O Mestre da Masmorra Brasileira

Autor(a): Eduardo Goétia


Volume 1 – Arco 1

Capítulo 9: Invasor

Sabendo do que se tratava, voltei rapidamente para a sala do núcleo. Assim que cheguei lá, minhas funções retornaram. Consegui voltar a utilizar minha tela de status.

Durante invasões, eu era impossibilitado de utilizar minhas funções de Mestre da Masmorra no andar invadido; ou seja, não poderia modificar terreno ou invocar monstros no andar invadido.

Corri para o trono e me sentei na frente do núcleo azul brilhante. Coloquei minha mão sobre ele e ativei uma das funções dele.

Um mapa do primeiro andar surgiu na tela. Pontos verdes eram monstros sobre o meu controle, amarelos monstros nomeados e havia um único vermelho.

— É ele... o invasor!

Fiz um gesto de aproximação com a mão e consegui ver imagens do invasor. Ele era um pequeno goblin selvagem. Andava com cautela pela masmorra, mas algo mais importante chamou minha atenção.

Nas costas dele havia uma cicatriz enorme. Era a marca de três cortes que ia de cima até embaixo. Era uma cicatriz bem antiga, possivelmente do momento que nasceu.

Hm. Isso pode ser interessante.

A marca que possuía indicava que ele era servo de algum monstro mais forte. Pelo tempo da cicatriz, consegui descobrir quando recebeu e isto também demonstrava o poder e Inteligência do seu mestre.

— Se ele utiliza o método de marcação para demonstrar poder, ainda deve ser da raça Goblin, mas se for um Rei Goblin, possivelmente terei problemas...

Eu odeio Reis.

Estalei minha língua inconformado, pois havia outro governante andando pelo meu território e isso era inaceitável.

Precisava descobrir a força do inimigo o mais rápido possível antes de tentar atacar. Para isso, possuía um plano simples. Havia um item perfeito para essa situação.

Procurei por ele na loja e, após uma curta busca, encontrei. Contudo o preço não era nada agradável aos olhos.

10.000 pontos por um transmissor de mana de grau 1.

O preço dentro do jogo era de 1000 Pontos, apesar de não ter essa quantia de pontos naquele momento, ainda era razoável, todavia 10.000 era coisa demais.

O transmissor agiria como um localizador e poderia transmitir imagens do alvo em tempo real. O plano original era prender o transmissor de mana no invasor e expulsá-lo, seguindo os seus movimentos pelo núcleo e descobrindo aonde ele morava.

Sem essa opção, tentei pensar em outra solução. Não consegui pensar em nada de imediato e outro problema me puxou a atenção.

— Ele está se aproximando...

Próximo ao invasor, havia uma dupla de goblins distraídos chegando perto. Caso algo ocorresse, nunca conseguiria chegar a tempo, então decidi apenas observar.

O invasor notou a aproximação e se escondeu atrás de uma árvore, puxando algo das suas costas.

Sem se darem conta do perigo, aproximaram-se com descuido da árvore. Contudo o invasor não atacou e apenas permaneceu parado.

Ele era bem mais inteligente do que eu pensei. Isto me surpreendeu. Olhei para toda a situação do primeiro andar e percebi que não havia mais ninguém por perto.

O goblin deu mais algumas voltas pela área da masmorra e então partiu. Em seguida, uma mensagem tocou.

❂❂❂

[Invasor expulso]

[50 pontos recebidos]

[Conquista]

Nome: Primeira Defesa

Grau: Comum

Prêmio: 100

Descrição: O Mestre da Masmorra foi bem sucedido ao defender a sua masmorra de um invasor. Não deixe essa pequena vitória subir a cabeça.

❂❂❂

Quase dei uma risada alta, pois o sistema considerou aquilo como uma expulsão. Ainda assim, continuei um pouco preocupado.

O invasor era inteligente e furtivo, mas não atacou. Reis Goblins costumavam focar apenas no poder de ataque dos seus servos, portanto aquele pequeno servia a outro monstro.

Busquei em minha mente monstros que davam a oportunidade para goblins ficarem inteligentes. Poderia ser um “Lorde Demônio”, mas era improvável que um monstro tão poderoso estivesse por perto.

Além disso, as marcas ainda mostravam-me que o líder talvez fosse até mais burro que os servos.

Então... Quem está por trás do pequeno?

Outras opções seriam um Goblin Xamã, um Goblin Rei Mutante e...

— Só pode ser isso... um Goblin Campeão.

Dentro da espécie Goblin, campeões eram reconhecidos como os mais brutos e corpulentos, podendo ser até maiores que seres humanos.

Eles não eram um grande exemplo de líderes por seu egoísmo, mas ainda poderiam construir ninhos e se proclamarem chefes.

Sendo tão burros quanto qualquer outro goblin comum, acabavam ameaçando a vida dos próprios servos que precisavam se adaptar a eles ou morriam.

— Este deve ser o caso daquele pequeno. Ele deve ter aprendido a sobreviver na marra.

Descobrindo do que se tratava, eu me acalmei um pouco. Se fosse um Rei Goblin, teria sido algo bem difícil de lidar, mas um Campeão não era tão problemático.

Com isto em mente, desci ao primeiro andar onde encontrei com um goblin e o mandei chamar por Glenn.

Voltei então para a sala do núcleo para me certificar de estaria tudo certo. Planejei uma forma de lidar com o futuro inimigo.

Ainda assim, porém, dei uma ordem para Glenn.

❂❂❂

— Provavelmente, receberemos um ataque em pouco tempo. É também bem provável que um poderoso inimigo acompanhe esse ataque — discursei brevemente e então cheguei ao meu ponto. — Eu quero que você lide com isso.

O hobgoblin me encarou com olhos brilhantes e logo seguiu ajoelhando-se e dizendo:

— Deixe comigo, mestre Kayn.

— Acredito que ainda teremos alguns dias, então relaxe. Nesse meio tempo, providenciarei recursos e ajuda.

Glenn me agradeceu mais um dúzia de vezes pela confiança que lhe dei. Após me cansar de ouvi-lo, arrumei uma tarefa aleatório para que ele sumisse da minha vista.

Ainda assim, porém, fiquei satisfeito com a sua lealdade e compromisso. Ter dado um nome a ele parecia ter sido uma ótima ideia agora.

— Bem... meus planos de investigar a área ficarão para depois. Preciso me preparar para isso.

Ainda que não fosse tão perigoso, um Campeão ainda era muito para um jogador novato enfrentar em Vanglória.

— Cerca de 3 meses...

Esse era o tempo que um jogador demoraria para conseguir sequer pensar em enfrentar um Campeão.

— Eu, por outro lado, tenho no máximo uma semana. É melhor começar.

Prossegui com o planejamento. Ainda neste dia, recolhi as pedras de mana e transformei em pontos.

Cada uma entregava uma pequena quantia de pontos. Cerca de 25% do valor original do monstro, o que não era muito, mas era ótimo.

No próximo dia, viajei com um grupo de caça. Desta vez, andamos todos juntos para que nada pudesse acontecer.

Ainda estava com meu arco nas costas e, com os pontos que possuía, comprei tacos para alguns Goblins.

A floresta densa ainda me causava um calafrio e o trauma que sofri há dois dias ainda estremecia minha alma, mas precisava, ainda, seguir em frente.

Em um curto tempo, encontramos outro coelho chifrudo. Aproveitei da sua distração para acertar-lhe uma flecha.

A sorte me sorriu, pois o coelho nem teve reação. A flecha bateu fundo no seu corpo e o matou instantaneamente.

Mandei um dos pequenos carregar o cadáver e continuamos a caça. Após mais uma curta caminhada, outro apareceu.

Peguei a flecha para atirar, porém dessa vez optei por mirar em uma das pernas do animal. Queria feri-lo e dar a oportunidade de abate para outro.

Matar criaturas também ajudava no desempenho dos monstros. Eles receberiam experiência para subir de nível e consequentemente suas estatísticas cresceriam.

Eu já havia matado alguns coelhos e aquele goblin, então dar a chance de abate a outro não seria um problema.

Um dos goblins correu e acertou o taco bem na cabeça do animal. Após mais três acertos, o crânio da criaturinha rachou em uma mistura nojenta de carne moída e líquido.

Segurei o vômito quando vi o goblin todo sujo de sangue e tripas e os mantei recolher o cadáver. Assim continuamos o processo de caça.

O número de coelhos chifrudos aumentava consideravelmente conforme íamos em direção ao noroeste. Havia tantos deles na floresta que até desisti de tentar contar.

Outras áreas ainda possuíam coelhos, mas o número não era tão assustador, embora ainda fosse mais que o normal.

E um detalhe não me fugia: eles estavam sempre comendo.

Como forma de ajudar no desenvolvimento de forças, fiz um plano. Assim que encontramos outro coelho, ordenei:

— Cerquem-no.

Seguindo o meu comando, cercaram o pequeno em todas as direções. Olhei para um dos goblins com um taco na mão e disse:

— Você, lute.

O goblin me encarou com confusão, mas não lhe dei outras palavras. Ele continuou me olhando e também para o coelho que já apontava o chifre na direção dele.

Poderiam me chamar de cruel, mas o mundo era mais.

Logo o goblin entendeu do que se tratava e, tremendo feito um gatinho, levantou o taco contra o adversário.

— Se você vencer, poderá ficar com toda a carne só para você.

O goblin escutando isso parou de tremer e olhou para o coelho com outros olhos. Olhos cheios de ganância.

Um homem sábio um dia disse: Quando recompensas teus homens com os benefícios que ostentavam os adversários, eles lutarão com iniciativa própria, e assim poderás tomar o poder e a influência que antes tinha o inimigo.”

Havia duas formas normais de se criar bons soldados e duas anormais; disciplina e recompensa. Equilibrar as duas era essencial. Já as formas anormais eram bem situacionais: desespero e abnegação.

Desespero era criado em situações de vida e morte. Quando a única opção é lutar ou desistir; neste momento os guerreiros de verdade eram revelados.

Abnegação era similar, mas ainda mais poderosa. Um soldado que abdica de tudo pela mínima esperança de conseguir proteger os que ama tornar-se-ia não somente um guerreiro, mas derradeiro berserker em batalha.

Caso um soldado tivesse todos os quatros, ele não seria mais um simples guerreiro, e sim uma máquina de guerra brutal e sem restrições.

No dia anterior, construí disciplina; hoje, recompensa. Os dois que faltavam viriam com o tempo.

A batalha entre eles começou!



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