O Meu Caminho Brasileira

Autor(a): Rafael AS


Volume 1

Capítulo 23: Conselho Geral da Academia de Bauchir

Era apenas uma porta. Uma simples porta que parecia inultrapassável. Talvez isso se desse por causa dos complexos ornamentos desenhados na madeira escura que deixavam claro o elitismo do local. Ou a cera na madeira que fazia refletir os raios solares que invadiam o corredor pelas aberturas das grossas cortinas brancas. Tudo era luxuoso e enfeitado demais.

Sentindo os pés se afundarem no grosso tapete carmesim, Hayek segurou a maçaneta prateada da porta. O metal estava surpreendentemente quente, certamente por runas mágicas. Nem esse detalhe deixaram escapar da arquitetura...

Suspirou fundo. Assim que abrisse a porta, se encontraria com uns dos principais dirigentes da Academia de Bauchir. Nos últimos tempos tem sido reconhecida pelo seu trabalho, convidada a atuar diretamente na manutenção das lendárias runas que protegem o terreno, e até requisitada a alterar a grade curricular do curso de magia e feitiçaria.

Não obstante, o assunto daquele dia — ter sido convidada para participar e ter voz no conselho deliberativo da Academia Real de Bauchir — estava em outro patamar...

Rodou a maçaneta, e a porta se abriu em um deslize suave e silencioso. Foi-lhe revelada uma sala iluminada por um grande candelabro ao centro, com uma extensa mesa oval que se estendia no meio do cômodo. Nove cadeiras se dispunham ao redor dela, sendo quatro nos dois cantos laterais e uma maior na outra extremidade, acolchoada como se fosse um trono da realeza.

Essa pertencia a Belchior, o lendário Mago Ancião. Como era bem sabido por todos, ele saíra em uma missão na capital do maior império humano, Viskhen. Na sua ausência, quem continuava coordenando a Academia...

Os olhos de Hayek percorreram os semblantes de cada um dos presentes. Eram cinco ao total. À direita, encontravam-se Tokewater, diretor da pesquisa em magia aplicada e responsável direto pela biblioteca, e Skruthon, representante do comitê de ética, já envelhecido, embora seus cabelos ruivos flamejantes proporcionassem um vislumbre da vitalidade que um dia já possuiu.

À esquerda, estava Carl Mounstein, de postura altiva, barba loira robusta e roupas que muito bem expressavam sua condição de conde, com tamanha elegância que parecia ser retirado vivo de uma pintura. Sua expressão era séria e destemida.

Ao lado, encolhia-se no silêncio um sujeito coberto por robes roxos e largos, somente visível fora da sombra da vestimenta o queixo e o pescoço, de tez branca pálida, e o longo cabelo negro preso em uma trança que descansava na base do pescoço. Era um professor substituto chamado Zonto.

Nenhum dos dois era digno de confiança. Mounstein era vaidoso igual um leão que treina o rugido para sair belo e imponente, sem jamais caçar na vida. E o professor substituto... Algo nele dava arrepios em Hayek. Não sabia o quê. Não que fosse da alçada dela determinar que tipo de gente a Academia contratava...

Hum-hum — pigarreou uma mulher ao lado de Zonto, cujo nome era Elizabeth. Tinha cabelos azuis encaracolados e curtos. A pele do rosto, mais flácida e enrugada, exibia uma longa trajetória de vida. Porém, os óculos retangulares na ponta do nariz que pouco escondiam os olhos afiados davam-lhe um ar astuto e perigoso. — É um prazer tê-la aqui pela primeira vez, professora Hayek.

— De fato é um prazer, Hayek — disse Skruthon, dobrando uma perna sobre a outra. — Trabalhar ao lado dela no último ano me fez perceber o quanto que desperdiçamos por não a ter em cargos superiores.

Hayek sorriu, agradecida, mas a densa atmosfera presente na sala a silenciou por um instante. Todas as figuras ali, mesmo as que não admirava, emanavam um ar distinto e potencialmente ameaçador. Os olhos perspicazes dos membros rondavam-na como se a examinassem, usando de anos de experiência para julgar quem ela é.

Mesmo assim, ela manejou o estresse e se acalmou. Respondeu:

— Fico lisonjeada com vossas palavras, senhor Bolghak. No entanto, temo não ser merecedora de tais apreciações. Se me permite expressar-me mais, amo o meu ofício de professora, e espero nunca me distanciar das práticas diretas de ensino.

Tokewater abriu um sorriso com as palavras da moça.

— Mesmo que sejamos a Academia de Magia mais renomada de todas as raças, ainda é raro encontrar professores com tanta disposição e afinco igual você, senhora Hayek. Aliás, você faz parte da nobreza. Por favor, chame-nos pelo nome direto.

— Obrigada pelas palavras, Tokewater.

Elizabeth abriu um sorriso.

— Não só nos chame pelo nome, mas se sente aqui também conosco. — Ela apontou para uma cadeira vazia ao lado de Tokewater.

— Gentileza sua. Com licença.

Hayek caminhou até o assento e se sentou nele com movimentos delicados. A atitude parecia ter sido bem recebida pelos olhares atentos nela. Sendo observada, a professora teve que suprimir o suspiro de desconforto e manter a expressão séria.

— É também um prazer ter o diretor Tokewater conosco mais uma vez — falou Elizabeth. — Embora tenha assumido o cargo neste ano, vem fazendo um trabalho exemplar.

— Obrigado — disse Tokewater com um pequeno sorriso orgulhoso. 

— Aliás — continuou Elizabeth —, como vocês já devem ter notado, atipicamente nesta reunião, contamos com o professor substituto, Zonto. Malgrado o curto tempo de serviço dele na instituição, algumas pautas de hoje lhe concernem diretamente, de modo que se faz apropriada a presença dele.

A atenção dos integrantes deslocou-se de Hayek para Elizabeth e Zonto. Como ninguém complementou a fala dela, Elizabeth prosseguiu:

— Muito bem. Agora que estamos reunidos, podemos dar início à nossa... — Ela abriu um caderno de capa de couro preto e ajeitou os óculos. — Centésima septuagésima terceira deliberação do Conselho Geral da Academia de Bauchir. Embora estejamos só nós presentes, não haverá prejuízo proveniente da ausência dos membros faltantes, porquanto as decisões de hoje são de caráter mais simplório.

Imediatamente após as palavras da anciã, a tensão se elevou a níveis sufocantes, com entreolhares que estudavam as disposições de cada membro. Mais do que uma busca à solução ideal de cada caso, os membros da reunião pareciam se preparar para um jogo político de interesses, na visão de Hayek.

— A primeira pauta que julgo ser de eminente valor é a respeito da segurança da Academia. Como todos aqui bem sabem, no dia treze de Agosto, Maria, uma estudante exemplar que tinha um futuro brilhante pela frente, foi assassinada em seu quarto. As investigações descobriram traços de magia negra no local. Nada mais.

“No dia quatorze de Agosto”, Elizabeth continuou lendo o caderno. “Um monstro humanoide assassinou o cavaleiro Hendrick e perseguiu Flamel e Aithne. Os dois jovens foram capazes de detê-lo antes que ceifasse mais vidas. Os dois. Alunos. Sozinhos. Enquanto ninguém da Academia foi capaz de fazer algo. Vocês entendem a gravidade disso?

“É no mínimo uma tragédia ter que falar isso para vocês. Nunca esperei que em meus quarenta e sete anos de serviço na Academia algo assim ocorresse. A reputação da Academia como uma conquista nas terras devastadas foi rasgada, e até chegam a cogitar que o Grande Mal pode estar ressurgindo. Tudo por causa de uma falha na nossa segurança. É uma vergonha.”

As palavras de Elizabeth atingiam Hayek em cheio, especialmente porque, mais que vergonha, Maria era uma de suas alunas favoritas. Era sempre uma facada no coração pensar que ela morreu e que uma runa de proteção melhor poderia tê-la salvo. No fim, a morte parece acompanhá-la aonde quer que vá, exterminando aqueles que tinham vidas grandiosas pela frente...

Hah... — suspirou Elizabeth, as artérias em seu rosto pulsando. — Prefiro nem me alongar mais nesse assunto. Gostaria, contudo, de propor um encaminhamento sobre a questão. Quero que a professora Hayek conduza a linha de frente das investigações sobre as falhas de defesa da Academia. Terá meu voto para ser responsável direta por isso, sem prejuízo por riscos impossíveis de serem previstos.

“Espera... o quê?” Os ouvidos de Hayek não acreditavam no que captaram. Com o queixo caído, boquiaberta, a mulher fitou os colegas. Ela era mera professora. Esperava continuar a ser assim. Mas subitamente será colocada para liderar a investigação e correção das falhas de segurança?

— Concordo — proclamou Skruthon. — Hayek possui um caráter exemplar e fará o possível para consertar o problema. No entanto, apesar de a situação ser uma catástrofe sem precedentes, ressalto que o regime de riscos ser somente de casos “impossíveis de serem previstos” é exageradamente ríspido. Toda runa que ela criar haverá riscos já conhecidos, e, mesmo se combinar incontáveis runas para complementar suas falhas, ainda haverá riscos. Nunca é uma certeza absoluta. Terá meu voto se for responsabilizada apenas conforme apuração por especialistas, cuja pesquisa mediarei.

Hayek observou o moço argumentando em alto e bom tom. Como um arauto da justiça, impedia que Hayek se tornasse um bode expiatório, em quem toda culpa recairia por um fracasso que talvez nem pudesse ser solucionado.

A professora suspirou, aliviada, e decidiu complementar:

— Como especialista na área, regozijo-me com a sabedoria de Skruthon, visto que é impossível-

— Então — interrompeu-a Elizabeth — é um voto a favor da minha proposta, e uma abstenção por parte do senhor Skruthon.

— Perdão pela intromissão, dona Elizabeth — disse Tokewater. — Mas interpreto o voto de Skruthon como negativo à sua proposta. Faço do meu voto o mesmo.

— Tokewater me entendeu bem. — Skruthon afirmou com a cabeça.

— Está certo... Um voto contra dois... E vocês, Mounstein e Zonto?

— Tem meu voto a favor — falou Mounstein prontamente, sem qualquer argumentação.

— O meu também — disse Zonto.

— Perfeito. — Elizabeth exibiu um sorriso malicioso. — Então são três votos contra-

— E-espera! — um filete de suor escorreu pela testa de Hayek. — A justificativa da presença de Zonto era só para assuntos que recaem diretamente sobre ele, não é? Por que-

Ordem! — O grito de Elizabeth foi imbuído com magia e atingiu impetuosamente os tímpanos de Hayek, fazendo-a se encolher na cadeira. — Não me interrompa. O professor Zonto será um dos pioneiros na pesquisa em magia negra na academia. Como tal, a opinião dele é importante no tocante às investigações que envolvam monstros e magia negra.

— Discordo — falou Skruthon incisivamente. — O senhor Zonto não está na instituição nem há seis meses. É ridículo existir uma deliberação do Conselho Geral da Academia de Bauchir em que ele tenha tido um voto válido em uma questão que lhe é só indiretamente pertinente. Por favor reconsidere sua posição, Elizabeth.

Os olhos do homem de cabelos ruivos se conectaram com seriedade aos da anciã. Da mesma forma, Tokewater exibia uma expressão azeda durante a conversa.

— Digo-lhe mais, Elizabeth... — começou Tokewater. — A não ser que se explique, interpretarei tal situação como uma tentativa de depositar toda culpa em Hayek, como um bode expiatório.  

— ... — Silêncio recaiu sobre ela. Pegou a pena e escreveu no caderno. — Dois votos contra dois. Para desempatar, podemos recorrer à própria subordinada que arcará com as consequências. O que deseja? — O olhar sombrio de Elizabeth deixava claro à Hayek que haveria consequências, talvez pesadas, se recusasse. Mas...

— De jeito nenhum. Sou completamente contrária a isso.

O olhar de Hayek era quente e determinado para Elizabeth, a raiva explícita, mesmo que a anciã pudesse destruir a vida da moça. Elizabeth encarou-a, e então examinou os olhares fervorosos também de Tokewater e de Skruthon. Acabou apenas suspirando fundo.

— Certo. Perdão, equivoquei-me — disse Elizabeth. — Queria apenas o bem da Academia, e todos aqui sabemos que, quanto mais frouxas forem as punições, menor será a motivação. Tudo que quero aqui é pelo bem geral da Academia e de todos os estudantes que por aqui passam. Abro, então, uma nova votação para responsabilizá-la apenas se ocorrer uma negligência, apurada por equipe especializada e intermediado por Skruthon.

— O ponto de Elizabeth de ser melhor à instituição colocar maior pressão na professora Hayek é muito importante — falou Mounstein. — Trata-se de um benefício geral e intenso, que procura garantir a vida de todos, em detrimento de um pouco mais de estresse em um só indivíduo. No entanto, como não houve aprovação da maioria, sigo a Elizabeth na nova proposta.

“Esses canalhas...” Hayek encarava-os sem acreditar no que acontecia. Agiam da forma mais descarada possível, mas encontravam uma argumentação que os fizesse parecer defenderem o certo...

— Voto contra — asseverou Tokewater. Os olhos de todos se arregalaram com tal afirmação, incluindo os de Hayek. — Não me encarem dessa forma, senhores. Voto contra porque eu sou diretor de pesquisa em magia. Exijo que eu faça parte da equipe de apuração, se chegar a haver um acidente. Somente então terá meu voto. Tudo que luto aqui é pelo justo.

Apenas com as palavras dele que os rostos dos membros à direita da mesa relaxaram.

— Concordo com o Tokewater. Também recuso — disse Skruthon.

Elizabeth suspirou, extremamente insatisfeita. Hayek, em contrapartida, tinha o coração vibrando com a defesa que recebia naquela sala. Não tinha voz, seria facilmente oprimida e sentenciada a situações injustas se estivesse sozinha, mas felizmente havia quem lutava por ela naquela mesa, com um poder formal que jamais possuiria.

A reunião se seguiu com a mudança na proposta para incluir o comentário de Tokewater, e logo foi aceita de forma unânime. Foi uma vitória para Hayek.

Mesmo assim, ela apertou a própria coxa com força debaixo da mesa. Queria viver seus dias pacificamente, apenas auxiliando as futuras gerações a terem mais brilho. Entretanto, não tinha voz para decidir seu próprio destino, e tinha mais que ser grata que insatisfeita por tido Tokewater e Skruthon a defendendo...

— Certo, agora...

Outras discussões seguiram a fio. Tratavam de coisas simples e técnicas como quais runas de proteção seriam adicionadas como reforço aos quartos, planejamento para evacuações de emergência, férias dos alunos etc. Assim se seguiu por longo tempo. 

No entanto, mesmo que Hayek tenha participado de todas as votações e com comentários bem-recebidos que por vezes fizeram Mounstein mudar seu voto, um gosto amargo subiu-lhe à boca.

— E o Flamel?

A pergunta fez silêncio recair sobre a mesa oval.

— O... Flamel? O que tem ele? — Elizabeth parecia não entender, o que apenas causou mais raiva em Hayek.

— Ele foi alvo direto do último monstro. Por outras razões, já é a quarta vez que é internado em um curto espaço de tempo. Quero propor que ele descanse na Torre dos Professores, em vez da enfermaria. Acredito que-

Negado — Elizabeth interrompeu-a enfaticamente. — Você sabe que-

— Perdão, Elizabeth, mas, se meu voto vale o mesmo tanto que o seu, deixe-me terminar minha fala.

Após as palavras de Hayek, Mounstein bateu com força na mesa.

— Como ousa falar assim conosco?! Saiba seu lugar, sua-

— Senhor Mounstein... — Hayek encarou-o com ódio exalando pelos olhos. — Já perdi meu marido e meus filhos. Nada resta de mim. Se quiser me demitir, me prender, fazer o que for, então faça. Mas se quiserem colocar meu nome nessa ata, terão que me ouvir.

As veias do pescoço de Mounstein explodiam, e o rosto ficava mais e mais vermelho. Quando colocou a mão no cabo da espada na cintura, Elizabeth o interrompeu:

— Está bem, Mounstein. — Ela acariciou o ombro do homem, antes de lançar um olhar áspero à Hayek. — Apesar de tudo, ela está no direito dela. Acalme-se.

O homem loiro sentou-se de volta à cadeira, mas não escondia o desgosto por Hayek. Elizabeth manteve-se mais serena, mas era óbvio a inquietação que sentia.

Diante daquela cena, Skruthon suspirou fundo, pensativo. Em nenhuma das deliberações houve tamanha quebra de formalidade igual essa. Diferente de Hayek, outros professores foram, de fato, feitos de bodes expiatórios em questões muito menores, e o voto dele contra não foi capaz de impedir o trágico destino. Nenhum deles havia se defendido também, temendo pior punição. Mas a Hayek...

— Certo. Obrigada — continuou Hayek. — Flamel é um garoto surpreendente. No último duelo que teve com Violette, foi capaz de utilizar dois feitiços não-complementares de elementos diferentes e-

Pffttt. — Mounstein tentou segurar um riso, mas falhou miseravelmente. — Hahahaha. Ok, ok. Você está no seu direito para falar, mas sério? Dois feitiços, de elementos diferentes, que não foram projetados para serem complementares? Sai daqui. Isso é uma discussão séria.

— É verdade o que ela diz. — A voz de Tokewater fez o rosto de Mounstein azedar. — Eu mesmo presenciei o duelo, em segredo. Passei meu cartão de identidade na catraca, se quiserem confirmar. Ainda vai ter um resquício da minha mana.

— ...

As encaradas que se seguiram foram agonizantemente intensas. Quem quebrou o silêncio foi Hayek. Ela assumiu a voz por Flamel e continuou tentando convencê-los a colocá-lo na Torre dos Professores. Havia quartos sobrando. Algo ruim poderia acontecer enquanto estava desmaiado e se recuperando em um local desprotegido.

— Continuo discordando. — Elizabeth suspirou, cansada e irritada. — Se dermos esse tratamento especial a ele, filho de meros barões falidos que abandonaram o filho como um cachorro, como poderemos querer não beneficiar alunos que são realmente herdeiros de grandes linhagens? Você sabe que...

E assim continuou a argumentação de Elizabeth, com baboseiras que Hayek nem prestou atenção. Apesar das palavras eloquentes, ela sabia que, no fundo, eram apenas desculpas para não beneficiar alguém que não fosse “tão nobre”. Seria o mesmo caso com a falta de punição de Cyle por quase tê-lo matado.

“Que inferno...”, pensou Hayek consigo. “Não consigo acreditar que alguém pode ser tão egoísta e interesseiro de forma tão descarada... Realmente, o inferno são os outros...”

Ela apertou ainda mais forte a coxa. Sentia muita, muita falta do falecido marido, que, apesar de nobre, agia de modo completamente diferente. Comportava-se com regras morais e brilho no olhar. Ela queria chorar, mas teve que manter a postura durante todo o resto de reunião.

Quando esse tema da deliberação foi fechado e começaram a discutir outro, Hayek não tinha sido capaz de dar qualquer ajuda a Flamel. Não só isso, mas ainda Elizabeth determinou que ele poderia colocar a enfermaria em risco, atraindo algum monstro ou visita indesejada, então deveria ser colocado para descansar no quarto dele, sozinho. Era quase um exílio, um sacrifício consentido, assumindo todos os riscos de ele ser atacado.

Para completar, Elizabeth lembrou os convidados sobre a possibilidade de Flamel ser um praticante de magia negra que invocou o monstro. Disse que sua presença poderia colocar em caos a Torre dos Professores. Zonto reafirmou tal possibilidade, com argumentações extensíssimas, até Skruthon mudar seu voto e permitir o “exílio” de Flamel. A votação final sobre o tema ficou 3 votos a favor e 2 contra.

Apesar dos quase quarenta anos de vida, Hayek não conseguia acreditar no que acontecia. Era um absurdo, uma falta de humanidade sem limites.

Em nada mais conseguiu prestar atenção. Secretamente, fazia planos sobre como ajudar o Flamel. Sem que Hayek percebesse, Tokewater a encarava constantemente, como se lesse no rosto dela toda angústia e vontade de conseguir fazer melhor. Ele mesmo queria. Mas nada disse ou fez, incapaz de alterar o destino do garoto.

Logo a sessão de deliberação chegou ao fim. Despediram-se e trocaram palavras educadas mas vazias. Hayek apressou-se para sair e, em pouco tempo já descia as escadas em espiral da Torre Central. Ela não deixaria as coisas terminarem assim.

Tokewater a assistiu de longe, o coração apertado por presenciar a colega tão afetada. Ele também gostava muito de Flamel, era o aluno com quem teve mais contato além de Aithne, sempre indo na biblioteca com aquele olhar tímido. E pensar que querem tratar mal um garoto como ele...

Enquanto Tokewater e Hayek estavam perdidos em suas próprias ideias, Zonto ainda permanecia com o rosto obscuro, tampado pelo capuz, refletindo friamente sobre cada fala dos integrantes da reunião...

Discord da Obra



Comentários