Medo da Escuridão Brasileira

Autor(a): Marcos Wolff


Volume 8 – Arco 3

Capítulo 72: Destino.

Shiori



Se existia algo que não deveria ter feito, era seguir uma pessoa tão estranha. Ele deixou a porta aberta e logo entrei, a casa era bonita… porém, sempre havia um mas nessa história inteira, as paredes eram avermelhadas, mas não por conta da pintura, e sim… era sangue.

— Eu disse que você é uma arma, então deve me obedecer!

Aquele homem joga Hideki com tudo no sofá, o que faz ele acordar novamente. O olhar da criança era de assustado, parecia que tinha quebrado uma regra gigantesca.

— Eu te avisei… avisei que não deveria entrar na sala de aula ao mesmo tempo que as outras crianças.

— Eu sei… desculpa pai!

— E SE ALGUÉM TIVESSE VISTO SEU PODER, O QUE IRIA FAZER?

— …

— Não repita isso…

E quando o homem ia dar um soco na cara do Hideki, uma mulher aparece.

— RIKI, PARA!

— ME SOLTA, RIKO, EU PRECISO ENSINÁ-LO UM DEVER!

— PARA, NÃO É ASSIM QUE FUNCIONA AS COISAS!

— OLHE PRA MIM, CRIANÇA.

Hideki, assustado, olha pra cima.

— Você… é um erro.

O homem desiste de atacar a criança e olha pra trás, onde eu estava. Parecia que não conseguia me ver.

Assustada faço um pequeno barulho, que faz ele se atentar ao que estava à sua volta.

— QUEM ESTÁ AÍ?

Mamãe aparece, tampando minha boca e se demonstrando para o homem.

— Sou eu, Riki.

— Apareceu em um momento ruim, Solveig… me diga, o que te traz a minha casa.

— Estava andando por aí e decidi fazer uma visita.

— Entendi… você o conhece, certo?

— O Hideki? Sim.

Hideki se esconde atrás da minha mãe.

— O que é isso? — pergunta Riki.

Ele se aproximava da mamãe enquanto começava a rir lentamente.

— Ei, o que eu te disse… Hideki?

— Calma, Riki… isso não vai dar em nada. — disse mamãe.

Riki não queria saber, seus sentimentos estavam à flor da pele, o que ele mais queria fazer era bater em Hideki com tudo.

— Embora tudo isso esteja acontecendo por minha causa… ainda sim… posso te culpar por tudo o que aconteceu, Hideki. — disse Riki.

Ele tenta dar um soco no Hideki, ignorando totalmente que minha mãe estava na frente, mas ela defende… segurando o punho do Riki com a sua mão esquerda.

— Não é certo um pai bater no próprio filho.

— Quem é você para se meter nos assuntos de família?

— Ninguém, mas não é certo você bater nele.

— Por que? Vai me falar que é só uma criança? Solveig, ele ainda sim é uma arma!

— Não.

Mamãe ficou com raiva e deu um soco com tudo na cara de Riki, isso o fez voar até a parede e quebrá-la.

— Não me importa o que ele é, poderia ser até mesmo uma lesma, mas um pai não pode bater no próprio filho.

— Você… tem noção do que acabou de fazer?

Riki olhou atentamente a mamãe, que demonstrava um olhar de desprezo.

— Ei… não me olhe assim… ei…

— Escute, Riki… escute a Solveig. — disse Riko.

— Você é só uma esposa falsa… NÃO PODE ME DIZER O QUE DEVO FAZER, VOCÊ NEM AO MENOS CHEGA PERTO DO QUE A PRÓPRIA RIKO FEZ, CALA A BOCA… CALA A BOCA… CALA A BOCA, CALA A BOCA, CALA A BOCA, CALA A BOCA, CALA A BOCA, CALA A BOCA, CALA A BOCA, CALA A BOCA, CALA A BOCA, CALA A BOCA, CALA A BOCA, CALA A BOCA, CALA A BOCA…

E assim repetiu essas palavras até se cansar.

— Você não tem outra opção… se não me obedecer, Hideki. Pois você sabe que a culpa é sua… o que aconteceu com a verdadeira Riko… é sua culpa.

O garoto logo arregalou os olhos, botou a mão nos ouvidos e começou a lacrimejar. Um sentimento forte bate em todos que estão na volta dele.

— Para… é mentira!

— Claro que não é, quem foi a pessoa que a destruiu? Vamos, você se lembra… não é?

— PARA!

Uma onda ecoa pela casa, fazendo todos os móveis voarem.

— VOCÊ NÃO ENTENDE… AQUILO… AQUILO NÃO FOI MINHA CULPA!

Mamãe estava incrédula com o que estava vendo. Ela não fazia nada até ver o Hideki começar a chorar.

— Riki… Cala a boca!

— Fique quieta você, isso é uma luta de família, alguém de fora não deve se meter.

Riki se levanta e anda até a mamãe, ela não reage pois não parecia uma ameaça. Não sabíamos que na verdade a pessoa que estava na nossa frente… era o deus da criação. 

Rapidamente ele cria uma espada e finca no estômago da minha mãe, e a joga para longe como se fosse nada. Em desespero imediato me levanto, gritando o nome daquela que me colocou no mundo.

— Ah, então realmente tinha alguém aqui…

— Não ouse… NÃO OUSE TOCAR UM DEDO NA MINHA FILHA!

— E o que você vai fazer, em? 

Enquanto Riki se aproximava de mim, Hideki se agarra no braço dele.

— PAI, PARA… POR FAVOR!

Os olhos de Riki mudaram de cor conforme o sentimento dele… com isso ele joga Hideki com tudo no chão e o olha como se fosse lixo, com seus olhos extremamente vermelhos… ele diz:

— Não ouse me chamar de pai, seu lixo.

Antes que pudesse fazer mais alguma coisa, uma voz familiar ecoou pelo lugar, dando a impressão de que tudo estava bem.

— PARA TRÁS!

Um galho voa em direção de Riki, que rapidamente se esquiva.

— Quem mais está tentando entrar em uma briga de família…

Atrás de mim surge… Riko, a deusa de todas as plantas. Quando ele percebe a pessoa que estava na sua frente… Riki paralisou. Seus olhos ficaram escuros, ele tremia um pouco…

— Não acredito que esteja fazendo isso… de novo.

Ao estalar a língua, Riki desvia o olhar como se estivesse envergonhado, com essa abertura, mamãe corre e me segura nos braços, saindo daquela casa e deixando tudo com aquela pessoa que tinha acabado de chegar.

Para uma criança, observar tudo o que estava acontecendo naquela casa era como uma tortura mental, um amigo meu estava sofrendo e não pude fazer nada. Não, não era isso o que estava acontecendo na minha mente, o sangue, o barulho de batidas, os gritos… tudo estava acompanhado de medo, um sentimento que até então pra mim… não tinha cor, não tinha… nome.

Com medo do que poderia acontecer com a sua filha, mamãe me levou para um lugar estranho, dentro de um castelo… nos andares subterrâneos. E de frente com um livro… mamãe orou.

Pediu por uma deusa que não era boa, pediu por alguém que iria ferrar com a vida dela, aquilo era só o início de tudo isso. A deusa em questão era a Nina, uma pessoa que para muitos poderia ser desconhecida, pois naquela época, Nina não possuía uma persona, fisicamente ela não existia, apenas vivia dentro de um livro.

— Em que posso lhe ajudar… minha humilde deusa do sol.

— Eu quero… que apague algumas memórias da mente da minha filha.

Um contrato foi assinado naquele momento, memórias referentes ao Hideki seriam apagadas, pois o garoto desde o seu nascimento era o deus da destruição, em troca disso, mamãe aos poucos perderia anos de vida, e morreria da forma mais intensa de todas, na frente daquela que mais ama.

Ela aceitou, pois mamãe queria passar por cima de tudo isso e sair como vitoriosa, ela queria fazer a minha vida ser uma paraíso e que nunca mais precisasse chorar, pois pra ela… esse sentimento intenso é impossível de escapar.

Minhas memórias sobre tudo o que aconteceu… foram apagadas, apenas sobrando algumas que são inúteis, daquele dia em diante nunca mais vi o Hideki na sala de aula, como se tivesse mudado de escola… O que tinha acontecido de verdade, era que Hideki não mudou de escola, apenas estava se afastando de mim, ele não queria que algo de ruim acontecesse comigo, pois no próximo dia ele conversou com a mamãe, e é isso o que vejo agora.

— Você… é o Hideki, certo?

— Sim…

— Provavelmente você sabe quem eu sou.

— A deusa do sol…

Hideki evitava olhar pra mamãe, provavelmente por conta do medo. Ela estava com um rosto assustador, como se fosse matar esse garoto a qualquer momento. No final das contas, mamãe respira fundo e diz:

— Olha… se afasta da Shiori, por favor. No primeiro dia ela já descobriu quem você é e o pior de tudo… ela conheceu o Riki. Shiori pode ser uma criança inocente e que não causa mal às pessoas, mas ao explorar o desconhecido, ela não para até se arrepender profundamente.

— Desculpa…

— Só me promete que nunca mais vai se aproximar dela, assim… tudo ficará bem.

Hideki abaixa a cabeça.

— Ei, garoto… olhe pra mim.

Mamãe desiste e vira as costas pro Hideki que simplesmente começa a chorar aos poucos, ela não se importa com o que estava acontecendo, então deixa tudo do jeito que está. O tempo passava e eu me enturmei com os outros alunos, na escola era conhecida como estrelinha, um apelido que foi carinhosamente dado por uma professora.

Nunca mais vi o Hideki naquela época, mas vendo todas essas memórias, percebi que ele estava se afastando o máximo que podia. Assim como muitas pessoas, ele tinha medo da mamãe, pois sabia o que ela poderia fazer caso pisasse na bola.

Os anos se passaram e terminei o ensino fundamental I, mamãe estava super orgulhosa comigo, era como se tudo o que ela quisesse estivesse sendo realizado, nas férias fizemos muitas coisas juntas, até mamãe me fazer se esquecer do fato dela ser uma deusa… da mesma forma que me fez esquecer do Hideki.

Em uma conversa que ela teve com a Lola, mamãe disse:

— Eu irei ter mais cuidado a partir de agora, não é certo falar pra Shiori essas coisas, ainda preciso ter noção do que irei fazer. 

— Entendo que você foi uma pessoa muito imatura ao dizer a sua criança que você é uma deusa.

— Eu sei, mas… não há o que fazer agora, só posso apagar as memórias dela e começar tudo de novo.

— Fazer isso já é demais, apenas peça pra Nina apagar as coisas relacionadas ao fato de você ser uma deusa.

— É, tem razão, assim poderei viver como uma pessoa normal.

— Mas… depois disso você tem que me prometer que nunca mais vai mexer nas memórias da sua filha.

— Por que?

— Memórias não são brinquedos para outras pessoas, talvez para a Nina, mas pra você… as memórias da sua filha são mais que joias, como se fosse a coisa mais importante do mundo, então por favor… tenha cuidado, imagine se chega um momento onde ela tenta procurar a verdade por trás da própria vida.

— Ela não vai precisar procurar a verdade…

— Solveig, as pessoas são curiosas sobre elas mesmas, se alguém que sabe do passado dela se manifestar, é certeza que ela vai procurar o que aconteceu. Quem sabe… ela até mesmo pode ver essas memórias… 

— Você… tem razão…

— Mais uma coisa, você não pode privar as amizades dela, mesmo se for com o Hideki.

Mamãe se espanta.

— COMO VOCÊ SABE?

— Estava te seguindo.

Stalker.

— …

— Aquele garoto só faz a vida dela ser pior…

— Eles passaram literalmente um dia juntos, você não sabe se podem ser melhores amigos, a deixe fazer suas amizades… não tem problema.

— Ah… tá bom, você ganhou.

— Ótimo, agora… vamos descansar. 

A promessa estava feita, mamãe nunca mais iria mexer nas minhas memórias, e ainda me deixaria viver uma vida tranquila. Os dias seguintes foram incríveis, visitamos lugares que nunca mais iria ver na vida, uma praia… cidades incríveis, um mundo perfeito…

Mas novamente no primeiro dia de aula do fundamental II…

Eu o conheci.

Estudávamos na mesma escola de sempre, e no mesmo lugar, na mesma hora, no mesmo dia, porém em um ano diferente… nos conhecemos da mesma forma. em um intervalo vejo aquele garoto sentado no tronco daquela árvore gigante. Ele observava intensamente a linda vista da cidade… mas em pouco tempo me percebeu.

— Oh, você é a… Shiori, certo?

— Ah, sim… quem é você?...

— Meu nome é Hideki Hirai.

Estava tão fixada nele que nem observava o lugar à nossa volta.

— O que traz uma garota a esse lugar extremamente chato?

— Eu… quero ser sua amiga.

Porém, tudo isso era diferente aqui. Hideki estava triste, e extremamente conturbado com tudo o que aconteceu… porém daqui em diante… tudo iria mudar.



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