Volume 1

Capítulo 27: Abstração Imposta ao Vento

Helm estava prestes a puxar o gatilho para acertar Colth em um disparo mortal, acertaria em seguida o garoto Jorge, para então, usar a força e capturar Celina, a guardiã de Tera. Foi o que planejou.

Quando estava prestes a executar o seu plano, algo chamou sua atenção interrompendo qualquer prosseguimento. Um animal foi jogado do telhado de um dos prédios residenciais próximos. O que parecia uma espécie de cavalo caiu do topo da construção de quatro andares e, enquanto se debatia e grunhia, despencou desajeitado pelo céu até encontrar as pedras polidas da viela mais próxima aos muros da capital.

— Mas que merda é isso... — Colth brandiu seus pensamentos.

O animal aterrissou exatamente entre o coronel e os seus alvos, uma nuvem de poeira espessa se ergueu em consequência da queda. Helm se desconcentrou e perdeu a visão dos fugitivos por um único segundo, foi o suficiente para Colth:

— Vamos sair daqui. Rápido!

Celina e Jorge se agarram ao seu guia, Colth correu rapidamente para fora da rua e atravessou o terreno gramado abandonado para rapidamente alcançar o muro fronteiriço.

A direção foi apontada pelo garoto que sabia exatamente o que procurava. A criança não mentiu, realmente havia uma pequena passagem escondida atrás de uma pilha de tábuas colocadas ali estrategicamente. Se espremeram para adentrar ao que parecia um buraco cavado a mão.

A abertura era apertada, principalmente para Colth que foi obrigado a se contorcer para passar por ali, mas não se importou, a fuga estava próxima.

Do lado de dentro dos muros, o velho Helm da barba farta procurava por quem havia provocado toda aquela distração, obviamente tinha sido planejado. Não demorou para obter a resposta.

No telhado do prédio residencial, de onde veio o cadáver daquela fera que agora apodrecia no centro da rua, uma figura se fez ser notada.

— Hum... — O coronel ergueu a sua vista até encontrar a pessoa que tapava o Sol com o seu próprio corpo. — Não estou surpreso com a sua participação nisso, Edgar.

— Você não cansa de estar no meu caminho, não é, Helm? — disse o Gerente no nível superior.

— Engraçado, quem colocou um obstáculo no meu caminho agora mesmo, foi você.

— Aquela criatura moribunda? — Apontou para o quadrupede em pedaços no calçamento da rua. — Só um dos brinquedos dos seus homens. Ah, não se preocupe, o rapaz todo tatuado metido a domador de criaturas sombrias está bem, colocou o rabinho entre as pernas e fugiu. Deveria fazer o mesmo e admitir a derrota, assim como fez anos atrás durante o ataque de Taemar, Helm.

— Derrota? — Sorriu e se colocou como superior, mesmo estando metros em desvantagem. — Entendeu completamente errado, senhor Gerente. Você está exatamente onde eu queria que estivesse.

Edgar estranhou com os olhos, mas não teve tempo de reagir, quatro homens da guarda Real já o cercavam por trás, fortemente armados os soldados se espalharam pelo telhado daquele velho prédio.

Edgar ficou imóvel imaginando como sairia daquela situação repentina.

— Na verdade, eu deveria agradece-lo, Gerente. Graças a você a região central da Capital está um caos, perfeito para o exército tomar conta da situação — disse Helm dando as costas para caminhar tranquilamente pela rua, de volta por onde veio.

— Espera! O que você... — Edgar notou o tom perverso naquelas palavras e, conhecendo bem o seu antigo aliado, constatou que estava diante de uma ameaça maior.

Um grupo de soldados tomou a rua em concordância ao coronel esperando as suas próximas ordens que vieram sem demandar:

— Capturem o Gerente e vão atrás da garota! — cuspiu Helm. Em seguida se fechou em seus próprios pensamentos e sussurrou: — Idiota de merda. Por mais que eu te odeie e gostaria de manda-lo para o inferno, ainda vai ser útil. — Deixou o local.

— Droga — reclamou Edgar enquanto os quatro homens brutamontes se aproximavam para realizar a sua captura.

Experiente, o Gerente deixou-os se aproximar até que pudesse reagir de modo oportuno. Mesmo que estivessem armados e cautelosos, não escaparam da decisão do valente solitário.

Edgar acertou o queixo do agente mais próximo com um único soco, como em um bote de uma serpente, antes que o segundo pudesse notar, já havia sido tocado pela palma da mão brilhante do inimigo, dormiu. O Gerente não perdeu tempo e usou o corpo do desacordado como escudo contra uma coronhada que levaria do terceiro homem.

O primeiro caiu no chão sem saber onde estava, o segundo já estava desmaiado sobre o golpe do terceiro. Este, por sua vez, deu um passo rápido para trás ao descobrir o quão adepto da luta física aquele velho era. Demasiadamente tarde, a coronha do seu mosquete foi agarrada pela mão esquerda de Edgar de modo invasivo.

O guarda não viu problemas em puxar com força o seu mosquete para que o Gerente fosse forçado a solta-lo, mas quando o fez, Edgar não só largou a arma como empurrou com ainda mais força. Desequilibrado, o guarda caiu para trás de forma patética.

O quarto homem manteve sua posição, apontou seu mosquete Sathsai com ainda mais ímpeto em direção a Edgar:

— Mãos pra cima! Agora! — exigiu o único que ainda restava de pé.

— Vocês da guarda Real nunca aprendem mesmo — retrucou o Gerente sem qualquer expressão de covardia ou mesmo de tensão. Mostrou as palmas das mãos erguendo-as no ar.

O velho Gerente parecia ter desistido, foi o que o soldado pensou, mas não havia notado o brilho emanado pela palma da mão do inimigo. Foi uma luz fraca e, devido a claridade do dia, passou despercebida pelos outros que não Edgar, mas estava lá.

O guarda com o mosquete em mãos sentiu sua significância se perder e seus sentidos serem todos consumidos pela confusão de sua cabeça.

Com movimentos nada naturais e trêmulos, o guarda Real virou a mira da arma para si e colocou o polegar sobre o gatilho com a ponta do mosquete diante de seu rosto. O outro agente, que se manteve sentado ao chão após tomar a surra de Edgar, se espantou boquiaberto:

— O que você está...

Antes de completar a sua interrogação, o agente viu seu colega puxar o gatilho do mosquete de Sathsai apontado para si mesmo. Um feixe de luz se ergueu em direção ao céu nublado deixando para trás um enorme buraco vazio no crânio do próprio atirador.

O silêncio se fez presente. Edgar baixou os braços e focou seus olhos no último oficial ainda consciente.

O último homem em vestes da guarda Real manteve-se sentado, mais boquiaberto do que nunca, ele tremeu os braços suplicando para que o inimigo se afastasse. Edgar não obedeceu, caminhou e se aproximou do covarde recuado.

— Deixo-o viver, se me disser o que fez o imperador atacar a sua própria capital.

— E-eu... — Se negou balançando a cabeça.

— Se não vai pelo modo fácil, vamos pelo difícil.

Edgar colocou a palma de sua mão sobre a testa do homem sentado ao chão que, imediatamente, soltou um grito de desespero amedrontado:

—Aaaaah!

Os dentes do guarda rangeram e todos os seus músculos se retraíram.

— Me diga, agora — ordenou o Gerente.

O guarda parou e encarou a face de Edgar de modo amedrontada.

— O mandatário não foi o imperador — respondeu em tom pleno, mesmo que seu rosto mostrasse uma expressão completamente diferente, o homem estava prestes a chorar como uma criança.

— Não foi o imperador? — o Gerente estranhou mais uma vez. — Que merda de guarda Real é essa?

— Não somos da guarda Real. Eu sou do exército.

— Um golpe?... — pensou alto.

— Impulsão! — O dizer repentino de uma voz aguda feminina percorreu o telhado e cortou o interrogatório tenso.

Antes que Edgar se virasse para entender o que seria aquilo, o homem a sua frente foi simplesmente expurgado do telhado. Foi arremessado como um peso morto para além da superfície superior do prédio e caiu em gritos desesperados.

O Gerente ficou de prontidão imediatamente e, assim que visualizou a dona daquela voz fina e delicada, se surpreendeu.

Uma criança, uma menina de cabelos acinzentados e olhos vermelhos com um tom infantil que beirava a inocência. Edgar já havia ouvido falar muito bem dela, sabia que estava com problemas.

— Você é a...

— Dilin. Dá para pular essa parte? — A garota, que aparentava ter menos de quatorze anos de idade, saltitou pelo telhado exibindo o seu vestido camurça até parar próximo ao homem receoso. — Quando me falaram que era um emissário de Anima, eu fiquei até apreensiva querendo te conhecer. “Quem será que o Hueh aceitou?” eu me perguntei, mas você parece mais um vovô do que um verdadeiro combatente. Se bem que, usar magia de Anima sem nem encostar no alvo, isso é surpreendente — sorriu ela rondando Edgar.

— ... — Boquiaberto, o Gerente arregalou os olhos imaginando o que estava acontecendo.

— Desculpe atrapalhar o seu interrogatório, vocês de Tera são muito falantes. Mas não fique triste, pode perguntar qualquer coisa para mim, depois que acabarmos aqui.

— Vocês não estão com Lux?

— Aquela bruxa? Não mesmo. Vamos tomar Tera antes mesmo dela ser invocada para esse mundo. Ela não é nem um pouco especial e...

“Eu estou tão confuso, mas essa definitivamente não é a hora pra isso” pensou o homem. Não esperou nem mais um segundo, correu para o canto do telhado buscando pular dali para encontrar um prédio mais baixo, mas antes que alcançasse o parapeito, foi bruscamente puxado por uma força completamente descomunal. Era como se a gravidade o agarrasse e seu corpo caísse na vertical pelo horizonte.

— Que ousadia — disse a menina com um sorriso franco no rosto em tom de admiração.

Edgar não pôde fazer nada contra tamanho poder. Seus ombros foram capturados e aquela força bizarra o fez atravessar todo telhado de volta, não teve tempo de pensar, sua nuca encontrou com algo que agarrou sua cabeça violentamente.

— Boa pegada, maninho!!! — Saltitou a garota esbanjando o seu vestido.

— Você, deixar minha irmãzinha falando sozinha, deve pagar — disse em tom absurdamente grave o homem envolto de músculos que possuía uma dicção terrível e segurava qualquer movimento de Edgar sem qualquer esforço.

Aquela coisa mal parecia humana. Com mais de dois metros de altura e uma armadura de placas de metal que protegia todo o seu torso, seus braços e pernas chamavam a atenção com o quão eram trabalhadas na força física. O rosto também assustava bastante, qualquer um que cruzasse com aqueles enormes olhos avermelhados teriam terríveis pesadelos.

— Não mata ele, maninho. Devemos leva-lo. — A garotinha praticamente dançava com a sua voz alegre frente ao oponente incapacitado pela mão do gigante carrancudo.

— Não matar? — perguntou o irmão analisando cada palavra lentamente, definitivamente os músculos eram a sua principal proficiência.

Com apenas uma mão, ele anulará completamente o Gerente que, mesmo se debatendo e usando de toda a sua força, não conseguia se desvencilhar daquele monstro em forma humana.

— Não matar — repetiu o imenso assim que captou as palavras.

Imediatamente enterrou a mão com a cabeça de Edgar no concreto do telhado.

Se tivesse usado uma fração de sua força, teria o matado sem resistência, mas por incrível que pareça, foi sútil o suficiente para apenas desacordar Edgar. Em seguida, o gigante colocou o corpo desacordado sobre os ombros e esperou pelas ordens da garota que sorriu alegremente.

— Muito bem!!! Vamos! — liderou ela novamente.



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