Ronan Brasileira

Autor(a): Raphael Fiamoncini

Revisão: Marina


Volume 1

Capítulo 29: Sombras do Império (3)

Cerrando os dentes, o líder dos Corvos da Tormenta tentou formular outro plano, mas a princípio, nada passou por sua cabeça. Teria de lutar contra o segundo melhor cavaleiro que conhecia.

Proferindo um riso satisfeito, Edmundo provocou:

— Não ficarei esperando que mais ratos se intrometerem.

O traidor ergueu a espada longa. Com uma veloz estocada tentou finalizar a luta num golpe fatal. Para seu azar, o oponente também era um veterano de guerra, capaz de defletir o golpe acertando a espada com a cabeça do seu machado.

Aproveitando-se a abertura, Eric ergueu sua arma para descê-la com toda a força, mas acabou atingindo a espessa armadura do adversário. No local da batida, uma saliência marcou cavou a ombreira metálica. Agora recuperado, Edmundo recuou. Não poderia subestimar o líder de uma tropa de elite.

Triss continuava desesperada. Já tinha perdido sua companheira, seus dois guardas e provavelmente, mais da metade da companhia ainda fiel a sua causa. A última coisa que precisava era que o único guerreiro capaz de enfrentar o capitão da Guarda Real, morresse.

— Eric! Eles estão subindo, eles estão escalando a parede — disse num lamento angustiado, após espiar para fora da janela.

Não posso alongar essa luta, mas se eu tentar apressá-la eu posso acabar dando um passo em falso e terminar morto, concluiu Eric.

Edmundo avançou novamente, desta vez com um golpe lateral vindo pela direita, Eric recuou e conseguiu desviar. Aproveitando-se da abertura, Edmundo se aproximou com uma estocada rápida o bastante para ver os olhos do oponente se arregalar.

Atingindo-o

Sangue escorreu da lateral esquerda do peito, tingindo o tecido da roupa. Eric sentiu o corte latejar e o sangue esvair. Não havia tempo sobrando, precisava pôr um fim naquilo. A angústia advinda da perfuração alimentou uma fúria ferina, sua grande força. Diferente da esmagadora maioria dos manipuladores, ele sabia como direcionar o ódio para uma canalização arcana, basicamente: única.

A runa do machado cintilou uma luz arroxeada e dela mesma, centenas de fagulhas na mesma tonalidade chisparam pela lâmina do machado de uma mão, iluminando o quarto num espectro violeta.

A arma estava imbuída e pronta para o massacre.

Eric julgou pronto para finalizar o embate. Com um sorriso que não emanava a dor que sentia, avançou contra o inimigo, recuou a arma para trás e a impulsionou num golpe fulminante.

Analisando a situação Edmundo aproveitou o avanço alheio para lançar uma nova perfuração, a última, aquela que traria um fim àquilo tudo. Não havia como ser atingido antes.

Seria o líder dos Corvos da Tormenta tão imprudente a ponto de abrir tanto a sua guarda?

Como esperado, Eric pensou. Abaixou-se num movimento premeditado, a espada roçou nos fios do cabelo arrepiado. Ele levou o machado para baixo e num gancho as faíscas de eletricidade enlouqueceram ao entrar em contato com a barreira de Edmundo. O machado conseguiu atravessar o escudo invisível para atingir o peitoral da armadura.

Agora. Eric concentrou-se. Pôde sentir a energia canalizar através do seu braço e…

Nada.

A canalização cessou ao trespassar a barreira rúnica do cavaleiro, que perdurou cintilante, anulando seus esforços. Seu engenhoso plano de reativar a runa com a arma dentro da barreira foi por água abaixo.

Com um sorriso debochado, Edmundo zombou da pífia tentativa:

— Criativo, mas fútil. — Socou com toda força o rosto do guerreiro problemático.

Eric, caído no chão, sentiu o mundo ruir perante seus olhos.

Se ao menos eu estivesse em minha armadura… duvido que… eu perderia…

O cavaleiro virou-se para Triss.

— Me dói ter de fazer isso… imperadora — zombou do título que tanto repudiava. — Trair minha rainha é desonroso, mas trair meu povo é imperdoável.

Ele quer conversar depois de tudo isso? Perguntou-se Eric, ainda caído no chão. Enquanto Triss pensava em algum contra-argumento, seu fiel guerreiro levantou-se. Mas o machado foi tomado por Edmundo. Para o azar de Eric, parte de sua força jazia na runa. Reunindo a coragem dos derrotados, enfrentou o vencedor.

— Você vai simplesmente entregar tudo para aquele crápula do Imperador? — questionou ao limpar o sangue que escorria da boca e do nariz.

Edmundo virou-se e apontou o machado roubado para o oponente.

— Admiro sua coragem, sua força e principalmente: sua runa engenhosa… Chefe Guerreiro, mas você não está em condições de me questionar.

Durante o embate Triss se escondera no canto esquerdo do quarto, ficando próxima da janela por onde espiava as forças inimigas.

— Edmundo, o que ele te prometeu? — ela perguntou ao levantar-se. — O que ele te ofereceu? Um palácio, um título de nobreza, uma bela esposa. Me diga!

— Me prometeu um fim… — ele respondeu transpirando a sinceridade em suas palavras, mas com um olhar soturno. — Um fim para tudo isso — disse quando ergueu as mãos que empunhavam a espada e o machado do derrotado, demonstrando toda a situação que os envolviam.

Eric estacou incrédulo ao ouvir tamanha desonestidade. Ele não percebe a ironia em suas palavras? Que tipo de sádico você é Edmundo? Pensou, mas antes de pôr para fora, Triss interveio.

— Eu te entendo. E até respeito seu ponto de vista, mas você perdeu: antigo capitão da Guarda Real.

O traidor expressou tanta confusão em seu olhar quanto Eric. Havia a imperadora perdido a noção? Refletiu Edmundo, cabia a ele trazê-la para a realidade.

— Sou eu quem empunha a espada e o machado, Triss…

— Mas vocês estão cercados. Seus agentes traidores foram exterminados enquanto você brigava com o capitão da minha tropa e discutia suas bobagens comigo agora a pouco. Não há mais escapatória para você — proferiu triunfante enquanto voltou o olhar para a janela.

— Veja você mesmo. — Ela apontou para fora.

Edmundo se aproximou, apoiou-se na janela e observou os soldados imperiais mortos no chão, por Ivar, seus colegas e a guarda maltrapilha da cidade. O rilhar de passos metálico impregnaram os cômodos do terceiro andar. Dois guardas reais que combateram os traidores no andar debaixo adentraram no quarto.

O traidor largou no chão sua espada e o machado confiscado.

Triss colocou-se de frente a ele e encarou-o com seu olhar inquisidor.

— Você lembra qual é a punição por traição?

Um aceno derrotado foi à resposta. Edmundo retirou o elmo. Triss virou-se para Eric, que sem precisar ouvir uma palavra, empunhou a espada de um dos guardas mortos. Sentiu o fio da lâmina ao encostar um dedo, permanecia afiada.

Sem delongas o Corvo desferiu um golpe certeiro.

E uma cabeça rolou no chão ensanguentado.

Inabalada, a imperadora caminhou e ignorou o corpo decapitado. Ajoelhou-se ao lado do corpo de sua fiel amiga feiticeira. Permitiu-se chorar uma última vez.

Eric abaixou-se para recuperar o machado largado no chão. Virou-se para a janela e observou os soldados lá embaixo. Após um tempo encontrou o amigo trapaceiro. Ele arrastava pelos braços o corpo de um agente imperial de capa vermelha. Colocando a cabeça para fora da janela, Eric berrou:

— Você é muito lerdo, sabia?

Ivar largou aquele saco de estrume e retribuiu o gesto simpático.

— Vai se ferrar! — berrou com as mãos nos lados da boca.

Após aquela noite, Eric Tormensson pagaria todas as rodadas de bebidas com o maior prazer.



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