Farme! Brasileira

Autor(a): Zunnichi


Volume 2

Capítulo 61: Bosque

O ambiente de aparência tranquilo era fachada, Lucas suspirou ao imaginar que não teria nenhum momento de paz mesmo num local que era para ser pacífico.

Ao lado daquela garota, ainda por cima, as coisas pareciam piores. Como se não bastasse ter que cuidar de si mesmo, cuidaria dela até que matassem o chefão da área.

Ou foi isso que Lucas pensou, pois uma janela flutuante o contrariou.

 

Ache o escolhido da entidade de Artemis nas profundezas dessa floresta.

Ele foi selado em algum lugar e diversas armadilhas foram colocadas para impedir o seu progresso.

 

“Hum? Encontrar uma pessoa ao invés de enfrentar um chefe? Isso é novo vindo do sistema.”

Ainda assim, deu de ombros, uma missão desse calibre seria mais fácil que matar monstros aleatórios por aí.

— Solein, fique atenta nos arredores. Viemos aqui resgatar uma pessoa, quando a trouxermos de volta essa dimensão vai ser completada.

— Que tipo de pessoa? — Ela inclinou a cabeça para o lado em dúvida. — Tem vários tipos de pessoa, você tem que ser específico. Ele é um humano? Um elfo? Talvez um dragão? Ora, tem diversos tipos e você não pode generalizar dessa forma.

— Não sei que tipo de pessoa é. — A forma como a elfa falava era irritante, mas Lucas não se importava muito. — Provavelmente ele ou ela está preso em algum lugar desse bosque, fique atenta com coisas estranhas… Também tem armadilhas por aí, então cuidado nunca é demais.

Solein acenou com a cabeça e seguiu o caminho guiado por Lucas. O rapaz, por outro lado, estava com seus olhos atentos escaneando o lugar inteiro.

A mensagem era estranha, pois mesmo com traços de mana vagando pelo ar, não se deparou com um ponto em que se focavam ou formavam uma trilha.

Tudo estava disperso, como um lago que não se conectava a nenhum rio, a ondulação das águas apenas acontecia dentro dele mesmo.

Seu mal pressentimento ficou mais intenso conforme andavam para as partes mais profundas do bosque e nenhum monstro aparecia.

Deveria haver pelo menos um goblin para ocupar sua atenção, mas nem isso aconteceu. O canto todo estava desabitado. 

Quando Lucas deu mais um passo adiante, um largo círculo mágico verde surgiu debaixo de seus pés.

Uma explosão sucedeu a ativação do símbolo, lançando Lucas no ar com vários ferimentos nas pernas e braços, fazendo-o cair alguns metros para trás.

Solein, olhando essa cena, soltou  um grito fino de susto e levantou o cajado em suas mãos o mais alto que pôde, reconhecendo um dos feitiços entre os configurados no item.

 

O feitiço Cura Média foi usado.

 

Os olhos de Lucas piscaram por um tempo, querendo recuperar a consciência, uma luz morna o revestiu como um lençol numa noite quente.

Lucas encarou seu braço cheio de cortes e reparou nos ferimentos rapidamente fechando, ao mesmo tempo que uma ardência tomou seu corpo inteiro.

Ele se sentiu um pouco cansado quando a cura terminou, mas era melhor que ter um ferimento e vê-lo sangrar por um longo tempo.

— Obrigado, Solein. — Ele acenou para a elfa com o braço bom de novo. — Continue atenta assim, eu vou desativar as armadilhas no caminho e você vai me curando, escutou?!

— Sim, sim, mesmo se você sussurrasse eu ainda escutaria! — Como se por instinto, ela levantou aquele cajado de flor e bateu em cima da cabeça do garoto. — Eu que não sou maluca de realizar isso que você acabou de falar! Tá querendo morrer, seu maluco?!

— Ai, desgraçada! — Suas mãos mexeram no calo que subiu com a pancada. — E o que você quer que eu faça além disso, hein?!

— Hah, Lucas, você pode ser uma existência de poder assustadora e ainda é tão ingênuo… — Solein deu de ombros, apontando o artefato mágico nas suas mãos em outro círculo que estava invisível no ambiente. — Veja e aprenda o motivo dos elfos serem conhecidos como fadas e serem uma raça mágica tão especial!

A mana ao redor do símbolo tremulou, então passou a se mexer desordenadamente até se desmanchar no ar. 

Em uma questão de cinco segundos, Solein foi capaz de desfazer um círculo mágico sem esforço, usando somente um simples catalizador.

— Não fique pálido, Lucas, eu já mexia com magia desde que era pequenininha… ou você acha que minha habilidade de sumir em flocos de neve foi uma alucinação sua?

Falando agora, fazia mesmo sentido uma coisa disso ser comparada a magia. Uma pena que tal habilidade acompanhava uma cena que queria apagar da mente.

Solein prontamente explicou que a natureza de todos os elfos era inclinada para magia, logo, se tornava natural para eles experimentarem o arcano.

Mesmo que a magia pudesse ser configurada de infinitas formas e demonstrada de maneiras completamente alienígenas, era fácil encontrar um padrão.

Era como identificar uma cifra usada em determinada língua, assim que você descobria como as coisas estavam ordenadas, tudo poderia ser controlado e manipulado.

Só que isso acendeu a imaginação de Lucas. 

Se a magia funcionava dessa forma, não queria dizer que qualquer lugar que possuísse acesso a isso tecnicamente eram semelhantes umas às outras?

Agora que pensava melhor, os portais forneciam a conexão entre mundos diferentes, e se funcionava dessa forma, então todos os mundos carregavam um tipo de forma própria para apresentar aspectos sobrenaturais.

No seu, era por meio de poderes que as pessoas desenvolviam naturalmente, mas no de Solein, aparentemente era por outros meios.

Os dois começaram a se aprofundar na floresta, visto que a elfa rapidamente resolveu a questão das armadilhas.

— Ei, como as pessoas usavam magia no seu mundo? — perguntou, meio despreocupado.

— Hm… como você é de outro mundo, não deve saber mesmo. — Ela colocou a mão no queixo, meio pensativa, até um novo símbolo precisar ser desfeito. — As pessoas geralmente usavam encantos, sabe? Falavam algumas palavras e tcharã, algo mágico acontecia. Todas usavam algum nível de magia, indo de primeiro nível até o quinto, os mais talentosos ou ricos tinham como acessar níveis mais altos e os mais pobres se contentavam com os mais baixos.

— Mas pra usar esse cajado você não falou nada, e também quando fez aquele truque de desaparecer não precisou também.

— É por dois motivos: certos cajados ou itens encantados têm habilidades inatas, como se alguém as tivesse gravado. Isso nas minhas mãos, por exemplo, é uma delas. A magia vem naturalmente à minha cabeça quando penso no que tem nisso. E quanto ao que fiz… é algo mais como exclusivo do meu povo. 

Ela hesitou um pouco em tentar achar uma razão exata para a última parte, porque não sabia exatamente como descrever em palavras.

Era mais algo natural, instintivo para cada pessoa. Elfos que viviam na floresta podiam se transformar em árvores e humanos possuíam ótima adaptabilidade para diversos elementos.

De certa forma, cada povo tinha um ponto alto. Solein retrucou a questão da mesma forma, mas ficou meio decepcionada com a resposta.

Só haviam humanos, todos com traços individuais que podiam ser herdados dos pais. Não era nada impressionante quando comparado ao seu mundo.

— Sendo franca, deve ter ocorrido muitas guerras e desgraças no seu mundo, Lucas. Tantas pessoas diferentes com um conjunto tão único de capacidades… Só consigo ver discórdia nisso.

— Hm, verdade, mas estranhamente não teve nada disso. Os tempos são bem pacíficos, não tem notícias de guerra ou coisa assim…

Lucas parou no meio do pensamento. Sem guerras? No mundo anterior havia guerras mesmo nos tempos modernos, e elas eram ainda piores que as catalogadas anteriormente na história.

Por que um conflito ou guerra não era registrado na internet? Devia ser fácil de saber ou ver algo desse tópico. Ele fez uma nota mental de ver essas coisas mais tarde.

Durante o longo passeio ao longo do bosque, eles se depararam com uma estrutura com certeza nada natural para o ambiente.

Aparentava ser um templo de pedra, no entanto estava todo desgastado, com rachaduras traçando vários caminhos ao longo das rochas e com musgo crescendo por toda parte.

Lucas se aproximou por instinto, e por sorte não havia nenhuma armadilha na entrada, o que facilitou para analisar os entornos.

Desenhos de faces decoravam a entrada, enquanto uma escadaria em espiral levava para um andar inferior e o restante do cômodo era aberto por quatro entradas.

Parecia até algo feito para ser encontrado e explorado. Solein se aproximou e também olhou um pouco o local.

— Não deve ser muito perigoso, até agora só vimos círculos e nada mais que isso. Tenho só o medo do que pode estar nos esperando lá embaixo. 

— Hum, qualquer coisa, corre. Eu vou tentar parar seja lá o que estiver aqui embaixo enquanto você dá no pé.

— Mas falar isso também é demais, eu não sou covarde assim!

— Olha, sem ofensa, mas você parece plenamente capaz de fazer algo assim.

Com esse comentário afiado igual uma faca, eles desceram a escadaria.

 

Adentrando uma área de grande instabilidade.

As skills, magias e técnicas do jogador foram desbloqueadas.

Todos os atributos foram reduzidos pela metade.

 

Nome do território: Sacrifício do Maioral

 

“Sacríficio do Maioral? Esse nome é bem… como que eu posso dizer? Esquisito?”

No entanto, o local do andar debaixo quebrou algumas das expectativas dele. Era uma grande área escura, com uma roda numa das extremidades da sala.

A roda era cercada por cordas, um cheiro pútrido atacou o nariz de ambos seguido por um forte aroma de ferro.

Era sangue, do qual Lucas se adaptou há bastante tempo, diferente de sua colega, que tremeu de medo perante o odor.

Ele empurrou a elfa um pouco para trás e a virou, impedindo-a de levantar a cabeça para ver o que tinha a seguir.

Era melhor ninguém ver, para falar a verdade, mas Lucas ainda assim pôs os olhos naquela cena horripilante.

Sentiu uma vontade imensa de vomitar, mas mordeu a língua na tentativa de segurar o desejo. 

Diante dele havia uma pessoa amarrada na roda, seus quatro membros esticados de forma muito inumana e com diversos cortes ao longo do abdômen.

A pessoa estava de cabeça baixa, o cabelo loiro caia por cima do rosto e o escondia, mas ao menos seus movimentos no peito indicava que respirava.

— Solein, continue do jeito que está e não se vire de nenhuma forma, ok? Me dê o cajado.

— Tu-tudo bem… — Esticando o braço para trás, ela entregou o objeto mágico. — Pode me dizer pelo menos o que é?

— É uma pessoa ferida, a cena também é muito feia. 

Lucas analisou o cajado e entendeu aquelas palavras de enxergar os feitiços dentro da própria cabeça. 

 

O feitiço Cura Média foi usado.

 

A pessoa ficou embuída com uma luz clara, parte de seus ferimentos sararam, mas muitos permaneceram. Ele tentou de novo e o resultado continuou o mesmo.

“Sendo assim, só tem um jeito de sair dessa.”

 

Poção de Cura Maior

Permite grande recuperação de ferimentos, podendo relocar membros de volta no lugar.

 

Lucas colocou o frasco na boca do indivíduo e o fez beber todinho, o efeito foi dezenas de vezes melhor que o feitiço, regenerando praticamente tudo.

Aproveitando, Lucas usou o Sabre de Pirata que havia levado consigo por dentro do moletom para cortar as cordas, segurando o corpo da pessoa antes que ele caísse no chão.

— Solein, pode me dar uma força aqui? Já pode se virar, tá tudo bem agora.

A elfa virou o rosto e se deparou com um homem de barba rala e roupas desgastadas todo jogado no chão, mas vendo que Lucas estava só ajudando, ela decidiu colaborar.

Os dois subiram a escadaria carregando aquele peso morto e o colocaram no meio da grama, achando que seria o melhor por agora.

 

Você resgatou um escolhido pela entidade

A deusa Artemis o recompensa com 2.000 unidades.

 

“Uuia, curti essa deusa!” Lucas dispensou ambas as telas, extremamente contente com sua recompensa.

No entanto, em meio aos seus pensamentos, ele não percebeu o homem caído se remexendo. Aquele cara abriu os olhos, uma feição perplexa ocupava seu rosto.

Num movimento agil, ele se levantou e pegou Solein pelos ombros, retirando uma faca enferrujada de um de seus bolsos furados e o apontou direto na garganta da elfa.

Novamente, as situações sempre iam de mal a pior com Lucas por perto, mesmo fazendo uma boa ação.



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