Volume 1

Capítulo 17: O Sorriso de Amon

— Ei... Mamãe... Por que está chorando? Quem é esse homem de preto...?

 

 ✵

 

— Capitão! — chamou o pirata em desespero. — Tragam o doutor aqui!

Escutando os irritantes gritos do seu subordinado, Amon despertou de outro dos seus pesadelos. Ele conseguia sentir a dor penetrante em todo o seu torso e escutar os gritos apenas tornava tudo pior.

— Estou vivo seu desgraçado!... Pare de gritar — exclamou com desgosto, em seguida, sentou-se recostado na parede. — Você trouxe o que eu pedi?

— Sim, senhor. Mas, você tem certeza? O médico disse que qualquer movimento poderia abrir os seus pontos.

— Não tenho tempo para isso. — Ele levantou o seu corpo, ficando de pé no convés. — Apenas traga minha arma e o maldito que diz saber da garota.

O subordinada não pensou duas vezes, virando-se e partindo em busca do que lhe foi pedido. Logo, ele retornou acompanhado do médico, de outros dois piratas e de um jovem amarrado.

Na mão do homem estava uma lâmina, uma cimitarra. Amon recebeu ela em mãos e observou o seu contorno. Ele sacou a espada e presenciou a imagem que se dispôs.

Uma lâmina prateada que reluzia com o brilho do sol do deserto. Uma espada que se curvava na extremidade livre, possuindo um punho azul que se dividia em duas até chegar na guarda mão e, em seu pomo, uma joia de mesma cor cintilava na cor do mar.

Amon cortou com a cimitarra para baixo e, realizando essa tarefa, sentiu uma estranha vitalidade percorrer todo o seu corpo, desde a ponta do pé ao topo da cabeça.

Quando estava prestes a chamar pelo homem amarrado, o médico se pós à frente, com um rosto preocupado nitidamente falso. Ele era apenas um covarde há algumas horas, mas agora parecia tentar ganhar algo com aquilo.

— Capitão, tenha cuidado. Os pontos podem se abrir e isso vai criar uma tragédia — falou o baixinho, aproximando-se de Amon. — Recomendo que descanse. Caso precise, posso até ser o seu médico pessoal.

Amon olhou para o rosto falso do homem por um momento e logo abriu um sorriso. Ele levantou a mão e fez um gesto para que o médico se aproxima-se e foi isto que ele fez. Ao chegar próximo, sentiu um toque suave no seu rosto.

Passando a mão com cuidado pelo rosto do homem, Amon estava quase lhe dando um carinho; um conforto. Surpreso, o doutor não negou e apenas aguardou sem dizer uma palavra.

— Sorria — disse Amon com frieza.

Hã? — O médico expressou confusão. — Não entendi, o que o senhor disse?

— Sorria... Sorria agora.

A mão que acariciava o rosto do homem agarrou o seu queixo. Amon pressionou com força, apertando o rosto do homem. Logo, o médico começou a tremer de medo.

— Senhor... Por favor! Está me machucando.

— Sorria! Estou mandando.

Aos poucos, Amon ergueu o corpo baixinho do médico que arranhava o braço dele incessantemente. O rosto dele já estava vermelho e as veias surgiam em seu pescoço. Ele pensava que o seu rosto iria ser arrancado.

— Sorria! — O grito ressoou por todo o porto e aterrorizou até os piratas.

Antes de perder a consciência, o médico usou todas as suas forças para abrir um pequeno sorriso. Neste momento, Amon soltou-o que caiu no chão duro de madeira.

— Viu? Foi simples, não? — disse o terrível capitão. O médico no chão chorava feito uma criança. — Suma daqui! Não quero ver o seu rosto nunca mais.

Liberado, o baixinho saiu correndo enquanto tropeçava nos próprios pés. A cena lamentável fez os demais saírem do seu transe.

O subordinado percebeu o que havia acontecido e se ajoelhou na frente de Amon.

— Parabéns por se tornar um Guerreiro de Nível Senhor, Capitão!

Inconscientemente, Amon havia executado uma técnica de Aura. Está técnica era um pouquinho similar ao Rugido do Ogro, utilizada por Ângela na sua luta contra os corvos que circulavam por Yggdrasil. 

— Realmente... — Amon apertou os punhos e moveu a sua espada de um lado ao outro. — Mas... esse poder não chega nem aos pés daquele monstro.

Ouvindo as palavras do seu capitão, o pirata engoliu em seco. Apesar das forças do Reino Médio não serem nada se comparada a de outros reinos em várias questões, o poder das elites ainda era algo mais individual.

Ele sabia que Guerreiros e Magos eram divididos em várias categorias, desde simples iniciantes até aqueles capazes de destruir cidades.

— O homem de preto é tão forte assim? — O pirata foi coberto de medo.

— Ele é ainda mais forte do que se imagina. — Amon tornou a abrir um sorriso. — Quanto maior for ele, maior será a queda.

Logo, ele seguiu para o próximo ponto, o jovem preso por cordas à frente.

— Soltem-me! Eu sou um grande guerreiro e exijo respeito! — Ele foi o jovem espadachim que havia sido anteriormente enganado por Sienna. — Piratas nojentos! Se não tivessem me pegado desprevenido!

— É ele? — perguntou Amon, revirando os olhos para aquela palhaçada. — se for, o soltem.

— Sim, capitão. Ele tem informações da menina.

Um dos piratas soltou as cordas que lhe prendiam e empurrou o jovem com um chute. Ele caiu de joelhos no chão na frente de Amon.

— Hey! Pirata imundo, você sabe quem sou eu? — interrogou o jovem espadachim.

Limpou as suas roupas com cuidado sem dar atenção alguma para o homem parado logo à frente. Ele parecia estar despreocupado com tudo aquilo.

“Ele é muito confiante, ou é apenas muito burro”, pensou Amon.

Amon também não possuía a melhor das aparências. Ele estava usando uma camisa branca social com uma grande marca de sangue e era possível ver a enorme cicatriz em seu peito pelas frestas da blusa.

Além disso, ele estava pálido, parecendo um esqueleto vivo. O espadachim não sabia manipular mana, muito menos tinha domínio sobre aura, por isso nem notou o perigo que o homem na sua frente significava. Ele era realmente apenas um idiota.

— É esse tipo de lixo que vocês trazem para o meu navio?

O som de respirações cessou e o barulho seco dos piratas engolindo ressoou.

Amon não perdeu tempo com reclamações. Ele aproximou-se do jovem e colocou as mãos em seu rosto, assim como havia feito com o médico. Apertou com força o rosto do espadachim que ficou sem reação.

— Ei! — O jovem tentou lutar para fugir, mas o aperto era forte. — O que você está fazendo?!

—  A garota, você a viu? Não foi?

Ele começou a erguer o espadachim. Engolindo seco, o jovem percebeu que agora as coisas estavam sérias. Nervoso, ele acabou soltando um pequeno sorriso e, vendo aquilo, Amon aliviou um pouco o aperto.

O jovem foi salvo por um sorriso.

— Eu vi uma garota estranha hoje. Ela estava na rua do Cassino. Ela pediu para ver minhas incríveis habilidades com a espada.

— A rua do Cassino... Isso é um problema. — A expressão no rosto de Amon tornou-se ruim. — Aquelas mulheres não são algo que eu consiga lidar sozinho e, além disso, nosso acordo me restringe muito.

O Cassino era uma poderosa força. Ninguém, além de Amon e o misterioso outro pirata, conhecia a facção que controlava o prédio. A única certeza que as pessoas tinham era de que o Cassino não era de nenhuma das três facções que controlavam os Reinos Médios. Apesar de não controlarem, todas elas tinham acordos com o Cassino.

Piratas dominavam o mar, tendo a maior parte do controle, em seguida vinham os comerciantes ricos, controlando outra parcela considerável e, por último, os cidadãos comuns elegiam líderes para manter um mínimo de controle sobre o próprio reino.

Embates entre esses grupos eram comuns, mas o equilíbrio era tão frágil que nenhum confronto muito grande se desenrolava. Todos tinham esperanças de que um dia o Rei dos Piratas retornasse e unisse todos os Reinos em apenas um.

Um sonho distante e cada vez mais utópico.

— Voltando ao assunto... Você disse ser um “Grande Guerreiro” — interrogou o capitão com um sorriso de escárnio.

O jovem percebeu a zombaria de Amon, e isto tocou um pouco no seu ego. Ele rapidamente esqueceu-se do que havia ocorrido alguns segundos atrás, caindo nas provocações.

— Isso mesmo! Nem um homem sobreviveu ao ataque da minha lâmina — esbravejou ele, sacando sua espada logo em seguida.

— Hm. É mesmo? — Amon também sacou a sua lâmina, brandindo a devagar. — Que tal um pequeno duelo? Eu adoraria testar minha nova lâmina.

O espadachim estava com receio em aceitar, ele havia presenciado o poder da aura do inimigo à frente e a força que ele possuía, mas; também havia visto o estado péssimo que o adversário se encontrava, ferido. Isto encheu o seu corpo e mente de confiança.

— Eu aceito!

Os piratas tomaram um pouco de distância para não atrapalhar o combate, ficando próximos o suficiente para caso uma emergência acontecesse.

A arma do jovem brilhava ao sol e reluzia o rosto nobre dele. O Florete era uma arma perfeita para duelos desse tipo, mas ainda era uma arma frágil que necessitava de muita experiência para ser usada e Amon sabia muito bem disso.

“Esse moleque é o blefe em pessoa”, pensou olhando para a boa postura do adversário.

Ele cortou com a própria espada para baixo e um som imperceptível para os demais ressoou nos seus ouvidos, o som de uma cobra.

— Venha, moleque. Vamos começar com isto de uma vez! — exclamou Amon com um vigor fora do comum.

— Estou pronto!



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