Volume 1 – Arco 2

Capítulo 12: “Por Favor, Me Solte”

E então finalmente Quevel foi em viagem, no dia seguinte de manhã, se despedindo das duas crianças que ficariam para trás na casa, acenando para ele com sorrisos, um sorriso animado da parte de Ahrija e um mais contido de Elia.

Curioso como aquela criança parecia mais velha do que realmente era.

Mas isso era coisa para depois, precisava fazer aquela viagem para conseguir trazer os pais dela para uma conversa, era de fato mais importante do que pensar em por que raios uma criança ficou tão feliz em ficar sozinho por dois dias.

Elia ficou em silêncio vendo o dracônico sumir entre as árvores antes de entrar na casa de novo:

— Você quer… Ué, o que você vai fazer? — Ahrija comentou enquanto via a princesa entrar.

Ela foi direto para a estante de livros que estava ali, puxou uma cadeira para subir, tinha um livro específico que queria ler desde que acordou, com cuidado desceu da cadeira já com o livro que era grande demais para si, o colocou no chão e começou a ler.

Era um livro sobre manipulação de mana, mesmo que não lembrasse de tudo que viveu no mundo astral, queria relembrar a manipulação de mana da melhor forma possível, ainda não sabia qual significado do seu novo olho, mas iria aprender aos poucos:

— Você sabe ler dracônico? — Ahrija se aproximou para ver.

— Sim, você também né? — Elia olhou para o garoto com um sorriso calmo.

— Sei sim, mas não sei ler em humano. — Admitiu baixinho.

Não entendeu.

Nem todas as crianças sabiam disso, mas até que percebeu, ela sabia.

Ele estava se sentindo mal por isso? A garota sorriu e fechou o livro, deixaria isso de lado por um momento:

— Quer que eu te ensine?

Eram duas crianças, ambas de idades próximas e pequenas, eram prodígios, querendo ou não, já sabiam ler com pouquíssima idade:

— Você faria isso?

— Claro, senta aqui.

Iria pegar papel e tinta para começar sua pequena aula, a verdade era que dracônico e humano eram idiomas bem parecidos, então o garoto não teria muita dificuldade, ao menos assim esperava.

Elia percebeu que Ahrija era bom de leitura, conseguia aprender rapido aquilo que lhe era mostrado.

As horas pareciam se seguir sem qualquer problema enquanto os dois se esforçavam na leitura e na escrita, numa manhã não seria possível ensinar tudo para Ahrija, mas mesmo assim tiveram um avanço considerável naquele tempo curto.

A sala de chão de pedra estava repleta de papéis riscados de palavras que eles estavam estudando, algumas anotações sobre os idiomas, mas os estômagos finalmente reclamaram de fome.

O sol alto na fora já indicava que era hora de almoçar, por sorte Quevel deixou a comida pronta para apenas eles se servirem, Ahrija que se responsabilizou por isso, tomando a frente em cima do banquinho:

— Seu nome é legal. — Elia continuava a conversa enquanto segurava os pratos para a mesa. — “Ah” vem de ar, e Rija vem do dracônico, significa “celeste” então seu nome é tipo “Ar Celestial”

Falava sobre isso enquanto iam pro chão comer, subir nas cadeiras parecia desnecessário já que só tinham os dois ali, poderiam comer no chão sem problemas, correto?

Ainda conversavam sobre coisas aleatórias, parecia ser uma conexão simples e pura entre duas crianças, mas aquilo no fundo machucava Elia, não de uma maneira ruim.

Nessa nova vida tinha amigos de verdade, amigos que não tinham medo dela, que pareciam gostar dela por ser uma pessoa e não pelo poder que supostamente tinha, se é que teria poderes, ainda não tinha certeza, para Ahrija o sentimento era parecido, mas não idêntico.

Desde que foi adotado por Quevel a um ano não teve contato com outras pessoas fora seu mestre e quase “pai” para si, e com Elia tinha ali alguém da sua idade para conversar, alguém que o escutava sem reclamar, o que era ótimo.

Sentia falta daquele contato, mas também tinha um medo ali, um medo completamente fundado:

— Alteza… Somos amigos? — Perguntou interrompendo a fala de Elia.

Olhava seu prato pela metade, com medo de uma resposta negativa, o que fez a princesa se surpreender, mas logo sorriu colocando a mão no seu ombro:

— Sim, Ahrija, somos amigos, mas para de me chamar de alteza.

— Claro, alteza.

Ahrija sorriu mostrando todos os dentes, inclusive as presas pontudas que ele tinha, fazendo Elia ficar emburrada e voltar a comer sem falar mais nada, o dracônico deu uma risada daquela situação.

Era uma criança.

Ambos eram crianças afinal, aquela implicância deixou o coração de Eliassandra mais quente.

Tinha amigos.

Amigos de verdade.

Segurou a expressão emburrada, não queria sorrir na frente daquele garoto que claramente sabia que era irritante.

Continuaram a refeição sem muitos feitos, até finalmente acabarem, Elia se apressou para lavar os pratos enquanto Ahrija organizava aqueles papéis que estavam antes no chão:

— Então… Quer sair? — O garotinho perguntou olhando pela janela.

— Acho que não podemos fazer isso.

— Eu sempre faço.

Ahrija sorriu animado, queria muito sair, mesmo com o não previo de Eliassandra, enquanto a garotinha andava pela casa, ouvia os pedidos quase incessantes o outro para poder ir seja lá onde.

Andava pela casa até bufar com aquilo:

— Certo, você ganhou. Vamos lá.

O garotinho dracônico festejou quando sua proposta foi aceita — depois de longos minutos insistindo. A princesa foi colocar um par de sapatos, os mesmos que sua mãe mandou quando veio para lá dois meses atrás, iria finalmente seguir Ahrija:

— ‘Pra onde vamos?

— Tem uma clareira cheia de árvores frutíferas. Quero te mostrar!

— Ah?

Queria dizer que era só isso, mas ele parecia tão feliz, não quis estragar aquele momento de felicidade que ele estava tendo.

Pela primeira vez estava saindo além do quintal daquela casa tão jeitosinha.

A floresta negra era realmente escura, não para Ahrija que além de ter uma visão mais adaptada por ser dracônico e por conhecer o local, avisando sobre as raízes altas, falando sobre algumas coisas, mas parecia que ele não conhecia os perigos.

Ou talvez aquela parte em específica não tivesse muitos perigos? Não sabia ao certo, mas sentia aquela segurança por um tempo, e também a felicidade por estar tendo um momento mais ou menos comum por um momento:

— Chegamos!

Era um pequeno pomar, de fato com muitas árvores, algumas carregadas de frutas, algumas sequer conhecia, mas parecia um lugar aconchegante de ficar, passaria um tempo ali, dormindo numa rede.

Que sonho…

— Aquela ali tem frutas docinhas.

— Mas acabamos de comer.

— E?

Ahrija deu uma risada começando a subir na árvore com tamanha destreza que fez até Elia ficar surpresa, parece que era acostumado a fazer aquilo, e aparentemente parecia seguro, então logo estava atrás dele para subir também. E então os dois estavam ali em cima, sentados sobre um galho:

— Sabe… Você é a primeira amiga que eu tenho.

Elia pensou sobre aquela afirmação e sorriu:

— Eu tenho outra amiga, a Daphne, deveria conhecer ela, ela é bem legal.

Como será que ela estava? Será que as outras crianças ainda estavam enchendo ela?

— É? Como ela é? — Ahrija tentou demonstrar curiosidade.

Mas no fundo sentia um leve desconforto.

Elia sorriu para ele:

— Quando você for pro reino, eu te apresento ela, que tal?

— Certo.

Estava com ciúmes? Não era possível! Achou uma das coisas mais fofas do mundo, estava sorrindo vendo o rosto emburrado de Ahrija:

— ‘Tá com ciúmes?

— Não.

Virou o rosto ainda todo sem jeito, o rosto estava até vermelhinho, o que Elia achou uma gracinha, era mesmo uma criança, com problemas tão fúteis que ficava feliz.

Fechou os olhos, sentindo aquela brisa sutil no seu rosto, lhe dando aquela paz que só teve nessa vida, mesmo depois de quase morrer naquele limbo, estava em paz.

A conversa continuava, Elia falando sobre sua vida no castelo, sobre sua mãe e tias e dos seus dois irmãos:

— Uau, você tem três mães?

— Não não, minha mãe é a Rainha Elengaria, Lady Leopolda e Lady Ana Bael, Lady Leopolda é mãe do Ferrer, meu irmão mais velho um, e Lady Ana Bael é mãe do Ian. — Elia falava com orgulho da sua família.

Ahrija escutava tudo com atenção, talvez um dia soubesse o que era essa sensação de ter uma família, até sorriu pensando nisso:

— Quando eu tiver idade, quero ter muitas esposas e ter muitos filhos!

— Meu pai tem três. — Elia encorajou sorrindo.

De fato, será que teria mais irmãos? Gostaria de não ser a mais nova, quem seria a felizarda? Não sabia se sua mãe teria mais filhos, a gravidez foi complicada, quem sabe Leopolda? Ou Ana Bael…

Ela tinha cara de que iria querer mais filhos.

Aqueles pensamentos a faziam sorrir de forma sonhadora, junto com Ahrija, o cheiro de frutas se misturava com o de plantas, deixando aquela tarde ainda mais calma, poderiam ficar ali, mas algo interrompeu.

Um crack.

Ahrija olhou para Elia com preocupação, e só conseguiu tempo de se aproximar para segurar sua mão quando o galho se partiu e a criança quase caiu:

— Droga!

— Calma, é só me puxar. — Elia tentou tranquilizar enquanto olhava para o dracônico.

Só aquilo deveria ser suficiente para o dia estar ruim, mas os rosnados chamaram mais atenção, Ahrija tremeu, não deveriam ter lobos aqui! Eles estavam alto o suficiente para não ter medo, mas com a princesa pendurada daquele modo tudo ficava preocupante:

— Eu vou te puxar.

Mas a mão de Ahrija escorregou.

Então Elia entendeu.

Não tinha como os dois se salvarem nessa situação.

— Ahrija. — Elia chamou com um sorriso. — Me solta

O garoto arregalou os olhos sem acreditar que ela diria algo como aquilo, mas Elia disse, pelos cálculos dela não daria para ela sobreviver, não nessa situação.

Não tinha magia, ele não tinha força suficiente e sentia que aquele galho não iria aguentar os dois daquele jeito. Se ela caisse os lobos iriam nela e Ahrija poderia correr.

Era um plano simples.

Mas Ahrija sequer pensou nisso, estava puxando ela de novo, mas sentia que escorregava:

— Você vai cair. Me solta.

— Não!

Os rosnados dos lobos de pelo cinzento e olhos vermelhos estavam cada vez mais perto, e depois os barulhos semelhantes a latidos começaram, tentando pular para pegar a criança:

— Ahrija…

— Eu não vou soltar você!

— Não vai aguentar nós dois…

Elia sussurrou abrindo a mão, se deixando começar a escorregar.

Fechou os olhos, esperando a queda, Ahrija gritou quando a sua amiga escorregou, não conteve seus impulsos, se jogando para pegar seu corpo, seria uma morte dupla.

Iriam morrer os dois.

Mas os braços de Ahrija envolveram o corpo de Elia com força e uma cúpula de ar se fez presente ao redor dos dois, jogando aqueles lobos contra as árvores, os lobos soltaram uivos agudos de dor e saíram correndo fazendo barulho pela floresta, com medo. Com medo dele.

Ahrija ainda abraçava o corpo de Eliassandra com força, sem abrir os olhos, até chorava um pouco, o corpo tremia de medo e nervosismo, por outro lado a princesa olhou ao redor, prestando atenção em tudo.

Os lobos, algumas árvores machucadas, os corpos perfeitamente intactos no chão, mas grudados. Aquele aperto machucava Elia, sentia as costelas serem apertadas.

— Ahrija.

Tentou chamar com animação, e certa dor, dando tapinhas nas costas do garoto que não se mexia de medo, mas seus olhos se abriram aos poucos, soltando a princesa aos poucos, mas não tirou os braços do redor da criança amiga que tinha:

— E-Estamos vivos.

-Sim! Estamos!

Elia riu abraçando o garoto agora, o derrubando no chão, e agora Ahrija ria, seja de desespero ou alívio, quem liga? Estavam vivos afinal! Mas para Elia tinha uma coisa muito mais importante que sua vida no momento.

O garoto despertou.

Ahrija tinha despertado o primeiro elemento como dracônico, não só isso, pequenos chifres pareciam brotar da testa do garoto do ar.

Estava crescido.

Estava desperto.

— Ahrija…

Elia chamou a atenção dele, ou tentou, tocou os chifres diminutos que estavam crescendo na testa de Ahrija, e finalmente a ficha dele caiu.

Finalmente.

Finalmente percebeu aquilo direito! Tinha despertado mesmo!

Sua vida como guerreiro dracônico estava finalmente começando.

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