Volume 4,5
Capítulo 1: O Resumo das Férias de Takahashi Kuroshima
Se alguém me perguntasse sobre o que deveria ser feito durante as férias de verão, eu responderia algo como “criar memórias” ou algo assim. Apesar disso, sou do tipo que dou risada de estereótipos como esse. Não é como se as pessoas precisassem se prender a estigmas de como devem vivenciar as coisas. Apenas faça o que queira fazer e pronto.
Como alguém ciente das próprias habilidades e qualidades, desde que o verão começou, frequentei festas e encontros por aí. Gosto de esfriar a cabeça de assuntos pendentes vivenciando coisas diferentes. Como ainda havia o interescolar para acontecer, decidi aproveitar os primeiros dias de descanso da escola.
Depois disso, treinos matinais. Geralmente eu e meus amigos ao saímos cruzamos boa parte de Chiba andando a pé ou de bicicleta. Sempre tive uma ótima condição física, então busco desafios de maneira eventual como: “até qual local consigo ir hoje?”. Isso se tornou algo como um hobby para mim.
Isto também se tornou algo rotineiro com os membros do time de futebol. Desde o início do ano letivo, recebi o título de capitão do time.
— Eu como capitão do time? Isso é sério? — debochei da ideia para o antigo capitão, Kazebayashi. — Não acha que sou despojado demais para isso?
— Você é o tipo de pessoa que quer curtir o momento, mesmo... — expressou Kazebayashi. — Mas também se dedica muito em algo que esteja interessado. E vi durante o ano passado que se esforçou até mais do que eu. Nada mais justo de querer colocar outra pessoa mais adequada nessa posição.
Cocei a nuca, mas ele não mudou de opinião. E aparentemente, todos do time concordaram com a ideia. Não tive escolha senão lidar com esse serviço.
No entanto, há poucos meses chegou um aluno transferido que era um ótimo jogador, mas com um ego maior que o meu...
— Sou Inuzuka Hiyama! — anunciou o transferido, com uma energia anormal. — Estou ansioso para jogar com vocês!
— Ele é o tal estudante novo que causou problemas com o time do Gotou e Juugo no início das aulas? — cochichei para Kazebayashi.
— Isso mesmo... pelo visto, ele é do tipo pavio curto que não gosta que fanfarrões como Gotou dê ordens apenas pelo bel prazer... — comentou. — Ouvi dizer que ele sozinho brigou feio com Juugo e quase recebeu uma suspensão..., mas ainda está atuando no time reserva de basquete por causa das suas habilidades, então...
— ...quando o time de basquete não precisa de repositores, o mandam pra cá... — completei, estressado. — Essa política do Gotou é realmente um absurdo, mesmo...
— E é isso. Teremos que lidar com esse diabo da tasmânia... — expressou Kazebayashi. — Essa é a sua deixa, capitão...
O encarei, irritado. Só pode ser coincidência um pouco depois de ser condecorado com líder me surge um problema desses... será que Kazebayashi soube dessa situação de antemão e por isso fez a renúncia do cargo?
Não me surpreende, claro. É algo comum que alguém entre os dez melhores do ranking geral saiba de informações do tipo, ainda mais se for popular...
Deixando isso de lado, me aproximei do círculo de pessoas envolta de Inuzuka, que animadamente conversava com o pessoal. É... chamá-lo de problema realmente soou muito cruel. Nos cumprimentamos assim que ficamos cara-a-cara.
— Sou Takahashi Kuroshima, líder do time. Vai ser um prazer tê-lo aqui conosco.
O aperto foi firme, sinal de que ele está levando a sério quem o encara nesse instante. Oh... interessante.
Meus amigos e colegas já sabiam da minha integridade física, então quase nunca competiam comigo nas coisas, mas isso mudou desde que Inuzuka chegou. Pois ele simplesmente competia em tudo.
— Eu sou o melhor! Há! Há! Há!
— Parece que ganhou um rival à altura! — brincou Kazebayashi. — Você realmente tem jeito pra isso, hein?
Esse Kazebayashi... mesmo sendo presunçoso e relaxado, talvez tenha um bom olho para essas coisas, afinal... quanto à Inuzuka, apesar dessa aura arrogante e irritante, também possui um carisma abrangente.
Não demorou muito nesses poucos meses para o transferido se destacar e virar atacante no time. Inuzuka tornou a me acompanhar nos encontros e caminhadas que tínhamos. Nosso treino matinal consiste em aquecimento com corrida (trote) e após isso passes de bola, mas Inuzuka apenas quer ser o primeiro em tudo... e durante vários momentos, me esquecia do objetivo principal de todo aquele treinamento apenas para querer ganhar dele.
Quando chegou o interescolar, a única coisa que pude descrever foi como uma montanha-russa de sentimentos. A ansiedade antes do jogo, a adrenalina de estar jogando no momento e os resultados finais de cada partida. Tudo isso fez cada instante ser único, pois era isso o que queríamos, o que qualquer jogador deseja. Ser visto, observado e avaliado da melhor forma possível.
Além do mais, seria a primeira competição que participarei como capitão do time... não sou de me importar com esses títulos, mas o nervosismo realmente me pegou em vários momentos. Sei que teria jogadores melhores, mas isso não importava para Inuzuka:
— Eu vou ser o melhor de todos! Vai ser no tudo ou nada, pessoal!
Antes das férias de verão começarem, reatei minha amizade com Kumiko Horie, uma colega da qual conhecia desde o ensino fundamental e nossa comunicação foi cortada. Ela se envolveu em várias confusões e no fim entrou para o conselho estudantil. Havíamos saído algumas vezes desde que as férias começaram, mas seu tom de voz em um destes encontros não foi nada agradável:
— Como pôde aceitar essa proposta absurda do Shiroyama?!
— Hum? Não estou entendendo... o que nós apostamos não te envolve diretamente. Se nós ganharmos no Festival Esportivo, não o vigiarei mais. Porém, posso usar isso como medida para que ele não te cause problemas.
— Mas não temos certeza do que ele poderá fazer neste acordo! — grunhiu Kumiko. — Ele é escorregadio demais, não dá pra confiar!
— Então quer dizer que está torcendo pela minha derrota? — indaguei, irritado. — É isso o que está me dizendo?
— Não..., mas, veja. Vou ter que torcer por outra pessoa por causa da minha aposta com ele. Não estou em uma posição favorável aqui!
— Tenho que te lembrar que tudo isso começou depois que ele alegou de ter áudios que te comprometam, por acaso? — rosnei. — Isso não é culpa minha, desde o início.
— É por isso que sugeri aquela ideia de pegar o celular dele de algum jeito e apagar quaisquer evidências! — proferiu ela. — Se tivesse feito isso, ele não teria como me ameaçar!
— Então o denuncie para os professores, ou sei lá! — esbravejei. — Se é algo tão sério a esse ponto, ao menos me diga do que se trata esses áudios!
— Não posso! Isso... não posso dizer.
— E você quer que eu aceite tudo isso sem reclamar?! — gritei, enfurecido. — Se uma mera aposta vai te colocar contra mim, do que adianta tudo o que fizemos para te ajudar?!
Kumiko desconversou a discussão depois disso, e não nos falamos direito após. Era estranho, pois no momento que estava prestes a jogar no interescolar, quis receber torcidas. Nana foi a primeira a me mandar mensagem, mas logo recebi uma nova notificação:
[Boa sorte no jogo, Takahashi] — Kumiko.
Porque aquela mensagem simples tirou um sorriso do meu rosto?
Era melhor deixar aquilo de lado, tinha que estar concentrado na partida acontecendo à minha frente!
***
O interescolar foi finalizado e houve um vencedor: o time da Yoriyoi. Recebemos o prêmio pelo segundo lugar. Foi um tanto perturbador termos que tirar fotos com os agentes da prefeitura de Yokohama junto aos vencedores logo após a partida ter terminado. Assim como eu, todos do time forçamos um sorriso no rosto ao aparecermos nas fotos.
Quando finalmente entramos no vestiário, sentei-me em um dos bancos do centro e não contive minhas lágrimas. Enxugava os olhos, mas as lágrimas não paravam. Sou o capitão do time, então todo o fardo da jogatina era cobrado de mim, somado ao que cobro de mim mesmo... onde foi que erramos?
A nossa cooperação não foi ruim... ah. mas teve a falta de comunicação durante a partida. Foi o nervosismo por ser a final? Só pode, mas não é algo que teria de culpar alguém por causa do resultado. Um time não se compõe de apenas uma única pessoa, então todos terão que carregar aquele fardo. Apenas isso.
Ouvi um barulho sucinto enquanto continha as lágrimas e vi Inuzuka descontando seu estresse socando um dos armários do vestiário.
— Não cause problemas desnecessários... — murmurei, sem vontade de levantar a voz contra ele. Ter de lidar com denúncias de má conduta nos vestiários seria problemático...
— Estávamos tão perto! Tão perto! — Inuzuka esbravejava, fungando o nariz e torcendo os olhos marejados. — Foi tudo culpa minha! Se eu tivesse feito passes melhores e acompanhado o ritmo! Que droga!
Sua cara enrugada é assustadora, mas não me intimidou, então o contive antes que começasse a realmente quebrar tudo ao seu redor.
— Não seja explosivo assim, Inuzuka... nós perdemos, mas ainda temos o segundo lugar! Fizemos bem, não vamos sair de mãos vazias!
Minha voz soou mais rouca do que esperava. Meus olhos estão irritados por causa das lágrimas, e tentar conter Inuzuka que se contorcia nos meus braços era realmente estressante.
— Não está nada bem! Temos que ser os melhores! — berrou Inuzuka, e se virou para mim. — Você não entendeu nada, seu líder estúpido!
— EI, Inuzuka! Pare de xingá-lo! — repreendeu Kazebayashi. — Se você não tivesse sido tão imprudente, teríamos feito mais! Tendo consciência disso, vamos melhorar nossos pontos fracos juntos!
— Eu sei, droga! Mas é tão revoltante... — grunhiu ele. — Vamos treinar, Takahashi! Temos que melhorar!
Como ele poderia pensar em algo como querer treinar depois de uma partida exaustiva daquela?
Porém, o pensamento dele não está errado. Então, concordei.
— Primeiro aquele ataque desenfreado dos punks, e agora isso... — retrucou Kawashita, membro do time. — Parece que foi até predestinado que teríamos problemas durante os jogos...
— Também não acreditei naquele cenário caótico... — expressou Kazebayashi. — Foi estranho demais.
— Se bem que o último jogo foi de longe o mais bizarro de todos! — exclamou Kikkawa, nosso colega mais descontraído.
— Nunca imaginei que teríamos tantos problemas de passe... — murmurou Totsuro. — Os caras da Yoriyoi foram realmente insanos.
— Mas não esquenta com isso. Também fui horrível nas marcações! — expressou Hiro, sem jeito. — Me desculpem por não ter conseguido acompanhar os lances!
— Não precisa conter sua frustração, Takahashi. — Morita se dirigiu a mim. — Todos nós erramos. Mas ainda estamos nessa todos juntos, certo?
— Isso mesmo! Na próxima, a gente vai vencer! — gritou Jinpei.
Apesar de ainda estar triste, sorri para aquele bando de idiotas. Se todos estão se motivando, então ainda podemos continuar.
Saímos do vestiário e agradecemos aos profissionais pela recepção e pelo uso do local. De lá voltamos ao hotel em que fomos hospedados. Apenas me lembro de chegar e deitar na cama, exausto.
Depois do jogo terá a festa de comemoração do fim do interescolar, mas não queria ir. Os outros do time pareciam estar da mesma sintonia que eu, menos Inuzuka.
Ele está transbordando de energia mesmo após o jogo. Ei, que animação toda é essa?
— Vamos, pessoal! Aposto que vai ter muitas garotas bonitas nessa festa! Temos que ir!
...
— Oh...! É isso mesmo! — exclamou Kikkawa. — Perdemos a batalha, mas não a guerra! Ainda podemos sair ganhando nessa viagem! Temos que aproveitar todas as chances possíveis de viver a vida, certo?!
— Como conseguem estar tão motivados assim? O jogo em si foi um dos mais difíceis que joguei até agora! — indagou Kazebayashi. — De onde tiram tanta energia? Eu estou totalmente cansado!
— E onde que arranjar garotas torna a gente vencedor? — retrucou Kawashita. — No máximo vão tentar nos consolar por termos perdido...
No entanto, Morita, Hiro e Jinpei não paravam de rir.
— Kikkawa só quis virar jogador para pegar garotas, mesmo! Esse cara não passa de um canalha! — brincou Morita.
— De qualquer jeito! Já que estamos aqui, vamos aproveitar! — Kikkawa e Inuzuka pareciam até irmãos andando lado a lado.
Não podia esperar muita coisa deles mesmo.
Nisso, todos nós rimos juntos. Inuzuka é uma figura. Kikkawa é um idiota. Mas o jeito descontraído e focado daqueles dois forma uma mistura desconexa que nos contagia.
No final das contas, acabamos indo para a festa. Ainda não estou muito animado, mas ao menos posso tentar esquecer um pouco da sensação de derrota. Afinal, o verão começou há pouco tempo. Inuzuka está certo em querer aproveitar o momento da melhor forma possível, já que não sabia quando voltaríamos para Yokohama por uma razão esportiva como aquela novamente.
Todos nós fomos, pegamos o metrô e chegamos mais ou menos uma hora após a festa ter começado. Haviam colocado tendas por entre o parque, que variavam entre mesas de comida e bebida e pistas de dança. Nos dividimos e combinamos que nos encontraríamos depois. Eu e Inuzuka fomos pegar algo para beber enquanto estávamos de olho aos arredores.
— Nossa, tem muita garota bonita aqui! — exclamou ele, confiante. — Tiramos a sorte grande, meu chapa!
Dei um gole em uma bebida com energético e soltei uma risada.
— Achei que já tivesse uma namorada ou algo assim... o único que sei que não vai conseguir dar jeito com ninguém é o Kikkawa...
— É complicado... — Ele suspirou. — Ser um aluno transferido traz seus problemas... não conhecia ninguém quando entrei na Daiichi e, até foquei meus olhos em algumas garotas e conversei um pouco, mas nada sério.
— É surreal ver alguém como você achando complicado ir falar com garotas... — comentei. — Mas, acho que elas são mais complicadas de se lidar do que um jogo ou um teste especial.
— Não é? É por isso que você é o capitão do time. Kazebayashi sabe das coisas! — zombou Inuzuka, mas não me importei. — Se quer saber, a verdadeira vontade que tive que vir aqui é curtir o momento, não de algo sério.
— Bom, isso estava óbvio, mas... — comentei sob devaneio, olhando os outros passeando ao redor. — ...você pensa em procurar algo assim mais pra frente?
— Quem sabe... na verdade, é o que todos querem, certo? — Ele solveu sua bebida. — É o que também quero, no fundo. Mas não se sabe onde pode estar a pessoa certa, então vivemos a vida. É assim que as pessoas aprendem sobre a sociedade em que se vive.
Dei de ombros, provando outro gole. E ele continuou:
— Mas também não é como se soubéssemos exatamente o que devemos fazer. Veja, nós perdemos o jogo de hoje. Estamos aqui relaxando neste momento por que ainda somos estudantes, não precisamos correr de um lado para o outro procurando por emprego e nem tendo uma família pra sustentar. O que estudantes como nós devem pensar neste momento?
Eu me fiz a mesma pergunta. Somos de uma escola avançada, ensinados a aprimorar nossos estudos a fim de conseguir bons empregos. Tenho minhas próprias razões pessoais para ir bem nos estudos, mas não é como se soubesse os motivos de todos ao meu redor. Inuzuka me indicou que, apesar das nossas perdas terem consequências, ainda estávamos na fase que podíamos pensar no assunto e tentar novamente.
Dei um tapa em suas costas e ele deu um sorriso zombeteiro. Não era um cabeça de vento, afinal de contas.
— Se não conhece sobre algo, vá a pesquisa... ou algo assim, então?
— Isso aí! Este é o espírito! — brandou Inuzuka. — Como eu lá vou saber o tipo de garota que gosto? O jeito é ir tentando e ver no que dá!
Ao menos não está agindo igual a Kikkawa, que avança para todos os lados sem pensar duas vezes...
Balancei meu copo quase vazio e refleti sobre aquele assunto idiota. Sim, nós somos idiotas. E era divertido ser assim. A única maneira que pudemos pensar foi de olhar adiante e tentar novos horizontes.
Nós não estávamos a fim das pistas de dança, então rodeamos o perímetro observando as garotas. Porém, Inuzuka não parava de comer, então foi meio difícil avançar muito.
Ainda por cima, começou a chover, o que fez todos se refugiarem nas tendas.
No entanto, algo ocorreu logo depois. De repente, aqueles nas pistas de dança começaram a correr, o som da música alta cessou e deu palco para um farfalhar de gritos e espasmos. Olhando na direção inversa da multidão que corria, reconheci um grupo grande de pessoas portando bastões de aço avançarem pelas vias do parque.
— Só pode ser brincadeira...
Olhei para Inuzuka, que assentiu. São os mesmos punks que apareceram em um dos jogos do interescolar.
— Droga, onde estão os outros? — exclamei, fitando a multidão. Os outros membros do time estão dispersos e fora de vista.
No entanto, Inuzuka reagiu de forma contrária do esperado.
— Há! Eu já estava era querendo que esses malditos aparecessem logo para um acerto de contas! — berrou, batendo os punhos. — Dessa vez, não vão escapar ilesos!
— Ei...!
Antes que pudesse impedi-lo, Inuzuka avançou em direção aos punks. Ele era rápido, mesmo tendo corrido longas distâncias durante o jogo desta tarde. Estou cansado, mas não posso perder para a energia dele, então o segui. Os punks estão atacando a qualquer um que entrasse no caminho, então tínhamos que tentar deter alguns, pelo menos.
Neste momento, não teve uma única troca de palavras. Aqui, seriam totalmente desnecessárias. Avancei acertando um chute no peito de um deles, que caiu atordoado, Inuzuka investiu contra dois desviando dos bastões e acertando um soco na cara de cada um. Pegamos seus bastões caídos e atacamos qualquer punk que passasse próximo de nós. Uma roda deles se formou ao nosso redor.
— Olha no que fomos nos meter... porque você sempre me mete nessas confusões, hein?
— Se não é pra terminar uma festa desse jeito, nem teria vindo! — exclamou Inuzuka, brandindo seu bastão. — É o seguinte, Takahashi: quem bater em mais, ganha! Venham, seus idiotas!
Não sabia se eram oito ou doze, mas todos vieram ao mesmo tempo. Recebi vários golpes pelos bastões, mas acertei violentamente vários no rosto de qualquer um na minha linha de visão pra sair do caminho, e Inuzuka fez o mesmo. Não precisávamos pensar no bem estar desses caras, então fomos com tudo. A roda se desfez em um instante.
Arfei pelo esforço em acabar com vários de uma só vez, mas ainda resta muitos deles, só que agora mais pessoas apareceram para ajudar a contê-los.
— Derrubei oito! E você?
— Ah, não contei direito... uns dez, talvez?
— Não começa a inventar número! Faça essa pilhagem de forma decente! — reclamou ele, abatendo outro marginal que surgiu de repente.
— Isso é bizarro, vindo de você...
— Ei, acha que são da Kanryou? — questionou Inuzuka. Kanryou foi uma das escolas participantes do interescolar, junto com a Daiichi, e a Yoriyoi, a campeã. A invasão dos punks ocorreu durante o nosso jogo com a Kanryou, por isso Inuzuka teve essa dúvida.
— Não sei... — respondi, incerto. — Nem mesmo pensei nessa possibilidade, nem a fundo do assunto..., mas pode ser provável. Se bem que é estranho quererem aparecer durante o próprio jogo e na festa de comemoração.
— É, tem razão... realmente não faz sentido.
Minha cabeça se encheu de dúvidas, mas nenhuma delas serão respondidas nesse momento. Podíamos tentar interrogar um dos punks que derrubamos, mas duvido que nos diriam algo... sem contar que daria muito trabalho.
Remoer tal coisa de algo que já se passou não combina comigo. Apesar da ideia idiota de Inuzuka, foi gratificante esmurrar quantos quisesse só para apaziguar minha raiva...
Depois de algum tempo, as viaturas chegaram. Elas bloquearam as vias principais e continham os punks com sprays de pimenta, alguns ainda jogaram bombas de gás lacrimogênio. Inuzuka queria continuar a espancá-los, mas o impedi.
— Se continuarmos, seremos confundidos com eles! Temos que ir embora, agora!
— Que droga!
Largamos os bastões e nos afastamos da multidão. Também era visível ambulâncias próximas, por muitas pessoas terem se ferido. Isso me deixou preocupado com os membros do time, então os contatei. Felizmente, eles estavam seguros próximos a estação.
Conduzi Inuzuka através das ruas escuras debaixo daquela torrente incessante. Após cruzar algumas quadras, chegamos onde nossos amigos se encontram.
— Vocês fizeram bem em se afastarem, está um verdadeiro caos naquele lugar! — exclamei para todos.
— Não gosto de entrar em brigas... — expressou Jinpei.
— Estar em brigas não faz o meu estilo... — comentou Kazebayashi. — E outra, não quero sair daqui com um olho roxo. Tenho um encontro marcado daqui há alguns dias!
— Ei, seu maldito! — Kikkawa quis enforcá-lo. — Já te pedi mil vezes pra me ajudar com alguma amiga sua e você faz é marcar encontro pra si mesmo?!
— Contenha-se, Kikkawa! Agora não é hora pra isso! — reclamou Kawashita, contendo-o.
— Resumindo a ópera, nós saímos do local assim que começou a confusão... — explicou Hiro.
— Não estávamos tão longe um dos outros, também... — explicou Morita. — Por isso, foi até fácil nos encontrarmos.
— O único problema foram vocês dois e o Kikkawa... — retrucou Kawashita.
— Ei, porque vocês sempre reclamam de mim?! — berrou Kikkawa.
— Por que desta vez foi difícil de achar você no meio daquela multidão! — reclamou Hiro. — Te ver tentando agir como um herói para qualquer garota que passasse pela sua frente foi terrível...
— Quase recebeu um golpe no rosto... — murmurou Jinpei. — Se tivesse pego, teria ido à nocaute.
— Quase perdemos o Hiro quando fomos te procurar! — ressaltou Totsuro. — Ainda bem que quando se trata de correr, você é perito nisso!
— Ah, não quero mais ouvir nenhum de vocês! — Kikkawa se curvou no chão, derrotado. — Eu só quero tentar parecer legal uma vez na vida e todos vocês me atrapalham!
Ninguém prestou atenção nele.
Por um instante, lembrei que Shiroyama e o grupo do clube de literatura poderia estar naquela festa também, o que me fez hesitar. Inuzuka me encarou, incrédulo:
— Ei, o que foi?
— Não, nada... Shiroyama não é do tipo que participaria de uma festa como essa... assim como o clube de literatura...
Porque me preocupei com alguém que só andou me causando problemas? Eu devia estar furioso com aquele sujeito mascarado a ponto de arrancar seu orgulho barato... que seja, apenas tenho que deixar tudo isso pra trás.
Dito isso, continuei a correr para dentro da estação junto com o pessoal, deixando aquele cenário violento e chuvoso para trás.
***
Aquela seria a última noite no hotel arranjado pelo treinador, então decidimos descansar. Eu e Inuzuka ficamos com algumas feridas diante de tantos caras que enfrentamos, mas nada sério. Ele começou a contar o que aconteceu com extrema empolgação, enquanto deitei na cama e adormeci sob o barulho forte da chuva lá fora.
No dia seguinte, um ônibus da escola veio nos pegar. A estrada não teve tanto trânsito, então conseguimos voltar para Chiba em uma hora, mais ou menos. Trazíamos conosco o troféu de segundo lugar, já não mais tão desanimados.
Quando o ônibus parou no campus da escola, entramos no prédio especial e colocamos o troféu na sala de prêmios localizado no segundo andar. Naquele momento, só havia nós do time de futebol, e a escola vazia parecia até um outro cenário.
Observei o celular sem muita pretensão, esperando que em algum momento Kumiko me mandaria alguma mensagem querendo saber das novidades, mas não recebi nada.
— Ao menos... — começou Kawashita. — Nosso próximo objetivo será o Festival Esportivo, e não terá problemas externos.
— Quem eram aqueles punks, afinal? — indagou Morita. — E como souberam da festa que teria depois do jogo?
— Só consigo pensar que foi a Kanryou... — expressou Kikkawa. — Eles são os mais suspeitos, no mínimo.
— Não lembro de a Kanryou ter históricos de alunos violentos... — expressou Kazebayashi. — Mas as coisas podem ter mudado, não sei.
— Será que vão tentar causar mais confusão por aqui? — temeu Hiro.
— Duvido. Deve ter sido coisa do momento... — apontou Jinpei. — Diante de tanta confusão, ainda não dá para ter certeza de que foram realmente eles.
— Isso você tem razão... — concordou Totsuro. — Mas pode ser que não precisemos mais nos preocupar... talvez.
— Sim, o jogo acabou e não estamos mais no território deles... — afirmei. — Vamos apenas esquecer tudo o que aconteceu e tirarmos o resto das férias para descansar e treinar.
— Então, estão todos dispensados! — berrou Inuzuka. — Vamos aproveitar as férias!
— Essa é a fala do capitão...
Depois disso, nos separamos, cada um para suas casas.
Passaram-se alguns dias, e o calor do verão entrou em seu auge, sob poucas chuvas. Como tinha que me preparar para o Festival Esportivo, sempre saía cedo para correr. Às vezes encontrava algum colega do time e fazíamos o percurso juntos, mas hoje parece que estarei sozinho.
De manhã, apesar de não estar num clima chuvoso, a brisa da geada foi mais intensa, então, coloquei um casaco para não me resfriar.
Enquanto corria, verifiquei a aba de notícias do celular. Poderia ser um motivo inconsciente, mas permaneci com a curiosidade de saber mais detalhes sobre Yokohama... o problema — que achei o mais estranho — foi não ter encontrado notícia alguma do ocorrido, mesmo em sites oficiais.
— Que raios está acontecendo?
Mesmo que não quisesse pensar no assunto, se tornou algo rotineiro sempre acompanhado dos treinos. Não tive como evitar... e não fui o único curioso. O treinador Koburo nos instruiu de termos mais cuidado nas próximas partidas externas, já que provavelmente possam usar o incidente de maneira negativa contra nós.
— Tenham em mente que, apesar do esforço de cada um ser o fator realmente importante, rumores indesejados podem fazer nos causar mal de forma psicológica...
— E quem é que vai ligar pra rumores idiotas?! — questionou Inuzuka. — Tem que ser muito imbecil!
— Você fala isso, mas sabe muito bem o que te aconteceu com o time de basquete... — resmungou o treinador. — Era quem mais deveria entender do assunto, seu cabeça de vento.
— ...que droga, treinador.
Eu realmente não ligo para isso, pessoas que procuram brigas desnecessárias não são hábeis em obter vitórias. São apenas coisas fúteis, no fim.
Foco. Mantenha seu foco. Coloquei o capuz sobre a cabeça e apertei o passo, como se pudesse deixar essas preocupações comendo poeira se avançasse cada vez mais. Contornei bairros, parques e vias. Quando parei pra descansar, notei que tinha percorrido grande parte do perímetro da área portuária de Chiba. Me encontrei em um parque próximo à escola, então me sentei em uma área gramada e fiquei ali por um tempo.
Há várias pessoas se divertindo no parque, me distrai fitando-as ao meu redor, até que me reparei com alguém conhecido.
Nana jogava vôlei com meus outros amigos de classe. Eles colocaram uma rede entre duas árvores e jogavam em duplas. As meninas usavam roupas leves e folgadas, usando biquinis por baixo. Talvez fossem à praia depois. Nana deu um salto e lançou uma cortada que decidiu a partida. Ela fica bem animada com algo que se dedica em fazer. Enquanto comemorava, me avistou e acenou para mim.
Devolvi o aceno e fui até eles.
— Treinando, Takahashi? — perguntou ela, ofegante.
— Um pouco... — respondi. — Alguma novidade?
— Ah, bem... — Nana conteve um riso, apontando para algo atrás de mim. — A novidade está chegando bem ali.
Ao me virar, me deparei com Kumiko. Ela também usava roupas leves. Sua blusa lilás foi amarrada no meio do abdômen, e há um lenço pendurado na cintura.
— Pessoal, eu trouxe a água e... — murmurou ela. — Oh, Takahashi...
Trocamos cumprimentos, surpresa ao me ver. Então notei que me encaravam por estar de casaco.
— Você é um gorila, por acaso? — brincou Nana.
O calor era tremendo que poderia derreter a qualquer momento. Tirei rapidamente o casaco e senti a brisa fresca do mar me refrescar. Os outros rapazes estão sem camisa, o que me fez perguntar:
— Vocês vão para a praia agora?
***
Não consigo entender quem gosta de nomear grupos, sinceramente. Ao meu ver, é algo irrelevante a ponto de querer debochar de quem cria tal coisa. Já faz muito tempo e não lembro em qual momento e quando nosso grupo se passou a ser chamado Grupo Takahashi... e nem soube o porquê.
O Grupo Takahashi chegou na praia e achamos um bom lugar para deixar nossas coisas. Nós, os garotos, avançamos através das ondas, competindo para ver quem iria mais depressa e mais longe.
— Ei, não vão se afogar! — exclamou Nana.
Praticamente não via os outros ao meu lado, dando constantes mergulhos. Ao olhar para trás, vi que hesitaram em entrar cada vez mais fundo na água, as correntes das ondas estão bem fortes.
— Seus medrosos! — dei risada e esperei uma onda imensa aparecer para retornar à margem.
Resolvemos fazer uma briga de galo, então a partida foi competida por duplas — ideia de Nana —. Antes que pudéssemos organizar os pares, ela se aproximou de mim:
— Farei par com Kuwasabe. Dê o seu melhor com Kumiko!
— Porque? É melhor não...
— Deixa disso! Não viu o quanto ela está toda tímida contigo? Não sei o que aconteceu, mas esse clima não pode continuar! Anda logo!
Kumiko ficou sob meus ombros e iniciamos a partida. Ela não me encarou muito, então não prestei atenção antes... seu visual mudou um pouco, não? E seu biquini combinou também. Nana tentava derrubar, enquanto corria de Kuwasabe entre a areia molhada.
— Corre! Corre! — Kumiko gargalhava, animada. — Oh, desculpe! Você não está cansado?
— Hum? Não... — Eu a fitei. — Você é bem leve, posso ficar assim o dia todo...
— Uh... o dia todo...
Vê-la nessa posição estranhamente me fez querer continuar a encarando. De repente, ela corou e pôs as mãos no meu rosto:
— Na... não me olha desse ângulo, Takahashi! Que vergonha...
— Assim não consigo ver nada... nós vamos perder! — brinquei, avançando contra a água. O ritmo das ondas limitou meus movimentos e após pouco tempo depois de Kumiko deixou de se agitar, fomos empurrados por Nana.
— Vencemos! Até que você dá pro gasto, Kuwasabe! — Nana vangloriou-se.
— Mesmo com a vitória, essas palavras não me deixaram nada feliz...
Emergimos da água e começamos a rir. Subitamente, Kumiko se agarrou no meu braço, agitada.
— Me ajuda, Takahashi! Não sei nadar!
Não sei quantas partidas nós fizemos ao todo, mas quando paramos, o sol já se ponha quase no fim do horizonte.
— Um dia de praia é o que significa estar de férias de verão, certo?!
Nana exclamou para o mar, que não lhe respondeu. Todos rimos. Compramos sorvetes e devagar fazíamos nosso retorno. Aquela tarde se passou em um instante. Parando para pensar, fazia muito tempo que não aproveitava um dia de tarde daquele jeito.
— Sei que treina todos os dias, mas mais cedo parecia distraído... aconteceu alguma coisa? — perguntou Nana.
— Ando com a cabeça cheia, por isso resolvi correr um pouco por aí... — disse.
— Takahashi com a cabeça preocupada? Será que vai chover? — brincou Ota, gerando uma salva de risadas.
Por que deveria estar tão preocupado? Aquilo não é do meu feitio. Não me importo com questões triviais, apenas aproveito o momento.
Nem sentia que deveria praticar tanto assim, e nem fiz tanta questão. Tenho um corpo prático, da qual tenho ciência de que se me empenhar o suficiente, posso superar qualquer obstáculo. O esforço é uma consequência que vem com o tempo. Não sou alguém desesperado por atenção, afinal.
O Grupo Takahashi é bem unido, mas não era perfeito. Bom, não espero muito deles, de qualquer forma.
— Aí, queria que esse tempo nunca mudasse... — murmurou Nana, distraída pelo pôr-do-sol. — Nossas férias duram bastante, mas quando voltarmos para a escola, só teremos poucos meses até virarmos veteranos do terceiro ano...
Logo virá a cobrança das provas chatas e exames de admissão das quais os professores vão nos pressionar a levá-las a sério. Tive que conter o riso... como se fosse algo realmente relevante. A vida real não é um período de estudo para provas, sabe. Em algum momento, isso vai acabar.
A vida real cobrará, e terá um valor alto.
— As férias mal começaram e você está pensando no final do ano? Não seja ridícula.
— Ué, mas é o que todos vão pensar em algum momento, não? — indagou Nana. — Não queria pensar nisso, mas esses tempos calmos vão passar... e não sei o que virá a seguir.
— Bem, sim... — concordou Ota. — Com todas as avaliações e provas desta escola, não vemos o tempo realmente passando. Daqui a pouco vamos sair por aí procurando emprego!
— E pra quê pensar nisso agora? — debochei novamente.
— Isso não te assusta? — questionou Nana. — Pensar no futuro?
Os outros pareciam estar esperando por aquela resposta, e apenas ri.
— Já sei como será meu futuro. Portanto, não preciso remoer sobre o assunto. Vou aproveitar a vida e é isso.
— Que bom, hein... — murmurou Kuwasabe. — Queria poder já saber o que quero fazer no futuro...
— Se não começar a levar isso a sério logo, Kuwasabe... vai se arrepender! — Nana o indagou.
A conversa continuou com Nana e Ota dizendo tópicos de interesse — fiquei até surpreso de o Ota estar tagarela... —, enquanto eu e Kumiko comentávamos. Entendo que era um assunto delicado, mas não simplesmente não me importo. Esportes? São um bom passatempo. Estudos? Me ajudam os conceitos básicos, o resto posso me virar.
Desde criança, aprendi que as coisas são dessa forma. Se você quer caçar motivações para ser esforçado, apenas conseguirá migalhas. Agora, se tiver esforço em tudo o que fizer, poderá conseguir tudo o que deseja. Mas, nem sempre será o que realmente queira fazer, e precisa apressar o tempo para tal? Uma hora vou descobrir por conta própria, tenha certeza de que vou esperar sentado, viu.
Eu e Kumiko nos despedimos de Nana, Kuwasabe e Ota na estação de metrô. Posso pegar um ônibus até minha casa, mas ainda tenho energia restando para voltar andando. No entanto, Kumiko me fitou curiosa:
— Vamos comer alguma coisa?
Estávamos perto do centro, podíamos passar num FamilyMart ou algo assim, mas não acho que isso não era convidativo para garotas exigentes como Kumiko. Estou bem com qualquer coisa para enganar o vazio do estômago, então concordei com sua ideia.
Ela sugeriu que fôssemos comer em alguma cafeteria. Não era chegado aos drinks com café, então aceitei um moca por ser gelado. Sentamos em um lugar para dois. A mesinha redonda mal cabia nossos lanches, mas as cadeiras longas são confortáveis, e tínhamos vista pela janela do céu em tons de violeta e laranja, anunciando o início da noite.
Notei desde muito cedo que Kumiko falou pouco com todo mundo. Isso me fez lembrar que ainda poderia estar incomodada com a pretensão de Shiroyama antes das férias começarem... ah, é mesmo. Cheguei a ver o rosto dele em Yokohama, será que deveria comentar a respeito pra tentar quebrar esse gelo?
Não... algo me diz que não foi mera coincidência ela querer me acompanhar e me trazer a um lugar a sós.
Sob seu olhar distraído pelo céu vespertino visto da janela, pude compreender suas intenções. Portanto... apesar do Shiroyama ter dito que poderia menosprezá-lo, não preciso fazer isso apenas pra iniciar uma conversa.
— E, então? O que quer falar?
— Oh, prefere que seja direto, então.
— Bem, por aí... — solvi meu moca. — Sou todos ouvidos.
— Aproveitou os jogos? — começou ela.
— Você ouviu o que eu disse? — indaguei. — Não precisa criar um clima pra chegar no assunto.
— Só tentei não ser invasiva, calma... — Ela levantou as mãos, como se achasse graça sobre o que disse.
— O que você quer saber?
— Vocês ganharam o segundo lugar, certo? Acredito que seu treinador esteja querendo que façam uma rotina intensiva de treinos, não é?
— Você acertou neste ponto, mas não quer dizer que farei isso. Quer dizer, posso fazer isso de vez em quando... sei lá.
— Bem, você tem muita confiança de si mesmo, não me surpreende... — murmurou Kumiko. — Mas, não ficou frustrado? Esteve se dedicando por quase todo o primeiro semestre para esses jogos, e quase deixou seus estudos de lado, não foi?
— E o que tem isso?
— Vi suas colocações decaindo por entre as avaliações. Agora, você está quite tanto nos estudos quanto nos esportes. Queria saber sua opinião como é essa sensação...
Senti uma veia saltando em minha testa. Segurei meu copo com força.
— E que diferença isso faz? Me dediquei para as duas coisas e esse foi o resultado, o que tem isso?
— Estou apenas avaliando suas ações, com base em tudo o que aconteceu antes do fim do semestre. Estou avaliando e pensando.
— Avaliando e pensando... e preciso disso? Não quero que ninguém avalie ou pense sobre mim, obrigado.
Terminei minha bebida com um gosto amargo. Me levantei e deixei o dinheiro no caixa, sem esperar por ela. Mas, aquela garota previu que sairia de imediato e logo foi ao meu encalço.
— Sua falta de humor é até bonitinho por não querer admitir que está frustrado com tudo o que aconteceu.
— Continua falando isso e vou responder algo mais do que um “não, obrigado” com um tom calmo... — retruquei. Tornei a andar mais rápido, mas Kumiko continuou a me acompanhar.
— Ora, vamos... — começou ela. — Não quero discutir com você. Apenas não consegue ver que estou preocupada com as ações deles? Depois de tudo o que aconteceu, não consigo mais confiar direito nas pessoas...
— Não consegue confiar? — indaguei.
— Você é diferente... os outros são diferentes. Nana, Ota... vocês me conheciam como era antes, e notaram o quanto mudei por não ter ninguém ao meu lado. Foram tempos difíceis para mim, e estou tentando ao máximo conseguir resultados nessa escola.
A voz dela havia algo melancólico, como se estivesse se segurando para não transbordar todos os seus sentimentos de uma única vez. Isso me fez lembrar daquele dia na biblioteca, onde cooperei com Shiroyama para desmascarar suas ações contra Yonagi, usando o antigo clube de jornalismo. Ela ficou acuada, e suas ações calculadas se perderam.
Ela segurou meu braço gentilmente, passando-o através do seu e se aproximou.
— Não quero desconfiar de vocês, que são pessoas importantes para mim. Principalmente, você.
Senti meu corpo pesar, e minhas pernas pareciam estar presas ao chão. O clima esfriava com a chegada da noite.
— Eu... estou sondando o Shiroyama. Não vou deixar que ninguém domine minhas ações. Se ele resolveu se empenhar pra me ajudar no Festival Esportivo, então que seja. Neste caso, toda ajuda é bem-vinda, certo?
Apesar de haver várias oportunidades das quais posso me aventurar, é ruim obter os mesmos resultados toda vez. O time de futebol, mesmo sem transparecer, se desanimou com a derrota e nossa motivação não voltará de um dia pro outro. Tinha que buscar o estímulo em algum lugar, de algum jeito.
— Mas, é só a ajuda dele que você quer? — Kumiko perguntou com uma voz doce, e apoiou sua cabeça em meu braço. — Posso te ajudar a ter mais coisas com o apoio do conselho estudantil, sabia?
— Ainda... ainda não sei o que fazer. Preciso pensar... — comentei, caminhando devagar. Não soube para onde deveria ir a partir dali, já que Kumiko não demonstrava vontade de ir embora.
— Por que não pensamos nisso juntos? — continuou a garota, com um sorriso infantil. Ela me olhou nos olhos e disse: — Quero ficar mais tempo com você, Takahashi.
...
O que eu devo fazer?
O que está passando na mente dela ao me dizer aquelas palavras?
Engoli em seco, pois sei que poderia apenas zombar do seu jeito meigo como sempre fiz com os outros. Por que não fiz isso?
Grunhi em silêncio. Será porque nunca a vi ser assim com outra pessoa além de mim?
Apesar da confusão, me senti satisfeito. Eu que causei essa mudança nela, e não tenho certeza até onde isso pode chegar. Nossa relação ainda é uma incógnita pra mim..., mas não acho isso ruim.
Soltei um pigarro, e disse:
— Bom... porque não janta em casa hoje? Não costumo receber muitas visitas além do pessoal do time.
Após isso, visualizei seu rosto confuso, que piscou algumas vezes, e soltou um sorriso travesso depois:
— Isso vai ser legal! Obrigada!
Uma brisa gelada contornava a todos que andavam na rua, mas ao sentir a presença dela próxima a mim, que mesmo ainda molhada pelo mar senti seu calor e não me importei com mais nada ao redor. No entanto, seus dedos são mais frios do que a geada de manhã.
***
Em minha família, praticamente todos os meus parentes são e foram militares. Tenho dois irmãos, um mais velho e outro mais novo. Fazia muito tempo que não via Tsutomi, meu irmão mais velho, por ele estar sempre ocupado pelo trabalho. Meu pai se aposentou da carreira militar e trabalhava no porto, enquanto minha mãe é enfermeira. Não sei que tipo de profissão meu irmão mais novo Irumi deseja, mas eu seguirei os passos de Tsutomi. Tomar o rumo da carreira militar é quase que uma tradição.
Sei muito bem que preciso me dedicar de corpo e alma para conseguir esse objetivo, dar tudo de mim. E isso me gerou uma dualidade sobre o que estou vivenciando no momento... o que há de tão importante durante o ensino médio? Não poderia apenas pular essa parte e ir direto para a ação?
Quanta coisa inútil.
Tsutomi uma vez me disse que o tempo em que somos adolescentes é cheio de arrependimentos. Se não fizéssemos tudo e além do nosso alcance, nos sentimos corroídos por anos. Tomei esse conselho como uma lição de vida pra aproveitar ao máximo a todo momento.
E exatamente por esta razão que tiro sarro de tudo. Tenho que ser o melhor no que gosto, e se for mediano no resto que não me apetece, não é importante. Neste Festival Esportivo serei o vitorioso, e não há como dar outro resultado. Kumiko não precisa se preocupar.
O céu já virou anil escuro quando chegamos em casa. As luzes estavam apagadas, então só poderia significar que Irumi saiu para brincar na casa de algum amigo e meus pais estão trabalhando. Enquanto Kumiko se esparramava no sofá, me encarreguei de esquentar a comida para nós.
Minha mãe preparou curry, então foi basicamente esquentar e comer. No entanto, em vez de apenas esquentar os pratos, mantive a panela aquecida para Irumi quando chegasse.
Cerca de quinze minutos depois, o jantar foi servido na mesa. Kumiko se juntou a mim e começamos a comer. De repente, ela estendeu sua colher para minha direção com curry.
— Olha o aviãozinho!
— Hein?
Ficamos alguns segundos nos encarando, até que ela desistiu e botou a colher na boca.
— Não me diga que você é um daqueles garotos que ficam preocupados de compartilhar utensílios que sejam um “beijo indireto”?
— Não seja idiota, não ligo para isso... — disse, afanando a mão. — Se fosse querer contato de verdade, faria isso dando um beijo de verdade.
Kumiko riu com minha resposta.
— Beijo de verdade, né? — ponderou a garota. — Quanta ousadia a sua, hein...
Terminamos de comer e ela me ajudou a lavar a louça. Irumi ainda não havia chegado, então não soube o que deveria fazer. Como está ficando tarde, é uma boa ideia acompanhar Kumiko até a estação mais próxima e...
Enquanto pensava, algo me puxou até o sofá da sala. Kumiko havia me empurrado e ficou em cima de mim, prendendo meus braços, com um rosto zombeteiro.
— O que está fazendo? — indaguei, imóvel.
— O que você acha que está deixando eu fazer? — provocou ela. — Não te disse que foi ousado antes?
— Ousado, hein...
— Apenas decidi que o melhor é tomar uma atitude quanto ao que você disse... — brincou. — Ou vai voltar atrás do que disse? Se for, a hora é agora...
Grunhi. Que garota ardilosa... é óbvio que poderia facilmente me desvencilhar dos seus braços sobre os meus, mas senti curiosidade sobre o que ela iria fazer.
— Faça o que quiser... não vou me opor.
— Tem certeza? Será que não vai se arrepender?
— Talvez minha melhor resposta seja me arrepender de não deixar você fazer isso.
Independente de tudo, seguirei minha ideologia até o fim.
— Ousado e convencido..., mas gosto disso.
Ela sorriu e aproximou o seu rosto no meu. O vislumbre de seus cabelos caindo sobre mim não me preveniu quando seus lábios me tocaram. Em dado momento, soltou seus braços de mim e os posicionou ao meu rosto para manter o beijo.
O beijo teve gosto de curry.
Ela afastou o rosto e se levantou, arrumando o cabelo. Sua cara está vermelha, mas suas feições ainda são zombeteiras, com uma sutileza infantil.
Me ergui atônito, confuso e ansioso. Ficamos nos encarando durante um momento, meus olhos não paravam de piscar.
— É... você fez mesmo.
— Acho que isso deve valer como prova da confiança que tenho em você... — murmurou Kumiko, com uma pose triunfante.
— E tem que acabar só com isso? — indaguei, chamando sua atenção. — Uma prova de confiança tem que valer mais do que um mero gesto, não acha?
Kumiko inclinou um pouco o rosto, rindo no fim. Ao me levantar, segurei sua mão e a envolvi num abraço. Apesar de suas mãos frias, pude sentir o calor emanando de seu corpo pequeno.
— Se eu confio em você por ter me beijado pela sua lógica, então vai confiar em mim por te tocar, certo?
Nossos rostos estão muito próximos, senti sua respiração quente se expelir com certa intensidade. Admito que contive a vontade de rir pela tentativa de deixá-la sem jeito, mas essa garota não desviou o olhar, mesmo quando encurtei a distância. Ela entornou seus braços em mim, e a beijei no mesmo instante. Não sei se foi pela excitação, mas nos envolvemos com um fulgor maior, sem querer parar de sentir seu gosto. Em rápidos segundos, trocamos de posições, deixando-a estendida pelo sofá. Me ergui para recuperar o fôlego, enquanto ela tocava seus lábios, distante.
— ...me tocar, é?
— O que acha? — perguntei.
— Pode não ser ruim, acho — Ela fechou os olhos, proveitosa. — São momentos como esse que o instinto fica acima da lógica, não é?
Não quis responder, como se quisesse. Tirei a camisa rapidamente e estendi minha mão, na qual ela pegou. A conduzi em silêncio em direção ao meu quarto, verificando o horário do relógio na cozinha.
Bem... se ninguém da minha família apareceu até agora, então desejei a mim mesmo que essa casa só tenha a nós dois por mais algum tempo.
***
Enquanto ela se abana para afastar o calor, eu a segui até a entrada de casa.
— Posso te acompanhar até sua casa, se quiser. Você está bem?
— Mais cedo, saiu da cafeteria sem nem olhar na minha cara... — indagou ela. — Eu devia ter te beijado antes, viu...
— Não é pelo beijo. Afinal, sei beijar bem... — dei de ombros.
— Deixa disso, seu folgado! — Ela riu, batendo em minhas costas. — Brincadeira, só quis te provocar. Pode deixar que vou sozinha, estou bem.
Ela andou alguns passos, até se virar pra mim novamente:
— Ou quer um beijo de despedida? Se você admitir que sou incrível, posso até considerar...
— Não seja besta... sei que quer fazer isso tanto quanto eu... — resmunguei. — Tivemos bastante tempo pra confirmar isso.
Porém, ela se aproximou rapidamente e me beijou na bochecha. Fez um rápido aceno e tornou a seguir em direção à estação, desaparecendo ao cruzar a esquina. Permaneci parado ali, ainda processando o que aconteceu.
— Não tem jeito... não consigo entendê-la...
O que aquilo deveria significar, hein? Foi alguma coisa, certo? Como devo interpretar essa situação?
Como essa garota me deixou assim e saiu sem hesitação? Por acaso, ela acha que isso poderia ocorrer a qualquer momento? Espera, será que ela virá de novo?
Esfreguei meu rosto várias vezes e ainda sentia seu toque. Meus lábios ficaram com o sabor forte do curry e uma sensação picante.
— Ela não sabe o que acontece quando alguém me provoca? Se isso aconteceu por parte dela, então quer dizer que posso exigir o mesmo depois, não é?
Fechei o portão e tornei a correr. Não tenho uma direção específica, apenas quero esfriar a cabeça. Minhas orelhas ardiam, assim como meu rosto. Minhas pernas pareciam tão leves para correr que mal notei quão rápido avancei pelas ruas. O vento gelado era muito refrescante e ver o entardecer me deixou confortável. Há infinitas possibilidades que posso fazer, correr, jogar, posso... posso...
Foi como Tsutomi me disse. Tudo é uma questão de não se arrepender do que se é feito. Que se dane o que venha depois! Eu quero curtir enquanto posso e dar tudo de mim para seguir meu objetivo!
A partir daí, foi o começo às minhas investidas em Kumiko. Essa garota é páreo duro, mas não sou alguém que se dobra aos outros com facilidade. Vou insistir até conseguir algo, e aproveitaria o momento, pois é o que mais desejo ter com ela daqui para frente.
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