Volume 1 – Arco 1

Capítulo 5: O Primeiro Elo Quebrado - Parte 1

Os dias passaram serenamente na escola, envoltos em um clima de tranquilidade. O sol, que antes brilhava intensamente, agora se escondia com frequência atrás de nuvens cinzentas, lançando uma luz suave sobre os corredores.

O som da chuva caía lá fora, criando um ambiente acolhedor. O cheiro da grama molhada trazia uma sensação de frescor. 

Com o tempo, as aulas se tornaram uma rotina familiar, e a paz que envolvia a escola fazia com que cada instante parecesse parte de um todo, sutil e harmonioso, como a neblina leve que pairava sobre o pátio ao amanhecer.


04 de Março de 2019 - Segunda-Feira

O sinal da escola ecoou pelos corredores, marcando o início da primeira aula. Minutos depois, na sala de Magia Avançada, o professor Daeros entrou com passos firmes e um olhar analítico, irradiando autoridade.

— A magia negra, embora seja proibida há séculos, seu estudo serve para entendermos como combater suas influências.

Os alunos se remexeram nas cadeiras, atentos ao tom sério do professor.

— Há mil e duzentos anos, figuras como Eldrik Sombyvil, Laetira, a Malígna e Okan, o Corrompido, espalharam terror usando magia negra por toda Alfhenia. Seus nomes foram apagados dos registros oficiais depois de tanto tempo, mas suas marcas permanecem nas lendas.

Ele caminhou lentamente pela sala, seus olhos fixando-se em cada aluno.

— Atualmente, não existe ninguém que pratique magia negra ou magia das sombras... pelo menos não oficialmente. Qualquer indício é investigado e eliminado pelas autoridades arcanas.

Ártemis, sentada ao fundo, ouvia em silêncio, absorvendo cada palavra. Havia algo na forma como Daeros falava, uma certeza fria que a fazia se perguntar o quanto daquela história havia realmente desaparecido. O ambiente, com os alunos trocando olhares de aprovação e alguns anotando com entusiasmo.


Horas depois. O sinal do intervalo ecoou pelos corredores, e a agitação tomou conta da escola. No refeitório, Ártemis, Trrira, Gumer, Glomme e Firefy se reuniram em uma mesa no pátio. O aroma da comida se misturava ao barulho de risadas e conversas animadas.

Gumer encarava a mesa como se ela pudesse responder às perguntas que martelavam em sua cabeça. Já fazia quase um ano desde que havia se aproximado de Glomme e Firefy. Um ano de conversas tranquilas, risos baixos trocados nos corredores do internato, tardes sossegadas sentados sob as árvores, inventando histórias e compartilhando segredos. Nunca havia sentido esse vazio, nunca. 

Agora, tudo parecia diferente. Ártemis estava no centro da atenção, o rosto iluminado por um sorriso radiante enquanto contava uma história qualquer. Trrira, Glomme e Firefy a escutavam com olhos brilhando, como se ela fosse mágica. Como se... ela tivesse algo que ele nunca teve.

Por fora, Gumer mantinha o rosto inexpressivo, cansado, quase entorpecido. Por dentro, ele gritava. Era um grito abafado, sufocado pela máscara que usava todos os dias. Um grito de ciúme, de raiva, de medo. Medo de estar sendo deixado para trás. Medo de não ser mais importante. Medo de ter sido, o tempo todo, só um figurante na amizade que acreditava ter.

Ele olhou para Glomme, rindo de algo que Ártemis havia dito. A risada dele era leve, sincera — tão diferente das que Gumer tentava provocar há meses. E Firefy... ela ainda evitava o olhar de Gumer, talvez por culpa, talvez por vergonha. Ele não a culpava. Ela também estava encantada por Ártemis.

Gumer passou a mão na perna, distraído, sentindo os dedos trêmulos. Não era só tristeza, era uma indignação que lhe corroía o peito. Como alguém podia chegar do nada e virar o centro de tudo? Ártemis nem parecia se esforçar. Ela apenas existia — e isso bastava para que os outros orbitassem ao redor dela.

“Eu odeio ela”, pensou, com uma clareza que o assustou. Não disse isso em voz alta. Nunca diria. Mas sentia. Odiava o jeito como ela ria, como todos a ouviam com atenção, como ela fazia Glomme e Firefy sorrirem de um jeito que ele nunca conseguiu. Odiava ter que fingir que não se importava, enquanto por dentro sangrava.

A mesa se enchia de vozes e risadas, e tudo que Gumer conseguia ouvir era o vazio entre as batidas do próprio coração. Ele desviou o olhar para os próprios pés, que se moviam inquietos sob a mesa. Era a única coisa sobre a qual ainda tinha controle.

E, ali, no meio daquele pátio repleto de vida, Gumer se sentia invisível.


Atrás da escola, encostados à parede fria, Quinn segurava firmemente Ahelys pelas nádegas, pressionando seu corpo contra o dele. O pênis dele penetrava-a de forma intensa e ritmada, cada movimento cheio de urgência enquanto ele impulsionava o quadril para frente, mantendo-a presa contra si.

As mãos dele subiam e desciam pelas curvas dela, agarrando e puxando com um toque brusco, quase como se quisesse marcar aquele momento, aquele corpo. Ahelys sentia o calor dele invadindo-a, o ritmo constante que fazia seu corpo estremecer, mas sua expressão era complexa — os olhos semicerrados e a boca levemente apertada revelavam um misto de entrega e obrigação.

No meio daquela intensidade, um lampejo de esperança brilhava no fundo dos olhos dela. Ahelys queria acreditar que havia algo entre eles, algo além do toque e da pressa. Ela se agarrava à ideia de que ele sentia algo por ela, mesmo que suas ações mostrassem o contrário.

O corpo dela se movia junto, tentando acompanhar o ritmo acelerado de Quinn, mas a mente dela se perdia num turbilhão. Sabia, lá no fundo, que para ele ela era só mais um corpo para satisfazer, mas ainda assim alimentava aquele fio frágil de sentimento, como se isso a fizesse suportar o vazio da indiferença.

Enquanto Quinn continuava com seus impulsos rápidos e fortes, Ahelys se mantinha ali, dividida — entre o desejo de estar com ele, a esperança de um amor que talvez nunca existisse, e a amarga sensação de ser vista apenas como um objeto, não como a pessoa que era.


Horas depois, com o sinal marcando o início da próxima aula, uma das turmas da classe 2 se reunia na sala de treinamento ao terraço. Um sala com um piso forrado por um material especial que não fazia som, criando um ambiente silencioso e focado. Uma das paredes laterais estava completamente ausente, abrindo uma abertura para um vasto campo sintético, sem barreiras que impedissem a visão. Equipamentos de treino estavam espalhados pelo espaço que permanecia calmo, contrastando com a agitação do lado, dentro da sala de treinamento.

Sob a supervisão do professor Kevin, os estudantes foram divididos em pares, prontos para treinar suas habilidades em combate.

Dentro e fora da sala, uma multidão de estudantes se formava para observar Icegren e Anaru no campo a fora, aguardando o início da luta. 

A tensão era palpável, com todos os olhares fixos nas duas. Icegren, com sua postura calma e confiante, se alongava lentamente, observando Evelyn com um olhar atento, já prevendo os próximos passos da oponente.

Os alunos ao redor murmuravam entre si, cientes de que, quando Icegren entrava em combate, o espetáculo estava garantido. Mesmo antes da luta começar, o ar parecia eletrizado pela expectativa do confronto que todos sabiam que seria intenso.

A luta começou em meio à tensão crescente, enquanto os gritos dos alunos ecoavam pelo ambiente. 

— Concentração, garotas! Não se esqueçam das técnicas que aprenderam! — gritou o Instrutor.

Icegren, a felina, foi a primeira a atacar, avançando com uma velocidade impressionante. Seus movimentos eram rápidos e calculados, desferindo uma série de socos que cortavam o ar com precisão. Evelyn, com habilidade e calma, bloqueava os golpes com os antebraços, mas cada impacto reverberava em seu corpo, forçando-a a recuar. O som dos punhos de Icegren batendo contra os escudos invisíveis de Evelyn era alto e contínuo, como marteladas de aço.

— De novo isso! — rosnou Icegren, seu rosto contraído em uma expressão de fúria. — Quero ver do que você é capaz, garota!

A frustração crescia em Icegren a cada defesa bem-sucedida de Evelyn, que tentava manter a compostura, mas já sentia o peso dos golpes. Evelyn, por sua vez, esperava o momento certo para contra-atacar, já que os ataques da adversária eram incessantes, quase sufocantes.

Então, em um movimento repentino, Icegren disparou uma joelhada brutal. Evelyn ergueu os braços para bloquear, mas a força foi tanta que ela cambaleou para trás, os pés afundando na grama enquanto lutava para manter o equilíbrio. Icegren não perdeu tempo — com um sorriso feroz, ela se abaixou, deslizando no chão com agilidade felina, contornando Evelyn. Em um piscar de olhos, ela estava atrás da oponente, pronta para desferir um ataque surpresa.

Evelyn girou rapidamente, ofegante, tentando ajustar sua guarda.

— Não adianta se esconder, Icegren! — gritou Evelyn, tentando esconder o cansaço.

— Veremos — sussurrou Icegren, agachada no chão.

Sem perder um segundo, Icegren pulou e girou o corpo em um chute rotativo feroz. O movimento foi tão rápido que o ar ao redor parecia deslocar-se. Evelyn tentou bloquear mais uma vez, mas o impacto foi devastador. O chute acertou seus braços com tanta força que ela foi arremessada do chão, seus pés se soltando da grama enquanto era disparada para trás. A sala pareceu prender a respiração quando o corpo de Evelyn foi lançado pelo ar, até que ela desabou com um baque seco no chão, rolando algumas vezes antes de parar.

O silêncio caiu sobre o campo de treino. O professor Kevin, ainda com os olhos atentos, ergueu a mão.

— Vitória para Icegren! — anunciou ele

Os alunos começaram a aplaudir, alguns claramente impressionados com a brutalidade e a técnica de Icegren, enquanto outros olhavam com um misto de desconforto e receio. Icegren, agora respirando pesadamente, ergueu-se triunfante. Seus olhos percorriam a sala, certos de que ninguém ali ousaria desafiá-la tão cedo. Ela havia provado, mais uma vez, sua superioridade indiscutível no treinamento.

Icegren caminhou com passos firmes até Evelyn, ainda caída no chão, respirando com dificuldade. Seu olhar era de desprezo, como se a derrota da garota fosse um fardo que ela não queria carregar.

— Você é fraca. Não adianta ficar bloqueando se não atacar, porra — disse Icegren.

Evelyn, com o coração acelerado e uma frustração crescente, tentou se levantar. Ela olhou nos olhos de Icegren, decidida a mostrar que não ia desistir facilmente.

— Eu... eu vou melhorar — afirmou, com a voz tremula.

Ignorando as palavras de Evelyn, Icegren virou-se com desdém, voltando para seu posto. O professor observou a interação com um olhar crítico, ciente de que, apesar do talento de Icegren, ela ainda precisava entender a importância do respeito e da camaradagem entre colegas.

Enquanto Evelyn se levantava, com as pernas ainda trêmulas, o professor se aproximou, ajudando-a. 

— Lembre-se que defesa é importante, esse é seu poder, mas ataque também é fundamental. Continue treinando.

Evelyn avançava entre a multidão, o rosto queimando de raiva e vergonha. A humilhação de ter sido exposta ali, na frente de todos, ardia como uma ferida aberta, e ela lutava para não deixar que suas emoções transparecessem. Desviava o olhar, tentando ignorar os sussurros e olhares ao redor, mas a tensão em seu corpo era palpável, uma mistura de frustração e vontade de se afastar dali.

Enquanto isso, Icegren, alheia à tempestade interna de Evelyn, bebia água calmamente e se alongava com precisão, preparando-se para o próximo desafio. Evelyn seguiu seu caminho, presa naquele turbilhão silencioso, sabendo que ainda precisava encarar o que viria.


Passaram-se mais algumas horas desde o início das aulas, e o intervalo finalmente havia tocado. O fim da tarde se aproximava, pintando o céu com tons suaves e dourados. Gumer saiu do banheiro, esperando por Glomme e Firefy, que ainda estavam lá dentro. O som animado do refeitório preenchia o ar ao redor, quando de repente um vento gelado soprou em seus ouvidos. O corpo de Gumer estremeceu, uma rigidez súbita tomou conta dele, e uma estranha pressão começou a se formar na sua cabeça, como se algo invisível tentasse invadir seus pensamentos.

Uma voz misteriosa invadiu a mente de Gumer, sussurrando com uma suavidade cortante que parecia penetrar as camadas mais profundas da sua alma. A voz dizia que ele não precisava carregar a culpa pelos sofrimentos dos amigos, que não era responsável pelo bullying que Firefy e Glomme enfrentavam, nem pela exclusão que ele próprio sentia desde a chegada de Ártemis e Trrira.

Essas palavras, tão claras quanto afiadas, cortavam como lâminas invisíveis, despertando em Gumer uma dor silenciosa. O calor das lágrimas começou a escorrer pelo seu rosto, enquanto uma paralisia tomou conta de seu corpo, como se aquela voz tivesse fixado seus pés ao chão, impedindo qualquer movimento ou reação.

— Não... não é verdade... — sussurrou Gumer, mas as palavras mal saíram, engasgando-se em sua garganta.

— E quanto à sua mãe, Gumer? Você se culpa por tudo, não é? Por que não estava lá quando ela mais precisava de você? Ela morreu sozinha, enquanto você se divertia na escola. Você se lembra da última vez que a viu? O olhar dela, cheio de esperança? E você? O que fez? Você a abandonou...

Um grito silencioso ecoou em sua mente. A lembrança de sua mãe, com o olhar triste e cansado, voltava a assombrá-lo. Ele se lembrou da noite em que recebeu a notícia do hospital, quando a vida deles se despedaçou, e como ele se sentiu impotente, como se estivesse parado enquanto o mundo desmoronava.

— Não... eu jamais faria isso... — Gumer murmurou, a voz falhando. — Eu não pude fazer nada...

— E seu irmãozinho? Aquele garoto frágil que luta contra o câncer? Ele precisa de você, e você só consegue pensar em si mesmo. Você não é um irmão, Gumer. Você é apenas uma sombra. Uma sombra que deixa tudo para trás. Ele está lá, sofrendo, enquanto você se afunda na sua própria insignificância.

Apoie a Novel Mania

Chega de anúncios irritantes, agora a Novel Mania será mantida exclusivamente pelos leitores, ou seja, sem anúncios ou assinaturas pagas. Para continuarmos online e sem interrupções, precisamos do seu apoio! Sua contribuição nos ajuda a manter a qualidade e incentivar a equipe a continuar trazendos mais conteúdos.

Novas traduções

Novels originais

Experiência sem anúncios

Doar agora