Arena Coreana

Tradução: Filipe

Revisão: Luz e Themis


Volume 1

Capítulo 43: Fuga (1)

— Enfim chegou o momento de romper o domínio dos licantropos!

O chefe tinha reunido todos os moradores e estava fazendo um fervoroso discurso.

— Nos criando como animais para nos usar como alimento... QUANTO TEMPO VAMOS VIVER ABAIXANDO NOSSAS CABEÇAS DESSE JEITO?!

Aquilo não deveria ser algo para se falar, visto que ele havia sido o primeiro a se curvar. Os moradores estavam confusos pela súbita mudança do chefe, que de repente havia se transformado em um combatente.

Eh, chefe, qual é o motivo de você falar essas coisas assim, de repente?

— Não é como se vivêssemos submissos porque gostamos deles, mas como vamos enfrentá-los? 

Um homem levantou uma boa pergunta, a qual o chefe apontou para nós e falou.

— Isso é graças a essas pessoas estarem aqui!

A atenção de todos se voltou para nós.

Hye-su, com uma expressão desconfortável, curvou seu pescoço. Joon-ho também parecia que tinha levado uma facada.

Depois que escutaram meu plano, os dois ficaram daquela maneira.

Reunir os moradores da vila para que eles enfrentem os licantropos, fingindo que lutaremos lado a lado, e então fugir. Era um plano cruel: usar os moradores como simples sacrifícios para que ganhássemos mais tempo.

“Eu também sei disso.”

Isso era pior que as coisas que o chefe veio fazendo todo esse tempo. O velho ao menos tinha a desculpa de que tudo o que fez foi para a sobrevivência da vila.

Por outro lado, eu tinha dado a eles a esperança da liberdade e, ao invés disso, estava guiando-os para a morte para que minha equipe sobrevivesse.

“Seja como for, os moradores não podem ajudar muito.”

Eles eram pessoas que há muito tempo vinham sendo controlados sem poder fazer nada. Unir forças com esse povo não nos daria a oportunidade de vencer contra mais de 100 licantropos. Sem falar que o líder do Clã Prata é bem inteligente e forte.

“Nesse caso…!”

Com isso, sacrificar essas pessoas para que pudéssemos fugir era o melhor a se fazer. De qualquer forma, uma vila como essa desapareceria em algum momento.

…Ao menos é como eu tentava dar sentido a isso 

E daí? Onde havia nesta vila uma pessoa sem nenhum pecado?

Ali não estava cheio de pessoas fracas sem culpa. Eles ofereceram outros seres humanos para os monstros, para que se salvassem. Ser fraco e ser bom não são sinônimos.

Então, mesmo que lançássemos essas pessoas para a morte seria legítima defesa!

— Esses viajantes disseram que vão nos libertar dos nossos carrascos! Eu vi: os quatro licantropos que vieram para a vila... eles cuidaram deles em um instante! Uma façanha difícil de acreditar!

Sabendo minhas intenções ou não, o chefe os convenceu com sua voz firme. De forma inacreditável, os moradores que haviam perguntado como poderiam lutar, foram convencidos pelo líder.

Acabou que eles tinham um olhar cheio de esperança quando nos olhavam. Seus olhares eram como se vissem os “enviados” para trazer sua libertação. Do meio deles, um homem de repente perguntou.

— Vocês vão mesmo lutar por nós?

Com essa pergunta, Hye-su e Joon-ho se encolheram e eu dei um passo à frente.

— Lutar por vocês? Essa frase é um pouco bizarra.

Hm?

— Você fala como se nós fossemos lutar pela liberdade de vocês em vez de dizer que vocês mesmos lutarão pela sua liberdade. Nós não vamos lutar “por” vocês, vamos lutar “com” vocês.

Na menção de “lutar” as expressões dos moradores se escureceram de novo, eles estavam com medo.

— Se todos não levantarem suas armas e enfrentarem os licantropos, nós, com certeza, não teremos motivo para lutar. Se for assim, nós simplesmente vamos fugir. Vocês provavelmente vão sofrer retaliação pelas mortes dos quatro licantropos. Os desgraçados devem pensar que vocês se aliaram a nós contra eles.

— Não fomos nós que matamos os licantropos!

— Vocês que mataram eles! Essa situação é culpa de vocês!

— É isso mesmo, nós não somos os culpados aqui!

Eles tentaram passar a culpa para nós e seu comportamento quase me fez vomitar.

— Vocês querem dizer que não tem culpa? Que não foi errado colocarem soníferos na nossa comida? Mesmo aqueles que tentaram nos oferecer como “comida de lobo” estão todos reunidos aqui? Se eu quisesse eu poderia me vingar por isso e matar todos vocês agora e partir.

Misturando ameaças e uma fala forçada, os moradores recuaram com medo. O único jeito de trabalhar com eles, era por meio do medo.

— Decidam se vão lutar ou não. Se não quiserem lutar, iremos embora agora.

Eles olharam uns para os outros.

— Claro que lutaremos! Essas pessoas falaram que vão lutar ao nosso lado, não teremos outra oportunidade como essa! — Falou o chefe.

As mulheres foram tomadas pelo nervosismo e os homens um a um confirmaram.

— Eu, eu vou lutar.

— Já que a situação está assim, não há outra escolha senão lutar.

— Mesmo que continuemos vivendo assim, não vai demorar muito para virarmos comida de qualquer jeito.

O chefe comemorou e falou para mim.

— Você viu? Decidimos lutar.

— Então se preparem para a batalha. Não temos muito tempo. Vocês têm armas?

— Temos alguns arcos que usamos para caçar e alguns machados que usamos para cortar lenha. Todas as outras armas que tínhamos foram confiscadas… 

“Claro que foram.”

Sem chance que eles deixariam os escravos ficarem armados.

— Preparem o máximo de arcos e flechas que conseguirem e, conforme o número de pessoas, façam algumas lanças de madeira.

— Entendido. Todos ouviram isso?

— Sim!

Os homens puseram a mão na massa e eu fiz mais solicitações para o chefe.

— Reúna os homens capazes em grupos de quatro e peça a eles que se revezem para patrulhar a cerca. Quando os desgraçados aparecerem eles devem gritar avisando.

— Certo, entendi. E…  quanto a vocês?

— Primeiro vamos patrulhar a área em volta e nos livrar desses cadáveres. 

Apontei para os três licantropos mortos.

— Tudo bem.

O chefe acreditou nas minhas palavras sem suspeitar de nada. Gesticulei para meus colegas.

— Vamos, Joon-ho e Kang Chun-seong, peguem um cadáver cada.

— Sim, hyung.

— Vou pegar.

Carregamos os corpos nos nossos ombros. Hye-su nos seguiu e juntos saímos da vila.

Hyung, por que trouxemos os corpos com a gente?

— Primeiro temos que coletar o majeong.

Ah… 

— Também vamos usar os cadáveres para outra coisa, mas, primeiro, vamos pegar o majeong.

Sylph pegou o majeong de dentro dos corpos e Hye-su os colocou na sua bolsa.

Olhei em volta, cortei alguns cipós e os enrolei ao redor dos pescoços dos cadáveres e pendurei os três em uma árvore.

Três corpos de licantropos pendurados em uma árvore, esse foi um bom arranjo para provocar o pessoal do Clã Prata.

Hyung, isso… 

— É uma provocação. Quando virem isso, eles ficarão furiosos. Somado a isso, como acha que vão reagir quando virem os moradores segurando armas prontos para lutar?

— Eles… vão atacar?

— Exato, temos que eliminar qualquer chance de diálogo. Temos que ter certeza de que ambos os lados lutem.

Para os licantropos, essa vila era uma importante fonte de alimento. Se matassem todos os moradores, também seria uma perda muito grande para eles.

Mas, assim, eles pensariam que não fazia sentido tentar dialogar e logo atacariam. Enquanto os moradores resistiriam.

Enquanto eles estivessem se enfrentando, teríamos que fugir para o mais longe possível.

“Então vai ficar tudo bem.”

Não havia nada mais importante que completar o exame.

— Vamos, não temos muito tempo.

— Está bem… 

A resposta de Hye-su foi um pouco fraca. Vi ela se sentir culpada, e isso deixou meu coração inquieto.

Contudo, me convenci de que estava certo, que essa era a única maneira de completar esse exame.

Seguimos sentido Oeste.

 

***

 

— Portanto, você é o único que sobreviveu?

— Sim, pai! Aquele velho chefe nos enganou!

Os irmãos que haviam sido enviados para a vila, morreram. Só um deles voltou, e mancando.

A notícia de que a vila ousou se rebelar, fez com que o clã ficasse furioso.

— Temos que matar todos eles!

— Como ousam matar nossos irmãos?! Os humanos enlouqueceram?!

— Temos que matar eles de forma brutal!

Os licantropos rosnavam conforme condenavam os humanos. Parecia que sua natureza selvagem, que gostava de matar, foi despertada.

Contudo, o pai continuou sangue-frio. Pensou profundamente e, então, perguntou para o seu filho sobrevivente.

— E você sobreviveu?

— Por sorte fui atingido na perna e consegui fugir.

— E quanto a arma dos humanos?

— Como o Helgi disse, com um barulho alto “disparo”, alguma coisa voou tão rápido que eu não consegui ver direito e entrou em nós. Com o som, meus irmãos morreram.

— Mesmo assim você conseguiu sobreviver?

— Eu tive sorte.

O pai olhou com frieza para seu filho e depois rompeu em um sorriso.

— Acho que não.

— Não?

— Da forma como vejo, acredito que os malditos deixaram você vivo para retornar.

— …?

Ignorando seu filho que não conseguia entender, o pai se levantou e falou para todos os licantropos que estavam reunidos na encosta.

— Todos, se preparem para a batalha. Antes do dia clarear vamos terminar isso!

Os licantropos ficaram alegres e entusiasmados. A palavra “batalha” fez o sangue dos licantropos ferver.

“Rugidos”

No meio da noite, o terrível uivo dos licantropos de cima da encosta se espalhou pelo céu noturno.

O pai acenou para Helgi, que imediatamente se aproximou.

— Sim, pai.

— Pegue todos e ataque a vila.

— Eu? Então, pai… 

— Tem outra coisa que eu preciso verificar.

Isso foi tudo que ele disse enquanto sorria.

 

***

 

Os homens seguraram suas lanças, prontos para a batalha. Todos estavam bem determinados.

Eram pessoas que fugiram de impostos abusivos. Porém, depois de escaparem de um lorde tirano se escondendo na floresta, um “governante” ainda mais assustador estava esperando por eles.

Os licantropos não coletavam dinheiro ou grãos, mas, sim, vidas humanas.

Todos viviam sofrendo sob a pressão de que seu destino, algum dia, seria o de se tornarem comida para lobo. Essa era uma vida tão miserável que eles chegavam a ansiar pela vida sob a tirania do lorde.

Incapazes de conviver mais tempo com isso, houve aqueles que tentaram fugir da floresta. Mas, no fim, suas cabeças apareciam na frente da vila no dia seguinte.

Viviam sem viver, mas isso terminaria ali.

Depois de decidirem que lutariam, os moradores, que sofreram aterrorizados, explodiram de raiva. Em vez de voltar a viver como antes, eles definiriam se viveriam ou morreriam, iam dar um fim para isso.

Então...

“Rugidos.”

O uivo dos licantropos ressoou por toda parte. Os moradores estavam morrendo de medo.

— Sã-são eles!

— Eles já estão aqui!

— Todos! Trabalhem juntos! Temos que lutar!

Os moradores tinham vivido bastante tempo vendo os licantropos e, com isso, sabiam que os uivos de agora mostravam muita raiva.

— Mas... o que aconteceu com aquelas pessoas? — Alguém perguntou.

Os homens se olharam entre si, se perguntaram e, por fim, olharam para o chefe.

— Aquelas, aquelas pessoas, disseram que estavam indo patrulhar… 

A cara do chefe estava em confusão.

Por que as pessoas que disseram que estavam indo patrulhar não apareceram mesmo quando os licantropos chegaram tão perto?



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