Medo da Escuridão Brasileira

Autor(a): Marcos Wolff


Volume 8 – Arco 3

Capítulo 70: A segunda estrela.

Shiori



— Bem, agora finalmente… podemos começar a contar um pouco a sua história.

O céu… as estrelas… tudo se formou diante de mim, para o dia em que nasci. Na minha frente estava a minha mãe… amarrada e com o rosto pálido, ela tinha me dado a luz.

— Essa também é uma falha.

— Falha? Acho melhor manter essa aí, não… Krig.

— Podemos dizer ao certo que é uma falha quando puxou o pai, Mier.

— Não não, tá na cara dela que é a mãe, então vamos manter essa aí.

— Ok, foram quantas.

— Um total de… 30 crianças?

— Você aguentou bem, Solveig.

Minha mãe deu uma certa risada.

— Acha mesmo que não irei aguentar coisas tão leves quanto você faz?

— Hm, acho incrível o poder do sol estar em uma mulher como você.

Krig se aproxima da minha mãe.

— Se eu quiser… podemos continuar de onde paramos.

— Isso… se você quiser.

— Hm?

— Venha, estrela.

O lugar começa a esquentar e as paredes que eram feitas de concreto estavam derretendo aos poucos.

— O que você fez? — pergunta Krig.

— Algo que talvez irei me arrepender.

Um portal se abre atrás da mamãe, demonstrando um exército indo em direção ao deus da guerra.

— CONTEMPLE O PODER DO SOL… seu “deuzinho” de merda.

Os olhos da mamãe brilhavam como estrelas e então… as cordas dela explodem. Solveig corre na direção da filha que acabou de nascer e a segura com os braços, correndo para o portal.

— NÃO DEIXE ELA FUGIR!

Enquanto Krig tentava impedir a minha mãe, Mier apenas a olhava de longe com um sorriso no rosto.

— Nos encontraremos no futuro… senhora Solveig, ou talvez… senhorita… Shiori.

Mamãe não escutou o que Mier falou, mas eu entendi algo… sem nem ter escolhido meu nome, como ela sabe disso?

Mamãe ao atravessar o portal corre em meio a uma floresta que não parecia ter fim. Sem olhar pra trás ela continuava como se estivesse em um looping temporal. A sua respiração se tornava pesada a cada segundo que passava, era possível escutar seu coração só se aproximando…

Ela para de frente com uma pessoa, e comigo nos braços ela diz:

— Pronto, pegue.

— E o que você vai fazer, rainha?

— Darei meu jeito de fugir… só por favor, não deixe ninguém tocar nela. Eu confio em você… Riko.

— Claro.

Uma mulher que estava com o corpo todo tapado começa a correr criando árvores até pular pelas nuvens… enquanto isso minha mãe ficava lá atrás com Krig a perseguindo.

— Se me quer tanto assim, terá que lidar até mesmo com a minha morte.

Mamãe… pula do penhasco.

— SOLVEIG!

Enquanto caía, mamãe se torna uma fênix e começa a voar pelas nuvens, seguindo a mulher que me tinha nos braços. Krig fica extremamente chocado que começa a rir.

— Eu caí certinho no plano delas, aiai…

— O que vai fazer agora? — disse Mier.

— Irei persegui-las por toda a vida, inclusive você… Shiori.

A mesma coisa acontece, meu nome nem tinha sido decidido, mas mesmo assim eles sabiam… quem são esses dois?

Nas nuvens, minha mãe se aproxima dessa mulher chamada Riko e ambas param acima de uma montanha.

— Como vai ser agora? Eles vão te perseguir por toda a vida, Solveig.

— Eu sei… mas não há muito o que fazer, terei que cuidar dela em segredo.

— Em segredo?

— Vou deixá-la sozinha no mundo… talvez assim seja melhor.

— Você não está pensando com a cabeça.

— DESCULPA TÁ? Eu nunca tive uma liberdade direito… está sendo a primeira vez.

— Onde eu me meti…

Nesse momento… começo a chorar.

Mamãe me pega nos braços e aos poucos eu vou parando, o calor dela era incrível, não estava na visão do bebê, mas mesmo assim conseguia sentir como se fosse comigo, um calor… tão bom.

— Calma, calma…

— Você já decidiu um nome pra ela?

— Ainda não, talvez vai ser Shiori.

— Talvez?

— Sim, pensei nisso agora.

— E qual… é o significado desse nome?

— Guia, a Shiori… irá guiar os outros pela vida.

Meus olhos se enchem de lágrimas… mas não às solto.

— Solveig, o que será dessa criança?...

— Irei torná-la a melhor pessoa do mundo!

— Mesmo sem estar presente?

— Essa parte a gente releva, tá?

— Entendo.

— Mas… quero que ela faça muitos amigos e seja feliz da forma dela, somente assim será livre… talvez da forma que eu queria ser.

— Você tem… bons sonhos para ser uma mãe.

— Claro! Aprendi com a melhor!

— Akumo?

— Sim, sim!

O rosto da mamãe falando sobre Akumo dava um pequeno sorriso, como se estivesse orgulhosa do que aconteceu com ela.

— Bem, não irei te julgar.

— Isso aí, não me julgue!

Ambas se sentam no chão e começam a ver o tempo passar… até que Riko tenta falar alguma coisa.

— Se quiser… podemos deixá-la na cidade onde estou.

— O que muda deixar ela lá? 

— É que… poderá ser melhor, já que dessa forma vai fazer novos amigos.

— Hm… falando nisso, Riko… você não está grávida? 

— Que falta de educação.

— Só estou querendo saber.

— Sim, estou.

— Já pensou em um nome pra criança?

— Se for menino… Hideki, se for garota… Mirai.

— Nomes do leste, né?

— Sim, os nomes de lá são extremamente bonitos… afinal, eu vim de lá também, nada mais justo que lembrar um pouco da minha terra passada.

— Hahaha, sim, eu entendo isso. Enfim… pra onde eu irei?...

Mamãe se perguntava isso da mesma forma que me perguntei muitas vezes… como irei prosseguir?

O sentimento de estar sem saber o que fazer nesse mundo dava uma tristeza no meu coração, mas em mamãe deve ser pior… já que ela estava sendo perseguida por deuses e tinha que cuidar de uma criança que talvez iria se tornar alguém no futuro. Olhando para esse passado eu vejo que mamãe tinha esperanças em mim, será que… consegui chegar onde ela queria?

A história do passado é importante para saber o que não pode fazer, mamãe não me ensinou nada sobre isso, afinal de contas ela nem esteve presente na minha vida, nunca entendi o motivo…

— Sabe, Riko…

— O que?

— Eu não quero que minha filha tenha uma vida terrível, por isso… não irei ficar atrás dela para que os deuses também não corram atrás dela!

— É um bom pensamento, mas não acha que ela vai se sentir sozinha sem você?

— Talvez… mas se ela descobrir o que eu já fiz nessa vida… talvez fique melhor sem mim.

— Não acho que seja uma boa forma de pensar.

— Não tem outra forma de pensar.

— … Só não… a deixe pensar que está sozinha nesse mundo. Quando alguém se sente assim, só lhe resta uma coisa.

— O que?

— Ir para o outro lado.

— Entendo…

O outro lado… algo conhecido como paraíso… falam que lá será o lugar onde você fica depois de morrer, e que dentro tudo que você imagina acontece, até mesmo para aqueles que só ferraram com a vida de todos, imagino se… talvez não fosse melhor só ir pra lá, e sonhar que tudo está bem.

— Mas… só os fracos vão para aquele lugar.

— Como assim, Solveig?

— As pessoas não podem lutar pelo o que querem, aqui terão que conquistar, lá… é só imaginar, pessoas que nunca tiveram a chance de conquistar algo só serão conhecidas como preguiçosas dentro do outro lado, mas alguém que já fez tudo isso, será um conquistador dentro desse lado, então… eu acho que é melhor morrer como um rei do que viver como ninguém.

— Sua lógica… é… estranha.

— Uma hora você vai entender, papo de mãe!

— …

— Bem, eu vou para a cidade onde você está vivendo.

— Tem certeza?

— Absoluta.

— Certo.

E foi assim que fui parar na cidade onde morei por praticamente minha vida toda, meu nascimento conturbado e todas as pessoas que vi por aqui me deixaram surpresa… mas o que ainda está para acontecer me deixa com medo… parece que minhas memórias não tem fim algum. Ainda quero navegar por todas e entender o que aconteceu nesse passado.

Mas por que isso? Simplesmente porque quero fazer a minha mãe um dia poder me ver e saber que por minha conta descobri tudo o que aconteceu, de certa forma ela queria algo assim… queria que eu vivesse por mim mesma, então irei tornar o sonho dela uma realidade.

Guiar os outros pode ser meio complicado, mas ainda sim irei fazer isso, irei guiar Hideki pela vida dele e também ajudá-lo a encontrar a verdade, da mesma forma que ele me ajudou. Essa história está muito longe de acabar, mas ainda sim está muito longe de um clímax, por isso… iremos seguir em frente.

O cenário todo muda pra um quarto infantil, lá estava minha mãe brincando comigo e tentando me ensinar a falar, havia uma pessoa com ela, mas não consegui ver quem era.

— Vamos… fale mamãe, fale!!!!

— Eu acho que não é assim que funciona…

— CALA A BOCA…

— Mas o que você quer que aconteça?...

— Ela vai falar, não importa o que…

— E se ela falar papai primeiro…

— Se isso acontecer… irei chorar…

Meu pai biológico… teoricamente é o Krig… então quem é essa pessoa que está com ela?

— Ah… pare de ser assim, vai, ela nem tem idade ainda para começar a falar.

— CLARO QUE JÁ TEM! Ela tem… 10 meses.

— …

— Qual foi… é meio ruim ter que cuidar de crianças… por que você não faz isso pra mim?

— Por que eu deveria?

— Você é a outra mãe?

— Ai viu… aceitei isso por conta de você não saber se cuidar, imaginar de uma criança.

— Tento o meu máximo!

— O seu máximo é ruim.

— Você é extremamente malvada…

A pessoa ia se retirando das sombras até aparecer por completo.

— O que você acha que vai acontecer, em?

— Acontecer? Como assim?

— Se ela saber que na verdade o pai dela é um deus terrível.

— Não sei… só sei que isso nunca vai acontecer, pelo menos… não tão cedo na verdade.

— Como você consegue se contradizer na mesma frase?

— Desculpa, tá? Só tenho olhos para a minha filha!

— Você…

— Eu?

— É uma idiota.

— Credo, me erra, viu?

Mamãe se levanta comigo nos braços e me joga pro alto como se estivesse brincando comigo.

— Então… como vai ser daqui pra frente? Se lembra que preciso cuidar do meu castelo.

— Calma, uma hora ou outra você vai fazer isso… Lola.

L… Lola?

“L-Lola apareceu e assim ela me tirou daquele inferno e assim começou a cuidar de mim. Ela me ensinou como eu poderia viver sozinha no mundo, seja lutando, aprendendo a ler, escrever, entre qualquer coisa que você ensina a uma criança… Nessa época eu conseguia ver o céu. Pela primeira vez na minha vida eu vi… o céu estrelado.”

Lola é a mãe adotiva de Yukiro, o que ela está fazendo aqui?

— Bem… cuidar de uma criança não é assim tão ruim… então vamos com calma, certo?

— Sim, sim! Mas não queira roubar a minha filha, se lembre… É MINHA FILHA, não sua.

— Ai, ai, por que eu iria fazer isso? Nem penso em ser mãe, só babá já está de bom tamanho.

A conversa das duas ia se estendendo até eu começar a chorar, por um segundo o coração de mamãe parecia ter parado e ela desesperadamente correu para me fazer parar de chorar, por um pouco… eu me sentia sendo acolhida pela pessoa que estava me segurando nos braços, era como se ela fosse presente… pelo menos nesse tempo que não lembro de nada.

Meus olhos se abriram, e com as pequenas mãos segurei o dedo indicador da mamãe…

Palavras aos poucos saíram da minha boca e chegaram nos ouvidos de todos que estavam presentes naquela sala.

— Ma… Mamãe…

— EU FALEI, CHUPA SUA OTARIA!

Mamãe tinha ficado extremamente feliz que pulou pra cima de Lola.

— Tá tá… você ganhou.

— HA!!!! EU SOU A MELHOR MÃE DE TODAS!

Por um momento, ver aquele lindo sorriso no rosto da mamãe… me deu um sentimento que não pude explicar, uma dor no peito. Sinto que nunca mais irei vê-la desse jeito.

Então… o cenário muda para a entrada de uma escola.

— Vamos colocá-la aqui!

— Ela terá que estudar… né? — pergunta Lola.

— Sim! COMEÇAREMOS A VIDA DE SHIORI EM… SHIORI, UMA VIDA ESCOLAR!

Ela fala isso de uma forma que parece uma série de TV…

 



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