Farme! Brasileira

Autor(a): Zunnichi


Volume 2

Capítulo 56: Corrupção

Solein era conhecida como a filha do ancião da tribo dos elfos de gelo. Anteriormente, mal possuía status, seu pai era um humilde artesão que trabalhou a vida inteira.

Depois de serem transportados foi que Tremwin despertou seus talentos para liderança e pôs ordem no meio de seus companheiros abatidos.

Ele ergueu da noite para o dia um grupo forte, extremamente unido, e com isso veio a responsabilidade de cuidar de todos.

Sua filha recebeu parte dessa responsabilidade como símbolo de pureza, uma madame linda que em algumas décadas se casaria com um belo homem e daria continuidade ao propósito de seu pai.

Por dentro, não desejava tal tipo de coisa, não achava ser apta para se tornar líder e muito menos mãe, mas sem previsão de quando voltariam, isso se tornou uma coisa plausível.

— Ohhh, então você também quer que eu acompanhe para não ter a possibilidade de seu pai morrer e você ganhar responsabilidades… — comentou Lucas, com as mãos escondidas nos bolsos do moletom. — Deus, você é bastante egocêntrica por pensar assim.

— Não é egocentrismo, é só que eu me preocupo com os outros! — Uma onda de vapor quente saiu de suas narinas, seguido por uma novo rosto irritado. — Eu também não queria assumir esse papel, mas não temos outra escolha…

— Há quanto tempo vocês estão aqui, por sinal?

— Pode parecer um tempo curto, mas atualmente por volta de um mês atualmente

“Essa marca bate próximo a quando matei o Leviatã. Quer dizer que eles vieram pra cá assim que derrotei o boss?”

A teoria batucou sua cabeça. O problema era como diabos isso veio a acontecer e o porquê. Não tinha sentido os elfos de gelo aparecerem só de matar o chefe.

Eles ficaram mais um tempo em silêncio, andando de lá pra cá, e Lucas passou a dar atenção aos caminhos que tomavam.

Certas árvores eram marcadas por desenhos minúsculos em seus troncos, coisa que precisava de bastante atenção para reparar.

Assemelhava-se a um meio de identificar um caminho, definir uma trilha. Outra coisa foi a falta de animais por aí.

Era estranho não ter sequer um urso vagando a floresta, só o vento, frio e neve aparecia no seu campo de visão. 

— Se não tem animais em nenhum canto, como vocês se alimentam?

— Cascas de árvore com tempero de folhas de pinheiro. Você se acostuma depois de um tempo.

“Uff, isso é doloroso. Simpatizei um pouquinho com você agora.” Mais uma vez ele olhou aleatoriamente para o lugar. — Tem muita gente triste ou irritada por não conseguirem sair daqui, não é?

— Sim… muitos… — O tom da elfa abaixou, fazendo o garoto perceber seu grande erro.

Ele não comentou mais nada, somente esperando chegarem a algum lugar que estivesse o tal elfo corrompido. 

Teve certa pena de Solein, no entanto. Ficar longe de casa, longe de todas as pessoas que conhecia ou amava, só para ser trazida e presa a uma região deserta e sem ninguém além deles.

“Vou pensar se posso ajudá-los com alguma coisa mais tarde… só vou porque sou um cara legal, obviamente.”

Lucas levantou o queixo diante da passagem entre as árvores que levava ao maluco. 

O elfo em questão tinha pele acinzentada e olhos arroxeados, ao contrário das cores brancas e azuis que pincelavam os doidinhos da vila.

Uma aura vermelha pairava ao seu redor, mexendo-se como fogo vivo e afastando a neve abaixo de seus pés, como um tipo de campo de força invisível.

Ele carregava numa mão um punhal de lâmina escura, com uma gema preta no cabo e um olho no pomo. Era muito nojento reparar no olho se movendo de um lado para o outro.

— O que é aquela arma na mão dele? — perguntou, agachando-se para não ser pego e puxando Solein também para baixo. 

— É uma arma amaldiçoada. Certos elfos, ao empunharem determinados tipos de itens, modificam sua estrutura para se adaptar ao traço elemental que apresentam, por sermos de gelo que nossos equipamentos apresentam características semelhantes.

— Ou seja, um elfo de fogo geraria uma espada de fogo, um elfo de vento uma espada de vento… e um elfo de gelo corrompido faz algo como “gelo sombrio” ou coisa do tipo?

— Sim… você entende rápido.

“É pra isso que meu PhD em RPG serve!”

Lucas analisou seu oponente outra vez. Se ele estava acima do nível dos elfos, seria um desafio interessante, fazendo-o questionar se precisaria tirar os pesos para lutar.

Sua cabeça pensou, olhando para o seu total de habilidades e técnicas disponíveis. 

Três magias, duas ofensivas e uma utilitária, uma skill para aumentar seu vigor, outra para contra-ataque, mais uma para drops.

Sequência Mortal estava travada, as outras duas poderiam cobrir o espaço que a arte deixava espaço.

Quanto aos seus itens… não possuía nenhum, nem mesmo o anel de abatedor. 

Seu objetivo era para aumentar o máximo possível seus atributos originais, para isso precisava se livrar de tudo o que aumentava.

Voltar e pegar o restante do equipamento era o plano de ação ideal, no entanto, quantas pessoas se machucariam no tempo que estivesse fora?

De acordo com Solein, era incomum um elfo de gelo enlouquecer, exceto sob pressão extrema. 

Isolar-se do restante da espécie num ambiente completamente desconhecido e ter que ficar com um humano batendo em você todo dia parecia estressante o suficiente.

Ele bateu as mãos nos joelhos para tirar a neve quando se levantou. Havia pena em matá-lo ali, muita pena mesmo.

Essa pessoa possuía uma aspiração, família e até um objetivo de vida grandioso, mas agora havia sucumbido a loucura e ferido seus próprios companheiros.

“Parece o destino de um herói trágico.”

Lucas estapeou suas bochechas e andou em direção ao alvo. Ele tinha certeza que podia vencer, mesmo com os pesos travados ao corpo e com seu arsenal atual.

Não, ele precisava vencer, do contrário, morreria.

Ergueu os punhos na altura da cabeça, ficando com a base e colocando a perna esquerda à frente. 

O elfo se contorceu. Ele jogou a cabeça completamente para trás, inclinando as costas e lançando um olhar assustador.

Lucas sentiu um frio correr pela espinha, se pudesse passaria longe de um maníaco com esse tipo de olhar, algo pior que vilões de filmes de terror antigos.

O punhal rodou pelos dedos do elfo, seu corpo girou de uma maneira nada natural para a direção de Lucas, que agora estava parcialmente pressionado pela aura.

A pressão aumentou, mas não deu motivo o bastante para o rapaz recuar. Como prova, entrou na sua postura de contra-ataque.

Os ombros relaxaram suavemente, seus braços ficaram molengas como macarrão e os movimentos do tronco estavam muito lentos.

Ele não se mexeu. O inimigo voou em sua direção, o punhal rodando a toda velocidade, combinada com uma agilidade que assustaria qualquer um.

Exceto que isso não o impressionou. A rapidez de seu mestre era dezenas de vezes maior, esse elfo nem mesmo se comparava.

O inimigo chegou na distância de um golpe, apunhalando em linha reta. 

Uma mão de Lucas bateu no palmo que segurava a arma, abaixando-o, enquanto o tronco rotacionou para o lado e transferiu sua força num jab.

Não fora muito efetivo, mas se combinado com a arte Um Dois Potencializado, as coisas mudavam. Um segundo soco veio, acertando o peito do oponente e o jogando contra o ar.

Lucas aproveitou a janela para respirar. 

“Cacete, eu pensei mesmo que ia acertar! Que sensação estranha, meu corpo se moveu por conta própria!”

Um sorriso apareceu nesse rosto. Grande parte da sensação ruim desapareceu ao reparar como essas duas artes entravam em harmonia.

A excitação tomou conta de sua alma. Seus olhos brilharam em chamas profundas. Essa era a sensação que desejava, o sentimento que buscava tanto.

Estava numa desvantagem, seus atributos drasticamente reduzidos, sem equipamentos, e mesmo assim seu punho fez o inimigo voar.

Cerrou ambas as mãos, seu corpo lentamente aumentando sua velocidade em disparada ao inimigo. Era hora da adrenalina correr por todo cérebro!

O punhal veio em sua direção, os pés de Lucas chutaram com força o chão e mudaram repentinamente sua trajetória, fazendo-o passar pelo flanco do elfo em direção as costas.

 

A skill Contra-Ataque ativou.

O dano se amplificou grandemente.

 

Um cruzado acertou suas costelas, seguido por um chute nas costas que o empurrou. O elfo cambaleou, contorcendo ainda mais, porém o rapaz mais uma vez o perseguiu.

Assim que seu inimigo se virou, um gancho acertou seu queixo, seguido pelo Um Dois Potencializado e um repentino relaxamento de seus ombros.

Naquele instante haveria um ataque, que errou e teve como retaliação um chute na panturrilha, afundando em parte na região. 

Esse golpe, no entanto, não abriu uma nova distância. O elfo corrompido agarrou a perna de Lucas com uma das mãos e estendeu o punhal para cima.

Ele pretendia aproveitar ao máximo da abertura, mas um soco na lâmina do punhal impediu, seguido por uma cabeçada em direção ao seu nariz que o tirou em parte de seus sentidos.

Aquilo não era planejado, na verdade por um momento temeu que perdesse a carne da perna, até suor frio passou pelas suas costas por tamanho susto.

Estava se virando bem suas magias. O inimigo era mais fraco que o esperado, talvez fosse a sorte falando alto demais.

“Ele está indo bem…”, pensou Solein, camuflada no meio da neve e atentamente prestando atenção ao que acontecia à sua frente. “Não chegou ainda na pior parte, quer dizer que as coisas estão indo devagar. O que aquele elfo corrompido espera?”

Uma coisa estranha rodeava o oponente de Lucas. Ele agia de forma muito despretensiosa, como se subestimasse quem enfrentava.

Era diferente dos relatórios, que falavam de um elfo com uma esgrima sobrenatural. O que poderia ter mudado isso? O corpo do elfo tremeu. 

Solein percebeu o que estava acontecendo e saiu de seu esconderijo, gritando com toda a força que tinha: — SAIA DE PERTO, LUCAS!

O rapaz demorou demais para perceber. Uma onda de choque negra se espalhou por toda a floresta, as árvores ao redor despencaram uma por uma.

Solein ficou soterrada por um tsunami de neve, tendo que cavar para achar seu caminho para fora. O pior havia acontecido.

Aquele elfo corrompido evoluiu de forma repentinamente. Demoraram tanto para resolver o problema que ele piorou de uma hora para a outra!

Agora Lucas estaria morto, com toda certeza! Não tinha nenhuma chance dele vencer essa luta, não com somente habilidades físicas!

Um garoto humano podia ser muito forte, mas sem magia, do que adiantaria batalhar contra uma espécie evoluída que varreria um batalhão inteiro de soldados?

Solein saiu do meio da montanha gelada sobre suas costas de volta ao ar fresco. Uma tontura machucava sua cabeça por causa do impacto.

Os olhos se estreitaram ao redor, nenhum sinal do elfo negro. Mais do que nunca precisava chamar todos os elfos da vila ou fugirem. 

“Não, nós TEMOS que fugir. Não é possível derrotá-lo agora nesse estado!”

Assim que ela foi saindo para fugir, suas orelhas captaram um som. Eram o de passos na neve. Olhando detrás do monte à sua frente, avistou Lucas andando na direção do monstro.

O elfo não era mais um de seus semelhantes, ele se tornou numa massa estranha de carne e o punhal em sua mão se fundiu ao corpo.

Um dos braços se tornou uma larga lâmina cheia de olhos vibrantes. O corpo era fibrado, cheio de veias pulsando de uma ponta a outra.

Seu rosto agora era completamente diferente da expressão distorcida e demoníaca, simplesmente não havia nada no lugar de sua face.

A definição de um demônio, e mesmo assim o rapaz ia adiante sem medo nenhum. 

“Ele é insano, totalmente insano! Não tem como derrotar uma coisa dessas!”

— Que bicho feio da desgraça… — comentou Lucas, fazendo uma careta ao erguer o rosto. — Parece até que foi espancado a vida toda e virou isso. Bem, não tem o que fazer, né?

As táticas normais não funcionariam mais, mas tinha uma coisinha em especial que cairia bem naquele combate contra um monstro largo.

— Lâmina de Vento!



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