Apocalipse de Yohane Brasileira

Autor(a): Henrique Ferreira


A1 – Vol.2

Capítulo 41: Labirinto de traumas

Elas entraram no local, que emitia uma forte luz rosa da entrada. Forte o suficiente para fazer seus olhos se fecharem por instinto. Quando os abriram novamente, encontraram-se no escuro. Yohane formou chamas ao redor de seu antebraço, fazendo todo o local se iluminar. Não conseguiam identificar onde estavam, a saída tinha desaparecido. A única coisa que sabiam era que estavam em uma encruzilhada. Dois caminhos para seguir, sem nenhuma dica de qual seria o certo.

Magda… — Uma voz feminina macabra foi ouvida pelas duas, vinda de todos os cantos. — Arne não disse para você vir sozinha?

— Olha, se você realmente acreditou que eu ia me jogar de cabeça na sua armadilha sem trazer reforços, eu superestimei sua inteligência.

É claro que esperava isso. Você é muitas coisas, mas idiota não é uma delas. Mas está tudo bem, não é como se eu fosse deixar vocês permanecerem juntas, de qualquer maneira.

— Como é que é?

Yohane perguntou, mas não precisou ser respondida. A resposta veio em direção a elas, rápida e agressiva, na forma de duas enormes mãos negras, com dedos alongados e unhas afiadas, vindas de ambos os caminhos. As mãos agarraram as mulheres pelo torso, separando-as. Magda foi levada para o caminho escuro da esquerda, desaparecendo nas sombras; enquanto isso, Jô foi levada na direção contrária, com seu braço iluminava todo o caminho.

— Me larga, sua mão nojenta! — Ela socava e socava o polegar da mão que a segurava, furiosamente gritando para que a soltasse.

As chamas da ruiva começaram a queimar a sombra, fazendo-a se dissipar. Em alguns segundos, ela desapareceu em fumaça… mas não fez a garota parar. Era estranho, ela foi agarrada no chão por uma mão mágica e, naquele momento, estava em queda livre por um poço vasto e sem fim. Ou melhor, quase sem fim, pois, como uma luz no fim do túnel, Yohane viu um feixe alaranjado fraco, aumentando seu brilho conforme se aproximava.

— Merda, merda, merda…! Ok, fiz isso em Londres, posso fazer de novo. — Ela respirou fundo e se concentrou, abrindo as mãos e apontando as palmas para baixo. O calor percorreu todos seus vasos sanguíneos, mas tentou contê-lo dentro do corpo até o limite. — Não surta, Jô, você consegue! Tem que ser na hora certa! — Ela segurou, segurou e segurou. Segurou aquele calor até sentir seu sangue borbulhar de tão quente. E então, quando faltavam menos de uma dezena de metros para ela se espatifar no chão… — Agora! — Duas explosões foram liberadas de suas mãos, lançando-a pra cima e desacelerando sua queda. A falta de equilíbrio a fez ser jogada na parede. Ela desceu rolando até bater a lombar no concreto.

— Isso… vai doer amanhã…

Com esforço, levantou-se e notou que sua queda havia acontecido através de um corredor que, naquele momento, sua percepção o via como solo. Ela estava pisando sobre a parede na qual caiu rolando anteriormente, o que fez a jovem arregalar os olhos, atônita.

— Uau, tenho que admitir... isso foi mais excitante do que roubar cerveja do Lenny com a Ruby. — Se lembrou de um momento de sua pré-adolescência, de sua antiga paixão e, consequentemente, de algo mais doloroso que aconteceu na infância. Respirou fundo e tentou limpar a mente. — Tenho que encontrar a Magda, mas nossa… é tudo tão real… — Passou a mão nos tijolos de concreto perto da tocha presa na parede. — Será mesmo uma ilusão?

Lançar o poder de dois quilos de dinamite pelos poros das mãos também parecia ilusão pra mim até agora. No entanto, aqui está você, Yohane Catherine Pride, a escolhida pela Fênix. Juro, não sei dizer se sinto inveja ou pena de você.

Jô ficou em guarda, acendendo seus punhos com chamas.

— Como você sabe meu nome? Até poucas horas atrás a gente nem sabia da existência uma da outra — dizia, olhando para todas as direções enquanto caminhava para frente, por um caminho que ia sendo revelado pelas tochas que eram acesas magicamente conforme a garota caminhava.

Tem razão. Eu não sabia sobre você e, mesmo agora, não me importo. Mas minha… parceira parece ter um estranho interesse em você e no Adam.

— Parceira… Carol? Ela tá com você nisso?!

Hm… Você a conhece por outro nome? Então vocês de fato têm um passado. E você ainda parece se importar com ela, mesmo ela tendo sido responsável por toda aquela bagunça em Nova York.

— É, sabe como é. Irmãs amam se odiar, odeiam se amar. Essas coisas.

Não, não sei como é a sensação. Tudo que sinto por minha irmã é ódio profundo. Uma coisa que não me deixa dormir à noite, que me obriga a fazer coisas ruins…

— Ah, já tentou conversar com ela? Quer dizer, as vezes vocês só precisam tomar sorvete juntas e falar mal do seus pais pelas costas... — Yohane franziu a testa, baixando a guarda. — Espera aí, por que a gente tá falando da sua família? Cadê a Magda?

Ah, não se preocupe, eu vou cuidar dela pessoalmente, só queria tentar entender por que você é tão especial para a Dawn. Talvez só seja o ponto fraco dela. Bem, ela me deixou fazer qualquer coisa contanto que eu não machucasse você e o Adam, então, enquanto eu mato a sua amiga bem devagar, aproveite o filme.

— Espera! — Yohane piscou e, quando se deu conta, não estava mais no labirinto. Ela sequer ainda estava em Faroe. Seus olhos se fecharam por um milissegundo e, quando se abriram novamente, a ruiva se viu em um lugar familiar, que trazia uma sensação quente e saudosa ao peito. — O quê? Como eu voltei pra cá?

Ela estava em um bar, vendo uma versão mais nova de si mesma sentada na mesa com outras duas meninas. Uma música country tocava em som baixo na jukebox, e um homem de terno conversava com Emília no balcão.

— Cat…? Cat! Tá me ouvindo? — falou uma das garotas, com a sobrancelha erguida, tentando chamar a atenção da pequena Yohane em devaneio. Ela tinha um cabelo curto loiro, e seus olhos tinha um tom carmim, quase avermelhado.

— Tô ouvindo, Ruby. Quem é aquele cara boa pinta com quem minha mãe tá conversando?

— Talvez seja o namorado secreto dela — disse a segunda garota, que tinha olhos verdes e um cabelo preto preso em rabo de cavalo.

— Nem brinca com isso, Ashley! Minha mãe só vai namorar alguém que eu ache que mereça ela. — Catherine encarava os dois de longe, com olhos afiados para o homem e contraindo os lábios em um beicinho.

— Espera… — Yohane pensou alto, mas ninguém parecia poder vê-la ali. — Eu lembro disso… março de 2009. Foi quando minha mãe conheceu o Ricardo.

— Cat, foca! Você pode pensar no namoro da sua mãe depois, a gente tem que decidir a música que vamos tocar na festa. E você ainda tem que treinar, porque as finais do torneio de queimada vão ser semana que vem. Você não quer perder pra Nancy Willis, né?

— Nem a Ashley perderia pra Nancy, ela é péssima em tudo que faz.

— Mas ela é ótima em fazer bullying com você. E se deixar ela mexer com sua cabeça na hora do jogo, você vai perder.

— Merda, o jogo de queimada…— Yohane se lembrou do dia em que sua vida mudou. Ela foi em desespero até sua versão mais nova. — Por favor, Yohane, você tem que cancelar o jogo. Acredita em mim, é o melhor pra todos... — Mas quando tentou tocar no ombro, sua mão atravessou como se fosse feita de fumaça. Era apenas uma memória, não tinha como interferir ou mudar o passado.

 — Pode ficar tranquila, Ruby. A gente vai arrasar na festa da sua mãe, e eu vou detonar a Nancy semana que vem. Agora, eu tenho que ver o que aquele cara pretende com minha mãe. — Catherine se levantou e foi em direção de sua mãe, com o peito estufado. Sua versão mais velha que estava apenas observando tudo, correu para tentar interferir novamente, mas quando piscou seus olhos, todo o ambiente mudou outra vez.

Ela continuou no bar, porém, mais pessoas estavam ali, comemorando. Emília continuava com Ricardo, em outro local do bar, enquanto no palco, onde eram feitas apresentações amadoras, estavam as três meninas, com instrumentos musicais feitos para crianças. Catherine estava na guitarra; Ruby estava na bateria; Ashley nos vocais.

— A festa da mãe da Ruby... foi nossa primeira apresentação com o bar cheio. — Yohane olhou para sua versão mais nova e suas antigas amigas com um sentimento nostálgico. Aquela era a última boa memória que tinha feito em Amarillo.

O que você está tentando fazer, Yohane? — Pôde ouvir sua própria voz vindo de todas as direções.

— Quem disse isso? É outro truque da bruxa? — Ficou em guarda novamente.

Por que está a deixando controlar você dessa forma? — disse a voz. — Você sabe que nada disso é real, é só um reflexo da sua mente. Então por que ainda está aqui dentro, e não procurando a Magda?

Yohane franziu a testa e pensou um pouco. Prestando atenção que a voz que ouviu era idêntica à sua, ligou os pontos e deduziu a quem se tratava.

— Se você tiver uma ideia de como sair daqui, sou toda ouvidos — disse a ruiva, deixando a voz em silêncio. — Pois é… é você, né? A Fênix que me possuiu.

Uma pequena chama em forma de falcão surgiu, batendo asas ao lado de Jô.

— Ficou tão óbvio assim? — disse a chama.

— Bem, era isso ou eu finalmente tinha enlouquecido de vez.

— Hm… que estranho…

— O quê?

— Não, é que estou acostumada a ver humanos se ajoelharem na minha presença, sem ao menos olharem pra mim, por medo. Mas você parece estar calma e confortável comigo ao seu lado.

— Ah, não deixe meu sorriso falso enganar você, eu tô apavorada! Ter uma divindade flamejante dentro do meu corpo não é exatamente o que eu pretendia fazer nas minhas férias. Mas não tem muito o que eu possa fazer, não é? Você deve ter me escolhido por alguma razão, não vou questionar isso.

— Sobre isso… não tenho a intenção de ofender você, mas eu nunca possuiria ou escolheria um humano por vontade própria. Eu acho toda essa situação desconfortável e humilhante.

Yohane arregalou os olhos e virou subitamente o rosto, encarando o falcão de fogo com a testa franzida.

— Como é que é?

— Sabe, na Era de Ouro dos Deuses, eu também fui adorada como divindade. Os humanos enviavam orações para mim, pedindo para que os protegessem dos frios gélidos do inverno e para que poupasse suas cidades e famílias. China, Grécia, Egito, todos me temiam e me respeitavam. Claro que fiz inimigos, mas todos que se impuseram contra mim sentiram minha fúria. E também, não havia muito o que podiam fazer contra um ser imortal. — A ave pousou no ombro da ruiva e suspirou. — Mas houve um dia que alguém conseguiu me matar... de verdade. Não sei quem, não sei como. Foi feito algo naquele vulcão que impediu minha ressurreição por quase três séculos. Quando despertei e voei aos céus, me senti diferente, presa. Como se houvesse uma coleira presa em meu pescoço. Então olhei para o solo e vi você, minha... Mestra. Isso foi há poucas horas e, como disse, não estou acostumada a ficar tão perto de um humano que é hierarquicamente superior a mim.

— Eu não sou superior a ninguém, mas você vai ter que aprender a lidar com humanos. Que passarinho arrogante, meu Deus… Mas eu ainda não entendi uma coisa.

— O quê?

— Como é possível você ter despertado há algumas horas, e eu ter o seu poder há tanto tempo? Quer dizer, eu usei suas chamas pela primeira vez meses atrás. E desde pequena eu tenho essa… resistência a calor.

— Curioso… é possível que eu tenha renascido dentro de você há alguns anos, mas como sua mente ainda não era madura o suficiente, minha consciência não tinha espaço para… acordar. Creio que quando você finalmente aceitou esse poder e compreendeu que esse mundo é diferente, eu finalmente tive a chance.

— Então o incidente na lanchonete, ou a luta com Constantim… Você não estava me controlando?

— Não sei o que houve, Yohane. Mas independentemente do que tenha acontecido, posso te garantir que, pela primeira vez em muito tempo, minhas mãos estão limpas.

— Entendo…

Yohane finalmente aceitou. Tudo que aconteceu desde a festa de formatura foi responsabilidade dela. Ainda tinha esperanças de que, talvez, algo tivesse influenciado suas ações e assim a culpa poderia ser menor. Seus olhos caíram e ficaram marejados, as bochechas rosadas esquentaram e ela sentiu vontade de chorar. Mas não era hora para isso. Naquele momento, tinha outras prioridades.

— Certo… — Limpou o canto dos olhos e se concentrou. — Como sairemos daqui?

A ave de fogo ficou surpresa com a maturidade da garota. Estava esperando ter que conter um surto de choro, mas não foi isso que aconteceu. Então, em respeito àquilo, ela também tentou se concentrar na questão à sua frente.

— Posso estar enganada, mas isso é muito semelhante a um labirinto mental que alguns bruxos gregos usavam para tortura. Os traumas das vítimas eram utilizados como arma, e o único jeito de sair era confrontar e superar aquilo. Mas isso nunca aconteceu, a maioria tinha morte cerebral com o estresse que aquele lugar causava. Então, Yohane, em que trauma estamos?

Yohane olhou para sua versão mais nova no palco, cantando junto de suas antigas amigas. Uma memória calorosa e nostálgica, mas a última agradável que fez em Amarillo.

— Ainda não chegamos nele.

Apoie a Novel Mania

Chega de anúncios irritantes, agora a Novel Mania será mantida exclusivamente pelos leitores, ou seja, sem anúncios ou assinaturas pagas. Para continuarmos online e sem interrupções, precisamos do seu apoio! Sua contribuição nos ajuda a manter a qualidade e incentivar a equipe a continuar trazendos mais conteúdos.

Novas traduções

Novels originais

Experiência sem anúncios

Doar agora