cada palavra, como se desejasse entrar na conversa a qualquer momento, mas não soubesse como.
Firefy, por outro lado, embora igualmente silenciosa, mantinha uma postura mais rígida. Seus olhos observavam tudo com atenção controlada, como alguém que havia aprendido a não se deixar levar pelas distrações ao redor. Apesar da expressão fechada e da natureza introspectiva, ela não era do tipo que se escondia. Sempre que alguém lhe dirigia a palavra, ela respondia com serenidade, sem recuar nem se esquivar.
Gumer e Ártemis levavam a conversa com naturalidade, enchendo os espaços com entusiasmo. Trrira observava tudo com atenção, especialmente os dois colegas mais silenciosos. Reconhecia nos gestos contidos de Glomme e no olhar concentrado de Firefy traços familiares, como ecos de sensações que ela mesma já havia vivido.
Gumer olhava para Ártemis com um leve desconforto. Ela estava conduzindo tudo de forma tão desinibida que ele começou a se sentir um pouco ofuscado. Normalmente, ele era o mais tagarela entre seus amigos, mas agora, com Ártemis tomando a dianteira, ele não sabia bem como se posicionar. Observando discretamente Ártemis. Ele notava cada gesto dela — o modo como ela gesticulava, sua risada alta e seus olhares estratégicos, como se quisesse que todos a sua volta prestassem atenção. Gumer sentia uma mistura de desconforto e fascinação, intrigado pela confiança dela, mas também questionando o motivo daquela exibição toda.
Ao lado, Trrira mantinha-se em silêncio, mas sua expressão tensa era evidente. Ela lançava olhares rápidos para as centenas de pessoas ao redor, cada vez mais inquieta com a ideia de que talvez estivessem falando dela, julgando-a ou observando seus movimentos. Sua respiração ficava mais rápida enquanto seus pensamentos mergulhavam no medo de ser o centro de críticas.
Gumer percebeu o desconforto de Trrira e lançou um olhar de apoio, tentando transmitir alguma calma com um sorriso discreto, mas sentiu-se ainda mais isolado ao virar e ver que seus amigos pareciam mais interessados nos assuntos de Ártemis.
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