Volume 1 – Arco 4

Capítulo 40: A Última Taxa.

O conflito finalmente chegara ao fim. O grupo se reuniu no interior austero da prefeitura, onde o ar pesado das pedras se misturava ao cheiro da cera das velas. As sombras longas das vigas desenhavam silhuetas no chão gasto, enquanto as janelas deixavam entrar os raios claros da tarde.

De repente, um grito rompeu a calmaria. Estridente e cheio de emoção: — KENSHIROOO!!!

A voz de Erina soou tão forte e carregada de aflição que pareceu fazer as paredes estremecerem. Todos se voltaram para ela enquanto avançava, o corpo tenso, os olhos ardendo de raiva e preocupação.

Ela agarrou os braços roxos e machucados do marido com força quase desesperada, socando-os como se quisesse transferir toda a sua frustração para aquele ponto.

— Você me prometeu que iria protegê-los! — disse, a voz entrecortada, carregada de dor e culpa.

Xin, completamente curada e livre do perigo, observava a cena com uma curiosidade quase divertida. Ao seu lado, Zudao mantinha-se sério, os olhos atentos como se fosse sua missão manter a jovem contida, para que não revelasse suas emoções.

Sebastian, pálido mas sem ferimentos aparentes, parecia um espectro anêmico. Ainda assim, mantinha um ar tranquilo, consciente de que bastariam alguns quilos de carne e sangue animal para recuperar sua vitalidade habitual.

— Senhorita Erina — disse Sebastian, com uma voz calma, tentando aliviar a tensão —, seu marido lutou com determinação. Se não fosse por ele, não estaríamos aqui para contar essa história.

Erina virou-se abruptamente para encará-lo, os olhos faiscando com um olhar mortal. Não gostava que alguém interrompesse seus momentos com Kenshiro.

— Aparentemente, meu marido só resolveu levar a luta a sério quando já estava quase tudo perdido, não é? — disse, apertando ainda mais o braço ferido dele. O som de osso se comprimindo soou cruel naquele ambiente pesado.

Kenshiro permaneceu impassível, as feições endurecidas e calmas como sempre, suportando a dor sem um gemido sequer.

— De que adianta ter um subordinado forte se ele tem medo de lutar até o limite? — continuou Erina, a voz baixa e venenosa.

Nesse momento, a porta da sala se abriu. Lois entrou, acompanhada por um homem de aparência distinta: um nobre elegante, trajando roupas escuras impecáveis e uma cartola que parecia saída de outra época.

— Estou atrapalhando algo? — perguntou Lois, com um sorriso irônico, enquanto os demais os observavam atentos.

Erina cessou a bronca ao perceber que Kenshiro não mudara de expressão — havia suportado tudo até o fim. Ela curou rapidamente os ferimentos dele, garantindo que não sucumbisse pela perda de sangue.

— Está tudo bem — disse, virando-se para Lois. — O que houve? Quem é este?

— Este é meu sócio, Walter Black — respondeu Lois, olhando para o homem ao lado. — Ele nos ajudou com a Votare e agora vai facilitar as negociações com os nobres de Altunet.

Erina arqueou uma sobrancelha, desconfiada.

— Achei que você queria a morte de todos os ricos...

Lois sorriu com ironia.

— Agora eu sou a governadora. Eles são meu povo, quer queiram ou não... Mas não serão ricos por muito tempo. A fortuna deles logo vai financiar a reconstrução da cidade, do jeito que eu planejei.

O silêncio se instalou, todos atentos ao nobre e à governadora.

— Altunet tem dinheiro, mas falta recursos, cultura própria, comércio... — explicou Walter. — Não importa o quanto eu tenha, sempre precisei mandar emissários buscar suprimentos fora da cidade. Isso é um atraso inaceitável.

Kenshiro, focado, interrompeu: — O que a nova governadora nos dará como recompensa pela ajuda?

A atenção voltou-se para Lois.

— Vamos para o meu escritório.

— Me pergunto se nosso "golpe democrático" foi legítimo — disse Sebastian, num tom de dúvida terrível.

Lois pegou a caneta do Governador e rabiscou algumas palavras, confirmando que era oficial. Os demais, que desconheciam as propriedades da caneta, ficaram impressionados ao testá-la.

Sentada em sua mesa, Lois reuniu alguns papéis.

— O que vocês querem?

— Recursos e dinheiro — disse Erina. — Imagino que você tenha de sobra.

— Claro que sim.

O som da caneta correndo no papel preenchia o silêncio.

Sebastian e Kenshiro trocaram olhares. Havia algo que ainda não haviam contado aos demais.

— Vou abrir o cofre e pegar algumas pedras preciosas para vocês. Serve?

O cofre apareceu magicamente em uma das paredes. A porta foi aberta sem dificuldade. Apenas o Governador parecia ter esse privilégio.

Mas, quando conferiram o conteúdo...

Lois tombou para trás, desmaiando de choque.

O cofre estava quase vazio.

Poucas moedas, algumas pedras preciosas — escassas demais para a riqueza que Altunet prometia.

Erina lançou um olhar duro a Kenshiro, que não pareceu surpreso.

O restante do grupo ficou aterrorizado ao ver cortes profundos no interior do cofre, suspeitando da intensidade do combate com Quasimir.

— Ao menos a cidade é de vocês — disse Kenshiro, sem jeito.

HA! HA! HA! — Gurok soltou uma gargalhada irônica.

Lois despertou, furiosa.

— Estão brincando comigo?! Todo aquele dinheiro já tinha destino! Como vou negociar com outras cidades? Financiar a ampliação?

Ahem... — Pigarreou o nobre, mantendo a calma. — Perdoe-me, governadora, mas acredito que as minas ainda estejam cheias. Do contrário, o Império não buscaria enviar tantos trabalhadores para cá.

Lois respirou fundo, frustrada. Embora fosse verdade, isso não a tranquilizava.

— E tenho certeza de que os nobres têm riqueza para os gastos mais urgentes — completou ele.

Ela inspirou fundo, tentando pensar positivo.

— Peguem o que restou no cofre e me digam o total.

(...)

— Quase 12 mil moedas, três esmeraldas, cinco rubis e dois diamantes — disse Erina.

— Uma miséria para os padrões daqui... — suspirou. — Parece que não tenho escolha.

Ela continuou escrevendo.

— O que está fazendo? — perguntou Zudao.

— Já disse que receberão uma grande quantia, mas como não tenho dinheiro, darei algo equivalente em troca.

— E o que seria?

— Gurok — disse Lois, chamando-o. — Parece que seu desejo se tornou realidade.

— O quê? — Todos ficaram surpresos.

— Sem dinheiro, ofereço os serviços do meu Juiz por tempo indeterminado. Isso basta, Erina?

Erina o avaliou, estudando cada gesto do orc. Olhou firme em seus olhos, buscando qualquer sinal de maldade ou corrupção. Não encontrou nada além de virtudes.

— Sim, ele basta.

Gurok suspirou, aliviado por ser aceito.

Ninguém ousaria questionar as decisões de Erina, especialmente sobre seus próprios membros.

— Imagino que vocês precisem partir — disse Lois. — Se ficarem muito mais tempo, o Império logo virá investigar os acordos, e eu não poderei escondê-los.

— Crianças, para a saída! — ordenou Erina aos subordinados.

(...)

Fora dos portões de Altunet, com a carruagem em movimento, Gurok caminhava ao lado dela.

— Quero trocar algumas palavras com meu Juiz, se não se importa.

— Claro — disse Erina. — Gurok, estaremos um pouco mais à frente. Não partiremos sem você.

Quando a figura de Erina e a carruagem desapareceram de vista, Lois e Gurok consideraram-se a sós.

— Acho que não havia outro resultado além deste — disse Gurok, contemplativo. — A população ainda não está pronta para um Juiz orc.

— Eles estarão, quando você voltar. Eu prometo — respondeu Lois, carregando a culpa de não ter tornado a cidade um lar para ele.

— Foi divertido.

— "Divertido"?

— Sim... Achei que soaria melhor do que "passamos bons tempos juntos".

— Sim... Dormindo com medo, pensando que poderíamos ser mortos em nossas camas.

— Ou traídos pelas pessoas comuns.

— E todo esforço ter sido em vão — disse Lois, lembrando dos que morreram.

— Sei que você dará conta. Você tem a determinação do seu pai.

Riram juntos pela primeira vez em muito tempo.

Quando o silêncio tomou conta, sabiam que era hora de se despedirem. Nenhum deles ousava.

— Meu Juiz, ajoelhe-se — ordenou Lois, com peso em suas palavras.

Gurok fez uma reverência, baixando a cabeça em sinal de respeito.

Lois levantou o rosto dele, obrigando-o a encará-la. Então o beijou. Um beijo simples, intenso, carregado de tudo o que não haviam dito.

— Agora levante-se. Parta em sua aventura e volte vivo. Senão... eu mesma te mato.

— Sim, minha governadora.

Gurok levantou-se, respirou fundo e olhou para Altunet — para a mulher que amava. Então caminhou rumo ao desconhecido.

Sem olhar para trás.

(...)

Erina o esperava encostada numa árvore.

— Foi rápido. Tem certeza de que está pronto?

— Sim, senhora.

— Espere — disse com autoridade.

Gurok parou e virou-se.

— Retire o elmo — ordenou.

Ele obedeceu, revelando lágrimas nos olhos. Tentava desviar o olhar, envergonhado.

Erina sorriu, feliz em ver o coração bondoso de seu Paladino.

— Gurok, permita-me falar sobre suas obrigações e direitos.

O paladino limpou rapidamente as lágrimas e a encarou, atento.

— Não espero nada menos que fidelidade total a mim e a meu marido. Você deve acatar nossas ordens sem descaso ou rebeldia, ainda que sejam absurdas. Deve respeitar e proteger seus companheiros, arriscando sua vida para mantê-los a salvo. E nunca vire as costas para eles.

Ela suavizou o tom, tornando-o quase acolhedor.

— Se fizer isso, se for leal a mim e ao seu novo grupo, eu prometo: você voltará são e salvo para os braços da mulher que você ama.

Ainda que não tivesse espionado, Erina sempre fora boa em perceber os sentimentos dos outros.

Gurok reconheceu sua posição. Vestiu o elmo e declarou: — Juro total lealdade a você e a seu marido. Tratá-los-ei como minha nova família.

Erina sorriu, satisfeita.

— Agora vamos. Temos uma longa jornada pela frente.

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