Volume 8
Capítulo 21: Sétimo Andar de Aincrad
21
— EU TAMBÉM VOU VENDER MEUS EQUIPAMENTOS PARA CONSEGUIR DINHEIRO! — insistiu «Kizmel». Foi necessário todo o nosso esforço para dissuadi-la dessa ideia e, depois de enchermos o estômago com refeições do serviço de quarto, começamos um detalhamento completo do nosso plano.
Na parte noturna da arena de monstros, que começava às nove, Asuna e eu faríamos apostas usando nosso fundo de guerra de duzentos mil cols como capital inicial. Eram cinquenta mil de mim, Asuna, Argo e «Kio», cada um. Depois de confirmar com ela, descobri que não era todo o dinheiro da Argo, mas se ela saísse disso sem nenhum retorno, teria que sobreviver com o velho e bom pão preto por um tempo — nada de creme dessa vez.
Asuna pediu a Liten os favoritos mais recentes segundo a lista de dicas, que ela nos passou com prazer. Sabíamos que venceríamos as quatro primeiras lutas. O problema era a última, cujo resultado estava completamente sob controle da família Korloy. Em qualquer caso, quando nós, a ALS e a DKB começássemos a apostar com um total de cento e cinquenta mil fichas, «Bardun» certamente desceria às pressas do terceiro andar, e esse seria o momento em que Argo e «Kizmel», mestras da infiltração, teriam uma janela para invadir o Quarto 7. Caso «Bardun» enviasse assassinos ou algo desse tipo, e dado que o estado de sua mestre poderia piorar de repente, «Kio» permaneceria no quarto cuidando de «Nirrnir».
Enquanto a luta final acontecia, esperávamos que Argo e «Kizmel» conseguissem um meio de entrar em contato com os Elfos Caídos. Caso não conseguissem, estávamos planejando apostar em monstros diferentes dos escolhidos por Lind e Kibaou, assim, independentemente do resultado, pelo menos um dos três grupos alcançaria cem mil fichas. Quando alguém reivindicasse a «Sword of Volupta» — que havia brilhado como um prêmio não reclamado atrás do balcão por séculos — «Bardun» certamente se afastaria de seu quarto por um bom tempo.
De preferência, queríamos obter a espada lendária, usá-la para derrotar o boss e depois vendê-la de volta ao cassino, para que pudéssemos devolver os cinquenta mil col de «Kio». Mas esse era o tipo de plano em que qualquer ganância poderia colocar tudo a perder, então me prometi que, se Lind ou Kibaou a conseguissem, estaria tudo bem. Às oito horas, havíamos terminado nosso briefing.
Nos vinte minutos seguintes, Asuna e eu trabalhamos em nossos disfarces para enganar a família Korloy. Na prática, isso significava Asuna usando o vestido preto pessoal da «Kio», e eu, o smoking preto do pai de «Nirrnir», ambos usando máscaras de baile.
As máscaras pareciam um exagero para mim, mas havia vários NPCs fantasiados também; obviamente, eu não podia aparecer de smoking e com um saco de estopa na cabeça de novo. A ALS e a DKB nos reconheceriam pelos cursores coloridos, e provavelmente se perguntariam o que diabos estávamos fazendo, mas escolhi acreditar que não se meteriam conosco até o fim das lutas na arena.
Por fim, conferimos se não havia nenhuma falha gritante no plano e, pontualmente às oito e meia, estávamos prontos para deixar o Quarto 17.
Exceto que «Kio» nos segurou por um momento.
— Asuna, Kirito, sou imensamente grata. Em nome da minha mestre... E, claro, por mim mesma, vocês têm minha mais profunda gratidão.
— Vamos deixar isso para quando ela estiver se sentindo melhor — disse Asuna, usando uma máscara preta de borboleta, e dando um abraço rápido em «Kio». Obviamente, eu não podia fazer algo assim, então apenas dei um aceno significativo com a cabeça. Depois de um breve olhar para Argo e «Kizmel», deixamos o quarto do hotel.
«Huazo» e «Lunnze», que estavam de guarda na porta, já sabiam o essencial do plano. Demos um aceno rápido e seguimos para a entrada do hotel. Ao passar pelo balcão e cruzar o saguão, lancei um olhar para Asuna. Pela máscara, dava para perceber que ela estava um pouco irritada com alguma coisa. Achei a princípio que tinha feito algo errado... Depois percebi que o problema era justamente eu não ter feito nada.
— Hã... Você está muito bonita com esse vestido, senhorita Asuna... — falei, meio sem jeito. Ela me lançou um olhar silencioso e, de repente, estendeu a mão esquerda. Me preparei para um de seus socos habituais na minha costela — mas, em vez disso, ela agarrou meu pulso. Depois de ajustar meu braço para que a palma ficasse virada para cima, alinhou-se ao meu lado e colocou a mão na minha.
Descemos os degraus em espiral assim. Apressado, desacelerei para acompanhar seu ritmo e perguntei, em voz baixa.
— Uh... O que é isso?
— Cala a boca; é assim que se faz.
Parecia uma resposta injusta, mas percebi que discutir não me levaria a lugar algum. Tudo o que podia fazer era caminhar — e rezar para que nenhum outro jogador nos visse. Já me sentia estranho o suficiente com os sapatos de couro brilhantes, que mal usava no mundo real, mas não podia reclamar para Asuna, que conseguia andar perfeitamente com aqueles saltos absurdamente delicados.
Felizmente, não tropecei escada abaixo nem encontrei ninguém conhecido. Quando chegamos ao primeiro andar, soltei discretamente a mão com a qual estava escoltando Asuna, exalei silenciosamente para que ela não ouvisse, e fui até o balcão de compra de fichas na sala de jogos.
Não teve jeito de evitar que minha voz falhasse ao dizer para a atendente de gravata-borboleta.
— Duas mil fichas.
Ela sorriu e respondeu.
— Claro, senhor — o que fez surgir uma janela de pagamento. Afastei qualquer hesitação e apertei o botão OK, obliterando instantaneamente os duzentos mil col do meu inventário. Duas moedas grandes apareceram no balcão, com 1.000 VC estampado na frente. Peguei-as e as coloquei no bolso interno do paletó do smoking.
As próximas duas horas definiriam se essas fichas virariam cem mil... Ou desapareceriam. Isso trouxe de volta o pesadelo do beta teste com clareza — e um suor frio na pele.
Naquela época, ter toda a minha fortuna apostada na última grande jogada fazia meu coração bater tão rápido que pensei que ia desmaiar. E agora, não era só o meu destino em jogo, mas a vida de «Nirrnir» e a honra de «Kizmel».
Já não havia mais possibilidade de cortar laços e dizer que, no fim, o que acontecesse com simples NPCs não importava. Aincrad carregava uma história construída ao longo de séculos, talvez milênios, e «Kizmel», «Nirrnir», «Kio» — até mesmo o espadachim do Palácio da Árvore «Harin», «Lavik», e o Visconde «Yofilis» — eram todas pessoas de verdade, que viveram suas vidas neste mundo...
— Vamos, anda logo.
Ela puxou meu braço de novo, e eu levantei o olhar, distraído dos meus pensamentos. Lá estava Asuna, olhando para mim como sempre fazia.
Tarde demais, percebi que, embora eu carregasse um peso muito maior do que sentia no beta, não estava mais carregando isso sozinho. Respirei fundo e disse.
— É... Estou pronto.
Batendo de leve nas duas moedas no bolso do paletó através do tecido, comecei a caminhar. Asuna tomou meu lado e, naturalmente, apoiou a mão no meu braço.
— Hã... Isso também faz parte do que "se faz"? — perguntei.
— É isso que você faz — respondeu minha parceira temporária, sem hesitar. Lancei um olhar de soslaio para o rosto dela, agora alguns centímetros mais alto graças ao salto, e achei ter visto um leve sorriso travesso nos lábios, sob a máscara de borboleta.
Não consegui evitar o pensamento: Será mesmo…?
O coliseu de monstros no subsolo do Grande Cassino, também conhecido como Arena de Batalha, estava ainda mais barulhento e animado do que na noite anterior. O salão espaçoso estava lotado de NPCs bem vestidos, suas vozes tão excitadas que abafavam o agradável acompanhamento de cordas tocando nos andares superiores. Após uma rápida análise do ambiente, encontrei a DKB reunida na área de refeições à esquerda do salão, enquanto os membros da ALS estavam à direita, falando animadamente em torno de uma mesa.
Eles estavam vestidos com roupas comuns e simples, claramente só tinham tirado o equipamento de combate, mas quase todos os NPCs usavam trajes formais — muitos com máscaras —, então, à primeira vista, provavelmente ninguém nos reconheceria. Faltavam quinze minutos para a primeira luta, então a primeira coisa a fazer era ir ao balcão ao lado do bar e pegar a lista das apostas da noite.
Qual será que eu escolho? pensei. No fim, fui até a área de refeições à direita, onde estavam os membros da ALS. Levei Asuna até uma mesa vazia no canto, sussurrei "Espere aqui" e fui até o balcão de apostas. As folhas mágicas com as cotações atualizadas automaticamente estavam disponíveis para pegar, então peguei uma e rapidamente me virei para voltar ao meu assento.
Mas então uma voz me disse.
— Yo, finalmente apareceu, né? — e uma mão bateu no meu ombro. Dei um pulo, congelei e me virei de forma desajeitada.
Era um homem com cabelos curtos e castanhos, espetados como uma maça, uma pequena barba triangular no queixo e feições carrancudas que indicavam uma personalidade extremamente teimosa — o líder da ALS, Kibaou. Uma das sobrancelhas dele se ergueu ao examinar minha aparência de cima a baixo.
— Por que diabos você tá vestido assim? — perguntou, e nesse ponto, não dava mais pra fingir inocência. Além disso, para ele, o nome KIRITO estava provavelmente visível bem acima da minha cabeça. Desisti de tentar escapar e cumprimentei.
— E aí, Kibaou.
— Bom, não tenho tempo, e não tô nem aí pra suas roupas. Cadê sua parceira?
— Ah… Ali — respondi, apontando para a mesa no canto. Ele se virou e começou a acenar exageradamente na nossa direção.
— Vamos lá, chega mais! — gritou, atraindo olhares reprovadores das senhoras e senhores em seus trajes de gala. Asuna percebeu — assim como eu — que ele podia acabar chamando a atenção de qualquer gente da Korloy presente no salão, então rapidamente se esgueirou pela multidão e murmurou.
— Boa noite, Kibaou.
— É! Boa noite. Pois, pois… Você fica bem melhor nessas roupas do que ele.
Mas o que você quer, afinal?! Tive que me segurar para não soltar essa.
— Escuta, Kibaou, a gente também não tem muito tempo…
— Eu sei, eu sei. Vou direto ao ponto.
Ele nos levou até uma mesa vazia próxima, lançou um olhar para seus companheiros de guilda e disse.
— Ouvi da Liten que aquelas tabelas de apostas eram uma armadilha do cassino. Tô aqui pra agradecer por isso.
Ver aquele cabeção espinhoso se curvar, ainda que um centímetro, em sinal de gratidão, me pegou de surpresa. Asuna tinha avisado Liten que era 99% certo de ser uma armadilha em troca de descobrir as probabilidades das lutas; só não esperava que isso acabasse levando a um agradecimento pessoal do Kibaou.
Pelo visto, as pessoas realmente podem mudar, pensei. Mas então ele disse.
— A parada é a seguinte: a gente já tava desconfiando ontem à noite. Tipo, seguir todas as apostas do papel e ganhar todas? Parece bom demais pra ser verdade, sacou?
— Mas… Vocês ainda apostaram de acordo com o papel em todas as lutas, né? — apontei.
Kibaou fez uma careta amarga.
— Bom, quer dizer, ele acertou nove de dez lutas. As cinco mais cedo hoje foram exatamente como dizia, e imagino que as quatro primeiras da noite também serão. Mas a última… A gente vai apostar contra o papel. Só queria te avisar isso — disse ele, virando nos calcanhares, dando um rápido adeus e voltando para os seus.
— E-Ei! Espera aí! — exclamei, agarrando a camisa verde-musgo dele e o virando de volta.
— Que foi?
— Quero dizer… Se vocês vão apostar no oposto, é com vocês. Mas você falou com o Lind sobre isso?
— Pra quê eu falaria?
— Como assim "pra quê"? Porque… Se a ALS e a DKB apostarem em monstros diferentes na luta final, isso garante que um dos lados vai ganhar…
— Escuta aqui, parceiro — disse ele, já impaciente, apontando o dedo no meu peito —, eu sei que não é o ideal ficar batendo de frente com eles o tempo todo. Como você falou, se a gente apostar em monstros diferentes, um dos dois lados vai ganhar, com certeza. Mas dessa vez não vai funcionar assim. Você viu as especificações daquela espada, né? Aquilo é um desequilíbrio total. É mais roubada que aquela bandeira de guilda. Nem o Lind, nem eu, somos grandes o bastante pra dar um passo atrás e deixar o outro levar toda a glória!
Ele recuou o dedo e bateu no próprio peito com a mão, então voltou para os companheiros. Três segundos de silêncio atônito depois, olhei para Asuna.
— Nunca vi alguém se gabar de não ser "grande o bastante" — ela comentou.
— Bom… Acho que isso é mais confiável do que alguém que afirma ser grande demais — murmurei de volta.
✗
O relógio marcava apenas sete minutos para o início da competição. Rapidamente abri a folha de cotações na mesa para examinarmos juntos. Para minha surpresa, a folha já tinha entradas alteradas para a primeira luta, que era onde o monstro seria substituído. O Rusty Lykaon havia sido trocado por um Quad Scissors Crab, aparentemente.
Segundo Liten, que vinha passando informações para Asuna, o homem mais velho das folhas de apostas apareceu do nada pouco antes das lutas noturnas começarem, distribuindo novas cotações para a luta alterada. Se eu não soubesse o que ele estava tramando, teria ficado impressionado com tamanha "ajuda". Usamos uma caneta de latão presa à mesa para marcar os palpites mais recentes ao lado dos monstros na lista:
Luta 1: Scaly Badger (O) vs. Quad Scissors Crab (×)
Luta 2: Studded Stag Beetle (×) vs. Squiddy Vine ( )
Luta 3: Lightning Squirrel (Δ) vs. Rocket Gopher ( )
Luta 4: Bestial Hand ( ) vs. Ferocious Hand (×)
Luta 5: Tiny Glyptodont (Δ ) vs. Verdian Bighorn ()
— Interessante que não existam foguetes neste mundo, mas tem um com esse nome entre os monstros — comentei, girando a pesada caneta de latão depois de verificar todos os nomes.
Mais uma vez, Asuna demonstrou um conhecimento surpreendente.
— Pelo que me lembro, a palavra "foguete" vem de um carretel de linha em volta de um bastão. Com certeza eles têm isso em Aincrad.
— Ah... Entendi.
— Além disso, há uma família de roedores da América do Norte conhecida como pocket gophers, então eu imagino que "Rocket Gopher" seja um trocadilho com isso.
— Ah... Entendi — repeti, me sentindo como um chatbot automatizado, então acrescentei: — Tipo o melibe viridis e o hematomelibe, né?
— Por favor, não fale disso — disse Asuna, me lançando um olhar mortal por trás da máscara. Ela passou o dedo pela lista de probabilidades. — Parece que os monstros da família Nachtoy estão do lado esquerdo, e os da Korloy, do direito.
— Hã...? Ah, é verdade.
Não tinha reparado nisso ontem, mas agora que ela falou, todos os monstros da família Nachtoy estavam mesmo listados do lado esquerdo da folha. Ou seja, a folha de dicas sugeria que os Nachtoy venceriam a primeira e a quarta lutas, enquanto os Korloy ganhariam a segunda, terceira e quinta.
Mas se a última luta fosse a única que contrariasse as expectativas — como aconteceu ontem — então o vencedor seria o Tiny Glyptodont da família Nachtoy. Kibaou disse que apostaria nesse, e talvez o grupo do Lind fizesse o mesmo.
Se fosse o caso, as chances de vitória do Glyptodont cairiam bastante. Dependendo de quanto a gente ganhasse nas quatro primeiras lutas, talvez vencer a última ainda não fosse suficiente para alcançar as cem mil fichas exigidas. Mas isso não era problema meu...
— E na última luta, vamos apostar em quem? — perguntou Asuna. Dei de ombros.
— Depende de como o Lind e o Kiba vão jogar. Mas se os dois apostarem no monstro dos Nachtoy, a gente provavelmente vai apostar no monstro dos Korloy.
— Hmmm... Se os Korloy conseguem manipular a vitória e a derrota como quiserem, não seria mais vantajoso pra eles fazerem o monstro deles ganhar? Assim ganham mais com as apostas perdidas.
— Essa seria a decisão racional, sim.
— Tenho a impressão de que isso vai fazer sua popularidade entre os Linds e Kibaous do jogo cair ainda mais do que no incidente da bandeira da guilda…
— Não dá pra cair abaixo de zero, então não me preocupo muito...
Nesse momento, o salão foi repentinamente preenchido pelo som estrondoso de um gongo. Holofotes se acenderam nas paredes, iluminando um estande no centro do piso.
— Sennnhooooras e sennnnhoreees! Sejaaam beeem-vindooos... À joia da coroa do Grande Cassino de «Volupta»: a Areeeeena de Batalhaaa!
Era o mesmo NPC estiloso com camisa branca e gravata vermelha que tinha apresentado o evento na noite anterior, bradando sob os holofotes. Era literalmente o mesmo discurso, palavra por palavra.
— A primeira luta da nossa programação noturna começará em breve! As vendas de bilhetes terminam em apenas cinco minutos, então façam suas apostas agora, enquanto ainda há tempo!
O burburinho da multidão aumentou em tom e volume, e uma dúzia ou duas de NPCs se dirigiram ao balcão. Respirei fundo antes de me juntar a eles, convertendo fichas no valor de duzentos mil col em um único bilhete.
— Bom, lá vou eu. Vou apostar no Scaly Badger na primeira luta — anunciei, sentindo minhas mãos suarem.
— Certo — disse Asuna. — Vou comprar umas bebidas e garantir lugares na frente pra gente.
— Valeu.
Pra quem morre de medo de fantasmas, ela é bem destemida em situações como essa, pensei, correndo até o balcão de apostas.
✗
O Scaly Badger era, como o nome sugeria, um grande monstro parecido com um texugo, coberto por escamas duras. Já o Quad Scissors Crab tinha quatro enormes pinças em vez de duas. O caranguejo capturou o texugo várias vezes com agilidade, mas não conseguia atravessar as escamas metálicas; o texugo esmagou um dos braços e uma das pernas com seus dentes afiados, finalizando o oponente. A folha de dicas acertou essa: agora tínhamos 4.320 fichas.
O Studded Stag Beetle, da segunda luta, era um inseto cuja carapaça preta apresentava protuberâncias prateadas ao longo do corpo. Seu inimigo, a Squiddy Vine, era um monstro vegetal com dez tentáculos longos e flexíveis, semelhantes a lulas. O besouro tentou cortar os tentáculos com suas mandíbulas, mas os tentáculos se dobravam e esticavam como borracha, sendo surpreendentemente difíceis de cortar. A planta envolveu o pobre besouro e o esmagou. Agora tínhamos 8.424 fichas.
Na terceira luta, o Lightning Squirrel media cerca de quarenta centímetros, incluindo o rabo. Seu pelo era azul puro, e os dentes frontais eram longos e afiados. O Esquilo, fiel ao seu nome, era incrivelmente rápido, pulando por toda a jaula, atacando o Gopher com dentes e garras. Comecei a me preocupar achando que tínhamos apostado errado, mas assim que a barra de HP do Gopher ficou vermelha, ele lançou fogo pela cauda e disparou pelo ar como um foguete, obliterando o esquilo. 21.818 fichas.
Na quarta luta, a Bestial Hand e a Ferocious Hand eram crustáceos de aparência repulsiva que lembravam mãos humanas — só que com o triplo do tamanho. A Bestial Hand era a espécie base, enquanto a Ferocious Hand era uma variação de cor. A Bestial tentava principalmente agarrar a outra, enquanto a Ferocious possuía uma habilidade especial de atordoamento. A princípio, achei que essa poderia ser outra daquelas lutas que quebram as expectativas, mas o atordoamento não parecia funcionar contra um da mesma espécie; a força de agarrar superior da Bestial a ajudou a esmagar a Ferocious Hand.
No fim, todas as quatro lutas aconteceram exatamente como o guia secreto prévia. Teríamos perdido tudo se qualquer uma tivesse tido um resultado diferente; isso me embrulhava o estômago — eu não fazia ideia de como estavam manipulando vitória e derrota. Será que havia um monstro com coloração diferente, como o Rusty Lykaon? Ou algum deles havia recebido um estimulante ou tranquilizante para alterar sua natureza? Ontem, eu presumi que isso seria evidente graças a um ícone de reforço ou penalidade, mas eu não estava enfrentando os monstros diretamente, e não dava para assumir que uma batalha de evento funcionaria como uma partida comum.
De qualquer forma, não tínhamos outra escolha a não ser apostar todas as 62.013 fichas na luta final.
Enquanto observava hipnotizada as seis fichas de dez mil VC, as duas de mil VC, uma de dez VC e as três de um VC, Asuna murmurou.
— Agora entendi.
— Entendeu o quê?
— Se é tão emocionante mesmo quando você já sabe quem vai ganhar ou perder, acho que consigo entender um pouquinho do que você sentiu quando faliu no beta.
— Que bom ouvir isso... Quer dizer, provavelmente não é bom — comentei, tomando um gole do champanhe oferecido aos apostadores de alto nível — embora o nome oficial do item fosse apenas "Vinho Espumante". — De qualquer forma, nossos ganhos já passam de sessenta mil, então mesmo que a gente perca tudo, ainda deveríamos conseguir passes para a praia, para nós dois.
Por trás da máscara de borboleta, os olhos de Asuna se arregalaram, piscando de surpresa. Então ela exclamou.
— Ah! É verdade. Era isso que eu queria desde o começo. Tinha me esquecido completamente.
— Mesmo que a gente consiga os passes, provavelmente vai demorar até podermos aproveitar a praia, infelizmente. Além disso…
Não terminei a frase, mas confiava que Asuna entenderia. Se não conseguíssemos salvar «Nirrnir» ou «Kizmel», não estaríamos exatamente no clima para curtir a praia tão cedo. O primeiro passo para aproveitar de verdade a areia branca e a água cristalina era conseguir aquele sangue de dragão e as quatro chaves sagradas.
Se isso daria certo ou não, dependia de quem alcançaria cem mil fichas após a luta final — nós, Lind ou Kibaou — e se isso atrairia «Bardun» até a arena, como esperávamos.
— Senhoraaas e senhoreeees! — bradou novamente o NPC locutor, acompanhado do som do gongo. — É hora do grand finale desta noite! A batalha épica entre nossos dois últimos combatentes começará em instantes!! As apostas serão encerradas em cinco minutos! Apostem alto e apostem com frequência!!
O alvoroço dentro do salão aumentou mais uma vez, e muitos visitantes correram para o balcão de apostas — Lind e Kibaou certamente entre eles. Eu também queria resolver isso logo, mas não podia agir até saber em qual dos dois monstros Lind-Kiba haviam apostado.
Após dez segundos agonizantes, Asuna abriu sua janela de jogadora bem acima do colo. Ela deu uma olhada nas mensagens, então se inclinou para mim e sussurrou.
— Tanto a ALS quanto a DKB apostaram no Tiny Glyptodont.
Essa informação vinha de Liten, da ALS, e do namorado dela, Shivata, da DKB. Ambos sabiam que o guia secreto vinha de uma fonte suspeita e concordaram em nos informar a escolha de suas guildas. Só fizeram isso porque gostavam muito da Asuna, claro.
— Entendi... Então estão apostando contra o guia — murmurei, conferindo a tabela de probabilidades. O Tiny Glyptodont do clã Nachtoy tinha um símbolo de triângulo ao lado, enquanto o Verdian Bighorn do clã Korloy tinha um círculo. Se o guia estivesse tão preciso quanto antes, o bighorn venceria, mas Lind e Kibaou suspeitavam que o guia era uma armadilha do cassino, e pretendiam aproveitar isso apostando no oposto.
Essa devia ser a escolha certa. Sabíamos que o guia era uma armadilha, e se eu tivesse que escolher entre os dois, apostaria contra o monstro listado no papel. «Kio» disse que não conseguia imaginar «Bardun Korloy» sem prever que alguém tentaria quebrar seu padrão, mas fosse qual fosse a trapaça usada na última luta — troca de cor ou agentes químicos — era difícil imaginar como isso poderia ser revertido nos menos de dez segundos entre o fim das apostas e o início da luta.
De qualquer forma...
— Se Lind-Kiba apostaram no monstro de Nachtoy, então teremos que apostar no monstro de Korloy, por mais que me doa. Assim, ainda estaremos cobertos caso tenham preparado uma camada extra de trapaça — declarei, tocando o nome "Verdian Bighorn" na planilha.
Asuna assentiu.
— Certo... Mas mesmo assim...
Ela não completou, então a olhei por trás da máscara. Ela apenas balançou a cabeça.
— Desculpa, não é nada. Vá pegar o bilhete... E outro champanhe, se não se importar.
— Pode deixar.
Levantei-me, segurando a moeda na palma da mão, e fui correndo até o balcão de compras.
Sessenta e duas mil e treze fichas — equivalente a 6.201.300 col — foram trocadas por um único pedaço de papel. Agora, Lind-Kiba e eu estávamos apostando sozinhos mais de cento e cinquenta mil fichas, e com os outros visitantes somados, o total devia estar passando das duzentas mil.
Depois, peguei duas taças de champanhe no balcão do bar próximo e voltei aos nossos assentos. Asuna enviou a mensagem que já havia preparado para Argo, no terceiro andar. Por fim, só nos restava ver se «Bardun Korloy» apareceria para monitorar a situação...
— Faaaaltam três minutos para fazer suas apostas! É o último e maior confronto da noite, então não deixem de participar!! — rugiu o NPC locutor sob o refletor. A lista de probabilidades mudava rapidamente conforme as apostas entravam. Por enquanto, o Tiny Glyptodont dos Nachtoys estava com uma taxa de retorno de cerca de um vírgula sete. O Verdian Bighorn dos Korloys estava em dois vírgula três. O Glyptodont, que era a aposta da ALS e da DKB, já estava abaixo do dobro de retorno.
— Será que eles vão conseguir chegar a cem mil fichas? — murmurou Asuna.
Fiz um cálculo mental rápido.
— Hum… Se eles conseguiram pelo menos sessenta mil, como a gente, então devem ultrapassar esse total. E se a gente vencer, vamos passar de cento e quarenta mil fichas…
— Como você calcula os valores tão rápido assim? — ela perguntou.
— Hã? Ah, é só multiplicação simples, então…
Asuna fez uma operação rápida na janela que ainda estava aberta diante dela. Depois, levantou a cabeça e sussurrou.
— «Bardun» está em movimento.
— Finalmente!
O aviso tinha vindo de Argo, que estava à espreita no corredor do hotel, vigiando a recepção. Era um obstáculo do plano que havíamos superado.
Mas a parte difícil estava só começando. Nossa sorte agora estava nas mãos do destino — na forma daqueles dois monstros —, mas para Argo e «Kizmel», a missão era invadir o Quarto 7 e encontrar o item que «Bardun Korloy» estava usando para fazer contato com os Elfos Caídos, antes que ele e seus guardas armados voltassem. E nós não fazíamos ideia de que tipo de item poderia ser.
— Vai dar tudo certo. Vai funcionar — sussurrou Asuna. Ela estendeu a mão até a que estava apoiada no meu joelho e a apertou com firmeza.
Nosso papel agora era confiar que nossas companheiras dariam conta da missão. Nossa tarefa era fazer de tudo para atrasar o retorno de «Bardun» ao quarto.
— Um minuto restante para comprar seus ingressos, pessoal! — anunciou o NPC.
Achei ter ouvido uma leve elevação nas cordas da trilha sonora e virei o rosto por sobre o ombro.
Pelas portas abertas da arena, um senhor idoso entrava na sala, protegido por quatro homens vestidos de preto. Seu corpo esguio estava coberto por um elegante terno de três peças, e ele exibia um cavanhaque e bigode bem cuidados — era inconfundivelmente Bardun, o patriarca da família Korloy. A figura atarracada de seu mordomo, «Menden», vinha logo atrás.
— Lá está ele — disse Asuna, enviando outra mensagem de confirmação para Argo antes de fechar a janela com decisão.
O grupo de «Bardun» atravessou a multidão de NPCs no saguão, seguindo direto para os assentos reservados da área VIP, logo atrás da cabine do locutor. Asuna e eu estávamos na linha de frente, com uma boa visão da jaula, então só poderíamos ver o rosto de «Bardun» se olhássemos para trás. Mas eu não queria me levantar e chamar atenção, com a luta prestes a começar em menos de um minuto, então mudar de lugar não era uma opção.
Voltei a encarar a frente. O gongo ressoou mais alto do que nunca.
As várias luminárias espalhadas no alto das paredes focaram suas luzes automaticamente — fosse lá como fosse que aquilo funcionasse —, criando quatro holofotes que cortavam o salão escurecido. Eles iluminaram a jaula dourada de combate, que brilhava ainda mais intensamente, capturando os olhares de todos.
A jaula retangular, separada em duas partes por um portão divisório, tinha cerca de três metros e meio no lado mais curto — e nove no lado mais longo. Mas os dois monstros que estavam prestes a aparecer com certeza fariam o espaço parecer apertado. «Kio» havia nos dito que os únicos monstros listados na tabela de classificação eram do tamanho certo para lutar dentro da jaula e não possuíam ataques especiais que pudessem ferir o público ou danificar a estrutura. Aqueles dois, presumi, representariam o limite exato dessas condições.
Um estrondo pesado fez ondas se formarem em nossa taça de champanhe. Dois pontos da parede de pedra, de um dos lados da jaula, se retraíram e começaram a se erguer.
— Começando agora a luta final da Arena de batalha desta noite! — anunciou entusiasmado o NPC de gravata borboleta, enquanto dois holofotes se concentravam no portão à direita — a passagem que levava ao estábulo subterrâneo de monstros dos Korloy.
— Nosso primeiro combatente… Vindo das Planícies Verdianas, a leste de «Volupta», a fera de dois chifres que dispersou viajantes e destruiu carruagens! O Verdiaaaan…Bighooooorn!!!
Um som de cascos — clok! clok! — ecoou pelo corredor, e uma criatura quadrúpede preta e marrom surgiu, com chifres curvos e retorcidos. Parecia uma mistura de cabra e boi, mas tinha quase dois metros de comprimento, e presas afiadas alinhavam sua mandíbula.
Novos holofotes acenderam na porta da esquerda, que levava ao estábulo de Nachtoy.
— Próximo! Vindo das longínquas planícies esbranquiçadas a oeste de «Volupta», a criatura bizarra que esmaga todos os adversários com uma cabeça dura como aço! O Tinyyyy Glyptodonnnnt!!
Trotando pesadamente para dentro da jaula veio algo que lembrava um tatu do mundo real, com uma carapaça enorme cobrindo seu corpo. Sua cabeça, no entanto, era muito maior do que a de um tatu comum, e possuía uma testa saliente como um martelo. Era tão grande quanto o bode gigante no lado direito.
— O bode eu entendi, mas… O que é um glyptodont? — murmurou Asuna. Eu já sabia a resposta, porque tinha pesquisado isso por curiosidade durante o beta.
— Um ancestral do tatu que foi extinto há milhares de anos no mundo real — sussurrei. — Acho que eles ainda vivem em Aincrad.
— É verdade. Parece mesmo um tatu — respondeu ela, ignorando a segunda metade do meu comentário. — Mas o que faz esse ser "Tiny"?
— Imagino que exista um glyptodont não pequeno por aí. Pelo menos, eu não vi nenhum no beta.
— Espero que nunca vejamos — disse ela, fazendo uma careta.
O narrador NPC gritou, mais alto do que nunca.
— Fera contra fera! Qual cabeça poderosa vai ceder primeiro?! Que comece a luta!!
O gongo retumbou, e a grade divisória dentro da jaula começou a descer lentamente para o subsolo.
O bighorn abaixou a cabeça, bem protegida, e raspou o chão com os cascos mais uma vez. O glyptodont esticou sua cabeça em formato de martelo para fora da carapaça, tensionando os membros.
Quando a cerca desapareceu por completo, as duas criaturas rugiram — um som dissonante e feio — e investiram de lados opostos da jaula com enorme ferocidade. Apesar do tamanho, cada uma tinha cerca de um metro de largura, e havia quase quatro metros de espaço lateral na arena, o suficiente para que passassem uma pela outra — mas nenhuma delas pretendia fazer isso.
Nem eu gostaria de tentar defender esses ataques. Elas avançaram em linha reta e colidiram cabeça contra cabeça com força brutal.
Apesar de serem ataques normais, um efeito luminoso apareceu no impacto, branco com listras vermelhas, seguido por uma forte onda de choque. O chão de mármore tremeu, e até um pouco do meu champanhe restante se derramou.
Tanto o bighorn quanto o glyptodont apenas cambalearam por um momento antes de recuperar o equilíbrio e recuar. As barras de HP de ambos estavam cerca de 20% menores.
— T-Toda a arena tremeu! Que colisão poderosa!! — exclamou o narrador, provocando uma onda de aplausos e gritos do público. Mas eu não estava no clima para tanta empolgação. Eu sabia que não tinha o direito de sentir pena das criaturas capturadas e forçadas a lutar, mas, se eu conseguisse compartimentalizar meus sentimentos tão bem assim, não teria me deixado levar pela emoção e libertado o Rusty Lykaon do estábulo anteriormente.
No mínimo, eu precisava manter a calma e ficar atento a qualquer sinal de trapaça na luta. Se minha suspeita estivesse certa, os Korloy tentariam maximizar seus lucros manipulando o resultado para que o Verdian Bighorn vencesse, de acordo com o gabarito fraudulento. Eu só não sabia como fariam isso.
Nenhuma das duas feras parecia estar em más condições, e presumia-se que não houvesse variações de cor nessa camada, então trapaça por tintura estava descartada. O método mais provável seria jogar algo de fora para dentro da jaula, mas ninguém estava suficientemente próximo para isso, devido ao risco das ondas de choque dos impactos. Se alguém estivesse perto o bastante, com certeza teria sofrido dano de respingo.
O bighorn e o glyptodont recuaram para seus respectivos cantos, então baixaram a cabeça novamente. Sob os refletores, vi os dois se prepararem para mais uma investida — o bighorn raspando o chão, e o glyptodont se firmando com os membros abertos. Um momento depois, a segunda investida começou.
Apesar de serem apenas monstros comuns, o impacto que sacudiu o salão parecia digno do ataque mais poderoso de um boss de andar. Eu só conseguia imaginar a visão de fichas empilhadas desmoronando e bolas de roleta escapando do controle no primeiro cassino, e essa preocupação crescente me fez lançar um olhar discreto para os assentos VIP atrás de nós.
A área de assentos estava escura, mas os assentos VIP eram próximos o suficiente da cabine do narrador para que a luz os tornasse vagamente visíveis. «Bardun Korloy» estava sentado ao centro de um sofá, com as pernas cruzadas, bebendo champanhe. A expressão serena em seu rosto não demonstrava qualquer preocupação com danos ao cassino ou com a possível exposição de sua farsa com o gabarito de apostas.
— Não olhe tanto, senão ele vai perceber — sussurrou Asuna, e eu imediatamente endireitei o pescoço.
O segundo choque entre o bighorn e o glyptodont causou mais 20% de dano a cada um, mas parecia que a perda de HP do bighorn era ligeiramente maior. Eu me lembrava de que os dois eram mais ou menos equivalentes em resistência durante a fase beta, mas o habitat do bighorn ficava na parte frontal do andar, enquanto o do glyptodont era mais ao fundo. Fazia sentido, portanto, que o glyptodont tivesse uma leve vantagem estatística.
— Nesse ritmo, parece que o glyptodont vai vencer — murmurei, inclinando a cabeça para a direita.
Asuna também se inclinou.
— Eu estava pensando a mesma coisa... Isso significa que os Korloy não conseguiram cancelar a trapaça antes da luta começar?
— Provavelmente. Ou talvez eles nunca tenham contado com o sucesso total do truque desde o início.
— Uh-huh…
Ela parecia incerta, no entanto. E eu também sentia essa frustração. A armadilha com a Argent Serpent havia sido extremamente engenhosa. Qualquer um que pudesse bolar e executar um plano daqueles certamente teria uma alternativa, caso o público-alvo percebesse o truque. Depois de apenas uma derrota, tanto Kibaou quanto Lind já suspeitavam de trapaça e estavam apostando de acordo naquela noite.
Se o glyptodont vencesse, Lind e Kibaou ganhariam cada um mais de cem mil fichas e levariam o grande prêmio, a «Sword of Volupta» para fora do cassino. Será que um homem tão ardiloso quanto «Bardun Korloy» simplesmente aceitaria isso com um "que pena"?
Tinha que haver algo mais. Eu sabia disso. Mantive os olhos bem atentos à jaula.
Mas não havia nada de errado visível nas paredes, no chão ou no teto. Não havia nenhum cavalheiro apostador pronto para lançar um dardo envenenado, nem uma dama prestes a espalhar ervas medicinais.
— De novo?! Eles vão colidir de novo?! — gritou o NPC, enquanto os holofotes brilhavam sobre os dois monstros.
— Hmm — murmurou Asuna. Notei que seus olhos estavam arregalados e piscavam rapidamente.
— O que foi?
— Nada… Estou bem. Acho que meus olhos estão cansados de tanto encarar.
— Hã…
Eu estava impressionado com o fato de que isso também podia acontecer em um mundo virtual, quando os monstros investiram pela terceira vez.
As vibrações sacudiram o chão. Instantaneamente, fui tomado por uma sensação estranha. O supostamente superior glyptodont estava um pouco mais lento do que nas duas investidas anteriores.
Aquilo não era ilusão. Quando os dois colidiram, estavam a cerca de um metro à esquerda do centro da jaula. O impacto ainda era feroz. A taça de champanhe que até então havia resistido aos tremores tombou, e precisei usar as duas mãos para segurá-la.
Todos os efeitos de luz e fumaça dentro da jaula desapareceram. Os chifres enrolados do bighorn estavam erguidos, e o glyptodont sacudia a cabeça baixa de um lado para o outro. Parecia que a redução na velocidade da investida estava fazendo diferença, porque agora a barra de HP do bighorn estava em melhor estado.
— Mas por que a velocidade dele caiu do nada...? — murmurei.
Asuna balançou a cabeça.
— Não sei… Não houve nenhuma interferência externa…
— Exato — concordei, examinando cuidadosamente. Mas não havia objetos estranhos cravados no corpo enorme do glyptodont, nem sinal de algum líquido jogado sobre ele.
O bighorn tinha pouco mais de 40% de vida restante, enquanto o glyptodont estava em torno de 38%. Duas investidas a mais provavelmente decidiriam tudo. Se o glyptodont continuasse perdendo terreno, o bighorn sairia vitorioso.
Essa mudança era resultado de alguma manipulação dos Korloy? E se fosse, como?
— Ah, de novo… — murmurou Asuna, piscando.
— O que está acontecendo com você?
— Não sei… Tem algo errado com meus olhos. Foi como se a cor do monstro tivesse mudado um pouco…
— Hã...? A do glyptodont?
— Antes, sim. Mas dessa vez foi a do bighorn.
Olhei rapidamente para a jaula de novo, mas não consegui notar nenhuma mudança de cor. A carapaça cinza do glyptodont e o pelo marrom-escuro do bighorn estavam exatamente iguais aos do início da luta… Não.
Não eram os monstros. Eram as pedras onde eles estavam. Havia uma diferença muito sutil de cor entre as duas, pensei. Sob os pés do glyptodont, as pedras eram de um cinza neutro, enquanto o local sob as patas do bighorn era levemente esverdeado…
— Hã…?!
Abaixei-me um pouco e me virei discretamente. Eu não olhava para os assentos VIP, mas muito mais acima, para os quatro holofotes no topo das paredes de pedra do cassino. A iluminação das grandes lâmpadas lá em cima era refletida por lentes côncavas antes de ser concentrada em feixes de luz. Do meu ponto de vista, os dois à direita tinham a cor de uma chama natural, mas os dois à esquerda tinham um tom levemente esverdeado. Os sentidos aguçados de Asuna perceberam a mudança na cor dos monstros, mas eu só consegui notar a diferença nas pedras do chão.
Não havia como essa diferença sutil de cor fazer parte da ambientação. Provavelmente, havia algum tipo de efeito negativo associado à luz esverdeada.
Estavam usando isso para garantir que o bighorn vencesse de surpresa… Mas espera, isso não fazia sentido. Segundo Asuna, os holofotes verdes estavam iluminando o glyptodont antes, mas agora estavam sobre o bighorn.
Se os Korloy estivessem controlando as luzes, isso significaria que estavam prejudicando os dois monstros.
……!! De repente, uma possibilidade me veio à mente. Endireitei-me e fui abrir minha janela — mas me detive. Argo estava se infiltrando no quarto de «Bardun» agora, então eu não podia pedir que ela enviasse mensagens para Kio.
Em vez disso, tirei a folha de apostas do bolso do meu smoking. No rodapé, em letras minúsculas, havia uma lista de regras e regulamentos da arena.
Penalidades por interferir com os monstros dentro da jaula…
Anulação do prêmio caso o bilhete seja perdido ou destruído…
Pagamento dos bilhetes vencedores tem prazo até a meia-noite do dia do evento…
E então, escondido nas letras miúdas, eu encontrei.
Se ambos os monstros ficarem incapacitados de lutar por um período de pelo menos três minutos, ou se ambos morrerem simultaneamente, não haverá vencedor declarado, e nenhuma ficha será paga.
— É isso…! — exclamei.
— O quê? — Perguntou Asuna, confusa. Apontei o item próximo ao fim da lista. Dois segundos depois, ela ficou tensa e imóvel, seu vestido preto tremendo brevemente.
— Em caso de empate... Todas as apostas vão para a casa?!
— É exatamente isso que eles estão tentando. Aquela luz verde está desacelerando o monstro sobre o qual incide. Eles estão usando isso para ajustar com precisão o dano, de modo que a colisão final derrube os dois ao mesmo tempo.
— Mas... Não pode ser tão fácil forçar um empate…
Asuna tinha razão. Se animais no mundo real continuassem sangrando em estado crítico, acabariam morrendo, mas, em SAO, enquanto um monstro tivesse pelo menos um ponto de vida, ele não morreria. E mesmo que os ataques parecessem acontecer ao mesmo tempo, na maioria das vezes, o sistema registrava uma diferença de tempo inferior a um décimo de segundo, com prioridade para o primeiro golpe.
Para causar um empate em PvP, quem recebesse o primeiro ataque e perdesse todo o HP teria que causar um dano excepcional com uma habilidade ou item — ou realizar algum milagre para manter seu avatar em movimento até ser considerado um empate.
Presumivelmente, o mesmo se aplicava a batalhas entre monstros, mas havia uma chance muito maior de empate nesse confronto específico. O bighorn selvagem e o glyptodont usavam ataques de cabeçada exclusivamente, o que significava que os ataques e os danos seriam simultâneos. Se «Bardun Korloy» tivesse escolhido colocar um bighorn contra o glyptodont dos Nachtoys especificamente por esse motivo, então sua astúcia e esperteza eram reais. Embora eu não tivesse provas, suspeitava que isso não fazia parte de um script pré-programado da missão, e sim do excelente planejamento da IA de Bardun, preparada para qualquer desfecho.
Dentro da arena, as duas feras se preparavam para o quarto ataque de investida. O bighorn arranhava o chão com a pata dianteira direita, e o glyptodont firmava seus grossos membros contra o solo.
As criaturas ergueram as cabeças e rugiram com tanta força que era quase possível ver o ar tremendo.
Aquilo era ruim. Um ataque especial — um golpe final. Ainda seria uma cabeçada, mas com o dobro de força. Se colidissem novamente com força total, o bighorn selvagem poderia sobreviver graças à vantagem nos pontos de vida, mas ele também estava sob o efeito das luzes de enfraquecimento. O ajuste fino nos danos podia facilmente levar ambos à morte, cumprindo os requisitos para um empate.
As duas criaturas rosnavam, esperando o momento certo para atacar. Precisávamos fazer algo sobre a luz de debuff nos próximos dez segundos ou nós, a ALS e a DKB, perderíamos todas as fichas juntos.
Será que conseguiríamos bloquear a luz com algum pano? Não, impossível. Os holofotes vinham do alto da parede atrás de nós, e nenhum estiramento permitiria alcançar o ângulo dos feixes. Uma cortina de fumaça? Também não — não havia como gerar fumaça suficiente de uma só vez para bloquear a luz. Se não podíamos bloquear, teríamos que fazer algo com os próprios holofotes, mas eles estavam a mais de trinta metros de distância. Nem mesmo uma corrida instantânea chegaria a tempo.
Em menos de meio segundo, descartei três ideias. Se ao menos eu tivesse magia! Mas mesmo que eu conseguisse lançar uma bola de fogo na arena, só causaria uma confusão. Seria acusado de interferir na luta e penalizado, talvez até preso.
Sem magia, sem arco e flechas; talvez eu conseguisse lançar uma faca ou algo pesado à distância, mas não havia tempo para procurar isso no inventário. Se ao menos eu tivesse algo para arremessar — de preferência, algo pesado, duro e longo…
Havia uma taça de champanhe nas minhas mãos. Olhei para o chão e depois para a mesinha acoplada ao encosto da cadeira à minha frente.
No canto da mesa havia um suporte com alguns itens para uso dos convidados — um guardanapo de cânhamo, um pequeno garfo e colher, e uma caneta de latão, do mesmo tipo encontrado na mesa do refeitório.
Coloquei a taça sobre a mesa e peguei a caneta. Não era tão refinada quanto uma caneta-tinteiro do mundo real — apenas um recipiente de tinta com um buraco na ponta — mas isso a tornava resistente e razoavelmente pesada.
Havia outra caneta de latão sobre a mesa diante de Asuna, que eu peguei e entreguei a ela, lançando um olhar significativo na direção dos holofotes atrás de nós. Minha parceira entendeu e assentiu.
Dentro da arena, o glyptodont e o bighorn selvagem pararam de rosnar e abaixaram as cabeças.
Asuna e eu nos viramos, usando o encosto das cadeiras como cobertura. A área do público estava totalmente escura, e todos estavam hipnotizados pela batalha. Se usássemos uma habilidade com espada, chamaríamos atenção, mas nem Asuna nem eu tínhamos a habilidade de «Throwing Knives». Isso significava que precisaríamos acertar os holofotes a trinta metros de distância, sem qualquer assistência do sistema.
Os alvos eram condensadores de luz com cerca de vinte centímetros de diâmetro. Acertá-los com a caneta não apagaria a fonte de luz, mas se as lentes rachassem, a luz se dispersaria — o que deveria anular o efeito de debuff.
— Há mais canetas nas outras mesas também; não hesite, apenas jogue! — sussurrei ao ouvido de Asuna.
Mas, na verdade, não teríamos uma segunda chance se errássemos o primeiro lançamento. Pelas minhas costas, eu praticamente sentia os monstros começando a correr. Agachado atrás da cadeira, puxei o braço o máximo possível para trás. Asuna fez exatamente o mesmo, no mesmo instante.
Com ou sem assistência do sistema, Asuna e eu tínhamos status acima do nível 20, concentração forjada em inúmeras situações de vida ou morte e (provavelmente) a proteção da sacerdotisa da Árvore Sagrada.
Vamos acertar!! pensei, canalizando minha vontade de vencer para dentro da caneta de latão enquanto lançávamos nossos projéteis.
Enquanto as duas canetas cruzavam a escuridão, cintilaram uma única vez, refletindo a luz.
Atrás de nós, os dois monstros começaram a investida.
E então, os dois holofotes distantes estilhaçaram-se, tanto as lentes côncavas quanto os espelhos refletores se despedaçaram. O rugido da multidão foi tão alto que era impossível ouvir o som dos estilhaços.
A luz de debuff se refratou em todas as direções. Virei-me de volta e vi o bighorn e o glyptodont, brilhando em azul e vermelho, respectivamente, correndo um contra o outro.
O bighorn selvagem parecia um pouco mais lento para começar, mas logo se endireitou e acelerou novamente. Os chifres curvados e a carapaça saliente colidiram bem no centro da jaula.
Cerrei os dentes, me preparando para uma onda de choque duas vezes mais forte que a anterior. A multidão gritou enquanto taças de champanhe caíam das mesas, estilhaçando-se em cacos azuis. Os efeitos de luz criados pelos dois monstros eram tão intensos que ninguém pareceu notar que os refletores estavam com metade da intensidade de antes.
Se alguém fosse perceber a diferença, seria «Bardun Korloy»… Mas, naquele momento, havia algo mais urgente.
No centro da jaula, a luz e a fumaça do impacto ainda giravam violentamente. Eu não conseguia distinguir bem os monstros, mas as duas barras de HP visíveis no ar estavam diminuindo exatamente na mesma velocidade.
Estavam abaixo de 30 por cento, 20 por cento… 10 por cento.
Será que o nosso incrível arremesso de caneta foi em vão? O bighorn e o glyptodont iriam cair ao mesmo tempo, resultando em um empate e garantindo à casa todas as fichas apostadas nessa partida final?
A mão esquerda de Asuna alcançou a minha direita. Apertei sem pensar, e ela segurou com toda a força que tinha.
Por fim, os efeitos visuais começaram a enfraquecer, revelando as formas das duas enormes criaturas. O bighorn e o glyptodont estavam imóveis no centro da jaula, com as cabeças pressionadas uma contra a outra. As barras de HP ainda esvaziavam: 7 por cento, 5 por cento, 3… Então a do bighorn parou de cair.
A do glyptodont, porém, continuou — até chegar a zero.
A força robusta abandonou seus membros, e a pequena montanha de besta tombou com um estrondo no chão da jaula. Uma luz azul envolveu seu corpo, que se contraiu momentaneamente antes de explodir em incontáveis pedaços.
No silêncio chocado que se seguiu, o bighorn ergueu lentamente a cabeça.
— Q-Qu-Qu-Que colisão!! — exclamou o locutor NPC, enquanto a multidão explodia entre euforia e desespero. — O vencedor desse combate feroz, um dos mais grandiosos e intensos da história desta Arena de Batalha, é… Verdian Bighoooorrrn!!
O bighorn vitorioso jogou a cabeça para trás e soltou um bramido triunfante.
Soltei o ar que estava prendendo e olhei para Asuna, que me devolveu o olhar. Talvez ela não tivesse percebido que ainda segurava minha mão — ou talvez tivesse.
De qualquer forma, ela murmurou.
— Então… Em quem a gente apostou mesmo?
— Acho que foi no bighorn.
— Então ganhamos a aposta? Quantas fichas isso dá?
— Hm…
Na minha cabeça, tentei multiplicar as mais ou menos sessenta e duas mil fichas que havíamos ganhado antes pelos odds do bighorn, mas fui interrompido por uma súbita sensação de arrepio na nuca.
Parei de calcular e espiei entre os encostos das cadeiras atrás de nós. «Bardun Korloy» estava se levantando do seu lugar na área VIP, apontando audaciosamente em nossa direção, os olhos ardendo de fúria. Parece que ele não perdeu o momento em que as canetas voaram pela escuridão. Quatro homens de terno preto deixaram a área VIP, vindo na nossa direção.
— Ih…
Encolhi o pescoço e puxei a mão de Asuna. Continuamos agachados, passando entre as pernas dos outros espectadores e pelas costas das cadeiras à nossa frente, seguindo para a esquerda da fileira. Quando alcançamos os degraus no fim, viramos e subimos rapidamente para a área do bar-restaurante, depois seguimos em direção à saída.
— P-Pra onde estamos indo?
— Vamos voltar pro terceiro andar para trocar de roupa. Tô preocupado com os outros também.
— Boa ideia…
Sob sua máscara de borboleta, os lábios de Asuna se contraíram. Estávamos nos esgueirando pela multidão no bar-restaurante, com as cabeças baixas, quando uma voz familiar rugiu com raiva e agonia em algum lugar à esquerda.
— Como é que isso foi acontecer?!
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