Medo da Escuridão Brasileira

Autor(a): Marcos Wolff


Volume 2 – Arco 1

Capítulo 10: O Orfanato.

Alysci

40 anos atrás.



Uma garota estranha chegou no orfanato, seus cabelos eram brancos e muito longos… até o momento que ela chegou, eu não tive a mínima chance de trocar palavras com ela, talvez seja pelo fato de que a mamãe nunca deixou… 

Desde que ela chegou tem sido a favorita da mamãe, isso vem deixando as outras crianças muito tristes… não sabemos ao certo o que está acontecendo, mas… está tudo tão triste.

Estamos brincando sozinhos por aí no pátio do orfanato e ninguém nos impede de fazer qualquer coisa… a mamãe não aparece faz umas horas, especialmente desde que a garota chegou, isso acontece com todas as pessoas?

Sou a única que não brinca, na verdade estou indo em direção ao quarto da mamãe, normalmente ela fica lá falando com as novas pessoas. Mamãe é uma pessoa misteriosa, não é assustadora, mas… 

— Qual seu nome, minha criança?

— Eu… não tenho um nome.

— Não? Que pena… que tal eu te dar um nome agora?

— Tudo bem…

— Seu nome… deixa eu ver…  seu nome será Saionara. Em hebraico seu nome é conhecido como “protegida por Deus''.

— Protegida por Deus?

— Sim, podemos mudar isso para… protegida por uma deusa.

— Como assim?

— Eu sou uma deusa, oras… a deusa da escuridão, você pode me chamar de mamãe, mas se quiser algo mais profundo… pode me chamar de Akumo.

Ninguém nesse orfanato chamou a mamãe pelo seu nome, ela disse que não queria se aproximar tanto das pessoas ao ponto de falar o nome real delas… até hoje ela só chamou a gente de filhas, ou qualquer outra coisa parecida.

Isso causa um certo ciúmes em mim… mas outra garota aparece e abre a porta no meu lugar.

— MAMÃE, COMO ASSIM A GENTE NÃO PODE TE CHAMAR PELO NOME?

A garota que apareceu tinha cabelos enrolados e laranjas, olhos que pareciam estrelas… ela é… uma estrela.

— Solveig, eu disse para você não entrar no meu quarto.

— NÃO MUDE DE ASSUNTO, MAMÃE!!

— Ok ok, você também pode me chamar pelo nome… não tem problema.

Akumo segura a garota pelos braços e a levanta.

— Eba! Hehehe…

Nesse momento ela percebe que eu estou ali no canto da porta olhando as três se divertindo.

— Parece que temos mais uma intrusa por aqui…

— D-Desculpa… — digo.

— Não há com o que se desculpar, Alysci.

— Mas…

— Venha aqui, para ficar justo com as três, eu deixarei vocês me chamarem pelo nome, mas só quando estivermos sozinhas, ok?

Todas concordaram e ficamos uns pequenos segundos em silêncio, até a própria mãe quebrar isso.

— Oh… verdade! Alysci, Solveig, essa aqui é Saionara, a minha nova filha… quero que vocês se deem bem com ela!

A garota era um pouco tímida, mas ainda sim respondeu a gente com um oi meio distante, Solveig sendo a garota que gosta de conversar com as pessoas, se aproxima de Saionara.

— Meu nome é Solveig, mas pode me chamar de A FILHA FAVORITA DA MAMÃE!

Sua pose era como se ela estivesse se gabando pelo que estava acontecendo, Akumo ri de uma forma meio tímida, alguém conseguiu deixar a mamãe envergonhada.

— P-Prazer… Solveig…

Me aproximo e me apresento.

— Meu nome é Alysci.

— Prazer… Alysci.

— Quero que vocês três sejam melhores amigas, não tenham medo de se aproximar…

Akumo assim se ajoelha e abraça nós três.

— Eu amo todas vocês… amo de verdade.

— Nós também te amamos, mamãe! — digo juntamente a Solveig.

Saionara não diz nada, estranho isso…

— Agora vocês três, vão brincar. E também apresentem o orfanato para Saionara.

— O que? Ah… que chato… — reclama Solveig.

— Chato nada, vamos vamos!

Akumo aos poucos expulsava a gente do quarto. E a porta se fecha com a gente do lado de fora.

— Olha aqui garota nova, eu vou te apresentar o local, mas a favorita da mamãe sou EU! — diz Solveig.

— Entendo… não irei fazer nada para ser a favorita da Akumo… 

— OLHE AQUI, NÃO A CHAME PELO PRIMEIRO NOME!

— Mas ela disse que eu posso…

Solveig estava rosnando para Saionara.

— Vamos andar por aí e mostrar o local. — digo.

Assim nós andamos por aí mostrando todo o orfanato para Saionara, todo o caminho ela estava achando tudo isso totalmente desinteressante, e eu até entendo seu lado, ela não queria saber muito sobre o lugar, parecia que tinha algo que chamava mais a atenção dela…

A todo momento ela ficava olhando para as janelas, as outras crianças estavam observando a nova criança sem nem ao menos se apresentarem, eles pareciam sentir um pouco de ciúmes da mamãe, ou até mesmo pareciam com raiva.

Ninguém queria uma nova irmã, todos sabiam que uma nova criança dentro do orfanato era pedir para falir o lugar, nós estávamos passando por momentos totalmente terríveis, e sabíamos que uma nova pessoa era como pedir um fim ao orfanato.

Infelizmente… não temos o que fazer. Akumo não escuta a gente e nem quer saber da opinião das crianças sobre coisas financeiras ou qualquer coisa do tipo, ela diz que nós não sabemos de nada do que está acontecendo e que tudo está de boa, não há preocupações.

Assim chegamos no quarto das garotas e lá Solveig aponta para a cama de Saionara que era do lado da minha. A nova garota pela primeira vez no dia sorriu, isso deixou Solveig totalmente envergonhada.

— Enfim, essa é sua cama.

— Obrigada pela ajuda, Solveig!

— NÃO PRECISA ME AGRADECER!

Solveig se deita em sua cama que era acima da minha e dorme.

— Enfim, hora de dormir, vamos logo… — digo.

As crianças começam a se juntar no quarto se apresentando cada uma para Saionara, ela parece meio envergonhada com o que está acontecendo, assim com todas as crianças na cama… Akumo aparece e senta em uma cadeira… abre um livro e…

— Brilha, brilha… estrelinha… quero ver você brilhar… 

Akumo começa a cantar uma música de ninar para todas as crianças que estavam ali, todas aos poucos começam a dormir, e, Akumo que estava cantarolando, se aproxima de minha cama e passa sua mão em meus cabelos. Ela beija a minha testa e diz.

— Boa noite… minhas estrelas.

Todas já estavam dormindo… menos eu.

— Boa noite… mamãe…

E assim… eu durmo.

No dia seguinte, estava marcado como o pior dia das nossas vidas… o orfanato foi invadido.

Um homem muito alto e forte apareceu no orfanato dizendo querer falar com Akumo, assim ela aparece…

— O que você quer? — pergunta Akumo.

— Nada demais, só que você tem que voltar para o campo de batalha.

— Eu já disse que nunca mais iria voltar.

As crianças aos poucos acordam e aparecem tentando ver o que está acontecendo.

— Precisamos de você, Akumo.

— NÃO PRECISAM DE MIM, VOCÊS CONSEGUEM SE VIRAR.

— Teremos que apelar então…?

— O que vocês querem fazer?

— HOMENS, AVANCEM!

Assim… o orfanato aos poucos começa a ser destruído, as paredes começam a cair e pessoas aparecem pegando todas as crianças e apontando armas nas cabeças delas.

— AKUMO, VOCÊ ESTÁ SENDO OBRIGADA A VIR PARA O CAMPO DE BATALHA, CASO O CONTRÁRIO MATAREMOS TODAS AS CRIANÇAS!

— EU POSSO MATAR TODOS VOCÊS!

— Antes disso… destruíram os seus sonhos…

As crianças estavam se questionando sobre o que estava acontecendo, muitas estavam chorando, outras estavam gritando. Akumo não sabia o que fazer, dava para ver isso… ninguém estava me segurando… e eu me aproximo da mamãe.

— Mamãe…?

Seguro em seu longo vestido preto.

— O QUE FOI CARALHO? — diz Akumo enquanto me olha de uma forma assustadora.

Ao me ver ali, sua expressão se torna de culpa e assim ela me segura no colo.

— Se vocês acertarem minhas crianças… eu não vou perdoar nenhum de vocês.

— Então venha para a guerra.

— Por que eu deveria ir?

— É a única capaz de bater de frente com os deuses, somente porque é um deles.

O olhar de Akumo era de ódio, assim ela se aproxima do homem que estava falando com ela.

— Não me compare com eles, não. Me. Compare. Com. Eles.

Lâminas assustadoras surgem das costas de Akumo, ela finca com tudo no pescoço daquele homem, nesse momento… o terror começa.

— FOGO!

Os homens assim atiram na cabeça das crianças que estavam ali. Akumo olhou para trás e arregalou seus olhos, ela grita de raiva e começa a matar todos os homens de uma vez… uma pequena guerra começa naquele lugar, explosões começam, sangue para todo lado, ossos quebrando, gritos de morte, tudo estava acontecendo… e eu… uma criança… estava vendo tudo aquilo.

Isso era assustador, eu não sabia uma forma de reagir pois queria que tudo aquilo fosse mentira, eu não queria ouvir os gritos, então tampo meus ouvidos, eu não queria falar nada, então fico quieta… isso até uma explosão acontecer do meu lado e eu ser jogada contra uma parede… e… desmaiar.

 

2 horas depois.

 

Escuto passos se aproximando de mim, aos poucos abro meus olhos... vejo uma fumaça na minha frente, dela sai uma mulher… parece Akumo.

Ela estava com duas crianças nos braços e com uma aparência assustadora, parecia ter me visto respirar e aos poucos abrir os olhos… 

— Ma… mamãe…?

— Ainda bem… você está acordada… ainda bem…

Akumo começa a chorar ao me ver, e sua pele começa a ficar branca como se fosse leite, seus olhos aos poucos começam a ficar vermelhos… 

— Ehehehe… parece… que tem algo acontecendo comigo…

Percebo que as duas crianças que estavam em seus braços eram Saionara e Solveig, minhas amigas… Akumo solta as duas e se ajoelha no chão. Tento me levantar, mas infelizmente não sinto minhas pernas… elas estão… sangrando… está doendo demais… eu não estou sentindo…

Mas isso não vai me parar. Me rastejo até mamãe e consigo abraçá-la.

— Mamãe… mamãe…

— Calma, minha filha… está tudo bem.

Meu corpo se sente estranho ao tocar em Akumo, parecia que… tudo estava voltando ao normal, meu corpo estava se regenerando e voltando a ter vitalidade, era estranho.

— Droga… você não podia me tocar…

— Mas…

— Ahaha… agora… tudo está acabado.

Akumo assim se levanta e começa a se afastar aos poucos, segurando sua cabeça e gritando para todos eles pararem… Eu não sabia o que estava acontecendo… ela estava cortando o ar…

— PAREM, NÃO É MINHA CULPA!

— Mamãe…?

— CALA A BOCA, VAI SE  FUDER, NÃO É MINHA CULPA, PAREM… PAREM… PAAAAREEEEMMMMM!

Assim eu corro para abraçá-la e ela para.

É como se eu tivesse feito ela voltar a realidade, eu estava muito assustada, tudo estava estranho… 

— Não tem mais tempo… Alysci… 

— Do que você está falando, mamãe?

— Vocês… terão que ir embora daqui…

O que? Ir embora? Do que ela está falando? Akumo assim me abraça ao perceber que eu começo a chorar, ela aos poucos falava que estava tudo bem, mas na verdade não estava… as duas acordam e percebem o que está acontecendo, elas correm para abraçar a mamãe também, todas estão com medo…

— Por favor… façam o que estou pedindo… 

Saionara diz que está assustada… então Akumo nos leva para a saída do orfanato.

— Sigam esse caminho… eu vou alcançar vocês…

Você não vai, né? Você está mentindo, né? Mãe, mãe… não vá embora… seus olhos estão me dizendo isso, eles estão se segurando para não perder sua humanidade, eu vejo isso…

Saionara e Solveig aceitam e dizem que ficaria tudo bem… mas elas sabiam o que estava acontecendo, não há muito o que fazer nesse momento, só podemos aceitar e ir embora, dando as costas para Akumo… 

Ela estava chorando e dá um abraço na gente.

— Por favor… minhas filhas, eu vou alcançar vocês quando chegarem na cidade… Ah sim, quando chegarem lá, peçam por ajuda… vocês vão me ajudar muito dessa forma…

Ela nos vira de costas para o orfanato, nós três que estávamos chorando e dá um pequeno tapa nas nossas costas.

— Vão, sigam em frente… minhas crianças, vão… 

Começamos a correr. Ninguém olhava para trás, porque lá havia algo que nos assustava… 

Akumo começou a rir loucamente, parecendo até uma pessoa extremamente psicopata... naquele momento, como uma criança eu não percebi... mas tudo, absolutamente tudo da minha vida tinha se tornado um inferno...

Daquele momento em diante já não saberia mais o que ser felicidade.

 



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