Volume 1 – Arco 1
Capítulo 32: Preparações de resgate
Olhos prateados, uma longa barba bem cuidada, com cabelos cinza começando a surgir. Um verdadeiro homem rico.
Não como os que vestem coisas caras para se exibir, mas com detalhes elegantes demais em partes que não precisariam desse nível de cuidado, como o bordado no interior da gola de sua camiseta ou a caneta saindo de um de seus bolsos, com fios de ouro e um formato atípico, emulando uma pena oca.
Uma roupa impecável o suficiente para se destacar, um perfume forte, perceptível de longe e um exército formidável o seguindo, em uma formação perfeita.
“Imagino que essa era a primeira impressão que ele queria passar.”
Uma pena que, perto dos monstros que nos protegiam, sua escolta só parecia no máximo ordinária.
Reconheço o esforço que ele e seus servos tiveram, porém suas roupas perdiam até para o pijama do Barão, por algum motivo, projetado por uma colaboração de um dos melhores artesãos do país e um professor da torre mágica.
Nem é preciso dizer que seu perfume passou batido e sua própria aparência perdia tanto no físico, quanto na face.
Evidentemente, com menos dinheiro que o Barão, uma espada tão bem cuidada, que dava a impressão que só servia para decoração e um nervosismo visível, minha cautela de antes sumiu por completo.
“Um nobre comum, tentando ganhar o favor dos poderosos Fortuna”, essa foi a minha verdadeira primeira impressão.
— Por acaso, essa região faz fronteira com algum país vizinho? — perguntei.
— O caso dos Laika é um pouco especial, mas todos dessa geração possuem o sangue dos Fortuna. Eles só mantiveram o sobrenome porque, de qualquer forma, todos da linhagem colateral são obrigados a escolherem um segundo sobrenome — respondeu Khajilamiv.
— Isso significa que ele tem a habilidade?
Sabendo de suas intenções, poderia me aproveitar disso. Com sorte, ele veria o mesmo que Khajilamiv viu e testemunharia ao meu favor, no julgamento do banquete.
— Se está falando da exata mesma que eu tenho, não. Como os Laika possuíam outra inata hereditária, o olho deles vê outra coisa.
— E o que é?
— Não sei. Nunca me interessei por eles. O que te contei é só senso comum.
— Que raro.
— O que?
— Para não despertar sua curiosidade, devem ser bem insignificantes. — E sem relevância, suas opiniões valeriam de nada, em frente ao Duque.
— O atual líder da família Laika possui o título de Marquês e o Duque confia muitos negócios essenciais a eles. É só que, com exceção do primeiro, que ganhou o título nobre por conta própria, nenhum deles se destacou.
— É tão surpreendente que sejam discretos?
— No fundo, o negócio mais importante dos Fortuna continua sendo as três grandes escolas. E toda família tem ao menos um membro que foi um estudante de honra do ano. Digo destaque nesse sentido. — Khajilamiv fechou os olhos, tentando se lembrar de mais algo. — Se não me engano, os jornais relatam tentativas de assassinato contra eles, de tempos em tempos. Uma verdadeira família discreta, nunca seria alvo de tanto ódio.
O Barão convidou o Visconde para conversar dentro da carruagem, já que o Sol se pôs a pouco tempo e as barracas ainda estavam sendo armadas.
Enquanto eles negociavam, houve uma troca de olhares e um clima estranho entre os dois exércitos. E a cada xingamento e piada sem graça, o motivo se tornava mais claro: inveja.
No outro lado, a única coisa que compartilhavam, era o padrão de suas armas e armaduras; porque para inflar os números, a maioria era composta por mercenários ou até pessoas comuns, buscando um dinheiro rápido.
— Pelo jeito, gastaram todo tempo de treino em acertar a marcha e esqueceram o resto — disse Rafun.
E se tinha algo que os cavaleiros de Fortuna recebiam, era isso.
— Te desafio a repetir o que disse! — Um dos poucos cavaleiros de verdade, se irritou com essa frase e o conflito escalou, por conta dos outros mercenários.
Logo, um círculo de pessoas foi formado, com os dois cavaleiros dentro.
Uma mistura de raiva, risadas e apostas, começou a ganhar força.
Mas essa agitação durou pouco.
Antes que o cavaleiro desse um passo, Rafun o nocauteou.
Olhando para o homem espumando no chão, outro problema ainda maior surgiu.
— Alguém roubou a minha bolsa! — gritou um dos trabalhadores do Barão.
— Quem diria. O que mais devo esperar dessa família de traidores? — disse Rafun.
— Está nos acusando?
— Quem mais teria feito isso?
Um soco levou a outro, um ataque levou a um contra-ataque.
Quando a porta da carruagem se abriu, os dois se depararam com uma briga generalizada.
E eu apenas observava de longe, protegendo a barraca do Khajilamiv, que sempre dormia cedo.
— P-parem com isso! — gritou o Visconde.
— Venham — disse o Barão.
Os nossos cavaleiros pararam de imediato e correram para se ajoelhar em direção a carruagem, mas a reação dos cavaleiros do Visconde foi mista, com alguns obedecendo, outros quase inconscientes, continuando a lutar contra o ar e uma pequena aglomeração de perdidos, confusos e medrosos, parados no lugar.
— Deixo a punição com você, Ampom. — Até o mais forte dos grão-mestres, tremeu.
O olho do Visconde emitiu um brilho branco, sua cabeça vasculhou todos os lados e ele apontou para um dos cavaleiros, entre os que não responderam.
Esse foi arrastado por dois cavaleiros de verdade e vasculhado até encontrarem a bolsa perdida.
— Matem...
— Isso não é excessivo demais?
— Não me ouviram!?
Eles hesitaram novamente e o próprio Visconde sacou sua lâmina e decapitou o ladrão, em um corte limpo.
— Irei me retirar por hoje — disse o Visconde, com o rosto rosa de vergonha. — Voltarei depois de amanhã, com a pedra elemental do acordo.
O Barão fez um cumprimento formal, se despediu dele, então ordenou:
— O enterrem dignamente.
Andei até a Selena, que contava seus lucros e perguntei:
— Sabe se aquele homem é perigoso? Como pode matar um de seus próprios cavaleiros, tão tranquilamente?
— É que ele tem um diagnóstico severo.
— Qual é?
— Nasceu nobre.
— ...
— Espere um minuto. — Ela começou a analisar as árvores e gritou: — Pode se revelar!
Uma mulher adulta, coberta por uma capa preta e vestindo sapatos com espinhos afiados na sola, caiu da árvore que a Selena estava olhando, se moveu apressadamente até nós e se curvou, perguntando:
— Do que precisa, pequena flor reluzente, que brilha na manhã e governa a noite?
— Se usar esse apelido vergonhoso novamente, vou pedir para o pai te substituir!
— Perdão, jovem mestra. É difícil me acostumar, quando você mesmo insistiu tanto que...
— Já chega! Caham... Preciso que investigue aquele Visconde.
— Qual a palavrinha mágica?
— P-por favor...
— Seu desejo é uma ordem.
Ela partiu com tanta velocidade que, para meus olhos, foi como se teletransportasse, como os magos aventureiros.
— Aquela...
No lugar onde desapareceu, ela deixou uma flor, pisoteada pela Selena.
— Já está tarde, não se agite antes de dormir — disse o Barão.
— Estava prestes a ir falar com você. Que acordo fez com um homem tão maluco? — perguntei.
— Sei que é pouco convincente dizer depois daquilo, mas ele não é tão estranho quanto parece. Digamos que... Para o trabalho que ele designado, soluções assim, costumam ser mais eficientes. E esse costume pode vazar para as outras áreas da vida.
— Ele é um assassino?
— Um pouco pior. Enfim, sobre o contrato, a multidão que surgiu para perseguir o colosso, veio, em maior parte, da cidade dele. Apesar de retirar os pedidos relacionados ao colosso de todas as filiais da guilda de aventureiros da cidade, isso só trouxe mais atenção para o caso. Depois de explicar a nossa situação, ele se dispôs a nos ajudar com nosso problema, com duas condições: em troca de fornecer uma pedra elemental do mesmo tipo, qualidade e capacidade, para que entreguemos a nossa para o colosso, ele quer ser viajar junto com a gente e ser escoltado pelos grão-mestres, o que não nos custa nada e o segundo...
— É um pedido absurdo? A cabeça dos cavaleiros que incitaram a confusão?
— Ouvindo os rumores dos dois pequenos gênios que estão viajando conosco, ele implorou para que eles ensinassem seu próprio filho, Voyro, futuro herdeiro do Viscondado, mas tão irresponsável, sempre fugindo de suas lições e tirando notas péssimas nas provas gerais e dos professores, que pode causar uma guerra de sucessão interna, caso continue assim.
— Estranhamente razoável... Deve ter alguma armadilha.
— Já estamos investigando, por causa disso — disse Selena.
Com isso, resolvemos o problema do colosso. Sem luta épica ou solução engenhosa, apenas a boa e velha política.
— Agora podemos nos concentrar no resgate do Trakov — disse o Barão.
— Já passou tempo demais e nossas tentativas anteriores foram um fracasso. Desista dele — disse Selena.
— Não posso. Até que o artefato sinalize o contrário, tenho a obrigação de tentar tudo que está ao meu alcance.
— Esse negócio deve estar quebrado, não tem como ele estar vivo.
Trakov, ???
Estou à beira da loucura.
Tenho estado exposto a esse frio congelante por dias, mas não morro.
Tenho sido esmagado por esse metal e espremido por essas linhas, mas não morro.
Tudo que tenho a disposição são esses rangidos que me cercam e a luz desconhecida.
Por que esse monstro ainda me mantém vivo?
Esfayl, 2017 D.C
Chegando ao escritório do ministro do esporte e procurando entre os muitos funcionários, descobri que a secretaria mencionada pelo Lucca não estava.
“Será que se aposentou?”
Perguntando, descobri que ela trabalhava em uma construção separada, porém, próxima.
Andando até lá, apertando no interfone, ouvindo um jingle e escutando a voz dela, expliquei meu propósito da visita e a porta se destrancou.
Entrei no prédio de três andares, passei por um corredor com dois banquinhos e uma mesa ocupada por uma cafeteira e copos descartáveis. Subi as escadas, visto que o elevador estava em manutenção, como indicado por uma nota de papel; procurei alguém no primeiro andar, vazio, apesar de uma TV ligada, conectada em um canal do governo, que reportava sobre os acontecimentos do planalto.
Então cheguei no segundo andar: uma sala com papeis de parede floridos, habitada por três pessoas.
Fiquei distraída por alguns minutos, observando um grande retrato de aparência antiga, épica, sobre a era colonial, uma paisagem com navios atracando nas praias brasileiras, até me relembrar do meu propósito e andar em direção a mesa daquela mencionada nas notas.
Um telefone tocava sem parar, atendido por um secretário da secretaria.
Com uma tranquilidade nada urgente, eles resolviam os assuntos extrajudiciais e extra oficiais do ministro, categoria que provavelmente se encaixava a solução para o resgate do Lucca.
Explicando o caso para a secretária, ela digitou algo no seu teclado, arrancou uma folha de papel de seu caderno, anotou algumas coisas com sua caneta preta e entregou:
— Vá daqui algumas horas e entregue isso para o recepcionista de lá.
Sem conversa, sem perguntas, simples assim. Um pouco anticlimático, pelo grande trabalho em chegar até aqui.
— Você não solucionou pelo computador?
— Isso é outra coisa
— É o favor exigido em troca do outro?
— Pelo contrário, estou recebendo um favor do Lucca
— Como assim?
— Felizmente, esse problema dele veio em um momento oportuno. Irei enviar esse tratamento indevido com os pobres recém retornados a Terra, para um jornalista.
— O que isso tem a ver com esporte?
— Nada
— É alguma rixa pessoal?
— Um presente para meu sobrinho, que está começando sua carreira política
A secretária pediu o meu número, para conversar melhor depois, mas respondi que ainda não tinha comprado um celular.
— Qual o seu nome?
— Esfayl.
Com a minha resposta, ela se virou para a mesa de um assistente:
— Me vê aquela caixa lá... Não essa, a outra. Obrigada. — Com um tom irônico, prosseguiu: — Parabéns Esfayl, você acabou de ganhar um celular de última geração no sorteio beneficente! Já vou deixar aqui meu número...
— Eu não posso aceitar isso.
— Por causa dos impostos? Posso te passar o contato de um amigo que resolve rapidinho
— Esses aparelhos não são caros?
— Mais do que deveriam
— O que vai pedir em troca?
— De novo isso? Se como um presente sincero não colou, considere como compra de votos
— Vai se candidatar?
— Pelos votos passados, que o Lucca ganhou para o ministro
Relutantemente, aceitei.
— Você não era de falar tanto... — disse a secretária
— Já nos encontramos antes?
— Espera, você não é a ex dele?
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