Volume 2
Capítulo 30: O caminho oculto
Sem mais atrasos, o grupo finalmente saiu para a exploração. A tensão predominava e inundava os olhares frios e cansados. Só de olhar para os soldados fortemente armados, dava para ter uma ideia do risco da missão.
— Vocês são estranhos — uma voz grave quebrou o silêncio — Por que não foi lá, mostrar para ela que se importa tanto a ponto de nos fazer esperar para ver o desfecho da luta? — disse Varbbek, torcendo o nariz, olhando para a figura que saía das sombras.
— Meu caro, agora ela não precisa de bajulação — disse Cázhor, se aproximando do druida e revelando, finalmente, quem estava na penumbra.
“Duvido muito que ele conseguiria bajular alguém.” Pensou Gutter, ao lembrar da fama do mago.
— Tem certeza de que sua ferida está cicatrizada? — Apesar de já ter ouvido falar dos grandes feitos do mago, Varbbek lançava um olhar preocupado para o maneta.
Mesmo com todo tratamento fornecido pelos druidas, a ferida do mago era grave e, da forma com a qual foi tratada inicialmente, só colaborou para que o ferimento piorasse. Cázhor já não dispunha de suas formidáveis poções e a tal barreira impossibilitou o transporte de matéria-prima e matérias para confeccioná-las.
— Isso é apenas um detalhe, temos algo mais importante para nos preocupar, meu caro.
Após tais palavras, todos seguiam silenciosamente, porém com passos firmes. O caminho, se é que podia ser considerado assim, era tortuoso e inundado de pesadas folhagens cobertas por uma densa neve. O vento já não soprava com a mesma intensidade de antes, mas a umidade que impregnava as roupas transmitia a mesma sensação.
Liderados por Varbbek, seguiam em direção a uma suposta nova base que estaria sendo construída pelos seguidores de Vastyr. A cada dia, os demônios se aproximavam mais e mais da sede de Mizuyr e, se os druidas quisessem evitar perder ainda mais seu território, precisavam urgentemente descobrir como impedir o avanço dessa barreira.
O terreno era irregular, cheio de escaladas íngremes e longas descidas. Pedras encharcadas e envoltas em lodo, que, hora ou outra, se soltavam, rolando vários metros abaixo. A falta de esperteza dos monstros, juntamente com o barulho da ventania, garantia que o grupo não fosse notado. Após dias de caminhada, se aproximaram da tal instalação.
— Me intriga que a diferença de tempo após a saída de Thorm antes da nossa seja tão pouca na perspectiva de quem estava na caverna, porém aqui fora, isso lhe deu meses de vantagem — disse Cázhor, estreitando os olhos enquanto observava uma pequena construção à frente.
— Apesar de tudo que já vimos nesse mundo, o que vocês presenciaram lá dentro... — Varbbek parou ao perceber algo estranho no ar.
A visão que o grupo tinha não era diferente do que já ouviram antes. O conhecimento sobre demônios e o reino de Phelgor era escasso. A intensa névoa tóxica que, hora ou outra, se fazia presente tornava o reino inabitável. Alguns estudiosos alegam que as terras de lá se corromperam quando a magia do mundo se fundiu com algum tipo de partícula estranha do lugar. Dalí surgiu uma variação da magia, também conhecida como mana escura. Todos que tiveram contato por um demasiado tempo com a mana escura, tiveram graves problemas de saúde ou morreram. Curiosos pesquisadores, buscando a glória de alguma informação da extinta nação demoníaca, eram os principais alvos dessa maldição.
Onde o grupo estava seguia a mesma premissa, a mata ao redor da construção estava definhando. A neve que, durante o caminho, era branca e pálida, ali, dava lugar a uma mistura lamacenta e acinzentada. A cada passo, mais e mais se podia ver da ação não natural causada por esses seres. Grandes árvores, agora, não passavam de pequenos tocos sem vida. O lugar fedia, era como se o miasma, lentamente, apodrecesse tudo ao redor.
— Não vejo ninguém — disse um dos guardas, enquanto se camuflava entre as poucas folhagens restantes.
— Espere! — alertou o líder druida.
Varbbek encostou sua mão direita no chão, mas diferente da forma que o elfo havia feito na caverna, o druida se conectou de uma maneira mais profunda à natureza ao seu redor. Sua sensação tátil se expandia como raízes profundas pelo chão lamacento, o que hora ou outra o fazia dar ânsia de vômito, como se seu corpo quisesse repelir o veneno que havia se instalado naquela terra.
— Tem algo vindo... Na verdade, já está bem próximo — disse o druida enquanto estreitava os olhos em direção à pequena clareira à sua frente.
— Então é assim que eles se esconderam por todo esse tempo? — Cázhor estava impressionado com o quanto evoluído essa raça era.
Eram como espelhos retorcidos que refletiam, estranhamente, tudo ao seu redor. Uma camuflagem perfeita. Para olhos despreparados ou desatentos, eles passariam facilmente sem serem notados. Algumas criaturas traziam grandes blocos de pedras maciças e acinzentadas, já outras, cestos com vários fragmentos de um cristal avermelhado. Entre um passo e outro, suas presenças oscilavam com o vazio da floresta, como a chama de uma vela prestes a acabar.
— É como se nossos olhos nos pregassem uma peça, hora estão ali, hora não mais — disse um dos guardas ao observar a cena.
— Parece que ainda estão no início. O que serão esses cristais vermelhos? Não me remete a nenhum tipo de magia que conheço ou já estudei — disse o mago, intrigado.
— A terra está em desarmonia. Eles estão contaminando Gaia! — O druida estava furioso.
— Calma, Sr. Beothoro. Viemos aqui para fazer o reconhecimento, entrar em um conflito não é nossa prioridade, mas sim descobrir como destruir essa barreira — disse Cázhor, baixinho, enquanto tentava acalmar o druida.
Ao contrário do que o mago viu na caverna, essas criaturas pareciam mais uma versão estranha e mal adaptada de animais do que algo que se assemelhasse a humanos. Faziam ações automatizadas e sem descanso. Tudo indicava seguir apenas ordens, sem qualquer vontade própria.
— Eles estão usando isso para fundir aqueles cristais? — Gutter questionou Varbbek.
— É o que parece — respondeu o druida, após ver uma das criaturas levantar um enorme tampão feito de pedra, revelando um grande forno de metal enterrado na terra.
— Um condensador de mana — concluiu Cázhor.
— Mas... é algo que somente as sedes têm. Isso não pode ter sido construído por essas criaturas que mal andam sem trombar umas nas outras. — Gutter parecia incrédulo.
— Precisamos de mais informações. De onde eles estão tirando esses cristais? Esse brilho vermelho... — Cázhor sentia uma forte onda negativa vindo do suposto mineral — A maldição do elfo! Isso! Eles têm a mesma energia que a daquele maldito demônio que enfrentamos na caverna.
— Pode ser que, se seguirmos essas criaturas, encontremos Thorm — sugeriu Gutter.
— Bem provável — concordou Varbbek.
Todos assentiram e, sem mais delongas, se puseram a seguir as criaturas até a origem do tal material. O líder druida mantinha-se na vanguarda, seguido de seu 2º líder do esquadrão da unificação, Gutter.
O rapaz era alto, com seus aproximados 1,90 m de altura. Seus cabelos negros pendiam acima da orelha e seu porte físico era de digno dos soldados de Carmim. Gutter nasceu em Mizuyr, sua pele, levemente morena, carregava marcas de sua infância cheia de traquinagens na mata da periferia do reino. Amigo de infância de Varbbek, mudou-se, ainda criança, com sua família, para o reino de Ancor pouco tempo após a morte do pai do druida, retornando recentemente como parte das tropas da nova aliança.
O grupo de Varbbek acompanhava cautelosamente as estranhas criaturas em sua viagem de retorno com os cestos vazios. Qualquer informação, mesmo a mais simples, era de suma importância. Romper as defesas do inimigo era um avanço significativo para evitar a total subjugação dos reinos a essa raça opressora. Embora as criaturas não mostrassem nenhum sinal de prontidão, o grupo permanecia tenso, sem ter a certeza do que poderiam descobrir na origem desses cristais.
O caminho era longo e, apesar de consideravelmente lentas, as criaturas mantinham o ritmo constante da caminhada, sem pausas para descanso. O druida e os soldados já estavam acostumados com esse tipo de jornada, os treinamentos e testes aplicados pelo exército lhes garantiam tal performasse. A maior preocupação era se o mago acompanharia o ritmo.
— Não se preocupem comigo, senhores — disse Cázhor, ao observar a tensão do grupo — pode não parecer, mas já fui membro das forças armadas de Ancor.
— Um mago combatente? Tá aí uma coisa que não se vê todo dia — disse um dos soldados druida.
— Hey! Esse é o famoso mago prodígio, Wilheiman. Cázhor Wilheiman. Tenha mais respeito — disse Gutter, baixinho. Em repreensão ao soldado.
Indiferente, o mago deu de ombros, sinalizando para continuarem o caminho.
— Sigh... — Varbbek, impaciente, soltou um longo suspiro.
A bajulação de Gutter trouxe lembranças da infância a Cázhor. Um garoto apaixonado pela magia e que sabia que precisaria de status para acessar pergaminhos de feitiços e lugares proibidos aos cidadãos comuns, o que o tornou o mago mais jovem a liderar a cúpula mágica. Contudo, sua obsessão o afastou de qualquer tipo de relacionamento. Mas isso mudou com a chegada de Lenna, que, inicialmente uma obrigação, se tornou essencial para ele. Cázhor se via na garota e, antes de conhecer toda a verdade, ela o motivou a se unir ao exército em busca de força para protegê-la.
— Vamos! — Varbbek deu a ordem ao perceber que os alvos haviam se adiantado.
O grupo seguia silenciosamente as criaturas. Horas se passaram, e elas ainda caminhavam em uma única direção, próximo à divisa com o reino de Nifhéas.
— Mas... o quê? — disse um dos guardas, estreitando os olhos em direção aos grotescos seres.
A visão que, até há pouco, era nítida, agora estava embaçada. A imagem hora aparecia, hora não, como o piscar da luz de um vaga-lume.
— Mas que diabos... — O mago também não compreendia.
— Eu os vejo, mas não sinto mais a presença, é como se nunca tivessem estado aqui. É como se fossem...
— Ilusões? Ha ha ha... — disse uma voz feminina, interrompendo o druida.
Nesse momento, todos entraram em alerta máximo. As criaturas que há pouco andavam enfileiradas já não se faziam mais presentes. O ar estava denso e a escuridão da noite havia caído repentinamente, como um véu que pende delicadamente sobre o chão.
“De onde veio essa voz? Uma armadilha? Como não notamos isso antes?” Cázhor olhava rapidamente ao redor na tentativa de encontrar alguma resposta.
— Não estamos mais nas terras de Mizuyr — disse o druida, quando sua visão finalmente se acostumou à penumbra.
— Um... portal... Passamos por um maldito portal! — deduziu o mago.
— Por que não nos avisou antes? — indagou o druida.
— Nunca passei por um para saber como é — retrucou o mago, sarcasticamente, mesmo sem ter a intensão.
A resposta arrancou um pequeno estalo da boca de Varbbek de desaprovação. Porém, sua expressão se transformou rapidamente, quando viu o que estava à sua frente.
— Bom... bem-vindos ao nosso reino, senhores — disse a voz feminina, terminando a frase com um silêncio ensurdecedor.
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