Trrira de volta em posição de equilíbrio, os pés firmes no chão, a respiração descontrolada, enquanto olhava para cima. Os olhos dela brilhavam intensamente em tons vibrantes de verde, como esmeraldas vivas pulsando com energia mágica, penetrando a névoa espessa como se ela não existisse. Seus olhos pareciam se transformar em sensores teleguiados, vasculhando o céu turvo com precisão sobre-humana. Era como se pudesse ver através do próprio ar, rastreando cada movimento, cada fragmento em queda, determinada a não perder de vista a estátua que acabara de lançar aos céus. Tomada por uma nova onda de coragem, ela agachou-se levemente, soltou a bolsa no chão e tomou impulso. Seus pés cravaram-se no solo, e ela saltou com um poder que rachou o chão abaixo de si, atravessando a névoa como um míssil. Lá em cima, entre os vapores opacos, ela encontrou a estátua. Girando o corpo com precisão, Trrira ergueu sua espada de espinho e desferiu um golpe certeiro, que despedaçou a estátua em milhares de pedaços. Os fragmentos de pedra caíram como chuva pesada, atingindo o chão com estrondos que ecoaram pelo cemitério.
Volume 1 – Arco 1
Capítulo 12: Ossos e Conflitos - Parte 2
Trrira continuava a caminhar pelo cemitério, seus passos ligeiros afundando levemente no solo úmido. A névoa espessa parecia se mover como um manto vivo ao seu redor, obscurecendo o que estava à frente e deixando apenas silhuetas sombrias das lápides em sua visão. Cada nova rajada de vento frio trazia uma sensação de inquietação crescente, como se algo – ou alguém – estivesse vigiando-a. Sua respiração tornou-se mais rápida, criando pequenas nuvens no ar gelado.
Ela parou de repente. O som de algo se movendo atrás dela fez seus músculos se retesarem, e seu coração bateu mais forte. Decidida a não ser pega de surpresa, Trrira se abaixou lentamente, tocando a terra com a mão direita. Fechou os olhos por um momento, concentrando-se em seus poderes. Sua mão direito começou a brilhar com um luz em tons de verde. Do chão, algo começou a brotar – algo vivo e pulsante. Um espinho enorme entrelaçado com musgo e vinhas. Essas vinhas se enrolaram firmemente em seu braço, apertando-o como se estivesse tentando se fundir com ela. Apesar do desconforto, ela segurou o grande espinho com firmeza, semelhante a uma espada, sentindo a força da natureza pulsar através da lâmina viva.
Se levantando devagar, com a espada de espinho em mãos, Trrira lançou um olhar rápido por cima do ombro, analisando o que estava atrás de si — mas não havia nada. Sem reduzir o passo, continuou. Seus olhos vasculhavam com atenção as lápides espalhadas em desordem ao redor. Ela procurava o nome de Rowena Cinder, mas até agora nada parecia corresponder. O cemitério parecia brincar com ela, como se as lápides estivessem mudando de lugar enquanto ela desviava o olhar. Cada passo aumentava sua sensação de que algo a observava das sombras.
Minutos haviam se passado. De repente, um som a fez parar novamente – um rangido seco, como pedra sendo arrastada contra pedra. Seu corpo inteiro ficou tenso enquanto ela girava para o lado esquerdo, tentando localizar a origem do barulho. Uma lápide à sua frente parecia fora de lugar, inclinada de forma irregular, como se alguém a tivesse movido recentemente. Trrira avançou com cautela, sua espada de espinho pronta para qualquer coisa.
Ela observou de perto a base da lápide deslocada, seu olhar afiado detectando marcas no solo, evidências de movimento. "Não é só o cemitério... tem algo estranho. Como se tudo estivesse se mexendo aos poucos, mudando de lugar. Tentando me confundir." ela pensou, um misto de fascínio e medo percorrendo-a. Apesar da tensão, um sorriso sutil surgiu em seus lábios. Se o cemitério reagia à sua presença, isso significava que ela estava chegando perto do que procurava.
"Rowena... Eles estão tentando esconder você de mim, não estão? Talvez porque você não queira ser encontrada. Ou porque algo está protegendo você. O que tem de tão importante em você?" sua garganta se apertou ao pensar na possibilidade de que o perigo não vinha apenas do lugar, mas do que ela buscava.
Enquanto continuava caminhando, já se aproximando do fim do cemitério, um arrepio subiu por sua espinha, como se algo a observasse de longe, silenciosamente. O som de passos atrás dela ecoou no silêncio melancólico, firmes e deliberados. Ela parou de imediato, seu coração batendo com força. As vinhas da espada apertaram ainda mais seu braço, como se sentissem o perigo iminente.
"Se eu olhar para trás agora, posso estar olhando nos olhos de algo que não quero ver." O pensamento era uma mistura de desafio e medo, e ela sentiu a garganta apertar. Ela respirou fundo, forçando os ombros a relaxarem um pouco. "Eu consigo lutar. Eu vim aqui para isso."
Ainda assim, seus pés pareciam presos ao chão, e ela percebeu que suas pernas tremiam levemente. Com um esforço consciente, Trrira limpou a mão esquerda suada na lateral da calça e ajustou o peso para um dos pés, preparando-se para girar. Ela inclinou o queixo levemente para baixo, os olhos focados na espada de espinho que se erguia em sua frente.
Ela começou a virar o corpo, milímetro por milímetro, o medo correndo por suas veias como gelo. "Seja o que for, eu estou pronta. Eu tenho que estar pronta." Trrira se preparou, cada músculo tenso, como uma corda prestes a estourar. Ela sabia que não havia mais volta.
Ao virar, Trrira sentiu seu coração disparar ao perceber a estátua do anjo deslocada, agora voltada diretamente para ela. Seus olhos, arregalados pelo medo, começaram a arder enquanto segurava as lágrimas que ameaçavam cair. "Não pode ser real." pensou. Seu corpo tremendo, seus músculos paralisados pelo terror. Mas antes que pudesse processar o que via, a estátua se moveu, correndo com uma velocidade sobrenatural, avançando diretamente em sua direção.
O som da pedra raspando contra o chão ecoou pelo cemitério, e Trrira soltou um grito involuntário, sua mente gritando "Corra!" mas suas pernas recusando-se a obedecer. Ela instintivamente inclinou mais a espada de espinho, mas o pavor parecia ter tirado toda a força de seu corpo. No último segundo, algo dentro dela despertou – um instinto de sobrevivência, algo primal e feroz.
Tudo desacelerou ao redor — o som, o vento, até mesmo o próprio ar parecia mais denso. A expressão de Trrira estava cravada entre raiva e sobrevivência, os olhos arregalados, a boca aberta em um grito que ecoava lento, quase silencioso, como um som preso no tempo. Trrira se agachou e girou para trás em em um movimento de 360 graus, cada músculo contraído com precisão, as mechas soltas de seus cabelos voando ao redor de seu rosto como uma moldura viva. Toda a força de seu corpo concentrou-se em sua perna direita — a tensão subindo das costas, passando pelo abdômen, pelos quadris, até explodir no momento exato em que a perna se esticou com brutalidade. O chute atingiu a estátua com tamanha violência que o impacto ressoou pelo cemitério como uma pancada surda e densa. A criatura de pedra foi lançada ao ar, sumindo na névoa espessa acima, como se tivesse sido arrancada do mundo real por pura fúria.
Trrira pousou no chão com os joelhos dobrados, causando um impacto que liberou uma onda de choque que desfez momentaneamente a névoa, revelando o cemitério em toda a sua desolação. A espada firme em suas mãos, enquanto olhava para os pedaços espalhados da estátua. Sua respiração estava ofegante, e ela não podia acreditar no que havia acabado de fazer. "Isso... fui eu?", ela pensou, tentando entender o que dentro dela havia despertado.
Mas seu momento de alívio durou pouco. Quando ergueu os olhos, viu várias outras estátuas espalhadas pelo cemitério, todas voltadas em sua direção. Seus rostos de pedra, inexpressivos, pareciam ainda mais ameaçadores agora que sabiam do que Trrira era capaz.
"Elas estavam esperando." ela pensou, um calafrio percorrendo seu corpo.
Ela girou lentamente, seus olhos escaneando cada movimento ao redor, enquanto apertava o espinho em suas mãos. "Isso vai levar mais tempo do que eu imaginava." pensou, agora totalmente alerta.
As estátuas começaram a se mover, uma a uma, o som de pedra se quebrando enchendo o ar. Trrira respirou fundo, ajustou a espada em suas mãos e preparou-se para o próximo ataque.
— Que venham — rosnou ela entre os dentes, os olhos semicerrados e fixos à sua frente, onde os inimigos se espalhavam por toda parte. — Estou mais do que pronta. Que se atrevam.
Na sala da diretoria, Hanvasa permaneceu sentada atrás de sua mesa, sua expressão grave e atenta enquanto observava os dois adolescentes diante dela. Ela cruzou os braços sobre a mesa, ponderando cada palavra antes de se pronunciar. A tensão estava no ar, e ela sabia que havia algo mais por trás dessa história.
— Então, vamos recapitular — disse ela, sua voz firme, mas controlada. — Misha, você está namorando alguém que Quinn não aprova e a briga foi por causa disso? Isso não faz sentido. Está claro nos rostos de vocês que essa história de ex e briga não passa de uma tentativa frágil de esconder a verdade. E o que é isso de Quinn ter te enforcado e você quase usar seus poderes contra ele? Isso não parece uma briga por causa de ex. Vocês estão mentindo para mim, e eu não tolero mentiras.
Misha e Quinn se entreolharam, o desconforto evidente entre eles. Quinn desviou o olhar, mexendo as mãos nervosamente. Ele sabia que estava em uma situação difícil, mas precisava resolver aquilo de uma vez. Não havia como continuar com as mentiras.
Finalmente, Quinn se endireitou na cadeira e soltou um suspiro, tentando se controlar.
— Não foi por causa de ex, diretora. Foi por causa de uma festa que eu fiz em casa — disse ele, a voz carregada de frustração.
Hanvasa fez um leve gesto para que ele continuasse, seus olhos fixos em Quinn, tentando entender onde ele estava querendo chegar.
Quinn lançou um olhar rápido para Misha antes de continuar. Ele explicou que Misha havia bebido demais e quebrado várias coisas em sua casa, o que deixou seu pai furioso a ponto de proibir festas ali. Irritado, Quinn foi tirar satisfação com ela, mas a situação saiu do controle. Ele estava revoltado porque Misha nunca assumia a responsabilidade pelos próprios atos, sempre culpando os outros.
Misha se virou para Quinn, o rosto cheio de firmeza, quase como se pregasse uma verdade absoluta.
— Olha aqui, Quinn — falou com voz decidida, apontando o dedo como se estivesse dando uma lição — Eu não fico jogando culpa em ninguém, não. Eu assumo é a minha responsabilidade, porque cada um responde pelo que faz diante do Senhor!
Hanvasa permaneceu em silêncio por um momento, observando os dois, e a tensão na sala só aumentou.
Quinn se levantou da cadeira, encarando Misha com um olhar afiado, cheio de desprezo.
— Cê só faz merda e fode a vida dos outros — disse ele, a voz carregada de provocação. — Parece que cê nunca liga pras porra das consequências.
Misha revidou com provocação, questionando se a família e a reputação de Quinn estavam limpas. Irritado, ele quase perdeu o controle e avançou contra ela, segurando-se para não explodir.
Hanvasa ergueu as mãos, interrompendo a discussão que estava ficando mais intensa.
— Chega! — exclamou ela, a voz firme e alta. — Vocês estão aqui para resolver isso, não para despejar acusações sem fim. A situação já está complicada o suficiente sem essa briga sem fim. E agora, quero a verdade. Parem de mentir e digam o que realmente aconteceu!
Os dois jovens trocaram olhares tensos, respirando pesadamente. Hanvasa permaneceu em silêncio por um momento, absorvendo a situação, antes de encarar Misha com seriedade, esperando uma resposta. Misha suspirou, demonstrando indiferença, mas reconheceu a culpa: havia bebido demais, quebrado coisas, inclusive a televisão do pai de Quinn. Admitiu que se alterou e causou problemas, mas seu pedido de desculpas soava vazio, sem arrependimento verdadeiro.
Hanvasa fez uma pausa, observando ambos atentamente. Ela balançou a cabeça, claramente desapontada.
— Eu não sei se devo ficar mais chateada com a falta de responsabilidade de vocês ou com o fato de vocês não terem a mínima ideia do que uma atitude como essa pode causar — disse ela, a voz carregada de seriedade. — Esse comportamento irresponsável como o de vocês afeta não apenas a imagem de vocês, mas também a de suas famílias e da escola. Cada escolha de vocês carrega um peso, e vocês ainda não entenderam isso. Se comportaram como se não houvesse consequência alguma, como se tudo fosse uma brincadeira. Essa falta de responsabilidade, essa imaturidade... é exatamente o que coloca tudo a perder. E sinceramente, eu esperava mais
Ela se levantou, andando até a janela por um momento antes de voltar a encará-los com firmeza.
— O que aconteceu na sala de treinamento foi um reflexo disso — continuou. — O comportamento impulsivo de vocês coloca todos em risco. Não estou aqui para julgar, mas vocês precisam entender as consequências de suas ações.
Ela respirou fundo e, ao voltar a falar, sua voz suavizou levemente, mas manteve a firmeza. Anunciou que ambos cumpririam um mês de trabalhos voluntários na escola como punição, uma forma de compensar o escândalo e aprenderem a lidar com suas atitudes. Deixou claro que novos incidentes trariam consequências mais graves.
Os dois assentiram, Quinn de maneira mais resignada, enquanto Misha deu um simples movimento de ombro, como se aquilo fosse algo fácil de lidar.
— Está resolvido então — Hanvasa indicou a porta. — Podem ir. E lembrem-se, o que acontece aqui não fica apenas com vocês. Afeta todos ao seu redor.
Os dois se levantaram e saíram da sala, a porta se fechando atrás deles. Hanvasa permaneceu em pé, olhando para a porta por um momento, pensando sobre como a adolescência podia ser tão caótica, mas também cheia de lições importantes que eles ainda precisariam aprender.
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