Em Outro Universo Angolana

Autor(a): Tayuri


Volume 1

Capítulo 9: Candy, Uma Menina Metida A Espadachim

Incrível!! Astrid repetiu em sua mente. Fechou o livro e o empurrou em direção a pilha de livros que repousava sobre a mesa, dispostos de forma desorganizada, parecendo uma torre prestes a ruir tão logo ela coloca-se o sexto livro no topo da pilha.

— Faça um resumo de cada um deles — falou Elis, assim que Astrid anunciou o término da leitura. — Diga apenas os pontos mais importantes, mas se por acaso não tiver assimilado nada, apenas recite tudo o que memorizou.

Nada!

Isso foi o que Astrid queria dizer, porém não teve coragem para tal.

Após ter sido tirada a força da cela, foi arrastada para uma sala onde lhe foi entregue um monte de livros e uma pequena caixa contendo um par de lentes de contacto. Prontamente Astrid as recusou, afirmando não ter problemas de visão, entretanto a doutora insistiu e assim Astrid as colocou, abriu o primeiro livro e percebeu por fim que as lentes não eram para ver melhor e sim para ler mais rápido. Sua leitura não levou mais do que uma hora, no entanto, mesmo tendo lido cada página, ela tinha a plena certeza que não havia decorado nem o título dos livros.

— Não memorizaste nada? — Muito lentamente Astrid negou com a cabeça.

— Se-serei enviada para dimensão das punições? Ou… os outros serão enviados para lá?! 

— Não! Nenhum de vocês irá para lá. — Os olhos de Astrid se fecharam e um suspiro escapou de seus lábios.— Vamos para o próximo.

Dois ajudantes se aproximaram da mesa; a mulher pegou os livros e o homem depositou um tablet e uma caneta sobre a mesa, posicionando-os bem na frente de Astrid. Os dois recuaram ao mesmo tempo e depois se dispersaram indo cada um para um lado.

— Agora farás uma prova. Os temas consistem em: matemática, física, química, história, robótica e anatomia. Há um total de cinquenta perguntas e as respostas para cada uma delas estavam nos livros, por isso tente forçar sua mente a se lembrar do que leu. Você tem...

— Desculpe. — Astrid tinha uma mão no ar, a qual baixou sem graça alguns segundos depois.

— Algum problema?

— Sim! Eu não creio que esteja mentalmente preparada para fazer uma prova.

— Lamento, mas terás de fazê-la na mesma. — Elis desviou seus olhos para o ecrã e, muito baixo Astrid disse:

— Já calculava.

Não é como se aqui fosse uma escola ou algo assim. Eles não vão enviar um boletim para o meu pai...então pouco importa a nota que eu tirar. Fechando uma das mãos em um punho, com a outra agarrou a caneta, entretanto antes de a direcionar para o tablet, Elis a chamou.

 — Tire as lentes primeiro. — Empurrou a pequena caixinha azul para ela.

Sem dizer nada Astrid as retirou, picando seu olho umas cinco vezes até conseguir tal feito, colocou as lentes na caixinha, que era azul claro, tão claro quanto o céu...tão claro quanto os novos olhos de Aiyslnn. A imagem de sua colega de escola e agora companheira de cela surgiu em sua mente, enquanto seus olhos estavam fixos na caixa.

Ela estava falando dessa prova? Astrid baixou seu olhar para a tela e em seguida levantou seus olhos observando mais atentamente a sala, que para além de ser desconhecida para si também não parecia possuir alguma identidade própria ou algum nome pelo qual poderia usar para referenciá-la, afinal haviam cadeiras e mesas que lembravam uma sala de aula, todas arrumadas e enfileiradas umas ao lado das outras com uma pequena distância as separando e cada uma delas estava de frente a uma tela. A parede atrás dela era repleta de prateleira de livros e encostado a outra parede havia quatro armários sem portas com vários objetos como: jogos de tabuleiro, vários tipos de bolas, cubos magico, brinquedos e na parede do lado oposto havia materiais de pintura, instrumentos musicais e uma mesa cheia de frutas.

Talvez a prova seja em outro lugar? Seus olhos passearam de um lado para o outro. Ela não mentiu quanto a punição, ela também não mentiria agora, certo? Mesmo sendo Aiyslnn...ou a gêmea dela...?

— Você tem duas horas. Começa!

Os olhos de Astrid piscaram e ela percebeu que ainda tinha uma prova por fazer. Elis disse que não vou para dimensão das punições, mas o quanto disso é verdade? Ela pode estar mentindo para mim...ou Aiyslnn. Com um suspiro profundo começou a prova.

Sua expressão exalava determinação, seus olhos leram atentamente cada pergunta e ela as respondeu a todas, até mesmo aquelas que lhe pareciam erradas, tal como a primeira de história que perguntava o seguinte: Qual é o nome do primeiro rei de Aquamarine? Astrid sem hesitar respondeu com o que julgava correto, esperando que pudessem notar que eles estavam errados, tal como estavam sobre mantê-la naquele lugar.

— Terminei. — Anunciou mais para si mesma do que para os outros. Pousou a caneta de lado e em silêncio doutora Swooney pegou o tablet, mexeu no dispositivo por alguns minutos e segundos depois fez sinal para Astrid olhar para o ecrã que estava afixado à parede. Assim que olhou para a tela um enorme, número vinte e oito apareceu lá.

— Você teve essa pontuação de propósito ou simplesmente não sabia as respostas? — perguntou Elis, enquanto entregava o tablet para um ajudante.

— Eu não sabia. — A resposta saiu involuntária da boca de Astrid, que olhava meio incrédula, pois tinha respondido a maioria das questões com coisas inventadas e outra metade apenas cantando canções que poderiam lhe ajudar a escolher a resposta certa.

— Entendo. Talvez inteligência não seja... — Deu uma pausa. — Seu forte?

Ela acabou de me chamar de burra? Astrid não pode evitar se questionar.

— Vamos para outros.

E assim se prosseguiu mais testes; memorização de números, jogo de xadrez, dar vida a bonecos, levitar objetos, cantar, desenhar, fazer esculturas e entre muitas outras coisas que Astrid se saiu pessimamente mal, claro exceto desenhar que foi o único teste em que ela se saiu perfeitamente bem, no entanto, Elis não pareceu achar o mesmo, após ficar uma hora parada olhando para o desenho acabou o mandando embora e assim ao terminar todos os testes Astrid foi colocada diante de uma câmera fotográfica.

— Para quê é a foto? — perguntou, assim que se acomodou na cadeira. O ajudante que parecia ser o fotógrafo mais uma vez não respondeu sua pergunta e ficou apenas checando a máquina, e doutora Elis como sempre tinha os olhos voltados para um ecrã, não fazendo menção de sequer encará-la.

— Irei tirar a foto agora. — Anunciou o ajudante, depois de um longo tempo em silêncio. — Pode sorrir se quiser, mas por favor não faça caretas.

— Sorrir?!! Porque está me tirando uma foto?

— É uma recordação...para quando você já não estiver aqui.

Astrid, inspirou profundamente.

— Eu... vou embora?! Posso finalmente ir...

— Não! Estava me referindo a tua morte. Será a única recordação tua que existirá aqui, então faça o que quiser, só não faça caretas por favor!!

Morrer?! Eu irei…

.

.

Rato de laboratório…ou melhor Rata. Foi o que Astrid pensou ter se transformado. Após sair da sala de testes, ela foi levada para outra. A colocaram em uma cadeira, injetaram uma agulha em seu braço e retiraram sangue, tanto que ela se sentiu seca quando o processo acabou. Depois foi colocada em uma sala branca onde só enxergava as paredes quando se chocava contra elas.

Andou às voltas na sala, enquanto sentia seu cérebro fritar embaixo do capacete estranho que haviam colocado em sua cabeça. Astrid não sabia para o que servia, porém tinha a absoluta certeza que estava a quebrando. Chocou contra mais uma parede e caiu no chão, rolou de um lado para o outro se sentindo estranha e vendo coisas ainda mais estranhas, pois as paredes que deveriam ser brancas começaram a ganhar cor. Seus ouvidos foram atacados por vários bips vindos do capacete até que muito lentamente a dor e o cansaço começaram a sumir e por fim Astrid… fechou os olhos.

.

.

— Papai! — Astrid o chamou. Ele levantou seus olhos azuis de sua pilha de papéis e encarou a menina, de jardineira meio verde e meio roxa que entrará em sua sala. Ela parou diante da mesa, ficou na ponta dos pés e apoiou seus braços na mesa cheia de papéis e objetos que ela já virá várias vezes, mas que não tinha qualquer noção para o que serviam.

— O que foi? Está com fome?

— Sim! Mas não sobre isso que vim falar. — Estendeu um porta-retratos para seu pai, que ao invés de pegá-lo apenas o encarou. — Eu vi essa fota em um baú do sótão enquanto procurava uma boneca e fiquei muito triste ao olhá-la.

— Porquê? — Ele continuou olhando para a foto. — Por que ficaste triste?

— Porque ela... não, eu pareço realmente triste. Aconteceu algo de ruim comigo nesse dia? Porque estou tão triste?

— ...

— Você não sabe? Papai!! — Moveu o porta-retratos de um lado para o outro capturando para si a atenção de seu pai.

— Disse alguma coisa, querida?

— Eu perguntei por que estava triste nessa foto, você não ouviu?

— Ah!... Sim. Eu...

— Então... — Suas sobrancelhas se elevaram e seus olhos brilharam de curiosidade. Astrid forçou seus pés a deixarem-na mais alta. Inclinou-se mais para frente e esperou pela resposta, que não veio.

— Então o quê?

— A fota.

Seu pai piscou uma, duas vezes e depois começou a rir.

— Hum?! Do que está rindo?

— Astri, é foto, não fota. — Corrigiu e continuou rindo enquanto o rosto de Astrid se contorcia em uma expressão zangada.

— A culpa é tua por eu ter errado. — Ele riu mais. — Não ria de mim!! Pare de rir.

— Tudo bem. Parei!

— Sério? — Seu pai acenou positivamente e depois muito lentamente enquanto sorria e falava sobre possíveis lanches que poderia fazer para ela, ele retirou o porta-retratos de suas mãos e o colocou em algum lugar entre seus papéis.

Astrid tentou voltar ao assunto da foto, quando seu pai deu a volta à mesa e pegou em sua mão, porém ao invés de responder às suas perguntas ele a conduziu para fora da sala, mas antes de deixar o cômodo Astrid olhou para o porta-retratos roxo que possuía uma foto que ela não lembrava de ter tirado.

.

.

— Papai…

Astrid abriu os olhos. Fechou-os e alguns segundos depois tornou a abri-los, quando se acostumou com a luz do ambiente.

Instintivamente levou a mão à cabeça, não encontrando o estranho capacete. Passeou os olhos por seu arredor e percebeu que a sala antes branca era agora iluminada por luz azul que formava um círculo no chão e no teto, os quais eram conectados por duas linhas que saíam do chão e se estendiam pelas paredes até tocar no círculo que estava no teto.

Onde raio estou agora?! Com dificuldade Astrid se colocou em pé, caminhou até o centro do círculo e encarou o teto até seus olhos cansarem da vista e se mudarem para parede ao lado onde encontraram alguém; uma menina. Tinha os olhos fechados e carregava uma expressão serena. Estava sentada no chão encostada à parede e com uma espada ao pé de suas botas. Suas roupas eram como de outros soldados, porém elas eram pretas.

— Desculpe…

A menina abriu os olhos e involuntariamente Astrid recuou, ao passo que ela se levantou do chão.

Porque estou com medo?!! Sem saber onde colocar as mãos, Astrid apertou a barra da camiseta enquanto assistia à soldada, jogar o cabelo castanho para trás e estalar o pescoço, provocando um som tão alto que Astrid não pode evitar se questionar se por acaso ela quebrou algum osso.

— Vo…você também…

— Morra!! — Vociferou.

— Ein!!?? Você está falando…

As palavras de Astrid fugiram, correram para bem longe quando em uma velocidade extraordinária ela a alcançou. Cerrou o punho direito e socou sua barriga.

O que…O corpo de Astrid foi puxado para trás ao mesmo tempo que cuspiu sangue. Sem oferecer qualquer resistência seu corpo foi contra parede e depois encontrou o chão.

Arfando, Astrid se contorceu em várias posições, procurando alguma que aliviasse a dor. Tossiu compulsivamente e a falta de ar que se seguiu a deixou em pânico, no entanto, não mais do que quando sua agressora começou a caminhar em sua direção.

Na-não!! Não!! Com os olhos marejados, começou a se arrastar, tentando ao máximo ignorar a dor que havia em seu corpo, entretanto não foi muito longe antes de ser segurada pelo tornozelo. Desesperadamente esticou os braços tentando alcançar alguma coisa que a puxasse para fora da cova que a menina parecia querer arrastá-la.

Socorro!! Gritou em sua mente, quando, como se não pesasse nada, a menina a colocou em seus ombros. Carregou-a como se fosse um troféu que acabou de ganhar e, como se descobrisse que não passa de uma falsificação barata, a jogou no chão.

A boca de Astrid abriu e fechou várias vezes e depois soltou um grito estridente.

— Socorro. — Sua voz saiu muito baixa quando a menina a agarrou pela camiseta, a levantou colocando-a a alguns metros longe do chão.

Me solta! Tira as mãos de mim, sua louca, maníaca. Astrid pensou, mas não conseguiu colocar em palavras. Na verdade, não teve coragem para tal e então cogitou em pedir por misericórdia, pedir um: por favor me deixe viver, porém os  olhos dela eram tão desprovidos de emoção e empatia que dizer um: me deixe viver, parecia um desperdício de palavras.

Mas uma vez Astrid foi jogada ao chão e antes de sequer pronunciar outro socorro, a menina deitou-se no chão. As duas pernas ficaram por cima do peito de Astrid, bem perto de seu pescoço e seu braço esquerdo foi puxado.

— O-o-o quê você está fazendo?!!

Astrid tentou fugir, porém não passou disso, e sem muitas opções passou a bater em uma das pernas de sua oponente, freneticamente.

— Me solta!! Por favor me deixe… — Astrid parou, quando constatou que iria ser desmembrada. — Ya-yah!! Pa-pare. Pareee!!!!

Astrid se debateu. Tentou empurrar as pernas da menina a qual puxava seu braço mais e mais, como se realmente quisesse arrancá-lo, disso Astrid estava começando a acreditar. Novamente bateu em sua perna, se debateu mais e quando por fim abriu a boca para mordê-la seu corpo sumiu e reapareceu em um canto da sala.

Com o corpo paralisado, Astrid tinha os olhos no teto enquanto seu cérebro tentava processar o ocorrido, até que uma dor surgiu em seu braço a relembrando de seu quase desmembramento. Trincou os dentes e tentou tocar seu braço, entretanto puxou a mão rapidamente quando a dor aumentou. Não estava quebrado, porém doía muito. Soluçou baixo e entre eles ouviu passos. Desviou seus olhos para o lado e encontrou sua fonte; era sua oponente, que caminhava em sua direção, riscando a lâmina da espada no chão parecendo uma ceifadora, que vinha lhe ceifar da terra.

— Por favor!

A espadachim levantou a espada diante do corpo de Astrid, a qual, viu seus olhos, terrivelmente assustados antes da espada descer em direção ao seu pescoço e tocar o chão depois de ela se teletransportar.

Durante os testes, Astrid lembrou de Elis dizer várias vezes que ela devia ter algum poder, tal como todos os outros adolescentes do centro. Ela não acreditou, mesmo se lembrando vividamente de seu encontro com Zayn… ou Aiyden. Mesmo achando tudo um absurdo e desperdício de tempo, Astrid fez os testes, quase sem reclamar, pois tinha a certeza que nada aconteceria, afinal ela não tinha poderes… ela não deveria tê-los.

Em pé, apoiada à parede, observou o outro lado da sala, onde sua adversária a encarava, furiosa. A soldada soltou a espada e correu em sua direção, seus pés perfuraram o chão e seu punho foi cerrado antes de socar o nada.

No meio do círculo, Astrid caiu de joelhos e encarou o lugar onde estava anteriormente. Seu coração bateu descontroladamente quando a ceifadora encontrou seu olhar. Ela vai me matar! Observou. Lentamente colocou-se em pé e assim permaneceu enquanto assistia sua oponente se aproximar mais uma vez.

Bom ou ruim? Ela não tinha a mínima ideia, entretanto, só neste momento em que sua vida parece mais frágil que uma taça de vidro, Astrid tentou não se importar com o que esse poder poderia representar ou significar, tudo que lhe interessava era sair viva, mesmo que sair daquela sala não a levasse para a liberdade que almejava.

Se teletransporte!! Suma para fora daqui! Pediu, mas nada aconteceu e o desespero começou a tomar conta de si. Por favor!!!

Sua oponente passou a correr e no meio de seu caminho, Astrid ainda tinha fé que sumiria, porém quando um soco se fechou em sua barriga, ela percebeu que sua maré de sorte havia terminado.

Outro soco. Astrid cuspiu sangue e foi contra parede, não demorando muito para encontrar o chão.

Muito lentamente, os sons a sua volta se tornaram mais baixos como se alguém tivesse diminuído o volume do universo. Seus olhos piscaram, suas forças se esvaíram e antes de apagar pela terceira vez no dia, seus olhos capturaram o bracelete envolto do pulso da espadachim, onde continha o nome: Candy – Soldada.



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