Volume 1

Capítulo 17: A Era da folia, Parte 3

Gritos restauraram os ânimos da torcida apaixonada. Ao resgate de seu líder de esquadrão, Kazo interferiu no duelo entre Proxie e Falco. A perna da garota foi segurada pelo homem com o colar de plumas vermelhas. Com Roccan distante da confusão, a competição se tornou uma disputa de dois contra um. Lâmpadas verdes, responsáveis por iluminar os pés da competidora em desvantagem, indicavam o momento de ouro da dupla favorita.

— Pontual como sempre, Kazo. 

— Depois de todos esses anos como seu subordinado, não imaginei que recorreria a truques tão baixos. Senhor Falco, às vezes você até me surpreende.

— Não há truque algum. Trata-se de uma luta entre equipes. Se essa fracassada não consegue aceitar algo tão simples, então nem deveríamos concedê-la a chance de batalhar.

— Nesse caso, seria pertinente encerrarmos logo essa humilhação?

— Nunca estivemos aqui para brincadeiras. Os Jogos da Folia são um espetáculo apenas para o público.

Com a perna humana de Proxie imobilizada, Falco partiu em busca do último ponto de equilíbrio da jovem. A prótese mecânica nunca esteve tão exposta quanto naqueles míseros segundos de abertura. Um chute impossível de ser desviado. O homem realizou a ofensiva derradeira, à medida que se aproximava do membro comprometido. 

Contra as expectativas daqueles dentro e fora da arena, o desfecho do ataque foi postergado abruptamente. Os braços da garota se recusaram a ceder, quando o golpe do oponente foi interceptado pelas próprias mãos da figura em perigo. A perna metálica continuava com a mera utilidade de manter-se de pé, enquanto as estruturas de carne e osso faziam o trabalho sujo. Com o uso exclusivo de seu corpo biológico, Proxie parou os movimentos dos dois atacantes de maior ranque.

— Inacreditável!! Reviravolta após reviravolta, o show de hoje acaba de entregar uma sequência estupenda!!! A Escultora de Ranque F se mantém viva na competição! — exclamou o apresentador.

Na arquibancada, Jiro permanecia apreensivo. Nenhum dos últimos acontecimentos parecia mudar o resultado esperado para o evento. Pequenos esforços aparentavam ser irrelevantes perante o verdadeiro problema, ainda inalterado.

Contorcendo a sua perna agarrada, Proxie surpreendeu Kazo através de uma escapada inusitada. Com seus dois pés de volta ao chão, a garota se distanciou brevemente dos adversários.

— Vocês são mesmos dois desgraçados… Isso me deixa com mais vontade de surrar esses rostos exibidos.

— Você está vendo as mesmas oportunidades que nós, Proxie. Não vai vencer apenas fechando seus olhos. — Falco a confrontou.

— Não somos iguais.

— Definitivamente não… com todas as bênçãos que recebeu, eu já estaria no Ranque S.

— Você quer o moleque na sua equipe? Pode levá-lo!! Pode levar cada uma dessas coisas! Eu vou te vencer sem elas!!!

— Por que quer tanto subir na classificação da resistência? Pretende chegar no topo e ignorar todos os benefícios, como fez até agora?

— O ranque não é uma conquista para mim. É uma meta que foi tirada do alcance do meu pai! Os benefícios serão dele, não meus!!

— Patético… então, não deveria se importar em perder a sua nave também.

— Devolva a nave do meu pai!!!

Uma reação imediata. Proxie avançou novamente contra Falco, no entanto, desta vez o sujeito possuía companhia. Kazo partiu para a proteção do seu superior. Golpes rápidos e ilógicos mantiveram a dupla temporariamente instável, sem êxito em responder ataques movidos pelo puro ódio. Chutes foram desferidos a partir de uma única perna, cuja composição de carne e osso tornava os acertos rápidos, porém leves. 

A prótese metálica seguiu em contato com o solo, completamente dispensada durante o combate. Os ideais da garota conduziram a ação por meio de uma abordagem impulsiva. Imersos no caos da imprevisibilidade, a compreensão dos alvos era dificultada pela movimentação desordenada.

— Acalme-se, Kazo. Ela é a mesma desesperada de sempre.

— Você realmente sabe como desestabilizar alguém, senhor Falco. Eu não gostaria de ser seu inimigo.

— Cale-se e espere uma abertura. Ela não mudou nada. Isso significa que irá falhar, como sempre fez.

— O pior esquadrão é verdadeiramente lamentável.

Como se estivessem atingindo cascos de tartarugas, os punhos de Proxie não conectavam à superfície desejada. Bloqueios interceptavam socos carregados de fúria, que não conseguiam progredir para além da defesa adversária. O embate se encontrou em uma monotonia deprimente.

Diante da performance ineficiente da garota, a plateia persistiu na torcida pelo Ranque A. A coloração verde do piso ainda ressaltava o momento decisivo. Somados ao estado conturbado da mente atacante, gritos contraditórios elevaram o estresse da jovem ao limite.

— Acabem logo com isso, vocês dois!!

— Vamos, Kazo! Derrube essa fracassada!

— Vejam que patética! Está apenas desperdiçando energias!!

— Essa escória está estragando o show!!! Livrem-se dela!!

Alheio ao ímpeto dos demais espectadores, Jiro poupava a sua voz para se concentrar somente no desenrolar da ação. Olhos atentos procuravam detalhes minuciosos, enquanto a mente operante tentava decifrar o sentido por trás das decisões tomadas.

"Esses dois não costumam lutar usando seus corpos. Nessas situações, não importa o quão altas sejam suas classificações, não passam de combatentes inexperientes. Essa seria a sua melhor chance, Proxie…"

Mais insultos foram emitidos pelo público, cuja agressividade sufocava a garota julgada. 

— Essa miserável está atrapalhando o nosso entretenimento! Tirem-a do palco!

— Ninguém veio aqui para assistir uma idiota de Ranque F! 

— Esperei até o final do evento para ver esse desastre? Devolvam o tempo que eu perdi!

A pressão exercida por Proxie contrariava a vontade da maioria, à medida que insistia em ofensivas cada vez mais curtas e diretas. A essa altura, seu sangue era como um motor superaquecido, o qual agia de modo limitado e incoerente. Os competidores alvejados não eram capazes de parar a garota descontrolada. 

Em contraste com a indignação crescente do restante da arquibancada, Jiro insistiu na quietude. Seu raciocínio se aproximava de uma conclusão.

"Você está dando trabalho apenas com golpes aleatórios e irracionais. Além disso, está lidando com uma dupla, sem qualquer auxílio. Até mesmo a plateia está gritando, enquanto te menospreza. Poderia encerrar a disputa aqui. As condições estão todas ao seu favor, deveria parar de ignorá-las."

Tais pensamentos foram sobrepostos pelos anseios da torcida, faminta pelo entretenimento que escapara de suas mãos.

— Fracassada!

— Miserável!

— Escória!!

— Verme!!

— Desgraçada!!!

— Estrume!!!

— Eu teria vergonha de ser da sua família!

Os dentes de Proxie rangiam, juntamente ao maquinário em seu membro inferior. A raiva fluía em suas veias, prestes a liberar todo o desgosto entalado em sua garganta. 

Um passo em falso. O rápido deslize desestabilizou a prótese mecânica, responsável por comprometer integralmente o equilíbrio da garota. Falco e Kazo reagiram imediatamente à brecha concedida. O homem com o colar de plumas segurou um dos braços da garota, ao mesmo tempo em que o líder de esquadrão agarrou a verdadeira perna da humana, imobilizando-a por completo. Lâmpadas verdes iluminavam o piso de mármore, preparando o terreno para uma queda sem escapatória.

Desapontado, Falco encarava a adversária, que não conseguia conter o temperamento violento. Condenada a mais um fracasso, a garota era obrigada a ouvir as palavras de seu oponente, que poderia derrubá-la a qualquer segundo, conforme seus interesses.

— Sabe, Proxie… Você e aquele velho realmente não combinam. 

— O que disse?

— Quando encontramos ele naquele hospital, ele estava em um estado deplorável. Um fracasso absoluto, sem dúvidas. Ele estava apenas aguardando pela morte, mas há algo pelo qual ele jamais poderá ser julgado.

— Não ouse…

— Aquele homem usou tudo que a sua existência miserável permitia. Além do mais, ele ainda está vivo, certo? Seu corpo continua lutando com tudo ao seu alcance. Apesar de serem pai e filha, vocês são totalmente contraditórios.

— Pare…

— Talvez, ele devesse apenas partir de uma vez. 

— Moleque, faça meu soco acertar esse desgraçado.

— Você não merece a existência de alguém como el–

Punhos cravaram a sua marca na face de Falco, através de um movimento conduzido por partículas rosas. Um portal, ao lado do rosto alvejado, garantiu a travessia para um golpe impossível de ser desviado. O impacto impulsionou o alvo para longe, libertando a perna da garota de mãos indesejadas. 

Com o queixo atingido, o corpo do homem fraquejou, colocando seu equilíbrio em cheque. A tontura tomou a mente da vítima, que resistiu bravamente à tentação do cansaço, enquanto usava todas as forças para manter-se de pé por qualquer mísero segundo adicional.

Diante do ápice de tensão, o silêncio dominou a arquibancada. Tal fato ocasionou o desligamento das lâmpadas esverdeadas, e consequentemente espantou o nervosismo do momento decisivo. Em um cenário onde a sua vulnerabilidade não comprometeria a vitória, Falco despencou sobre o chão escurecido.

— Até que essa competição não é tão ruim. Aqui, eu posso amassar o seu rosto sem ser punida. — Enfim aliviada, Proxie expressou sentimentos genuínos.

— Finalmente…

— Queria tanto assim apanhar?

— Queria ter mais motivos para varrer o seu nome da resistência.

A adrenalina havia deixado todos os espectadores boquiabertos. Durante um breve instante, calafrios fizeram o impossível ser cogitado, com a passageira, porém real, chance de derrota da dupla favorita. Após segundos na tentativa de compreender os acontecimentos anteriores, o apresentador encontrou palavras adequadas para expor suas emoções.

— Meus olhos não estão me enganando, certo? Inacreditável!!! Por detalhes que nem sequer a ciência consegue explicar, Falco permanece na competição!!

O desespero logo foi acompanhado de uma intensa satisfação, a qual reforçava a inquestionável tenacidade do ranque superior. A força dos menosprezados acendeu faíscas nunca antes despertadas. Ódio e rivalidade culminaram na união daqueles com um inimigo em comum. 

Conduzindo o espetáculo, o profissional sabia claramente seu papel, quando a nova ameaça elevou o entretenimento para além de uma simples humilhação.

— Senhoras e senhoras, essa é a última Convocação da noite!!! No dia de hoje, os Jogos da Folia podem estar sediando uma das melhores exibições da história!!!

Dentro da arena, sentimentos dos mais diversos tipos colidiram para uma atmosfera atípica entre os competidores. De um lado, um sorriso debochado escancarou a alegria de Roccan, que provocava a garota enfurecida.

— Hehehe, você finalmente entendeu.

— Eu não entendi nada!

— Gostou de socar a cara dele, não? Pode fazer isso quantas vezes quiser!

— Sua ajuda não é bem-vinda! Foi apenas um deslize.

— Nesse caso, estarei aguardando seu próximo vacilo.

— Está torcendo contra mim!?!?

Depois de ir ao resgate de seu companheiro, Kazo estendeu a mão para Falco. Ao contrário do clima leve que cercava seus oponentes, o subordinado possuía assuntos pendentes com o líder.

— Está satisfeito? Fez ela partir com tudo para cima de nós.

— Não, esse não parece ser o caso. É exatamente por precisar desse empurrão que ela ainda não é capaz sequer de competir. Venceremos sem maiores problemas.

— Acha que foi um golpe de sorte?

— Sorte ou não, ela claramente não pretende repeti-lo. Esse é um erro imperdoável.

Determinada, Proxie se preparava para mais uma investida. Seu ânimo havia sido restaurado. À medida que aquecia o seu corpo, cada movimento indicava o auge de sua aptidão física. Livre de qualquer nervosismo, o corpo da garota estava leve como nunca antes.

Em contrapartida, o homem caído acabara de passar por um sufoco não experienciado há tempos. Enquanto se levantava, Falco tinha plena certeza: o topo da resistência não poderia se contentar com uma performance tão baixa. Com uma pequena distância lhe separando da sua maior adversária, o homem precisava deixar claro o extenso caminho que segregava o melhor e o pior dos Escultores. Um objeto foi retirado de seu bolso, ao mesmo tempo em que o sujeito olhava atentamente para Roccan.

— Você parece estar se divertindo com o poder da sua relíquia, pirralho. 

A figura de um sol marcava a superfície do pequeno item, cujo formato e tamanho se assemelhavam à estrutura de um broche. O material enferrujado indicava a rica história por trás de décadas de existência.

Esculpido no formato de uma montanha, um artefato de textura rochosa também era alvo da atenção local. Rachaduras compunham outro meticuloso acessório, que servia como um chamariz para o entretenimento. Falco e Kazo se revelaram usuários de dois dos maiores tesouros da humanidade.

— O que acha de nos juntarmos a você?

— Heh… Podem vir!

Duas relíquias mudaram os ares da batalha. O confronto foi elevado para outro nível.

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