Volume 1
Capítulo 8: provação
A viagem começou após atravessarem uma ponte, o rio abaixo dela estava congelado, e a neve tomava as laterais da pequena ponte que os suportava.
Seus olhos se despediram daquele local. Por ser sua primeira vez saindo de Arneb, não pode esconder a dor de barriga e o frio exagerado ao esfregar os braços.
Puxou ainda mais seu gorro, escondendo os cabelos pretos, atravessou os mesmos com os olhos azuis.
O ar nostálgico daquele lugar, não deixou ele ouvir outra coisa além do vento, calmo e sereno. Seus olhos encaravam a neve e as árvores tomadas por ela, totalmente inerte.
Ao se distanciar cada vez mais de Arneb, Kaleek manteve o olhar baixo, observando os furões com asas e renas com chifres de aço que rodeavam eles de uma distância segura.
As criaturas intrigantes se movimentavam em grande quantidade na parte do dia, ainda mais nesta região, pois era mais segura e protegida dos males do mundo.
Enquanto ele olhava os furões se reunirem e saírem voando, seu ombro foi tapeado, ao virar um garoto de cabelos loiros sorriu para ele.
— Presta atenção, já estamos saindo do território de Arneb. — Ele apontou para um cristal grudado nas árvores à frente, curiosamente intactos mesmo tendo muitas criaturas nos arredores.
Kaleek abriu os olhos para isso, os cristais brilhavam quando seu grupo passou por eles, e, uma deformidade se formou no ar como se passassem por um portal.
— Passamos pela barreira, fica atento aos Seijuus.
A imagem turva chegou a trazer um certo desconforto aos seus olhos, ao coçar-los, se deparou logo acima de um declive. Kelmoth parou com os pés na beira dessa descida mortal, afastando-se em seguida.
A vista de quilômetros de florestas nevadas, era ofuscada, parte pela neblina distante, e pelo susto repentino de quase cair e rolar ladeira abaixo.
— Toma cuidado desgraça!
— O que aconteceu? — perguntou Ellen.
— O Kaleek, querendo se jogar!
Ellen atravessou a barreira até eles, Zae e Carlos logo atrás dela. Uma gota de suor desceu em sua testa, com os gritos de Cosmo.
— Teremos que pegar outra rota…
Suas palavras vieram acompanhadas com o suspiro condensado e tom calmo. Seus olhos estremeceram, ainda olhando para baixo.
No fundo da sua garganta um gosto amargo agarrava-se a ela. Engoliu saliva várias vezes, mas não fez essa sensação ir embora.
Era asquerosa, como se seu corpo se virasse de cabeça para baixo. A ilusão ou até mesmo pensamentos sobre talvez ter caído, fizeram seu estômago embrulhar.
Puxou as cordas, guiando Kelmoth para longe da ladeira. Seus olhos arregalados amoleceram com a aproximação dela, a meia-elfa de cabelos loiros.
O olhar preocupado perfurou-lhe, empalado com tal preocupação, ele escondeu tudo que sentia por trás de um sorriso.
— Kaleek… você tá bem?
— Eu tô bem Eli, como vocês estão?
— Estamos bem… — ciciou Ken e Ellen ao mesmo tempo.
Ele se despediu com um sorriso, logo depois se distanciou novamente deles, tomando seu posto junto de Cosmo para contornar o declive.
— O que será que ele tem…
— Eu acho, que meu irmão tem medo de altura.
— Sério!? — Ellen arregalou os olhos para a resposta de Ken.
Ken fez uma expressão insatisfeita para as costas de seu irmão, cruzando os braços ele bufou ao virar o rosto.
Os outros reagiram surpresos, em especial Ellen, que chacoalhava o corpo de Ken buscando respostas. Ele fez barulhos contínuos enquanto ela movia seu corpo, pedindo que parasse.
Ellen finalmente parou de perturbar o pequeno Ken.
— Eu não sei, eu disse que “acho”.
— Séria hilário se fosse verdade — ciciou Carlos.
— Melhor continuar, senhorita fique alerta. — Zae ultrapassou eles, ficando atrás de Kaleek e deixando o restante para trás.
Manteve uma boa distância deles, mas o suficiente para ouvir o que conversavam. Os lábios se moviam devagar, ajudando a leitura labial, mesmo que o movimento de suas cabeças não ajudasse.
— Ficou enjoado?
— Foi a barreira — ciciou Kaleek, mantendo o olhar centrado.
— Toma cuidado, numa dessas você cairia.
— Eu sei.
As respostas dele eram curtas e sem nenhuma mudança de suas expressões. Era quase como se nem se importasse, isso fez uma veia saltar na testa de Cosmo.
— Fiquei sabendo que você apanhou.
— Lá vem o Maria Fifi…
— Você apanhou mesmo? Eu acho que quis apanhar.
— Que papo é esse?
Seus olhos penetraram as iris amarelas que se viraram para ele, em silêncio ele apertou as sobrancelhas e continuou a falar:
— Sei que se sente culpado, pode enchergar isso como uma punição, mas, você só tá sendo idiota.
— Você não…
— Eu sei, porra eu sei!
Suas palavras cortaram ele como uma katana em saque rápido, retalhando o que reprimia Kaleek.
— Acha que só você tem que ser punido?!
—...
Os olhos dele se arregalaram. Nunca imaginou que veria ele com aquela expressão, com olhos marejados e voz alterada, olhando ele fixamente.
— Na última vez… ela estendeu a mão para mim. — Ele pareceu segurar algo ao fechar os olhos. — Eu não consegui pegar a mão da Mabel…
— Então ela…
Não pode acreditar. Aquela que ele amava teve a vida escorrendo entre os dedos, não pode deixar de lembrar dela, a sua pessoa perdida.
— Ela não deu um sinal sequer. Depois do acontecido, eu voltei lá, mas não encontrei nada.
A mágoa transbordava em seu olhar, ele levantava a cabeça evitando contato visual com Kaleek, que olhava de volta com olhos estáticos.
— Eu sinto muito…
— Se sente, não me faça perder um irmão também.
Seus olhos se viraram para ele novamente, após um leve momento de recaída encarando as cordas que segurava, ele arregalou os olhos para o elfo.
Ele manteve um sorriso leve, mesmo estando totalmente quebrado por dentro. A expressão séria, era mascarada por pela angústia e medo em seu toque.
— Promete, que você vai meter a porrada nesse cara, depois disso tudo.
Seus olhares se encontraram, igualmente sérios e penetrantes, como se selassem um pacto silencioso. Cosmo estendeu o punho cerrado em direção a Kaleek, que respondeu com o seu próprio, os dois se unindo em um gesto simples, mas cheio de significado.
Cosmo era a única pessoa capaz de entender o peso que ambos carregavam: a responsabilidade de proteger, de ser a força de que o outro precisava. A missão de ser forte por pura necessidade.
O impacto do toque dos punhos foi mais que físico; foi uma troca de promessas. Um sorriso sutil surgiu nos rostos deles, sem palavras ou pensamentos, apenas o gesto. Nesse instante, um sentimento profundo se fez presente — claro e sereno, como águas calmas.
O toque, quente e firme como o fogo, representava a força de ambos. Era a chama que os guiava, a tocha que iluminava o caminho, protegendo os que estavam ao seu lado.
O significado disso tudo era claro em sua mente, como um rio cristalino fluindo pela alma. Era a união de amigos, de parceiros, de guerreiros. Mais que isso, era o vínculo de irmãos.
— Eu prometo.
***
Levaram algumas horas para contornar o enorme declínio, suas pernas e braços estavam dormentes, se não fosse por uma pedra de mana que carregava, teria congelado passando por uma breve nevasca.
O vento tentava levar até mesmo os grandes animais que carregavam eles, suas roupas rasgavam com tal força.
O grupo enfrentava uma grande tempestade de neve, seus integrantes lutavam para manter-se juntos, esta foi a ordem que lhes foi dada.
A frente de Kaleek e Cosmo que cobriam o rosto para se proteger do atrito do vento, Zae ergueu o cajado.
— Aery, Helma!
Uma rajada de vento combateu o atrito, junto disso, um de seus aneis brilharam. Como um anjo da guarda os protegendo, a barreira feita com mana barrou o infortúnio de atingi-los.
Kaleek percebeu o rosto estridente de Zae, que se esforçava com as mãos erguidas para a barreira.
— Juntem, todos! — Kaleek gritou para todos. — Aqui!
Os javalis se agruparam, formando uma fila atrás do grande escudo que Zae ergueu. Contudo suas forças estavam se esvaindo, a cada segundo uma gota de sangue escorria de seu nariz.
Seu corpo absorveu toda fadiga dos companheiros atrás dele, mesmo sem perceberem estavam aos poucos conseguindo se mover com mais liberdade.
O sangue escorria de suas narinas, ele ergueu a cabeça para não deixá-lo pingar na neve.
Meu sangue, não derramará nessa terra imunda!
Ele adicionava mana a barreira de forma desenfreada, fortalecendo a mesma que começará a ceder.
— Senhores, apenas segurem firme.
Ele começou a avançar, mais e mais, pisando firmemente na neve. Estalando ao atolar as botas, com olhos cerrados e mãos trêmulas.
Quando viu uma fenda naquele ambiente, era estranho, percebeu na hora que se tratava de um domínio ou alguma armadilha mágica.
— Só precisamos atravessar. — Ele engoliu em seco — Se segurem, se alguém sair do meu alcance, não serei capaz de impedir que se despedace.
Teve essa impressão ao quase ser repelido, a pressão e o chiado daquele local aumentava cada vez mais, mais forte e mortal.
Agora mais que isso, as árvores e pedras eram jogadas contra a barreira. Na primeira pancada, Zae estremeceu, mas se levantou segundos depois de ajoelhar.
— Estou bem, obrigado Sr. Cosmo.
Cosmo vendo o esforço notável do garoto, tentou ajudá-lo ao vê-lo ajoelhado, mas o mesmo se levantou por conta própria.
— Aery!
Mantendo os braços fixos, Loki uivou, e vários cortes se firmaram com o movimento do vento, cortando as árvores ao meio que caíram ao lado na trilha.
O suor desceu e escorreu pelo seu pescoço, braços e pernas ameaçava despencar na neve, mas sua força de vontade lhe deu força para aguentar até que ele tocasse a fenda entre a armadilha e o mundo real.
Quando a quebra de terreno veio, Zae caiu para o lado, sua respiração estava desregulada demais para tentar se levantar, mas alguém se aproximou dele.
Cosmo e Carlos o carregaram, pegando ambos os braços e levantando ele até que visse Kaleek.
— Uma armadilha mágica, estaríamos fritos se não fosse você. — Kaleek reconheceu o seu esforço, e estendeu um cantil. — Pega isso.
O sangue escorria encharcando seus lábios até o pescoço. Seus suspiros se acalmaram, quando pegou o que aquele garoto lhe entregou.
— Não me agradeça.
— Agradeço.
Ao levar o cantil até os lábios manchados de sangue, pode sentir o gosto de ferro. Aquele gosto asqueroso impregnou em sua garganta, quando engoliu a água.
Ao ingerir toda reserva, o sorriso frouxo se formou nos lábios do mago, quase instantaneamente após entregar o cantil de volta para Kaleek.
Porém seu tempo era curto, não pode alfinetar ou prestar atenção nas expressões que ele fazia, pois algo que merecia mais sua atenção estava à sua frente.
Ken estava encolhido nos braços de Ellen, assim como ficou toda a tempestade, brevemente levantou a touca que lhe cobria os olhos.
Carlos acompanhou Zae com seu sorriso malicioso, enquanto limpava a boca, observou junto de todos ali a entrada de Pollux.
Mas mesmo em meio à paz das luzes de Pollux, algo os observava na escuridão. E esperava que dessem mais um passo em falso.
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