O Mestre da Masmorra Brasileira

Autor(a): Eduardo Goétia


Volume 1 – Arco 1

Capítulo 11: Os Planos de Gleen

No dia seguinte, acordei cedo outra vez. O meu corpo estava exalando energia e vivacidade. Eu dormia no trono de madeira, então não era o melhor dos lugares.

Ele era desconfortável, mas serviria até que eu arranjasse algo um pouco melhor.

Tirando isso da cabeça, comecei minhas tarefas diárias. Desci ao primeiro andar e recebi os relatórios de Gleen.

Aparentemente, um goblin foi ferido, mas eles já estavam tratando-o. Nada de ruim aconteceu com as goblins grávidas. Os coelhos chifrudos continuavam sendo a única ameaça.

— Creio que seja só isso, mestre. — Gleen concluiu o seu relatório e voltou as suas próprias tarefas.

Sem muito o que fazer, retornei para a sala do núcleo e continuei o meu intenso treinamento. As horas foram passando, até que uma mensagem ressoou:

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[Habilidade: Maestria com Lança] Adquirida

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Abri um sorriso e quase saltei satisfeito. Ter o seu esforço recompensado era algo muito bom.

Em seguida, peguei o pedaço de madeira e voltei a balançar. A habilidade ainda era de nível baixa, mas eu notava uma diferença substancial.

O meu aperto estava mais firme, minhas mãos se moviam para a posição correta, os ataques estavam mais rápidos e precisos, além de que os meus braços não tremiam tanto.

Claramente eu não era um mestre, mas pelo menos não era mais apenas um idiota balançando um graveto. Agora eu era um idiota com maestria.

 Continuei treinando por um tempo. Quando cansava de treinar, tomava banho, andava pela masmorra e observava os pontos subirem pouco a pouco.

Essa rotina continuou por 7 dias.

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Masmorra

Nome: Nenhum | Tipo: Torre

Raridade: Único | Grau: 1

Servos: 11

Andares: 2 | Andares Subsidiários: 0

Pontos: 6510

Requisito para próximo Grau: 1000 Pontos | Monstro Incomum | Monstro de Grau: 2

[Bônus]

Monstros Dominados e Domados tem um chance de receber a habilidade Mente Calma

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Os pontos acumularam uma quantia relevante e, enquanto observava isso, preparando-me para olhar a minha tela de habilidades, uma outra mensagem ressoou.

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[Invasão em andamento]

[Acesso a tela de status] bloqueada

[Primeiro Andar: Sem nome] Invadido

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Apressadamente olhei para a tela à frente. Havia a possibilidade de ser apenas um invasor comum, mas também tinha chance de ser o campeão.

E, como se para atender minhas expectativas, lá estava ele. Passava entre as árvores com brutalidade, derrubando tudo pelo caminho apenas com a palma das mãos.

O corpo dele era extremamente musculoso. Os braços eram grossos e o tamanho era assustador. O rosto inconfundível de um goblin resplandecia em sua cabeça.

Atrás do Campeão, uma comitiva com cerca de trinta goblins seguiam logo atrás. Na liderança, o antigo invasor guiando a todos.

Vendo isso, sentei no trono de madeira. Trouxe o núcleo e deixei bem próximo, caso uma emergência ocorresse.

— Lobo, avise o Gleen.

O lobo acenou com a cabeça e saiu em direção ao primeiro andar. A grande criatura se aproximava.

E agora Gleen... Como você lidará com isso?

Um sorriso brotou no canto do meu rosto. Aquele sentimento de êxtase me consumiu. Meus olhos se prenderam na tela e eu comecei a assistir tudo.

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Gleen recebeu a mensagem e acenou com a cabeça. Ele correu até o centro da clareira e chamou todos os goblins que podiam lutar.

Ele se preparou todo esse tempo para provar que poderia fazer isso. Ele era capaz de se provar ao seu mestre.

Assim, com tudo certo, partiram mata adentro, desaparecendo no terreno.

O gigantesco campeão se aproximava sem temer. De repente, um monte de terra caiu sobre a sua cabeça e, irritado, olhou para cima.

Um pequeno coelho chifrudo olhava-o e parecia rir da sua aparência miserável.

Enfurecido, ele chocou o seu corpo contra a árvore, jogando-a ao chão. Contudo o pequeno pulou de uma para outra, escapando do ataque.

Em seguida, ele jogou mais um punhado de terra na cabeça do monstro.

O campeão então passou a perseguir o pequeno com os demais goblins seguindo logo atrás. Aquele primeiro invasor, entretanto, começou a sentir que havia algo de estranho.

Passando pela mata como um verdadeiro Juggernaut destruidor, ele perseguia, incansável, o pequeno coelhinho travesso.

A distância entre ele e os demais goblins aumentava a cada árvore derrubada. Até que, em um momento de fúria, ele derrubou uma outra árvore no caminho dos seus servos e os abandonou.

O primeiro invasor e os demais goblins perderam o seu chefe de vista. Eles tentaram passar pelas árvores, mas de repente, uma flecha voou na cabeça de um deles.

O sangue vazou e o corpo ainda quente bateu na terra.

Um grunhido ressoou do goblin invasor que assumira o comando dos demais. Ele organizou todos em um grande círculo e os mandou observar todos os lados.

— Ele é esperto — sussurrou Glenn no meio das altas árvores. — Deixe aquele vivo. Ele vai ser um bom servo para o mestre Kayn.

O goblin com um arco que estava ao lado dele acenou e atirou outra flecha.

A seta voou em linha reta, mas desta vez errou o alvo, a cabeça, acertando a coxa de outro goblin. Este que caiu no chão gritando de dor.

A multidão então tornou-se ruidosa. Temiam por suas vidas. Não eram soldados treinados, então qualquer coisa abalava a sua moral.

O invasor sabia disso, portanto nem tentou suprimir os demais. Ele viu de onde a flecha veio e concentrou-se apenas naquilo.

Ele olhava diretamente nos olhos de Gleen, mesmo sem conseguir enxergar a mata escura.

— Não atire outra agora. Vá para o outro lado e quando eu der o sinal, atire.

— S-sim... — O verdinho de arco se levantou e andou calmamente para outro lugar.

Gleen então levantou o braço. Acenava para outro grupo abaixo. Este constituído de três goblins que tinham lanças.

Com um gesto da mão, o grupo se dividiu em três e foram para lugares diferentes e, com mais um gesto para baixo, eles atacaram.

O lugar era rodeado de árvores e moitas, então, quando um goblin deu-lhes as costas, um ferimento profundo da lança de madeira atravessou pescoço, ombro e peito respectivamente.

Logo em seguida, as lanças foram puxadas e os goblins fugiram da posição em que estavam.

Aquele que recebeu o golpe no pescoço, caiu no chão morto. Aquele que recebeu no ombro, gritou de dor e fugiu do círculo para a mata. Aquele que recebeu no peito, caiu no chão, agonizando.

Gleen era ardiloso e usava da sua posição para controlar o combate na palma da sua mão. Ele já havia há muito definido uma estratégia para lidar com os números superiores.

Para um combate — uma guerra — várias coisas eram importantes. Um número imensurável de coisas. Quaisquer variáveis poderiam mudar o resultado da luta.

Acima de tudo, um general —  o líder — precisava saber o que estava fazendo. Um bom general conhecia o seu inimigo como a si próprio, ou até mais que isso.

Ele separou o líder dos demais, obrigou-os a entrar em posição defensiva e quebrou — destruiu por completo — a moral deles.

O talento de Gleen era demonstrado de verdade.

Percebendo que não duraria muito mais, acenou com o braço outra vez. Com esse gesto, outra flecha voou de uma posição completamente diferente da anterior.

Junto dela, outro inimigo caiu no chão. Alarmados, os goblins enlouqueceram. Em seguida, outro aceno. De repente, as lanças passaram pela mata e mais três caíram.

Neste momento, um terço dos inimigos morreu, outro terço fugiu e os restantes eram basicamente criancinhas frágeis, assustados.

Com um último aceno, a curta luta se encerrou. Da mata, Gleen surgiu. Aproximou-se a passos lentos do centro. Encarou o rosto dos restantes e declarou:

— Lhes darei uma chance. Ajoelhem-se e se rendam, então vivem ou... — Erguendo a mão, outra seta voou por cima da sua cabeça a bateu próximo ao pé do primeiro invasor.

A mensagem foi enviada. Sem opções, o pequeno invasor aceitou a sua situação. Sendo mais esperto que os demais, sabia que não havia outro jeito.

Ele soltou a arma que tinha na mão. Caiu então de joelhos no chão e abaixou a cabeça, orando por misericórdia.

Os demais seguiram o mesmo caminho.

— Prendam eles até que tudo termine — disse olhando para as árvores destruídas. — Agora, preciso lidar com aquilo.

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Observei tudo. A frieza, liderança e perspicácia daquele Hobgoblin me assustavam. Ele normalmente era todo serelepe, mas realmente não se devia julgar um livro pela capa.

Ao menos ele está do meu lado.

Pensando desta forma, continuei assistindo tudo.

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O campeão continuava a perseguir, incansavelmente, o pequeno coelho. Este que pulava de árvore em árvore com um esforço enorme.

Sabia que, caso parasse por um instante, morreria em um único ataque. A cada pulo, o som da madeira quebrando batia-lhe aos ouvidos.

Pensava que aquele som logo poderia vir dos seus próprios ossos. Isto lhe dava energia para continuar em frente, mesmo sofrendo de um cansaço destruidor.

O poderoso Juggernaut não daria trégua.

De súbito, uma flecha voou. Passou raspando por entre o pelo branco do coelho e acertou em cheio o peito do monstro.

Perfurou a carne, mas não fundo o bastante. Ele puxou a ponta sangrenta e quebrou a seta em pedaços pequenos de madeira. Então, continuou, ainda mais enfurecido, a perseguição.

Bateu contra outra árvore e, outra vez, uma dor crepitante e ardente. Uma outra flecha pousava em sua coxa.

Ele também a arrancou, mas desta vez não voltou a correr. Gritou para à mata; sabia que alguém o alvejava.

Gleen acenou com a mão para cima e o goblin com arco parou.

— Mude de posição. Se atirar, ele saberá nossa localização. E, diferente daqueles, ele vai atacar sem pensar.

O pequeno com arco acenou com a cabeça e se misturou as moitas que estavam próximas. O Juggernaut parou a sua perseguição e ficou olhando.

Passaram-se alguns segundos, mas nada ocorria. Porém o coelho continuava a provocar-lhe cada vez mais. Ele, entretanto, mantinha-se observando.

— Aguarde. Ele não vai aguentar... vamos, posso ficar aqui o dia inteiro — sussurrava o hobgoblin no meio das árvores.

Minutos passaram até que o coelho jogou mais um amontoado de terra na cabeça do campeão. Emputecido, correu atrás do pequeno animal branco.

Quando se virou, porém, Gleen acenou com a mão. Outra flecha voou de uma posição completamente diferente.

Recebendo o ataque no ombro, gritou de dor e correu na direção de onde veio. O pequeno arqueiro há muito havia fugido.

Contudo, antes que pudesse dizimar aqueles pedaços de madeira e tudo que estivesse ali, três ataques lhe foram dados por lanças de madeira.

Um no peito, bem onde antes foi ferido, um na perna e o outro raspou-lhe um dos braços. E, na mesma hora que surgiram, desapareceram.

Gleen sorriu em cima da árvore. A satisfação de brincar com a sua presa parecia a de um felino caçando. Sádico? Cruel? Palavras poderiam mesmo descrever aquele sentimento?

Talvez fosse de sua natureza, talvez também influência das ações da figura de maior familiaridade que tinha. O homem que friamente puniu aqueles que lhe foram contra, mas que também, incansavelmente, buscou salvar um servo.

Em mente, o seu mestre não era um alguém a quem ele simplesmente servia. Um deus, talvez? O seu criador. Isto repercutiu na persona que ele mostrava ao mundo.

Comumente, alguém sadio; serelepe nas palavras de Kayn. Em batalha, no entanto... alguém que nem o mais forte general daria as costas!

Retornando ao campeão. Ele começava a suar bastante. O enorme corpo tardava a executar a tarefa mais frívola, respirar.

A raiva havia há muito passado. Agora, temia pelo que poderia vir. Não importava mais o coelho. O pequeno continuava tentando irritá-lo, mas sabia que se tratava de uma questão de vida ou morte.

O seu instinto não permitia distrações, portanto ignorava-o. Continuava centrado naqueles ocultos.

Gleen não previu aquela calmaria, mas ainda estava dentro dos planos. Na verdade, facilitaria muito. A grande criatura continuou sangrando e sangrando.

Quando mais uma hora passou, uma poça vermelha já jazia abaixo do Juggernaut. Neste momento, Gleen agiu.

Saiu por detrás de uma árvore e se apresentou de mãos vazias ao campeão, que não mais parecia ameaçador.

— Você se nega a perder. Seria muito útil ao mestre, mas ele disse que você é mais precioso morto. Nunca iria contrariar as suas ordens, porém saiba que ganhou meu respeito.

Em suas últimas forças, o goblin atacou-lhe com um soco. Gleen desviou para o lado com um passo lento. O peso do próprio ataque jogou o gigante no chão.

Sem mais tempo, incumbido daquilo, embora com um pouco de pesar, Gleen subiu no enorme dorso dele, sentou-se no pescoço e apenas um estalo ressoou.

Ele saiu de cima do cadáver, andou calmamente em direção à mata e proclamou:

— O trabalho ainda não acabou. Precisamos eliminar os desgarrados.

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[Invasores eliminados: 21]

[Invasores capturados: 10]

[4500 Pontos Recebidos]

[Conquista]

Nome: Aquele que vence

Grau: Incomum

Prêmio: 1000

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Surpreendentemente, as coisas correram muito melhor do que eu havia esperado. As recompensas também eram encantadoras.



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